Nacional

O recente processo de envelhecimento da população é, neste momento, favorável à Previdência

Hoje, mais do que nunca, o governo e diferentes setores da sociedade brasileira defendem a necessidade de uma reforma radical da Previdência Social. Os principais argumentos utilizados compreendem a desestabilização financeira provocada pela criação de novos direitos na Constituição de 1988 e pela mudança do perfil demográfico da população e a necessidade de conceder uma proteção igual para todos, abolindo as diferenças existentes entre homens e mulheres, entre trabalhadores urbanos e rurais e entre segurados do setor privado, servidores públicos e membros do Executivo, Legislativo e Judiciário.

De fato, a situação financeira da Previdência Social encontra-se bastante fragilizada. No passado recente, a receita de contribuições de empregados e empregadores era de longe a principal fonte de financiamento dos benefícios previdenciários, das ações e serviços de saúde e das ações e benefícios assistenciais. Em janeiro de 1995, somente a despesa com benefícios da Previdência absorveu 87% dessa receita.

O aumento da "dependência" dos benefícios em relação à receita de contribuição tem basicamente duas causas. Em primeiro lugar, não há dúvida de que os novos direitos instituídos pela Constituição de 1988 elevaram o patamar do gasto previdenciário. Em 1994, a despesa com benefícios foi 60% superior à média de 1988/1989 e 33% superior à realizada em 1991. Mas também é verdade que o nível atual da arrecadação é dos mais baixos já registrados nos últimos anos. Em relação a 1986, por exemplo, o volume arrecadado durante o ano de 1994 foi 20,4% menor.

Dentro desse quadro, uma política de crescimento do salário mínimo real ou um aumento, um pouco acima da média, da demanda de benefícios resultaria, inevitavelmente, em déficit, fazendo rapidamente desaparecer o atual saldo disponível. Esse raciocínio, embora aparentemente correto, pressupõe a imutabilidade das condições que estão fragilizando a situação financeira da Previdência.

Hoje, mais do que nunca, o governo e diferentes setores da sociedade brasileira defendem a necessidade de uma reforma radical da Previdência Social. Os principais argumentos utilizados compreendem a desestabilização financeira provocada pela criação de novos direitos na Constituição de 1988 e pela mudança do perfil demográfico da população e a necessidade de conceder uma proteção igual para todos, abolindo as diferenças existentes entre homens e mulheres, entre trabalhadores urbanos e rurais e entre segurados do setor privado, servidores públicos e membros do Executivo, Legislativo e Judiciário.

De fato, a situação financeira da Previdência Social encontra-se bastante fragilizada. No passado recente, a receita de contribuições de empregados e empregadores era de longe a principal fonte de financiamento dos benefícios previdenciários, das ações e serviços de saúde e das ações e benefícios assistenciais. Em janeiro de 1995, somente a despesa com benefícios da Previdência absorveu 87% dessa receita.

O aumento da "dependência" dos benefícios em relação à receita de contribuição tem basicamente duas causas. Em primeiro lugar, não há dúvida de que os novos direitos instituídos pela Constituição de 1988 elevaram o patamar do gasto previdenciário. Em 1994, a despesa com benefícios foi 60% superior à média de 1988/1989 e 33% superior à realizada em 1991. Mas também é verdade que o nível atual da arrecadação é dos mais baixos já registrados nos últimos anos. Em relação a 1986, por exemplo, o volume arrecadado durante o ano de 1994 foi 20,4% menor.

Dentro desse quadro, uma política de crescimento do salário mínimo real ou um aumento, um pouco acima da média, da demanda de benefícios resultaria, inevitavelmente, em déficit, fazendo rapidamente desaparecer o atual saldo disponível. Esse raciocínio, embora aparentemente correto, pressupõe a imutabilidade das condições que estão fragilizando a situação financeira da Previdência.

Atualmente, o nível estimado da evasão da receita de contribuições é de 30% e o mercado informal de trabalho representa cerca de 50% da população economicamente ativa. Além disso, a Previdência Social brasileira não conta com um cadastro de contribuintes e segurados, o que lhe impede o acesso exatamente àquelas informações que lhe seriam mais importantes. Não é por acaso que, sistematicamente, a Previdência se vê obrigada a fazer recadastramentos, mobilizando significativo volume de recursos materiais e humanos.

Esses dados indicam que é absolutamente prioritária, para melhorar a situação financeira da Previdência, a realização de uma ação coordenada entre o Ministério do Trabalho, da Previdência e a Receita Federal. Somente aumentando a fiscalização e fazendo cumprir as leis trabalhistas pode-se diminuir o nível de evasão e de sonegação. Para isso, no entanto, é preciso vontade política. E esse parece não ser o caso do atual governo.

Além de aumentar significativamente a disponibilidade de recursos, a melhora da fiscalização e o aumento do grau de formalização do mercado de trabalho tornariam evidente que o recente processo de envelhecimento da população brasileira é, neste momento, favorável à Previdência. Isso porque, não fosse o tamanho do mercado informal de trabalho, o aumento do número de pessoas em idade de trabalhar colocar-nos-ia em situação semelhante a dos sistemas europeus na década de 50, quando o ingresso de contribuições sobre a folha de salários apresentou um desempenho extremamente favorável.

Por outro lado, somos obrigados a reconhecer que a velocidade das mudanças demográficas por que está passando a população brasileira é muito maior do que a verificada nos países chamados desenvolvidos. Acentua-se, em todas as classes de renda, a queda da fecundidade e o aumento da sobrevida. Essa realidade exigirá que, num futuro próximo, tenhamos que discutir seriamente alterações nas condições de acesso aos benefícios relacionados com os riscos previsíveis, tal como a aposentadoria.

No que se refere à eliminação das diferenças de tratamento entre homem e mulher, entre segurados do setor privado e servidores e entre trabalhadores rurais e urbanos, é preciso dizer que, mesmo defendendo, como princípio geral, que a proteção social deva ser igual para todos, não podemos esquecer que as condições de trabalho e vida desses segmentos permanecem desiguais. Sendo assim, a defesa de tratamento igual torna-se, além de abstrata, extremamente injusta e regressiva, penalizando os que ingressam mais cedo no mercado de trabalho e penalizando as mulheres que exercem dupla jornada de trabalho.

Nesse momento, dada a ofensiva do governo, a única atitude que nos cabe é lutar pela retirada da emenda constitucional e pela abertura das contas da Previdência e da Seguridade Social. Exigir que o governo pague, como mandava a lei, os Encargos Previdenciários da União (EPU) com recursos fiscais, deixando de desviar receita da Seguridade, tal como a arrecadação da Cofins. Exigir que os benefícios de caráter assistencial sejam financiados, como manda a boa doutrina, por recursos de impostos. E, mais do que isso, exigir que os trabalhadores e os segurados tenham, junto com os empresários e representantes do Estado, efetivo poder para administrar o sistema previdenciário.

Essas são as condições necessárias para que os trabalhadores e a sociedade possam discutir de fato quais são os problemas da Previdência e qual o tipo de proteção social que almejam e estão dispostos a financiar. Somente quando as informações estiverem disponíveis e quando os verdadeiros interessados na Previdência tiverem como interferir na gestão é que questões como a aposentadoria por tempo de serviço e a extinção das aposentadorias especiais vinculadas a categorias e não a indivíduos podem ser seriamente discutidas. Enquanto isso não acontecer, e a Previdência não se constituir realmente num fundo dos trabalhadores, toda proposta de mudança somente pode ser vista como uma tentativa de destruição de direitos.

Qualquer outra alternativa de encaminhamento implicaria aceitar o processo antidemocrático imposto pelo governo. Este, ao propor a desconstitucionalização de aspectos fundamentais do atual plano de benefícios e ao não explicitar por inteiro sua proposta, sugere que a sociedade lhe conceda uma procuração, com todos os poderes, para que altere o sistema como bem quiser. Sendo assim, rechaçar a emenda da Previdência não consiste somente em defender a Previdência; é parte integrante da construção da democracia neste país.

Rosa Maria Marques é professora do Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e técnica da Área de Financiamento das Políticas Sociais do Instituto de Economia do Setor Público (IESP) da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap).