Internacional

Tão repressivo como a última ditadura que derrubou, o governo dos aiatolás, sob a fachada de um discurso igualitário, é um regime retrógrado que não se opõe ao "neoliberalismo", mas à própria idéia de progresso

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A esquerda vibrou quando eles expulsaram o xá do Trono do Pavão e instauraram, no lugar, uma república islâmica cuja primeira iniciativa em política externa foi conclamar as massas do Oriente Médio à guerra santa contra os Estados Unidos, o "Grande Satã". A alegria durou pouco - o tempo suficiente para se perceber que o regime dos aiatolás iranianos era, no mínimo, tão repressivo como a ditadura que derrubou. Todas as forças políticas laicas, inclusive as marxistas, foram eliminadas de cena, em muitos casos fisicamente; as mulheres, obrigadas a se esconder atrás de véus e de pesados vestidos negros; o pensamento, sufocado por um clima de obscurantismo que encontrou seu maior símbolo na sentença de morte contra o escritor Salman Rushdie, o autor dos Versos Satânicos. "Assassinato - como lembrou o New York Times em recente editorial - não é uma forma aceitável de crítica literária".

Também a direita não poupou aplausos quando eles, com armas americanas e dinheiro dos xeques do petróleo, humilharam o Exército Vermelho nas montanhas do Afeganistão. O que ninguém poderia prever é que os mísseis portáteis Stinger doados pela CIA aos guerrilheiros mujahedin, eficientíssimos contra a aviação soviética, fossem parar nas mãos de terroristas espalhados pelo mundo, enquanto os muçulmanos afegãos continuam se digladiando até hoje pelo poder. Pior ainda: que alguns desses "combatentes da liberdade", como o presidente Ronald Reagan os chamava, acabariam por levar o terror ao próprio território americano, com um atentado devastador no World Trade Center, o emblema do capitalismo em Manhattan.

Protagonistas da maior revolução deste final de século, os militantes islâmicos - ou fundamentalistas - são uma formidável charada para os ocidentais, incapazes de compreender o fenômeno dentro dos conceitos de "esquerda" e "direita" nascidos da Revolução Francesa. No bloco político ocidental liderado pelos Estados Unidos, a posição é clara: o islamismo como ideologia é um inimigo a ser combatido a ferro e a fogo, para o bem dos interesses das multinacionais e dos regimes conservadores nos países de fé muçulmana. Do lado das esquerdas, ou do que restou delas, há uma tentação quase irresistível de se torcer pelo time do Islã. Revoluções, afinal, são um produto escasso nesses tempos de pós-Guerra Fria.

O levante fundamentalista, que varre como um vendaval a faixa do planeta que se estende do Norte da África ao Sudeste Asiático, tem mesmo vários dos ingredientes de uma boa revolução. É um movimento de massas, com raízes nas multidões que sofrem com o desemprego, a estagnação econômica e as altíssimas taxas de natalidade. Suas bandeiras são igualitárias, aparentadas, nesse ponto, às reivindicações populares de qualquer lugar do Terceiro Mundo - contra o crescente abismo entre ricos e pobres; por saúde, moradia e educação ao alcance de todos; por uma vida digna e justa que, acreditem, só será possível através do retorno aos valores religiosos tradicionais, sufocados por décadas de ocidentalização. Com ênfase à caridade e ao espírito solidário, os fundamentalistas preenchem as lacunas do Estado com uma ampla rede de serviços sociais, como escolas, hospitais, creches, centro esportivos e assistência jurídica gratuita. É onde recrutam seus militantes.

Na opinião da maioria dos analistas, o fascínio que a política do Islã exerce sobre a juventude é conseqüência do fracasso de todas as ideologias experimentadas no Oriente Médio durante as últimas décadas. O nacionalismo árabe gerou ditaduras sanguinárias como a de Hafez Assad, na Síria, ou a de Saddam Hussein, no Iraque, tão eficientes para massacrar os próprios povos como inepta na economia e no combate a Israel, cuja existência é encarada como uma cabeça-de-ponte do Ocidente no coração do mundo muçulmano. Não por acaso, o ponto de partida da atual ascensão do fundamentalismo se situa em 1967, quando Israel estraçalhou os exércitos árabes na Guerra dos Seis Dias uma derrota interpretada por muitos como um castigo de Deus por terem se afastado do Islã. O socialismo à moda árabe teve seu exemplo mais expressivo no regime que vigorou durante trinta anos na Argélia, um país dominado por uma nomenclatura corrupta e incompetente, que posava de antiimperialista e dava abrigo a exilados da América Latina enquanto remetia para contas secretas na Europa bilhões de dólares roubados das estatais. O capitalismo, na versão das elites locais, teve como resultado mais visível as favelas e a criminalidade.

Numa época de perdas para os povos árabes, cuja imagem mais eloqüente talvez seja a dos soldados iraquianos maltrapilhos beijando as botas dos americanos no final da Guerra do Golfo, o fundamentalismo traz de volta a lembrança de uma era dourada, em que os cientistas e os filósofos árabes botavam no chinelo seus equivalentes europeus, e os domínios do Califa se estendiam até a Península Ibérica. Depois, durante os séculos de domínio otomano, a civilização árabe mergulhou num estado de torpor, ficando à margem do progresso vertiginoso no Ocidente. A influência européia e americana, mais intensa depois da Segunda Guerra Mundial, virou de cabeça para baixo o modo de vida tradicional no Oriente Médio, mas foram poucos os beneficiários das mudanças, como assinala o orientalista Bernard Lewis, da Universidade de Princeton. "A introdução dos métodos comerciais, financeiros e industriais do Ocidente propiciou um enorme acúmulo de riqueza, mas apenas para os membros das minorias ocidentalizadas e uma pequena parcela da maioria muçulmana. Com o tempo - prossegue Lewis - esse pequeno grupo aumentou, mas continuou isolado das massas, das quais se diferencia até mesmo na maneira de se vestir. Inevitavelmente, seus integrantes passaram a ser vistos como agentes e colaboradores de um mundo hostil".

De início, os governos pró-ocidentais do Oriente Médio menosprezavam o potencial revolucionário do fundamentalismo, ao qual chegaram a dar uma mãozinha em algumas ocasiões. Na década de 70, o presidente egípcio Anuar Sadat tirou centenas de militantes islâmicos dos cárceres onde tinham sido trancafiados por seu antecessor, Nasser, para que servissem de contrapeso ao avanço da esquerda. Nos territórios ocupados da Palestina, Israel fechou os olhos enquanto o Hamas - organização cuja sigla, em árabe, significa "fervor" - construía, com dinheiro saudita e iraniano, a rede assistencial que lhe permite hoje disputar em pé de igualdade influência com a OLP. Deu no que deu; Sadat acabou metralhado por um grupo de fanáticos e o Hamas tornou-se a maior ameaça ao acordo de paz israelense-palestino.

As organizações islâmicas não agem a partir de um centro unificado. Suas estratégias variam de país para país, ora pacíficas, ora violentas. Há grupos sunitas e xiitas - os dois ramos rivais em que se divide o islamismo. Só estão de acordo num ponto: a solução de todos os males sociais está no rompimento com a influência ocidental e substituição da lei dos homens pela Sharia, o conjunto de regras de inspiração divina que regula todos os aspectos da vida de um muçulmano, da alimentação ao casamento. Nos países onde chegam ao poder, sua primeira medida é proibir o álcool e instituir o código penal baseado no Corão - os assassinos são decapitados, os ladrões têm uma das mãos decepada e as mulheres adúlteras, mortas por apedrejamento. Na Arábia Saudita, o único país a aplicar integralmente a Sharia, são proibidos a música, a dança, o cinema e até mesmo os vasos de flores, prazeres terrenos que desviam os fiéis da contemplação de Deus. Durante a Guerra do Golfo, mulheres sauditas que desafiaram a lei dirigindo seus carros em passeata foram parar na cadeia. Mesmo em países de costumes mais abertos, os governantes tentam acalmar os grupos islâmicos com concessões ao integrismo religioso. A Jordânia, por exemplo, decidiu fechar as piscinas mistas, enquanto a Indonésia, há poucas semanas, cedeu ao clamor popular para acabar com a loteria. O governo egípcio, pressionado pelo establishment muçulmano, confiscou, em 1985, todas as cópias disponíveis de As mil e uma noites, o maior clássico da literatura árabe, proibido como pornográfico. Nesse ponto, todos os fundamentalistas se parecem - cristãos, judeus ou muçulmanos, eles adoram proibir.

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A fúria com que os fundamentalistas investem contra certas liberdades individuais tem a ver com a própria maneira muçulmana de organizar a sociedade. No Corão, não há lugar para a separação entre a Igreja e o Estado, um princípio consolidado no Ocidente desde o fim da Idade Média. O único país muçulmano onde o Estado está formalmente separado da Igreja é a Turquia, o menos religioso de todos. Nos demais, a idéia de "a César o que é de César, a Deus o que é de Deus" está ausente dos códigos legais, quando não é completamente ignorada. Para o devoto, a autoridade legítima emana diretamente de Deus, e não do povo. As leis não nascem das decisões humanas, através de um processo legislativo regido pela razão, mas são fruto da revelação divina. A Sharia é, portanto, um sistema jurídico hermeticamente fechado, perfeito por definição, em que não há espaço para debate nem para reformas. Cabe aos homens (e às mulheres), viver como Deus mandou.

Com seus aparelhos de fax, sermões em fita-cassete e armas sofisticadas (recursos do mundo moderno que, pragmaticamente, não desprezam), os militantes islâmicos estão mergulhados no universo cultural do século VII, quando o profeta Maomé lançou os fundamentos da civilização árabe a partir de um punhado de tribos nômades. Para eles, o Renascimento, o Iluminismo, o Manifesto Comunista, a teoria da evolução e a psicanálise são elementos de um mundo alienígena que não lhes diz respeito. Numa entrevista, o acadêmico marroquino Mohammed El-Jabry se queixava de que "não temos um Descartes, um Roger Bacon, um Karl Popper". Nesse quadro, a onda democrática que se espraia pelo planeta tem necessariamente uma leitura peculiar. Mesmo quando participam de eleições, os fundamentalistas tendem a reduzir a democracia à mera vontade da maioria. Os direitos das minorias, um componente essencial do regime democrático, são completamente desprezados. No islamismo puro e duro, não há lugar para o pluralismo político, para o conflito. As lutas sociais e as divergências ideológicas são um mal em si mesmas. Sequer passaria pela cabeça de algum trabalhador propor um sindicalismo combativo nos moldes do praticado pela CUT - no mínimo, seria chicoteado em praça pública.

Intrinsecamente autoritário, o islamismo militante cria impasses monumentais quando resolve disputar o poder segundo as regras da democracia. Na Argélia, a Frente Islâmica de Salvação (FIS) entrou nas primeiras eleições livres no país, em dezembro de 1991, fazendo profissão de fé de suas convicções democráticas, numa campanha que explorava, com habilidade, a situação de miséria da população. Ultrapassada a primeira fase do processo eleitoral em que conquistou 188 das 231 cadeiras em disputa e caminhava para obter, na segunda rodada, uma maioria folgada no Parlamento de 430 lugares -, o movimento ressuscitou sua velha palavra-de-ordem: "Nada de Constituição. Só as leis de Deus e o Corão." Alguns oradores desarquivaram propostas como a "abolição" do trabalho feminino e a proibição das antenas "diabólicas", que permitem o acesso a emissoras de televisão estrangeiras. Não faltou pretexto para a entrada em cena dos militares em janeiro de 1992, apoiados pelo Ocidente e pelas elites seculares argelinas, as Forças Armadas assumiram o poder, cancelaram o segundo turno e colocaram a FIS na clandestinidade, provocando uma guerra civil em que os dois lados têm demonstrado requintes de brutalidade. A ambigüidade da FIS em relação à democracia não justifica o golpe de Estado, mas traz à tona a indagação sobre o que o movimento religioso faria se tivesse alcançado o poder. A piada que corre é que eleições livres, na definição dos fundamentalistas, se reduz a "um homem, um voto, uma vez só".

O paradoxo argelino em que a aplicação da democracia significa entregar o poder às forças interessadas em destruí-la - está presente também no Egito, palco de uma nervosa queda-de-braço entre o governo secular e a militância islâmica. Lá, a política do Islã apresenta-se em duas embalagens, uma moderada, outra terrorista. Com mais de um milhão de adeptos, a Fraternidade Muçulmana optou por formas de luta não violentas, na esperança de participar das eleições - algo fora das cogitações do regime de partido único que vigora no país com as bênçãos das potências ocidentais. Os extremistas reúnem algumas dezenas de milhares de jovens. Seu poder de fogo, porém, é suficiente para colocar o governo em pânico com uma onda devastadora de atentados que liquidaram vários figurões do regime e ameaçam privar o país de sua maior fonte de renda, o turismo. Embora a Fraternidade Muçulmana tenha condenado - muito a contragosto - o recurso ao terrorismo, na prática é quase impossível traçar uma linha divisória entre a ala pacífica do movimento islâmico e sua vertente violenta, uma vez que o objetivo é o mesmo, a implantação da Sharia. Um episódio significativo aconteceu durante o julgamento de alguns fundamentalistas acusados pela morte do escritor Farag Fodah, um dos mais importantes intelectuais egípcios, baleado no ano passado.

Um xeque tido como moderado, e dono de um programa semanal na televisão, foi convocado como testemunha de defesa. Em seu depoimento, declarou, referindo-se ao escritor trucidado: "Alguém que defenda o secularismo representa um perigo para a sociedade. O governo tem o dever de matá-lo."

Não é só no Egito que escritores têm a cabeça a prêmio. Por todo o mundo muçulmano, está em andamento uma guerra suja com o objetivo de extirpar qualquer manifestação de pensamento independente. Na Argélia, o terror islâmico ataca com particular ferocidade os jornalistas e os professores, mortos aos magotes. No caso mais chocante, um sociólogo foi degolado em sua própria casa por cinco fundamentalistas que obrigaram sua filha a assistir à cena. A caça às bruxas não se limita à praticada por grupos clandestinos. Em países muçulmanos de regime pró-ocidental, como Bangladesh, o fundamentalismo muçulmano é manipulado por governos conservadores. A escritora Taslima Nasrin, um Rushdie de saias, que defende a igualdade para as mulheres e a separação entre o Estado e a religião, teve seu livro Vergonha proibido, depois de vender 50 mil exemplares. A obra fala sobre uma família hindu perseguida em Bangladesh depois que a mesquita de Ayodhya, na Índia, foi destruída por fanáticos hindus, em dezembro de 1992. A alegação oficial foi de que a obra "criava desentendimento entre as duas comunidades".

Estudiosos do Islã chamam a atenção para a existência de correntes mais progressistas dentro da fé muçulmana. São os teólogos humanistas que nadam contra a corrente no esforço de conciliar a Sharia com a modernidade. Mas são sementes que só deverão germinar num futuro distante. No clima pesado que reina no Oriente Médio, qualquer tentativa de reforma do islamismo por ora está fadada à irrelevância. "O Islã é hoje a linguagem da oposição", diz Abu Zayd, um educador sudanês citado pela revista Foreign Affairs. "Para atrair os jovens, o Islã precisa ser raivoso e militante, contrário à ordem vigente. Falar num islamismo moderado, hoje, é uma contradição em termos."

Isso não significa que a maré fundamentalista seja um fenômeno irresistível, que só possa ser detido através da repressão. Na Jordânia, o país mais democrático do mundo árabe, o islamismo radical não só foi derrotado nas urnas, recentemente, como teve de engolir a eleição da primeira mulher para o Parlamento - já devidamente ameaçada de morte. Na Turquia, os partidos fundamentalistas não vão além dos 15% dos votos e, mais importante, não têm o monopólio da representação das massas dos deserdados. Há pouco tempo, quando um famoso jornalista laico foi assassinado por terroristas islâmicos, seus funerais transformaram-se numa das maiores manifestações da história do país. Mesmo nas antigas repúblicas do Sul da União Soviética, o renascimento religioso tem coloração menos extremista.

Apesar da sedução que exercem sobre as massas, as propostas dos fundamentalistas ainda não foram aprovadas no teste da prática. Catorze anos depois da revolução islâmica no Irã, a população está vivendo pior do que nos tempos do xá. A renda per capita é de dois terços do que era e a economia está em frangalhos. Depois da morte de Khomeini, uma facção mais arejada subiu ao poder. Entre outras coisas, pretendia-se afrouxar o moralismo, atrair capitais e tecnologia do Ocidente e privatizar a indústria, monopolizada por fundações religiosas que produzem de automóveis a pirulitos. O projeto não prosperou. A crise é tão profunda e o descontentamento popular tão generalizado que, para o regime não desmoronar, os aiatolás "pragmáticos" tiveram de pedir socorro à linha dura. Resultado: as milícias islâmicas voltaram às ruas, revistando carros em busca de bebidas alcoólicas e castigando mulheres vestidas de maneira "imprópria". Nos demais países do Oriente Médio, onde estão fora do governo, os fundamentalistas ainda não foram capazes de explicar como a aplicação da Sharia iria trazer a prosperidade e a justiça social por eles prometida. "Para uma utopia, o melhor remédio é a realidade", diz o professor argelino Lahouari Addi, em artigo publicado no Libération.

Sob a fachada de um discurso igualitário, o fundamentalismo islâmico é uma força essencialmente retrógrada, incompatível com os direitos humanos como a liberdade de expressão, de religião e, em particular, com os direitos das mulheres. "Não se trata - como observa a jornalista Judith Miller, autora do livro Saddam Hussein e o conflito do Golfo Pérsico, editado no Brasil -simplesmente de uma maneira diferente, e igualmente aceitável, em termos morais, de organizar a sociedade." Na esteira da pregação apocalíptica dos mulás, legitimam-se costumes bárbaros, como a mutilação genital feminina, uma tradição em países muçulmanos da África cuja prática por imigrantes na França dá munição aos políticos racistas, ou o apedrejamento de mulheres que voltam a casar-se depois do divórcio, como ocorre, sob o manto da Sharia, nas áreas rurais do subcontinente indiano. A resistência aos programas de ajuste econômico inspirados pelo FMI, quando ocorre, é circunstancial. A oposição não é ao "neoliberalismo" mas à própria idéia de progresso.

A imensa distância, geográfica e cultural, que separa o Brasil de países como o Irã ou a Argélia não deve nos induzir a uma atitude complacente em relação ao fundamentalismo. Durante muito tempo, as esquerdas da América Latina adotaram, nas questões internacionais, a fórmula tortuosa segundo a qual "o inimigo do meu inimigo é meu amigo". O que é ruim para os Estados Unidos é bom para o Brasil, como diria um Roberto Campos às avessas. No que toca ao Oriente Médio, essa postura pavloviana é o que levou alguns brasileiros a apoiar a invasão do Kuwait pelo Iraque de Saddam Hussein. O fim da Guerra Fria pode não ter alterado os interesses essenciais do império americano, mas tornou o mundo incompreensível nos marcos do velho maniqueísmo. No ano passado, para ficar só com dois exemplos, assistimos ao enterro do apartheid sul-africano, sob os aplausos de todo o establishment internacional, e à assinatura, com as bençãos de Washington, de um acordo entre Israel e a OLP que abre caminho para a criação de um Estado Palestino. Quem apoiamos? Mandela ou os grupos que querem uma África do Sul só para os negros? Arafat ou os fundamentalistas?

Igor Fuser é jornalista

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