Nacional

Ministro do Desenvolvimento Agrário Guilherme Cassel explica o programa Territórios da Cidadania

Ministro do Desenvolvimento Agrário desde abril de 2006, o gaúcho Guilherme Cassel explica o programa Territórios da Cidadania, faz um balanço da reforma agrária e fala da relação com os movimentos sociais

Qual a novidade do programa Territórios da Cidadania?

É um programa com objetivo claro e generoso: superar de uma vez por todas a pobreza no meio rural brasileiro. A partir de um foco nos territórios, ou seja, identificando localidades onde persiste a pobreza mais grave, com menor IDH, onde há mais famílias assentadas, quilombolas, comunidades indígenas, fazemos uma espécie de blitz de políticas públicas nesses locais. A idéia é coordenar e concentrar todos os esforços do governo federal nessas regiões num tempo muito curto e a partir de três eixos: garantir direitos de cidadania (documentação, Bolsa Família) a toda a comunidade, enfrentar os gargalos de infra-estrutura (luz, habitação, água, estradas) e, o que é muito importante, dar apoio à atividade produtiva, acordar com as populações locais a saída econômica para as regiões estagnadas e financiá-la para gerar renda e emprego.

Foi anunciado um investimento de R$ 11,3 bilhões. Qual a origem desses recursos?

Esse programa vem sendo construído desde 2007. Como o Orçamento está saindo agora, muitos recursos foram projetados. O MDA, por exemplo, tem R$ 1,1 bilhão a mais para o programa Territórios da Cidadania. Há recursos de quinze ministérios. Todos os recursos estão orçados, carimbados, o que significa que só poderão ser gastos nesse programa. É um esforço do governo de inverter a perniciosa lógica que persiste no país: o Estado sabe quais são as regiões pobres, ano após ano se orçamentam recursos para essas regiões, e por razões históricas ou por falta de representação parlamentar forte ou eficiente o dinheiro acaba não indo para essas localidades. Se executa o orçamento e o dinheiro previsto para essas regiões acaba indo para outras cidades mais ricas. A idéia desta vez é carimbar isso e controlar. Ou seja, ou o dinheiro vai ser gasto naqueles locais, ou não será usado.

No que esse se diferencia dos demais programas do governo federal?

Uma diferença muito significativa é que o Territórios da Cidadania prevê participação popular muito ativa e controle social bastante grande. Todo o programa foi apresentado às comunidades com uma matriz de investimentos de serviços, o recurso que o governo tem disponível para a região. Estamos na fase em que nos territórios está sendo cumprida a agenda de discussão com assentados, quilombolas, estão ocorrendo plenárias temáticas de educação, saúde, desenvolvimento econômico. A população vai nos dizer quais são suas prioridades. Tudo o que for acordado entre governo federal e comunidade será publicado no Portal da Cidadania. A partir de abril será possível visualizar o tamanho da obra, onde será feita, quanto será gasto, o cronograma e o responsável por ela. Participação popular e solução tecnológica avançada, moderna, ampliam o controle social efetivo. É uma grande novidade. O programa é muito transparente, tem participação popular e recursos.

Qual a novidade do programa Territórios da Cidadania?

É um programa com objetivo claro e generoso: superar de uma vez por todas a pobreza no meio rural brasileiro. A partir de um foco nos territórios, ou seja, identificando localidades onde persiste a pobreza mais grave, com menor IDH, onde há mais famílias assentadas, quilombolas, comunidades indígenas, fazemos uma espécie de blitz de políticas públicas nesses locais. A idéia é coordenar e concentrar todos os esforços do governo federal nessas regiões num tempo muito curto e a partir de três eixos: garantir direitos de cidadania (documentação, Bolsa Família) a toda a comunidade, enfrentar os gargalos de infra-estrutura (luz, habitação, água, estradas) e, o que é muito importante, dar apoio à atividade produtiva, acordar com as populações locais a saída econômica para as regiões estagnadas e financiá-la para gerar renda e emprego.

Foi anunciado um investimento de R$ 11,3 bilhões. Qual a origem desses recursos?

Esse programa vem sendo construído desde 2007. Como o Orçamento está saindo agora, muitos recursos foram projetados. O MDA, por exemplo, tem R$ 1,1 bilhão a mais para o programa Territórios da Cidadania. Há recursos de quinze ministérios. Todos os recursos estão orçados, carimbados, o que significa que só poderão ser gastos nesse programa. É um esforço do governo de inverter a perniciosa lógica que persiste no país: o Estado sabe quais são as regiões pobres, ano após ano se orçamentam recursos para essas regiões, e por razões históricas ou por falta de representação parlamentar forte ou eficiente o dinheiro acaba não indo para essas localidades. Se executa o orçamento e o dinheiro previsto para essas regiões acaba indo para outras cidades mais ricas. A idéia desta vez é carimbar isso e controlar. Ou seja, ou o dinheiro vai ser gasto naqueles locais, ou não será usado.

No que esse se diferencia dos demais programas do governo federal?

Uma diferença muito significativa é que o Territórios da Cidadania prevê participação popular muito ativa e controle social bastante grande. Todo o programa foi apresentado às comunidades com uma matriz de investimentos de serviços, o recurso que o governo tem disponível para a região. Estamos na fase em que nos territórios está sendo cumprida a agenda de discussão com assentados, quilombolas, estão ocorrendo plenárias temáticas de educação, saúde, desenvolvimento econômico. A população vai nos dizer quais são suas prioridades. Tudo o que for acordado entre governo federal e comunidade será publicado no Portal da Cidadania. A partir de abril será possível visualizar o tamanho da obra, onde será feita, quanto será gasto, o cronograma e o responsável por ela. Participação popular e solução tecnológica avançada, moderna, ampliam o controle social efetivo. É uma grande novidade. O programa é muito transparente, tem participação popular e recursos.

De acordo com o presidente Lula, o novo programa não vai substituir o Bolsa Família, mas servir como complemento das ações do gover no voltadas para a redução das desigualdades. Como seria essa complementação? Ele pode ser considerado um rearranjo de outros já existentes?

Não. Acho que o programa corresponde ao estágio que estamos vivendo no Brasil. O primeiro mandato do presidente Lula tinha um conjunto de tarefas, uma pauta civilizatória a ser cumprida. O país voltou a crescer de forma sólida, a gerar empregos, a enfrentar a desigualdade social, está distribuindo renda e combatendo a fome de forma eficiente com o Bolsa Família. Então, a situação hoje é muito diferente de quatro anos atrás. Os desafios são outros. Agora temos de caminhar para soluções mais estruturais. O Territórios da Cidadania é isso. Vai ao meio rural, onde a pobreza é grande, supera os limites regionais e sociais. A idéia não é substituir o Bolsa Família, mas criar mecanismos a partir de políticas públicas permanentes que corrijam os desequilíbrios regionais e as desigualdades sociais e ofereçam oportunidades de trabalho e renda para as pessoas.

Como o programa Territórios da Cidadania vai ampliar as possibilidades de inclusão social e econômica?

Por exemplo, quando garantimos documentação a todos, realizamos a regularização fundiária para assegurar a posse da terra. Só com isso já é possível inserir a pessoa no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), financiar investimento em sua terra e, junto, resolver os problemas de infra-estrutura e a construção ou criação de uma rede de comercialização, ou a construção de um matadouro, por exemplo. Garantimos que a pessoa saia da condição de excluída e torne a região mais dinâmica economicamente. Isso melhora muito as condições para que não fique permanentemente vinculada ao Bolsa Família ou ao auxílio do Estado. Ela pode ter vida econômica produtiva. A idéia é chegar aos lugares aonde as políticas públicas nunca chegam, dar um choque de políticas públicas, e com isso criar condições para que homens e mulheres possam ser incluídos e inseridos na cadeia produtiva da região.

Quais são as áreas prioritárias no primeiro momento do programa?

Os três eixos em que o programa está assentado estão organizados em sete temas: direitos e desenvolvimento social; organização sustentável da produção; saúde, saneamento e acesso a água; educação e cultura; infra-estrutura; apoio às atividades dos territórios; e ações fundiárias.

Em quais regiões?

O programa envolve mais espaços no Nordeste. São sessenta territórios que abrangem 458 municípios e uma população de quase 24 milhões de pessoas, 27% de toda a população rural do país, 1 milhão de famílias da agricultura familiar, 320 mil famílias assentadas na reforma agrária, 37% das comunidades quilombolas, 25% de comunidades indígenas, 33% de pescadores. O critério desses territórios é que haja pelo menos um em cada estado.

A oposição diz que o programa é eleitoreiro e beneficiará áreas consideradas bases eleitorais do PT...

A reação da oposição sobre o programa é de quem não consegue conviver com a realidade. O país tem crescido, distribuído renda, gerado empregos e está enfrentando os temas que nunca foram resolvidos, como a pobreza rural. E a oposição cria uma realidade paralela de crises falsas, numa postura quase esquizofrênica. A reação que teve a esse programa foi de irracionalidade absoluta. Primeiro dizem que é ano eleitoral. Mas o país tem eleições de dois em dois anos. Não podemos pará-lo por isso. Não podemos fazer políticas dirigidas aos mais pobres porque eles votam, é isso?

Sabemos que o país tem uma enorme desigualdade, ainda convive com grande número de pobres. Então todos nós que somos civilizados achamos que as políticas públicas devem ser dirigidas àqueles que mais precisam, os mais pobres. O programa envolve governadores, prefeitos de todos os partidos. Em seu lançamento, o governador de Alagoas, Teotônio Vilela, e o governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima, do PSDB, o elogiaram porque cumpre o que é obrigação do Estado: combater a pobreza rural.

Então a oposição, que não consegue assimilar que o país está bem, torce para dar errado e promove o mau humor, tem esse discurso.

O que muda na atuação do Ministério do Desenvolvimento Agrário do primeiro para o segundo mandato?

Os desafios no segundo mandato são de outra natureza. Temos de fazer um balanço bem adequado do primeiro mandato e do que foi feito até agora pela reforma agrária. Assentamos nos primeiros quatro anos do presidente Lula 450 mil famílias. Isso é muito significativo. Foram 38 milhões de hectares de terra. Para se ter uma idéia, na história do Brasil, até hoje, foram assentadas 960 mil famílias. Então, 50% do que foi feito no país até hoje aconteceu nos últimos cinco anos, quando nos referimos à reforma agrária. Evidente, isso cria uma outra situação. Na primeira gestão, era grande o número de acampamentos à beira das estradas e há muito tempo não se assentavam famílias. Se é verdade que a tarefa do MDA e do Incra era enfrentar com rapidez essa demanda, agora temos de persistir nesse ritmo e assentar cerca de 100 mil ou 120 mil famílias por ano, num período entre seis e dez anos, para alterar a estrutura fundiária do país. O ministério, o Incra, os assentados e os movimentos têm de se preocupar com a produção e a qualidade de vida nos assentamentos. A situação deles hoje é muito diferente da que encontramos há cinco anos, melhorou, mas ainda há muito a fazer. Ainda há deficiência de infra-estrutura e temos de aprimorar a produção.

A agricultura familiar foi impulsionada a partir de processos de reforma agrária?

Os dados no Brasil são muito precários. Deve sair em setembro o censo agropecuário que o IBGE fez no ano passado e acho que aí teremos um panorama atual do meio rural brasileiro mais preciso. Os dados preliminares do IBGE mostram que o número de proprietários no meio rural cresceu de 5,8 bilhões para 6,3 bilhões – o que é significativo – e o tamanho das propriedades diminuiu. Se for confirma doesse quadro, o programa de reforma agrária do governo brasileiro começa a mudar a estrutura fundiária do país. Não estou dizendo que muda radicalmente, como muitos têm expectativa. Mas a situação começa a se alterar, e com isso criamos condições propícias para o desenvolvimento da agricultura familiar. O recém-assentado da reforma agrária é um sujeito que caminha para se transformar em agricultor familiar. O governo Lula ressignificou o papel da agricultura familiar e mostrou para a sociedade brasileira que ela é responsável por 11% do PIB. Ampliamos o crédito, criamos o seguro agrícola, recriamos uma política nacional de assistência técnica, criamos políticas de comercialização, de garantia de preços, de renda. A renda da agricultura familiar em 2007 cresceu 7%, mais que a média do país, e tudo leva a crer que estancamos o êxodo rural nos últimos três anos. Aos poucos cria-se no Brasil um outro meio rural, com outra estrutura fundiária e políticas públicas para a agricultura familiar.

Os índices de produtividade da terra serão atualizados?

Espero que sim. Nosso trabalho está todo concluído e estamos aguardando a decisão do Ministério da Agricultura e do presidente Lula para colocar novos índices na rua. O índice disponível é de 1975, e isso não é aceitável. Os atuais facilitarão o trabalho do Incra e ajudarão a agilizar a reforma agrária. É uma tarefa imprescindível do próximo período. O presidente Lula tem muita sensibilidade para isso e informou que pretende resolver no menor prazo possível.

Qual a quantidade de terras improdutivas no país?

Com o censo agropecuário teremos uma aproximação mais adequada. Temos de separar as terras improdutivas da União das privadas, atualizar os índices para os padrões tecnológicos de hoje e firmar um acordo nacional sobre o que será considerado produtivo ou não.

O MST diz que no governo Lula a reforma agrária não avançou da forma necessária para desconcentrar a propriedade fundiária no país e os assentamentos realizados não atacaram o latifúndio. O que o ministro tem a dizer sobre isso?

Os dados dizem o contrário. Não é razoável imaginar que se assentam 450 mil famílias em quatro anos e isso não tem nenhuma conseqüência na estrutura fundiária. Tenho muito respeito e muita admiração pelo MST. Procuro dialogar e aprender com a experiência do movimento, mas acho muito perigoso virar as costas para a realidade. Evidente que desconcentrou, mas não fazemos reforma agrária para atacar o latifúndio, e sim para dar terra a quem nela quer trabalhar. Fazemos reforma a favor de quem quer produzir, e isso tem ocorrido. É preciso avaliar o trabalho realizado porque o discurso ideológico às vezes fica sem sentido.

O MST tem alguns desacordos com conceitos; por exemplo, se os assentados em terras públicas são considerados assentamentos ou não. É uma discussão teórica. O importante para mim é que assentada é aquela família que não tinha terra e passou a ter seu lote com direito a crédito, assistência técnica e possibilidade de produzir. Devemos superar de uma vez por todas as discussões que não têm importância. Estamos do lado da reforma agrária, movimentos sociais e governo. Temos o mesmo objetivo, mudar a estrutura fundiária do país. Isso às vezes é feito em ritmos mais rápidos ou lentos, frustrando a expectativa de uns e outros, mas não podemos disputar versões, o mais importante é somarmos esforços.

E como está a relação do MDA com os movimentos sociais do campo?

Aprendemos muito nesses cinco anos, governo e movimentos sociais. Do ponto de vista administrativo, do que o governo fez neste período, coloca novas questões para os movimentos, que geralmente não são de fácil resposta. Estamos entrando num período em que há mais a fazer do que disputas verbais, retóricas. Começamos a somar esforços. Os movimentos hoje estão muito envolvidos com o governo no trabalho de construir alternativas produtivas mais eficazes, de melhorar a qualidade de vida nos assentamentos, resolver de uma vez por todas o drama do índice de produtividade. Movimentos sociais e governo têm acordos fundamentais, queremos outra estrutura fundiária para o país, outro modelo de distribuição, mais gente na terra. Não gosto de alimentar falsas polêmicas. São muitos movimentos no país, Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetaf), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). E todos têm muita gente assentada, o Incra melhorou muito seu funcionamento. Em 2006 seu orçamento para reforma agrária era de R$ 1,5 bilhão e em 2008 é de R$ 4,3 bilhões. Em 2002 o governo federal gastou R$ 287 milhões em aquisições de imóveis para a reforma agrária; em 2007 investimos R$ 1,4 bilhão, cinco vezes mais. Evidente que esses fatores têm repercussão e é possível fazer um balanço equilibrado da reforma agrária. Respeito muito as pessoas que têm expectativa superior, de um processo mais rápido, mas acho que muita gente está migrando para uma posição mais equilibrada e agora temos de enfrentar as tarefas de forma coletiva.

*Fernanda Estima é editora assistente de Teoria e Debate