Política

Quando a militância toma conhecimento fragmentado da
existência da participação de empresários em instâncias do partido, surgem tanto apoios entusiásticos quanto rejeições veementes

O Diário do Grande ABC publicou uma nota intitulada "PT S/A", afirmando que será criada uma nova administração para o PT, controlada por empresários. Mera estratégia de intriga? Se for, o intrigante tomou por base a criação da Associação dos Empresários pela Cidadania (Cives), com sede em São Paulo. Fundada no início de 1995, pelo mesmo grupo de empresários que deu vida ao Comitê Empresarial Lula Presidente, durante a campanha de 1994, tem como propósito dar continuidade ao trabalho iniciado naquela ocasião. Proclama-se entidade independente que objetiva aprofundar o diálogo da classe empresarial com o PT, já que esse objetivo, como acentua Oded Grajew, coordenador da associação, não é meramente eleitoral.

As informações sobre a Cives encontram-se, porém, restritas àqueles dirigentes e militantes partidários que acompanham mais de perto as atividades do empresariado que se aproximou do PT. Quando a grande militância toma conhecimento fragmentado da existência de uma entidade desse tipo, e da participação de empresários em instâncias do partido, surgem tanto apoios entusiásticos quanto rejeições veementes. Uns ficam "encantados" com a suposição de que os empresários estão descobrindo as vantagens de unir-se aos trabalhadores. Outros reafirmam a certeza de que todos os patrões merecem o fogo do inferno. A intriga do Diário do Grande ABC aproveita-se, provavelmente, dessa cizânia para tentar aumentá-la.

De qualquer modo, talvez essa intriga nos convença de que já estamos atrasados na discussão do problema. Afinal, todos poderão vir a aliar-se ao PT, como pensam os "encantados", ou todos serão nossos eternos adversários, como supõem os pessimistas? Qual é verdadeiramente o papel dos empresários no processo de transformações que a sociedade brasileira deve sofrer? Por que um número crescente de empresários acerca-se do PT e vários, inclusive, tornam-se filiados? Quais as vantagens e problemas desse relacionamento e dessa participação? O que isso pode significar para a perspectiva socialista do PT?

Histórico pouco conhecido

Houve um tempo em que o ingresso de empresários no PT parecia uma heresia. O PT emergira na luta contra a ditadura com uma posição classista muito definida. Enxergando só duas classes na sociedade brasileira - patrões e trabalhadores não titubeava: era dos trabalhadores e contra os patrões. É verdade que, apesar disso, empresários como Percival Maricato, Caio Graco Prado, Ademar Gianini e outros foram petistas de primeira-hora. Mas, eram vistos como ovelhas desgarradas e não empresários atuando como tais no partido.

As cartas embaralharam-se, pelo menos em São Paulo, durante a campanha de Eduardo Suplicy para a Prefeitura, em 1985. Outros empresários, além dos já filiados, apresentaram-se para cooperar na campanha sem esconder sua condição empresarial. Como reação, Mauricio Soares, então advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, bradou pela Folha de S.Paulo que o PT não devia ter empresários. Embora sem maiores conseqüências, esta atitude reforçou na militância uma certa aversão ao envolvimento de empresários com o PT.

Mesmo assim, o Diretório Regional de São Paulo aprovou a formação de um Conselho Consultivo de Finanças, integrado por empresários, filiados e não filiados, como órgão autônomo, fora da estrutura partidária. Tinha a missão de ajudar na captação de recursos financeiros, sem qualquer interferência política na vida do PT. Desse modo, contornavam-se as resistências naturais, mas ao mesmo tempo adiava-se a discussão de fundo. Até os que se opunham à iniciativa evitavam discuti-la. Por tudo isso, era inevitável que não vicejasse a idéia de Percival Maricato de reunir os empresários petistas para enviar propostas ao Encontro Estadual do partido, em 1987.

Logo depois, aumentou o número de administrações municipais governadas pelo PT e intensificou-se o duro aprendizado de tratar diretamente com os empresários, sendo governo. A maioria dos prefeitos de então reconheceu, como afirma Luís Sérgio Nóbrega, atual prefeito petista de Angra dos Reis, que essa relação, nos quatro primeiros anos, salvo raras exceções, foi muito difícil. O preconceito e o distanciamento eram recíprocos. Ocorriam conflitos na revisão dos valores do IPTU, na adoção de métodos transparentes e democráticos para a realização das licitações, na cobrança impostergável dos impostos e dívidas com o município, na definição das tarifas de transportes urbanos e em diversas outras áreas de ação das administrações municipais. Por outro lado, pelo menos em São Paulo, diversos empresários assumiram postos de destaque na administração municipal petista.

Fenômeno interessante desses primeiros anos de aprendizado governamental do PT foi que, mesmo mantendo sua oposição aos administradores petistas, muitos empresários deram-se conta de algumas vantagens do modo petista de governar. O combate à corrupção e ao sistema de "caixinhas" permitia preços menores e lucros, e a democratização das licitações abria oportunidade para empresários de menor porte. Mas, era prematuro afirmar ser esse o motivo pelo qual os empresários acercavam-se do PT. Por isso, mesmo entre dirigentes da época, havia o sentimento de que tal acercamento ocorria principalmente porque boa parte do empresariado buscava novos espaços para escapar das lideranças de classe carcomidas. Os movimentos que levaram à formação do Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE), do qual participavam praticamente todos os empresários com alguma ligação com o PT, reforçavam aquele sentimento.

Isso, no entanto, não conduziu a um debate partidário mais sério sobre a relação PT-empresários, apesar de iniciativas idênticas à de São Paulo em outros estados, como Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Nem impediu, naturalmente, que na campanha presidencial de 1989 a participação e a ação de empresários, assim como os contatos com personalidades do setor, ganhassem uma amplitude até então desconhecida. Oded Grajew, que coordenou o Comitê Empresarial Lula Presidente, em 1994, reconhece que a idéia de um trabalho de relacionamento mais consistente com o empresariado germinou em 1989.

Entretanto, acrescenta, em 1989 as condições para o diálogo não estavam maduras. A campanha Lula teve um sucesso que ninguém esperava e, quando se concretizou a perspectiva de vitória no segundo turno, conclui, o resultado foi um diálogo precipitado. Apesar disso, as críticas cresceram e não são poucos os militantes que até hoje creditam a derrota de Lula ao exagerado namoro com os empresários, em detrimento dos trabalhadores.

Foi nas eleições de 1994 que a atividade de empresários na campanha do PT tomou um vulto organizativo e uma projeção política mais consistentes. Oded Grajew acredita que havia se criado uma situação nova, já que o PT e Lula se apresentavam como alternativa mais séria de poder. Nessas condições, o Comitê Empresarial Lula Presidente pode desenvolver uma atuação desassombrada. Enviou a proposta de governo Lula para uma lista imensa de entidades empresariais e homens de negócios, organizou reuniões entre empresários e economistas e dirigentes do PT, realizou eventos para captar recursos financeiros, publicou e distribuiu um livreto intitulado Fatos e Versões - O que você precisa saber sobre o Programa de Governo Lula e, algo aparentemente impensável, realizou panfletagens em frente à Fiesp e à Bolsa de Valores, em São Paulo.

Oded Grajew participou da Coordenação Geral da Campanha presidencial e, juntamente com outros membros do comitê, realizou uma ação nacional de conquista de apoios entre empresários. Oded era figura permanente nos jornais, com artigos defendendo o apoio à Lula e a participação, dos empresários na campanha. Mas não somente ele. Outros empresários incorporaram-se às comissões e grupos de trabalho da campanha e colaboraram na elaboração dos programas de governo, em especial no programa para a micro, pequena e média empresas. Nas cartas e boletins que editaram, os empresários reunidos no Comitê enfatizaram os compromissos de Lula com a estabilidade, o crescimento econômico e sua proposta de um "choque de produção", por meio da geração de empregos e do aumento da produtividade e do consumo. E previam uma relação sadia e democrática entre empresários e trabalhadores, sem interferência do governo, a exemplo das Câmaras Setoriais, embora esta seja uma previsão polêmica dentro do partido.

Como é sabido, apesar de todo o empenho, a maioria do empresariado manteve seus preconceitos e preferiu jogar suas fichas em Fernando Henrique. Mas, quem pensar que esse resultado levou os empresários petistas ao desânimo engana-se redondamente. Eles avaliaram a participação do Comitê na campanha como o início de uma longa caminhada para modificar a visão empresarial sobre o PT. Em conseqüência, num primeiro impulso de continuidade do trabalho, encararam a hipótese de transformá-lo em núcleo de PT. Depois, pensando melhor, evoluíram para a formação da Cives como opção a pessoas que não pretendam se filiar ao PT, mas desejem dialogar com ele. Com a Cives, abre-se uma porta menos compromissada para um maior. conhecimento e superação das desconfianças. Com isso, ao mesmo tempo, talvez tenham finalmente colocado na ordem do dia a discussão do tema.

Empresários: adversários ou aliados?

Gilberto Carvalho, secretário-geral nacional do PT, acha que o partido suplanta os preconceitos da relação com o empresariado à medida que se explicita um setor deste com o qual há condições de realizar alianças táticas e outro com o qual é possível até mesmo estabelecer alianças estratégicas. Ele enfatiza que as contradições, em particular na economia nacional, mostram uma subsetorização acentuada do empresariado e fazem surgir uma parcela grande e importante que se aproxima e assume uma postura afinada com o PT. Com isso, vai sendo superada a visão de que o empresariado, no atacado, é uma massa homogênea e está totalmente do outro lado.

Lauro Marcondes, secretário nacional de finanças do PT, também considera que há um setor significativo do empresariado nacional que, ameaçado de destruição pela internacionalização do capital, tende a perder sua identidade e procura aliar-se ao PT para resistir àquele processo. Nesse sentido, esse setor é bem-vindo. Fábio Cascino, um dos empresários da Cives, argumenta no mesmo sentido. Para ele, a aproximação com o PT e a formação dessa entidade aconteceram agora porque há uma crise geral que força os empresários a repensarem sua função social e até mesmo a colocarem-se a hipótese do suicídio de classe. Tarso Genro, prefeito petista de Porto Alegre, relembra que a entrada de empresários num partido socialista não é um fato histórico novo. Para ele, esse fenômeno ocorre tanto porque há empresários que têm ganhos por uma visão de mundo contraditória com a sua classe, como porque há empresários que entendem que o programa a ser aplicado pelo partido favorece o desenvolvimento de sua atividade econômica.

Em outras palavras, pelo menos algumas lideranças do PT parecem dar-se conta de que os empresários, como os próprios trabalhadores, não podem ser vistos como blocos homogêneos.Há trabalhadores que pertencem às classes médias e há uma grande massa de excluídos que precisa ser tratada com identidade própria. Do mesmo modo, como diz Luís Sérgio Nóbrega, é preciso distinguir os pequenos empresários dos monopólios. Ou ir mais além, distinguindo ainda os empresários médios dos grandes e muito grandes, que podem ter interesses contraditórios e até antagônicos entre si. A crise atual, engendrada pela internacionalização ou globalização do capital, talvez somente reponha em novas bases as tendências que sempre levaram setores do empresariado aos braços dos trabalhadores e socialistas, como ativistas ou como aliados políticos. Não nos esqueçamos que um dos autores da famosa frase "Trabalhadores de todo o mundo, uni-vos!", no século passado, foi um empresário chamado Friedrich Engels.

Oded Grajew reconhece que um empresário pode vir ao PT, seja por preocupar-se com as questões sociais, o Brasil e a ética na política, ou por uma questão pragmática, por enxergar no sucesso político do partido uma chance para a expansão do mercado e para o desenvolvimento econômico e, portanto, uma chance para seu próprio sucesso empresarial. Nesse sentido, para Lauro Marcondes os empresários não são muito diferentes das pessoas de outros estratos sociais que ingressam no PT: elas também seguem esse caminho por diferentes interesses e motivos, desde o engajamento classista até o carreirismo oportunista, num processo extremamente complexo. O importante, segundo ele, é que mesmo incorporando empresários e outros setores que buscam satisfazer seus próprios interesses, o projeto do PT continue coerente com a perspectiva de transformações socialistas e não seja descaracterizado.

Em qualquer dos casos, Tarso Genro considera importante o debate da classe dos empresários com o partido, já que possibilita a este checar como é vista a aliança de classes pelos setores que serão objeto de sua política, uma política com larga capacidade de mudança. Embora concordando com essa importância e com o trabalho levado a cabo pela Cives, Gilberto Carvalho alerta, porém, para a necessidade de dar o devido valor às resistências à aproximação e ingresso de empresários no PT. Preocupa-o a visão que considera "encantada", em parte "capituladora", em parte ingênua, de achar que todo mundo é igual e companheiro e que, como o socialismo teria dançado e o PT perdido seu perfil classista, os empresários passariam então a desempenhar um papel imprescindível no processo de transformações sociais.

Gilberto Carvalho considera que alguns depositam na participação desses empresários uma esperança que eles não estão em condições de atender. Para ele, essa atitude, que procura apagar todas as contradições entre as classes, é falsa e artificiosa, porque, nessas condições, quem acaba aderindo e fazendo concessões é o PT, e não o contrário. Defende que o partido não deve abrir mão de seu perfil classista, nem de sua perspectiva socialista, como salva guarda de equilíbrio indispensável para que os empresários que se aproximam e aderem ao PT contribuam efetivamente para a luta pelas mudanças sociais.

Socialismo com empresários

Se depender dos empresários que militam na Cives, segundo Oded Grajew, o PT não terá porque preocupar-se com sua perspectiva socialista.

Eles têm discutido o assunto com a colaboração de intelectuais e dirigentes de diferentes correntes do PT e concordam com a perspectiva de uma sociedade solidária, democrática, mais justa, em que predominem valores mais coletivos. A valorização do coletivo, da responsabilidade comum, em oposição à sociedade competitiva, individualista e fragmentada, não é incompatível com a parcela do empresariado que organizou a Cives.

Luís Sérgio Nóbrega também acha possível um Estado socialista com empresários, embora considere que isso encerre contradições que devem gerar muitos debates. Tarso Genro não vê contradição antagônica do programa do PT, "na sua parte real e aplicável", com uma parte substancial da iniciativa privada. Para ele, o socialismo possível de ser pensado não supõe a eliminação da propriedade privada dos meios de produção, mas sim o controle público estatal e não-estatal sobre os setores fundamentais da atividade econômica. A contradição sempre existirá e jamais será superada em seu todo, mas é uma "boa contradição" por nos impedir de cometer os mesmos erros que foram cometidos no Leste europeu.

Evidentemente, essas opiniões não gozam de unanimidade dentro do PT. Há correntes que continuam associando socialismo à completa eliminação da propriedade privada dos meios de produção. Outros, por seu turno, embora admitindo a impossibilidade de socializar a propriedade de todos os meios de produção, associam o controle público estatal e não-estatal sobre os setores fundamentais da atividade econômica à eliminação da propriedade privada sobre tais setores. Isso para não falar daquilo que Gilberto Carvalho chama de "socialismo religioso", que se contenta em fazer declarações de fé num socialismo perfeito, pré-moldado e ao qual todos devem enquadrar-se igualmente e sem diferenças.

Assim, o mais provável, dentro das previsões de Luís Sérgio Nóbrega, é que os empresários petistas se vejam compelidos a sair de sua adesão genérica, mesmo sincera, a uma sociedade solidária, democrática, justa e de crescentes valores coletivos, para a discussão concreta, e às vezes exasperante, sobre como construir tal sociedade no difícil terreno da economia, das relações sociais e da política. Mesmo porque, como alerta Lauro Marcondes, será indispensável definir mais claramente os contornos do projeto socialista petista, incluindo aí o mercado e diversos outros mecanismos de funcionamento capitalista que poderão subsistir, em novas bases, numa sociedade socialista. Somente nesse processo de definições será possível medir o grau de adesão ao PT e a amplitude das alianças com outros setores do empresariado. Nada tão assustador, mas sempre um alerta de que o caminho, além de pétalas de rosa, deve estar cheio de espinhos incômodos.

PT S/A

Certamente, a discussão em torno dos problemas enfrentados pelo PT e pelas administrações petistas em suas relações com os empresários já deve estar servindo como um treino imprescindível para a abordagem de assuntos mais espinhosos. Em termos mais objetivos, há setores do PT desconfiados de que os empresários estejam se aproximando do partido para garantir as administrações como reservas de mercado para seus negócios. Parcela considerável dos empresários que constituem a Cives tem consciência de que esse é um problema a ser tratado adequadamente e para o qual não bastam declarações de honestidade e boas intenções. Do mesmo modo que Agripina, a mulher do imperador romano César, aos empresários petistas não basta ser honesto, é preciso também parecer honesto.

Partindo deste pressuposto, as opiniões apresentam poucas nuances. Oded Grajew considera que não há possibilidade de que empresários petistas queiram tirar partido de sua condição política para conseguir privilégios, porque são radicalmente contra isso. Concorda com Jorge Abrahão que as licitações nas administrações petistas devem caracterizar-se pela transparência e igualdade de condições, e que essas condições são de responsabilidade da administração pública. Sergio Milleto aprecia como normal o acesso às prefeituras pelos empresários,, mesmo por aqueles que são petistas. Os empresários, em geral, consideram bom negócio fornecer para as administrações governadas pelo PT: nelas, as concorrências são limpas, sem caixinhas de corrupção, com pagamentos em dia e seguem de processos de licitação em que ganham os que apresentarem melhores preços e condições técnicas superiores. Assim, empresários petistas podem participar nas mesmas condições dos demais. Jorge Abrahão completa com a idéia de que a Cives deveria atuar como consciência crítica nessas relações, partindo do ponto de vista da sociedade de que elas devem pautar-se pela lisura.

Lauro Marcondes reitera que o PT pode ser instrumento para implementação de projetos pessoais, mas não acredita que a Cives tenha visão de reserva de mercado. Gilberto Carvalho também concorda com a possibilidade de aparecimento de oportunistas, mas considera que a própria Cives tem demonstrado um cuidado especial para manter desvinculada sua ação de qualquer envolvimento empresarial com as administrações petistas, embora não haja nada de errado ou ilegal na participação de empresários petistas nas concorrências públicas. Tarso Genro e Luís Sérgio Nóbrega são curtos e explícitos: reserva de mercado somente pode ser conseguida pela corrupção; quem procura as administrações municipais petistas com esta intenção não merece atenção política; não há nem deve haver relação especial alguma entre as administrações governadas pelo PT e os petistas; estas são marcas que distinguem o modo petista de governar dos demais.

Desse modo, há uma convergência acentuada entre empresários, dirigentes e administradores públicos petistas quanto ao relacionamento entre empresários em geral ou petistas, e as administrações públicas, petistas ou não. O mesmo não se pode dizer da idéia de profissionalizar o PT. Para vários empresários petistas, assim como as administrações petistas dão maior transparência às licitações, também o PT deveria promover concorrências para decidir o processo de escolha de profissionais para serviços como publicidade e marketing, por exemplo, profissionalizando todo o processo.

Gilberto Carvalho e Lauro Marcondes não escondem sua preocupação e divergência quanto a essa visão de profissionalismo que tende a tratar o PT como uma empresa ou uma administração pública. Gilberto considera-a um corte simplista e pragmático, fruto da falta de experiência e vivência numa organização política como o PT. Para ele, o PT possui processos políticos internos completamente distintos dos processos de uma organização empresarial, ou de uma administração pública, o que impede o aproveitamento de propostas que partam daquela visão. Lauro acentua que os partidos possuem uma lógica de funcionamento diferente da lógica empresarial. No caso do PT, isso é ainda mais intenso em virtude de seu caráter de partido de massa, com uma base social ampla e com uma estrutura que deve estar voltada completamente para fora, para a sociedade. Nessas condições, é impraticável moldar o PT à estrutura organizacional de uma empresa ou de um órgão público.

Por outro lado, ambos consideram que há um aspecto positivo nessa preocupação com o profissionalismo. As críticas às estruturas de funcionamento amadorístico do PT, uma organização de importância histórica sendo gerida como se fosse uma empresa familiar mal administrada, são pertinentes e devem ser levadas em alta conta. Nesse sentido, pensa Gilberto, é preciso abrir mais espaço às contribuições para superar essa situação. Lauro considera que, se as sugestões de maior profissionalismo forem no sentido de organizar e fazer funcionar melhor as estruturas partidárias, inclusive com o aproveitamento de instrumentos criados pelo capitalismo, mas úteis para a implementação e funcionamento do projeto do PT, a exemplo do cartão de crédito PT-Bradesco, tais sugestões são justas e não há divergências. Embora, verdade seja dita, também sofram restrições de diferentes setores dentro do partido.

De qualquer modo, parece haver um sentimento consensual de que o PT precisa agir com maior profissionalismo, seja na tomada de decisões, na definição de responsabilidades, ou no controle da execução das decisões adotadas, como aliás faz qualquer empresa que se preze. A diferença parece residir, em grande medida, no fato de que no partido os mecanismos democráticos de consulta e participação, para a adoção das decisões e para o convencimento de sua aplicação, são de natureza diferente dos mecanismos empresariais. Nesse sentido, parece ter razão Luís Sérgio Nóbrega quando afirma que as relações dos empresários da Cives com o PT deve dar-se dentro de um processo pedagógico, em que todos terão muito que aprender uns com os outros.

Wladimir Pomar é jornalista.