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O presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, fala a Wladimir Pomar do futuro energético do país

O presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, fala a Wladimir Pomar do futuro energético do país, explica as mudanças ocorridas com o governo Lula, a produção de biocombustíveis e os impactos da crise internacional no setor petrolífero

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Qual é a natureza jurídica da Petrobras? Ela é totalmente estatal?

Em seus primeiros anos, a Petrobras foi constituída para garantir o volume de combustíveis que o Brasil precisava, mesmo sem produzir a quantidade suficiente. Desde sua origem, a empresa tem características mistas, porque possui ações privadas e o governo como controlador. Mais recentemente ocorreram duas mudanças, distintas, que provocaram impactos diferenciados. A primeira é que, até 1998, o monopólio direto da exploração e produção do petróleo da União era exercido pela Petrobras. A empresa tinha o direito de exercício do monopólio da União sobre os recursos de hidrocarbonetos. Em 1998, esse monopólio acabou e a companhia foi forçada a competir com outras empresas para exercer a atividade de exploração e produção de petróleo. Em 2000 houve uma segunda mudança, que não tem a ver diretamente com a quebra do monopólio. Parte das ações que pertenciam ao governo foi colocada no mercado a dois tipos de acionista: trabalhadores com conta no FGTS e acionistas da Bolsa de Valores do Brasil e de Nova York.

Hoje o governo tem 56% das ações com direito a voto, mas só 37% das ações totais da Petrobras. Mesmo assim, tem o controle da empresa, por meio da indicação dos membros do Conselho de Administração, que se reúne mensalmente para definir questões estratégicas. De um lado, houve uma mudança na quebra do monopólio estatal do petróleo no que se refere ao exercício. Mas a União continua exercendo o monopólio por meio de concessões.

Como ficou a Petrobras diante dessa situação?

Esse sistema provocou uma enorme pressão sobre a Petrobras em termos competitivos. A companhia continua submetida a todos os controles do setor público e, ao mesmo tempo, tem de responder com agilidade, como uma empresa privada.

Além disso, como 40% do valor das ações está em Nova York, é submetida também às leis do mercado norte americano. Precisa ter mais transparência que qualquer outra estatal, pois é acompanhada no dia-a-dia pelos analistas e fiscalizadores do mercado de ações, afora os controles de órgãos do governo brasileiro.

A Petrobras deu ao Brasil a autossuficiência na produção de petróleo. O que isso significa de fato?

A autossuficiência foi conquistada. É bom lembrar que a Petrobras começou produzindo 2.300 barris diários e, hoje, são 2,4 milhões de barris. Em termos quantitativos, produz o volume que as refinarias têm capacidade para processar, mas isso não quer dizer que a Petrobras e o Brasil deixarão de importar. Nossa produção é, predominantemente, do chamado petróleo pesado, do qual são produzidos derivados pesados. Porém, a demanda brasileira cresce em deriva dos mais leves, como óleo diesel, GLP, nafta. Para produzir mais derivados leves, ou ajustamos as refinarias para processar o petróleo pesado e gerá-los, ou obtemos um petróleo mais leve no exterior, para processar uma proporção maior nas refinarias.

Estamos fazendo as duas coisas: investindo fortemente nas nossas refinarias, para aumentar a capacidade de processar o petróleo brasileiro, e, ao mesmo tempo, a depender das crises dos preços, importamos petróleo leve para usar nas refinarias e exportamos o pesado que produzimos.

Então, atingimos a autossuficiência na produção, em termos volumétricos, mas não deixamos de importar. Como temos no país um mercado de derivados de combustíveis, o mais importante para nós é fornecer o diesel, a gasolina, o gás de cozinha que o Brasil precisa para crescer. Temos, hoje, uma capacidade de produção de gasolina excedente, mas não produzimos o suficiente de nafta, GLP e diesel para esse mercado.

A Petrobras deixou de ser uma empresa exclusivamente de petróleo e passou a ser uma empresa de energia, e tudo indica que o petróleo continuará sendo um grande insumo. Quais as perspectivas reais em relação a isso e quais são os planos da nova subsidiária da Petrobras para cuidar dos biocombustíveis?

Nos próximos anos, não vemos mudanças significativas na proporção de petróleo, gás natural e carvão como fontes primárias de energia no mundo. Esses três combustíveis continuarão representando de 70% a 80% das fontes primárias de energia mundial nos próximos trinta, quarenta anos.

No que se refere ao petróleo, vemos uma situação em que, se a demanda mundial crescer 1% ao ano, haverá em 2020 um déficit potencial de 55 milhões a 65 milhões de barris por dia, em relação à produção atual. Esse déficit será coberto parcialmente pelo aumento da produção de petróleo, pela melhor eficiência no uso do petróleo e pelo uso de combustíveis alternativos.

No que se refere aos biocombustíveis, achamos que o etanol de cana, em particular, é a alternativa com a maior possibilidade de crescer. Não acreditamos que vá substituir a gasolina, mas poderá ampliar a proporção de fornecimento de combustíveis para veículos. No Brasil, o álcool já representa mais de 50% dessa proporção.

Esse crescimento do uso do álcool de cana no país coloca a Petrobras, produtora de gasolina, na situação de ter de buscar alternativas. Do ponto de vista da empresa, temos de ampliar a presença na produção e na logística do etanol. Isso decorre da avaliação de que esse setor crescerá no mundo. Então, nós, que temos todas as possibilidades logísticas, a vantagem de estar no Brasil e a expertise acumulada, podemos nos posicionar bem. Por outro lado, temos de manter uma posição exemplar para minimizar os impactos negativos da expansão de biocombustíveis, de modo que não afete a produção alimentar nem tenha impactos ambientais. Também precisamos cuidar para que condições sociais não se deteriorem, ao aumentar sua produção, e ter a condição de regular sua produção como combustível, e não apenas como algo alternativo ou complementar à produção do açúcar.

No caso do biodiesel, uma indústria mais nascente que a do etanol, a Petrobras tem um papel ainda mais importante. Hoje, a principal matéria-prima para o biodiesel é a soja, mas isso precisa ser diversificado. Temos de usar matérias-primas que envolvam, de um lado, o desenvolvimento tecnológico e, de outro, a montagem de uma cadeia de produção baseada na agricultura familiar ­ o que requer tempo, organização social e articulação com a sociedade. Por isso, criamos a Petrobras Biocombustível. Os US$ 2,8 bilhões que usaremos na área do etanol e do biocombustível, nos próximos cinco anos, são investimentos muito grandes para o setor, mas pequenos dentro da Petrobras. Se fosse para cuidar do setor de biocombustíveis, esta sempre seria uma atividade menor dentro do volume de empreendimentos da companhia. No entanto, ao criar uma empresa exclusivamente para esse fim, a dimensão é outra.

Qual o significado do pré-sal para o Brasil e para a Petrobras?

Temos uma situação muito peculiar. A maior parte das grandes empresas de petróleo do mundo é exportadora de petróleo cru ou grandes refinadoras que atendem diversos mercados. A Petrobras tem a maior parte de sua produção relativamente perto de suas refinarias e localizada no seu principal mercado consumidor. Essa característica obriga a empresa a investir não exclusivamente na área do desenvolvimento da produção e da exploração, mas também no refino, gás, e na área energética em geral.

Outra característica da companhia é seu sucesso exploratório, em volumes significativos, que podem se transformar em reservas rapidamente. Poucas empresas do seu tamanho têm grandes descobertas recentes. A maioria está com seus campos consolidados.

O pré-sal é uma área que foi formada há bilhões de anos, quando os continentes africano e latino-americano ainda estavam unificados. Foi constituído, portanto, antes que o sal se compusesse. Com a separação dos continentes, o sal se formou por cima dos reservatórios. Isso viabilizou a existência de uma camada de sal muito extensa, mantendo abaixo dela volumes significativos de petróleo.

O desenvolvimento tecnológico, basicamente da Petrobras, mas não só dela, permitiu interpretar os dados dessas camadas e identificar o que havia debaixo. As condições para encontrar petróleo podem ser identificadas no laboratório, mas, certeza, somente perfurando. Fizemos dezesseis furos nas áreas que vão do norte de Santa Catarina até o sul do Espírito Santo, e em todos encontramos petróleo. As áreas com grande volume ficam em Tupi, Iara e no Espírito Santo. São de 9.500 bilhões a 14 bilhões de barris de óleo recuperado nas três. As reservas totais do Brasil, hoje, são de 14 bilhões de barris. Portanto, num horizonte próximo, é possível dobrá-las. Isso sem falar nas outras áreas com volume já identificado.

O nosso plano estratégico prevê que, até 2020, produziremos no pré-sal das bacias de Santos e do Espírito Santo 1,8 milhão de barris por dia. Levamos 54 anos para atingir esse mesmo volume e, agora, pretendemos aumentar mais 1,8 milhão de barris em doze anos, somente nas áreas já identificadas. Isso envolve investimentos da ordem de US$ 111 bilhões. Estes representam uma parte do total para desenvolver a produção do pré-sal até 2020.

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Quais as consequências dessa descoberta para a sociedade brasileira?

Se vamos aumentar o volume da produção de petróleo, é preciso aumentar a capacidade de refino. O mercado brasileiro vai crescer e o valor adicionado, que se tem pela venda de derivados como nafta, GLP e diesel, será maior do que se for negociado apenas o produto não refinado. É preciso olhar para os recursos do pré-sal em relação à capacidade de refino. Estamos ampliando essa capacidade, do atual 1,9 milhão de barris para 3,3 milhões, por dia, até 2020. Além disso, teremos um volume de royalties e participações elevado, o que aumentará a arrecadação tributária, concentrada em determinadas áreas.

Existe ainda um potencial enorme de áreas não identificadas na região do pré-sal. O regime regulatório brasileiro hoje premia àquelas empresas que assumiram o risco exploratório, que compraram o bilhete antes de ser premiado. No pré-sal, o risco exploratório é mínimo. É um bilhete premiado. Para as áreas não descobertas as regras têm de mudar, porque as condições exploratórias não são as mesmas. O monopólio do exercício da exploração e produção do petróleo dessas áreas é da União, tanto é que permanece na Constituição brasileira e permite a concessão como exceção.

Como cidadão, acho que esse monopólio deve ser utilizado pela União para beneficiar uma transferência de renda intergeracional. Deve promover a expansão da educação, da saúde e da infraestrutura, de maneira que se tenha a consolidação de um processo de inclusão social e de mudança da sociedade. É preciso redefinir as regras para essas áreas não concedidas ­ o que será resultado do funciona mento da comissão interministerial, criada pelo presidente Lula.

Temos três situações no caso do pré-sal. As áreas já concedidas que têm um sistema regulatório, condições legais e contratos definidos; as áreas vizinhas às já concedidas, que pertencem à União e apresentam algumas diferenças em termos regula tórios e tributários, a serem definidos; e aquelas das quais ninguém tem noção e pertencem à União. A legislação atual permite premiar as empresas que assumem riscos exploratórios onde os há. Pode-se manter esse regime para outras áreas, que não sejam as identificadas do pré-sal.

O pré-sal é muito importante para a sociedade brasileira, pois envolve um volume de recursos muito significativo. Com ele, abrem-se novas oportunidades. Fazendo uma política de conteúdo nacional competitiva, que atraia novos capitais e desenvolva competências, poderemos sustentar um conjunto de fornecedores do país, que vão gerar emprego e renda com um conjunto de atividades que atendam o setor petrolífero e também outros setores da economia brasileira. Portanto, distribuindo o crescimento, tanto regional quanto setorialmente, e permitindo maior inclusão social.

Esta é uma enorme oportunidade para crescer, adensar a malha produtiva brasileira, ampliar os benefícios econômicos e sociais da utilização desses recursos. O volume de produção que prevemos tornará o Brasil um dos grandes produtores mundiais de hidrocarbonetos. Do ponto de vista geopolítico, altera a correlação de forças do país no mundo.

O que mudou na Petrobras com o governo Lula?

A empresa é praticamente a mesma desde os anos 50, mas algumas coisas foram mudadas e são essenciais. A atividade exploratória da Petrobras estava definhando, e isso é mortal. Revertemos esse cenário com a diretoria que assumiu em 2003 e crescemos nas áreas exploratórias. Abrimos horizontes de longo prazo para a continuidade da expansão da empresa.

O segundo elemento importante é que a empresa estava caminhando para um processo de partição, segmentação, em unidades de negócios isoladas, em que se privilegiava o resultado da unidade em detrimento do sistema como um todo. Reforçamos os vínculos corporativos e do sistema Petrobras, fortalecendo a instituição.

O terceiro movimento foi a retomada dos investimentos em refino, que estavam em faixas muito baixas. Investimos e ampliamos a capacidade das nossas refinarias, assim como continuamos os investimentos na qualidade de nossos produtos.

Em quarto, intensificamos a reconstituição da força de trabalho da Petrobras. Hoje temos 60% dela com mais de dezoito anos na companhia e 40% com menos de oito anos. Esse processo se intensificou em 2003. Reforçamos a constituição de uma força de trabalho da Petrobras, com transmissão de valores corporativos e nacionais, consolidando um grupo empresarial com fortes vínculos com o país, olhando para o longo prazo.

No que se refere à área de gás e energia, passamos por um processo turbulento de ajuste de decisões anteriores, que levavam a situações dramáticas no portfólio de termoelétricas e na estrutura de gás da companhia. Fizemos um processo de melhoria substantiva nas condições de propriedade e nos contratos na área de gás. Investimos pesadamente em sua distribuição e levamos a Petrobras a ser uma das grandes geradoras de energia elétrica do país, a partir de usinas a gás, óleo, entre outros combustíveis.

Na expansão internacional tivemos a consolidação dos investimentos realizados e a concentração dos investimentos em áreas que permitam maior expansão do nosso potencial exploratório internacional. Foram movimentos para fortalecer a estrutura da Petrobras, enquanto companhia controlada pelo Estado brasileiro. Esse elemento fundante da empresa se fortaleceu muito nos últimos seis anos.

E a crise teve impacto sobre a empresa? Há mudanças, em função dela, para o próximo período?

Frente a toda essa estruturação, e como temos enormes potencialidades exploratórias, de refino, de gás e de biocombustíveis, não podemos olhar para o curto prazo. O tempo médio entre a primeira descoberta de petróleo e o primeiro óleo é de oito anos. Uma refinaria não se faz em menos de quatro anos. Então, no nosso plano estratégico há um plano de negócio até 2013, com uma visão até 2020.

O mundo continuará andando de carro, a carga continuará sendo transportada por caminhão, ônibus, aviões e navios. Todos continuarão circulando. As pessoas continuarão usando ar condicionado e aquecimento. Portanto, a demanda de óleo e gás persistirá. Temos de fazer o investimento agora. Somos uma das poucas empresas que podem fazer isso. Temos acesso ao produto, à tecnologia, temos a equipe, as condições institucionais, mas precisamos financiar.

Já estamos com todo o financiamento do investimento de 2009 resolvido. Vamos investir cerca de R$ 60 bilhões. Em 2010, se tivermos de investir US$ 35 bilhões, com o preço do petróleo a US$ 41, geraremos US$ 16 bilhões de caixa operacional. Precisamos financiar US$ 19 bilhões, mas, como já temos US$ 10 bilhões do BNDES, serão necessários apenas US$ 9 bilhões. No ano passado, levantamos R$ 18 bilhões e consideramos possível, em dois anos, conseguir os US$ 9 bilhões. Se, até 2013, o petróleo ficar em US$ 45, vamos levar o financiamento da companhia a até 35% de alavancagem. Então, por que não fazer o investimento?

Nesse sentido, eu diria que a crise não afetou diretamente a Petrobras. A crise nos atinge via mercado consumidor e financiamento. Torna difícil a captação de recursos, mas não impossível. No que se refere ao mercado consumidor, não está ainda claro o que acontecerá, se há uma mudança significativa em relação ao volume do que vendemos em 2007 e 2008. Temos de observar o primeiro trimestre de 2009, que parece indicar um ritmo de crescimento menor.

O mercado de fornecedores (sondas, navios, tubulações, equipamentos, compressores, máquinas, serviços) pode ter sua capacidade afetada com a crise do crédito. Estamos preocupados com isso e trabalhando para ampliar as linhas de crédito para os fornecedores. Praticamente dobramos o volume de recursos que pagamos com menos de trinta dias. É uma forma de ampliar o capital de giro do fornecedor.

Lançaremos, muito em breve, fundos com o BNDES e o Banco do Brasil, que vão financiar fornecedores da cadeia Petrobras. É uma área para a qual estamos tentando atrair novos capitais internacionais para se instalarem no Brasil, de forma que tragam expertise e experiência técnica, para manter a cadeia em funcionamento.

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Como o senhor vê as perspectivas do Brasil diante da crise?

Hoje deparamos com uma situação de crise internacional que provocará profundas mudanças mundiais em pelo menos três dimensões relevantes: em relação ao papel do Estado, à arquitetura institucional dos fluxos financeiros mundiais e às questões energéticas e ambientais. Diante dessas três dimensões, vejo o Brasil com excelentes condições de se tornar um grande líder mundial.

Em relação ao Estado, o país tem condições, tanto nacional quanto internacionalmente, de desempenhar papel muito importante como dinamizador e viabilizador da transferência intergeracional de riqueza, de inclusão social, de participação popular na gestão. No que se refere às questões financeiras, temos condições não só de ser exemplo internacional como também de influir fortemente na redefinição dos fluxos financeiros, de forma a privilegiar sua vinculação com a economia real. Portanto, voltar à linha da desvinculação do capital financeiro com o capital industrial é um caminho para o qual o Brasil tem contribuição importante a dar. O Estado como viabilizador do mercado interno de massas e de um sistema financeiro que privilegie os fluxos reais em relação aos fluxos puramente financeiros caracteriza um novo tipo de situação no mundo.

Frente a esse quadro, temos o aquecimento global do planeta, um crescente problema ambiental e energético cuja solução é vital para o progresso do mundo real. Nesse sentido, as condições do Brasil são muito boas. Tem hoje uma matriz energética bastante limpa e renovável e qualidades para ser um grande fornecedor de combustíveis alternativos. No curto prazo, temos condições macroeconômica e microeconômica, de vários segmentos no país, que permitem enfrentar a crise melhor. Podemos sair desta mais rapidamente do que outros.

Estamos vivendo agora uma situação objetiva do mandato do presidente Lula, com uma eleição dentro de dois anos. Temos condições de ter uma continuidade de políticas na direção de maior inclusão social, diminuição das desigualdades e melhor crescimento do mercado interno, com integração internacional. Nesse sentido, acho que a crise internacional, combinada com o desenvolvimento do país nos últimos seis anos, nos coloca numa situação muito positiva frente ao futuro.

Como está a Petrobras no exterior? O foco continua sendo a ação no Atlântico?

Em nosso plano estratégico, congelamos a política de expansão internacional e os investimentos no exterior. Tínhamos, no plano anterior,em torno de US$ 16 bilhões para a expansão internacional. No plano atual mantemos os mesmos valores.

Estamos hoje em 26 países. Nossa principal atuação internacional é de prospecção e exploração de petróleo. É importante mantê-la porque não somente diversifica nossas potenciais fontes de produção futura como permite um conhecimento mais variado do comportamento dos diversos reservatórios, o que acumula a capacidade de nos desenvolvermos no próprio Brasil. A prioridade hoje é claramente investir no Brasil. A companhia, que tem atividades ainda concentradas na chamada área do Atlântico (África, Golfo do México e Brasil), atua também no leste da África, na Ásia e na Europa. Mas o foco continua no Atlântico. A maior parte da nova produção vem da Nigéria e o maior investimento está nos Estados Unidos.

No processo de nacionalização na Bolívia, a Petrobras foi criticada tanto pela direita quanto pela esquerda. O que o senhor tem a dizer a respeito?

No caso de Bolívia, Equador e Venezuela, observamos um movimento legítimo dos governos em tentar ampliar a parcela na renda petroleira e do gás. Discordamos de alguns métodos, mas, em um processo de negociação duro com a Bolívia, chegamos a um patamar de respeito mútuo.

Quando o governo boliviano decidiu, legitimamente, que a atividade de refino não deveria ser de outras empresas, adquiriu nossas duas refinarias, pagando o real valor por elas. Não perdemos nada ao vendê-las. O governo boliviano usou uma forma que foi espalhafatosa, com o Exército em torno das refinarias, mais por razões políticas internas.

No que se refere a nossa atividade como produtor de gás na Bolívia, houve uma redução da rentabilidade, porque seu governo decidiu aumentar a tributação. Um movimento legítimo, que não inviabiliza nosso investimento naquele país. Por outro lado, como temos um contrato de fornecimento de gás extremamente estratégico para o mercado brasileiro, em particular para o centro-sul e em especial para São Paulo, é vital manter o fluxo de produção. Isso significa que, desde que haja condições, temos de investir na Bolívia, o que estamos fazendo. Com dificuldades, com muita negociação, em um ambiente que permite retorno pequeno porém positivo e viabiliza a expansão da produção.
O governo boliviano nunca deixou de cumprir os termos do contrato de venda de gás para o Brasil, mesmo no auge da crise. Temos uma relação conflituosa, sem dúvida, mas com parâmetros definidos. Empreendemos todos os esforços para manter essa relação estratégica, mas não podemos admitir que a necessidade boliviana de ampliar sua renda resulte em prejuízos para o consumidor brasileiro.

Com a Venezuela e o Equador, houve um movimento semelhante com características distintas. O governo ampliou sua presença na atividade exploratória e, evidentemente, reduziu nossa presença na área. Mas isso não é só um problema na América do Sul. Acontece em todo o mundo toda vez que o preço do petróleo ou gás sobe. Com a crise, com a redução do consumo, esse ambiente vai mudar de novo, em outra direção. É um processo cíclico geopolítico identificado.

Wladimir Pomar é membro do Conselho de Redação de Teoria e Debate

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