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Há vários anos se fala na necessidade de uma reforma política que fortaleça os partidos

Há vários anos se fala na necessidade de uma reforma política que fortaleça os partidos e possa permitir maior representatividade dos anseios da população. Mas essa reforma esbarra sempre na manutenção dos privilégios dos que detêm o poder econômico. Poder político e poder econômico são face e contraface da mesma moeda.

No caso brasileiro, a proliferação de siglas partidárias exprime os interesses particulares daqueles que desejam se perpetuar no poder. A última criação foi o Partido Social Democrático (PSD), para atender aos propósitos do prefeito de São Paulo. Mas a maior distorção ocorre pelo uso do poder econômico nas eleições, e a representatividade dos reais interesses populares fica assim comprometida.

Por outro lado, dificilmente se caminha para uma reforma econômica que permita melhor distribuição de renda e um sistema tributário que taxe proporcionalmente mais quem ganha mais. Assim, quem ganha até dois salários mínimos (SM) paga 49% de seus rendimentos em tributos e quem ganha acima de trinta SM paga 26%.

Alterar leis tributárias que reduzam a regressividade esbarra sempre nos interesses de parlamentares e/ou magistrados que não querem ver suas rendas e patrimônios alterados. Exemplo emblemático disso é o Imposto sobre Grandes Fortunas, previsto na Constituição de 1988, cuja regulamentação está travada no Congresso Nacional até hoje. Alterações na tabela do Imposto de Renda para dar maior progressividade tributária também não passam no Congresso.

Embora tenha havido, nos últimos anos, avanços nas questões econômicas, com melhora na distribuição de renda e crescimento da classe C, ainda perdura o domínio do mercado financeiro na condução da economia. A expressão desse domínio está nas altas taxas de juros que marcam o Brasil há vários anos como campeão mundial delas. Com isso se processa uma distribuição de renda às avessas, pois os ganhos financeiros se dão em cima dos títulos do governo, e esses juros são pagos por todos, especialmente pela população de média e baixa renda. Em 2010 atingiram R$ 195 bilhões, ou seja, quinze vezes o Bolsa Família.

Desde setembro do ano passado ocorre uma forte pressão do mercado financeiro pela elevação da Selic para combater a inflação, decorrente do crescimento mundial dos preços dos alimentos e commodities, mas o governo está tentando resistir com as chamadas medidas macroprudenciais, como forma de contê-la, em vez de elevar a taxa de juros.

O grande desafio deste governo é conseguir enfrentar o mercado financeiro, com a redução da Selic, abrindo espaço no orçamento federal para ampliar suas ações destinadas ao combate à miséria, à melhor distribuição de renda e à desoneração tributária, que atinja sobretudo os produtos da cesta básica.

O mercado financeiro se opõe à adoção das medidas macroprudenciais devido à exigência de maior capital para suas operações e aumento de depósitos compulsórios dos bancos no Banco Central. Mas ganha com a Selic elevada nos títulos do governo, no aumento dos juros cobrados e na apreciação do real. Daí a briga com o Banco Central, procurando desacreditar sua capacidade de enfrentar a inflação com a nova política.

Reduzir a Selic é o primeiro passo a ser dado para um crescimento sustentável, com equilíbrio das contas internas (redução dos juros), externas (pela desvalorização cambial) e a eliminação da especulação dos capitais internacionais. Vamos aguardar para ver se o governo enfrenta as pressões do mercado financeiro e rompe as barreiras do atraso.

Para avançar na reforma política e nas questões econômico-sociais será necessário ainda um longo caminho a trilhar, mas isso só deve servir de estímulo na luta por novas conquistas que reduzam o domínio do poder econômico na política e na economia.

Amir Khair é mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor