Sociedade

É urgente que um número maior de brasileiros e brasileiras entre no debate para mudar a sub-representação política

Se desejamos um Estado menos patriarcal, com menos clientelismo e corrupção, é urgente que um número maior de brasileiros e brasileiras entre no debate para mudar a sub-representação política

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O Brasil ocupa uma das últimas posições no ranking mundial quanto à presença fem

O Brasil ocupa uma das últimas posições no ranking mundial quanto à presença feminina no Parlamento com parcos 8,6% de mulheres. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr

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Parece-me urgente no Brasil construir estratégias de despatriar­ca­lização, de destradicio­nalização do Estado. A dinâmica de aproximação dos movimentos feministas com o Estado é recente. Isso porque, historicamente, as feministas de diversos matizes e orientações teóricas criticam e repudiam o patriarcado público que o modelo de Estado e o capitalismo exercitam (Abramovitz, 1988; Brown, 1981; Mackinnon, 1989; Pateman, 1989; Walby, 1990). É compreensível, portanto, que as mulheres participem tão pouco dos debates em curso sobre a reforma política no Brasil. Mas compreender não é concordar. Nós, mulheres, precisamos ser mais ativas nessa discussão.

Se o patriarcado significa “qualquer sistema de organização política, econômica, industrial, financeira, religiosa e social na qual a esmagadora maioria de posições superiores na hierarquia é ocupada por homens” (Dahlerup, 1989: 103), parece inquestionável a assertiva anterior. A presença de mulheres nos parlamentos em todo o mundo não chega a 20%, segundo dados da União Interparlamentar (IPU). Esta sub-representação é generalizada. Pouquíssimos países se aproximam de algo como a paridade de gênero na representação. O Brasil ocupa uma das últimas posições no ranking e está em penúltimo lugar na América Latina e Caribe, com parcos 8,6% de presença feminina na Câmara dos Deputados (perdemos apenas para o Panamá, que contava, em 2010, com 8,5% de mulheres na câmara baixa). Os percentuais no Brasil são bem inferiores até aos dos países árabes (12,5%, em média, em 2011)! O percentual é baixo também nas assembleias legislativas e nas câmaras municipais, girando em torno de 11% e 12%, em todo o país. Tal quadro se deve a um conjunto perverso e multideterminado de fenômenos que não me cabe discutir aqui, já o fizemos em outros momentos (Matos, 2008; 2010).

Entre esses fatores contam, com expressividade e importância, as regras de nosso sistema político-eleitoral, assim como a atuação ou mesmo omissão das instituições que o circundam. Corrobora para a manutenção de tais desigualdades no Parlamento a prática deletéria do não cumprimento por parte dos partidos da legislação. Esta assegura uma cota por sexo, mínima de 30% e máxima de 70%, para as candidaturas nas eleições proporcionais. No processo de barganha para a aprovação da lei, não foi possível impor sanções a seu descumprimento pelos partidos (esse simples elemento já nos dá a dimensão das forças em jogo). Desde 1995Em 1995 foi aprovada a Lei nº 9.100, que estabelecia 20% de candidatas mulheres nas listas partidárias para as eleições de 1996. Em 1997, a Lei 9504, regulamentando as eleições de 1998, estipula para os cargos do legislativo, eleitos pelo voto proporcional, que cada partido preencha suas listas com o mínimo de 30% e o máximo de 70% de cada sexo., a implementação das cotas para candidaturas femininas no país é efetivo exercício de retórica. Tais distorções fazem com que a democracia brasileira não seja, de fato e de direito, representativa e participativa em relação a todos os segmentos da sociedade. De modo sistemático e continuado, exclui mais da metade da população da obtenção de sucesso numa disputa que termina por se dar num formato profundamente desigual e desleal, sempre em detrimento das mulheres.

Entendo e defendo que o debate sobre a reforma política atualmente se constitui em elemento-chave para a crítica – necessária e urgente – à forma como as relações sociais vêm estruturando há séculos o sistema político brasileiro. Se desejamos um formato de Estado menos patriarcal, menos patrimonial e menos oligárquico, e também no qual as práticas experimentadas sejam de menos nepotismo, menos clientelismo, menos personalismo e menos corrupção, parece urgente que o maior número possível de cidadãos entre no debate e possa melhorar sua condição de sub-representação política. Predomina ainda no Brasil uma discussão sobre essa reforma, reduzindo-a a um sentido restrito do sistema político-eleitoral e político-partidário que envolvem a representação política, esquecendo-nos de debatê-la em seu sentido amplo, envolvendo todas as práticas políticas. E, mesmo nesse sentido, a forma como os debates se dão acaba sendo tão fechada que as pessoas, de modo geral, se sentem incapazes, não autorizadas em relação à participação política. Essa é mais uma das estratégias utilizadas por aquelas forças que pretendem manter “as coisas exatamente como estão”.

É essencial que a maior parte possível da população entenda, de fato, do que se está falando quando se discute um projeto de reforma política: esse é um trabalho político estratégico e necessário, que deveria estar sendo cumprido, no mínimo, por partidos, parlamento e mídias. Mas, infelizmente, não tem sido assim. As brasileiras sabem que há regras que estão/são criadas, modificadas, reformadas que podem influenciar diretamente o percentual maior ou menor de sua representação? Sabem que no final de 2009 foi aprovada uma minirreforma eleitoral que indicava algumas novas regras que afetam diretamente esse percentual? Creio que não. Mas isso acontece, constantemente.

As novas regras começaram a valer já nas eleições de 2010. A reforma na lei foi sancionada pelo presidente Lula em setembro de 2009. Trata-se da Lei nº 12.034, que contribui para um aumento quantitativo da representação política das mulheres, sobretudo no espaço dos partidos. No texto anterior da chamada “lei de cotas para mulheres”, presente na lei eleitoral, constava apenas a circunstância de o partido reservar o quantitativo das vagas para as mulheres. Com a minirreforma, os partidos passam a ter de “preenchê-las”: “Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”. Mais uma vez, porém, nenhuma sanção ou punição foi prevista para o descumprimento da lei. Apenas um único partido político (entre os 29 que temos no sistema brasileiro hoje) preencheu a cota dos 30% para mulheres nas eleições à Câmara em 2010. Mesmo com questionamentos feitos ao TSE e a tomada de posição da instituição, a lei não foi efetivamente cumprida.

A determinação de ter 30%, no mínimo, de candidatas nas listas partidárias consta da Lei nº 9.504, em vigor desde 1997 no Brasil, mas nunca foi cumprida pelas agremiações partidárias, que sempre contaram com a tolerância do Poder Judiciário para manter essa situação. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Ricardo Lewandowski, foi o porta-voz da nova orientação, quando a minirreforma foi aprovada, informando que os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) devem intimar os partidos a corrigir as distorções entre o número de candidaturas de cada sexo. O ministro fez a afirmação depois de o plenário do TSE ter determinado que o diretório regional do PDT no Pará (um questionamento surgido naquele momento) teria de ajustar o percentual de seus candidatos homens e mulheres ao cargo de deputado estadual. Ao decidir sobre o caso específico da chapa pedetista do Pará, o TSE acabou ampliando a determinação para os demais partidos. “Quando essa proporção não for observada, os processos são devolvidos aos TREs, que intimam os partidos a corrigir a falha. Na impossibilidade absoluta, os partidos deverão justificar e os TREs examinarão a justificativa”, disse à época Lewandowski. Para atingir o percentual mínimo de 30% de candidatos do sexo feminino, o PDT precisaria retirar de sua lista dois candidatos do sexo masculino ou acrescentar duas mulheres à lista. O julgamento da questão, no dia 12 de agosto de 2010, não obteve unanimidade no Tribunal. A maioria dos ministros “prefere” entender que o recorte de candidatos deve ser feito pelos partidos (?!), e não pelo TSE. Apenas o ministro Marco Aurélio Mello votou para que o recurso apresentado pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) não fosse aceito. Para ele, como os registros de candidatura não sofreram impugnação no tempo correto, a chapa não poderia ser modificada. Ele chegou a afirmar: “A meu ver, essas situações não podem ser alcançadas. Teríamos de afastar candidatos já registrados para que houvesse a adequação aos percentuais de gênero”. Foram vários os recursos que chegaram ao TSE contra a reserva de vagas, entre eles ações questionando decisões dadas nos TREs do Amapá, Pará, Rio Grande do Norte e Rio de Janeiro. A decisão mesmo acabou ficando, então, nas mãos dos TREs, que, invariavelmente, sancionaram todas as listas “ilegais”.

Segundo a advogada e diretora da União Brasileira de Mulheres (UBM), Alcenira Vanderlinde, a lei poderia ter surtido efeito se o TSE não houvesse deixado tal interpretação a cargo dos Tribunais Regionais. Ela afirmou: “Para nós, isso (a troca do “reservar” por “preencher”) passa um sentido de obrigatoriedade, numa proporção que deveria ser respeitada. No caso de não completar o número de mulheres, se deveria retirar as candidaturas de homens até atingir a proporcionalidade 70/30”. Todavia, a interpretação dos TREs no Brasil permitiu que, caso os 30% de mulheres não fossem completados, os mais de 70% de homens fossem mantidos.

Outras mudanças foram previstas na minirreforma, como a determinação de que 5% do fundo partidário seja destinado à preparação das mulheres: a criação e manutenção de programas de formação, promoção e difusão da participação política das mulheres. O partido que descumprisse a lei teria de aumentar em 2,5% esse percentual no ano seguinte. A reforma na lei eleitoral estipulou ainda que 10% do tempo da propaganda eleitoral na TV fosse dedicado às campanhas de candidatas como mais uma forma de promover e difundir a participação política feminina. Até este momento não temos um levantamento confiável se essas duas condições foram efetivamente levadas a termo, mas, a julgar pelo que se deu em relação às cotas nas listas partidárias, parece-me bastante provável que não.

Todas essas descrições têm um único objetivo: demonstrar que há um patriarcalismo institucionalmente arraigado no Brasil. Desde os partidos políticos, passando pelo Congresso Nacional e pelos Tribunais Estaduais e Federais, todas são instituições masculinas feitas, mantidas e com regras organizadas pelos homens, que atendem diretamente a seus interesses. E tudo isso sob o manto mítico da universalidade, da neutralidade e da isonomia! Esse é um dos motivos que nos impulsiona à urgência de pensar numa reforma política que tenha seu foco, desta vez, na perspectiva e nos interesses das brasileiras. Ainda que eu compreenda que as mulheres, sobretudo no Brasil, sejam infinitamente plurais (e não uma categoria homogênea, unívoca), é na defesa e garantia dessa pluralidade que devemos lutar por uma reforma política feminista.

Para isso, vou elencar aqui apenas três propostas que têm sido levantadas pelas feministas em defesa de mudanças políticas. Nem todas essas medidas são consensuais, mas é importante que as conheçamos.

Financiamento público

As campanhas brasileiras são notoriamente caríssimas, e os valores vêm crescendo exponencialmente ao longo do tempo. No Brasil, não é incorreto afirmar que o financiamento de campanha é misto: há o fundo partidário, provido com recursos pelo Tesouro Nacional; há o acesso gratuito ao rádio e à TV para o processo eleitoral; há ainda tanto a possibilidade de descontos tributários por parte das redes de rádio e televisão que veicularem as propagandas quanto doações de campanha oriundas de pessoas e instituições privadas. Assim há, de fato, uma gama de recursos públicos embutidos em toda campanha eleitoral, que não é exclusivamente financiada por recursos públicos. Esse fenômeno produz fortes  distorções no processo eleitoral. Está consagrado no §9º do artigo 1.462, da Constituição de 1988, a necessidade da proteção da probidade administrativa, da moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. Esse parágrafo alude à finalidade de proteger a normalidade nas eleições contra a influência ou o abuso do poder econômico. Também o Código Eleitoral de 1965, ainda vigente, em seu artigo 237 estabelece: “A interferência do poder econômico e desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos”.

Já é público e notório que o Brasil é um país onde as desigualdades imperam, sobretudo a desigualdade de renda, uma chaga que corrói nossas instituições. Esta costuma afetar de modo ainda mais duro e significativo as mulheres que, além de serem, em média, mais pobres que os homens, ainda precisam enfrentar um mercado de trabalho discriminatório e segregacionista. Seria absoluta ingenuidade imaginar a tão almejada liberdade do voto sem ter em mente que ela está sempre constrangida numa sociedade com tamanhas desigualdades sociais. A partir daí, as questões relativas a como atingir a melhor possibilidade de garantir essa liberdade do voto entram em cena. As feministas defendem, então, o financiamento público exclusivo de campanhas eleitorais. Esse seria o único instrumento disponível para combater a “privatização da política e a corrupção dos processos eleitorais, para assegurar condições mais igualitárias de acesso aos recursos, e para restringir o poder de grupos econômicos e favorecer a participação de segmentos socialmente excluídos, como mulheres, afrodescendentes e jovens, entre tantos outros” (Cfemea, 2006).

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As listas fechadas

No sistema político praticado no Brasil hoje, os/as eleitores/as votam em listas abertas de candidatos/as, sendo eles/as (o eleitorado) a decidir quem terá mais votos e irá então se eleger. Lijphart (2003, p. 173) explica que as listas de candidatos/as podem ser de três tipos: fechadas, como se utiliza na Costa Rica, Espanha e Israel; parcialmente abertas, como na Bélgica e Holanda; ou abertas, da qual Finlândia e Brasil são os principais exemplos. No caso da lista aberta, o destaque cairá sobre a escolha pessoal dos representantes; no caso da lista fechada, sobre a determinação prévia das decisões políticas, quase uma estipulação de compromissos vinculantes entre candidatos e eleitores. Estes se guiam, então, pela proposta dos partidos, daí o compromisso dos eleitos com as plataformas político-partidárias.

O questionamento em relação ao sistema de lista aberta vem da constatação de que tem contribuído para a situação negativa de manutenção de um forte personalismo e individualismo nas candidaturas, assim como tem estimulado e fomentado uma competição interna predatória, e injusta, dentro dos próprios partidos. Significa dizer que há um efeito de transbordamento da autoridade de líderes partidários (leia-se “caciques” partidários) para seus candidatos “preferenciais”. Ainda que não se utilize a lista fechada, é fato que todos os partidos praticam, em função do império dessa lógica personalista, uma lista “virtual”, em que as lideranças, de modo claro, apoiam mais alguns candidatos/as em detrimento de outros/as. E, evidentemente, é muito raro as candidaturas de mulheres ocuparem seu topo.

A defesa pelas feministas da lista fechada se coloca na direção de uma maior democratização partidária. Contudo, como sabemos que os partidos também são instituições masculinas, só faz sentido a aprovação da lista fechada se vier acompanhada da alternância de sexo – e, de preferência, da observância de critérios étnico-raciais e geracionais. Do contrário, tais “minorias sociais”, mais uma vez, ocuparão o final das listas e não conseguirão, mais uma vez, se eleger.

As ações afirmativas

Apesar de várias mulheres estarem à frente de governos, inclusive na Presidência, as instituições são masculinas, feitas e mantidas com regras organizadas pelos homens

Prefeitas são recebidas pela presidenta Dilma |Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr

A mais expressiva ação afirmativa conquistada pelas brasileiras no campo da política parlamentar, como já mencionado, foi a “reserva” (1997) – e agora o “preenchimento” (2010) – de ao menos 30% das vagas de candidaturas para um dos sexos. Essa ação, ainda que absolutamente necessária, tem sido insuficiente para garantir a eleição de um número expressivo de mulheres. É necessário que as brasileiras, organizadas, se mobilizem para, nas eleições de 2012, impedir que as listas partidárias sejam sancionadas pelos TREs sem cumprir o preenchimento dos 30% de candidaturas femininas. Várias pesquisas internacionais já demonstraram que, sendo a cota efetivamente cumprida, é possível alavancar um processo virtuoso (e não viciado e perverso) de maior elegibilidade para as mulheres.

É urgente acompanhar e fiscalizar se os 5% do fundo partidário estão mesmo sendo destinados à preparação das mulheres, com a real criação e manutenção de programas de formação. Assim como é crucial fiscalizar se os partidos estão, de fato, atribuindo 10% do tempo da propaganda eleitoral gratuita na televisão às candidatas como forma de promover e difundir sua participação.

A fidelidade partidária é um elemento também importante da agenda feminista, mas não está mais em questão na atual reforma política porque avançamos mais nesse sentido. A cultura política brasileira nos legou uma estrutura partidária frágil, na qual as agremiações partidárias, como visto anteriormente, com frequência estão sob a tutela de comandos pessoais, sem grandes vinculações com as bases e com conteúdos ideológicos ou programáticos e com baixo nível de fidelidade. Na prática, a maioria dos partidos no Brasil comumente afastou o peso das bases partidárias, com honrosas exceções. Esse legado cultural foi forjado na época colonial e veio à tona quando se constituíram os primeiros partidos na monarquia e, depois, logo após nossa independência.

Até 2006, eram os próprios partidos políticos que elaboravam e implementavam suas disposições para lidar com a (in)fidelidade partidária. Mas ressalte-se que aquele/a que se elegeu poderia então mudar de agremiação sem perder a cadeira no Parlamento. No dia 27 de março de 2007, o TSE decidiu que o mandato parlamentar pertence ao partido, e isso provocou discussões de toda ordem. O assunto chegou até o STF, que ratificou a decisão e, para efeitos de segurança jurídica, decidiu que daquela data em diante qualquer parlamentar que trocasse de partido poderia perder o mandato. Esta, por mais inusitado que possa parecer, é também uma conquista das brasileiras, já que interessa à agenda feminista o fortalecimento orgânico, ideológico e programático dos partidos, de forma que esses sejam os critérios para decidir tanto a filiação quanto a desfiliação partidária e não seja permitida a prática de acordos oportunistas.

Ou seja: são muitas as tarefas e ainda muito poucas as mulheres (e mesmo os homens, pois o feminismo não é um patrimônio das mulheres) que estão conscientes de sua importância. Mas, em última instância, trata-se de um raciocínio que é, em si, algo muito simples: porque as mulheres não se candidatam, elas não se elegem; porque não se elegem, não estão nos parlamentos e também não podem se reeleger. O estatuto da reeleição – há pesquisas confiáveis que comprovam isso – é o fator mais decisivo do sucesso das carreiras parlamentares no país. As poucas que se elegem estão literalmente isoladas e solitárias em nossos parlamentos, com baixíssima capacidade de articulação e mobilização política em prol dos interesses efetivos das brasileiras. Esse círculo perverso para as mulheres políticas, no Brasil, precisa ser interrompido, sob pena de não sustentar, de fato, o tão almejado projeto de desenvolvimento que desejamos. Ou alguém acredita que o desenvolvimento do país será efetivo com a exclusão, a opressão ou a alienação de mais de 50% de sua população?

Referências

ABRAMOVITZ, Mimi. 1988. Regulating the Lives of Women: Social Welfare Policy from Colonial Times to the Present. Boston: South End Press.

BROWN, Carol. 1981. “Mothers, Fathers and Children: From Private to Public Patriarchy”, in Lydia Sargent, ed. Women and Revolution: A Discussion of the Unhappy Marriage of Marxism and Feminism. Boston: South End Press, p. 239-267.

CFEMEA (Centro Feminista de Estudos e Assessoria). 2006. Ponto de Vista Feminista sobre a Reforma Polĩ­tica. Publicação em formato de cartilha pela CFEMEA, disponível em: http://www.cfemea.org.br/index.php?option=com_jdownloads&Itemid=128&task=viewcategory&catid=4, Último acesso em 2 de abril de 2011.

DAHLERUP, Drude. 1989. “Confusing Concepts – Confusing Realityu: a Th eorical Discussion of the Patriarchal Sate”, in Women and State. London: Sasson/Anne Showstack.

LIJPHART, Arend. 2003. Modelos de Democracia: Desempenho e Padrões de Governo em 36 Países. Tradução de Roberto Franco. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.

MACKINNON, Catharine. 1989. Toward a Feminist Theory of the State. Cambridge: Harvard University Press.

 MATOS, Marlise. 2008. “Mecanismos de inclusão de mulheres no poder: a ‘corrida de obstáculos‘ e as experiências das cotas partidárias para mulheres no Brasil”. Seminário Internacional Fazendo Gênero 7. Simpósio Temático ST06 – Sujeitos do feminismo: políticas e teorias, 2006. Disponí­vel em: http://www.fazendogenero7.ufsc.br/st_06.html, Último acesso em julho de 2008.

 MATOS, Marlise. 2010. “Justiça social e representação democrática: é possível incluir democraticamente no Brasil? O caso das mulheres candidatas na política”, in Izabel Mizagia (Org.). Região e Poder. ed. 186. Goiânia: Editora da PUC de Goiás, v.1.

PATEMAN, Carole. 1989. “The Patriarchal Welfare State”, in The Disorder of Women Democracy Feminism and Political Theory. Stanford: Stanford University Press.

 WALBY, Sylvia. 1990. Theorizing Patriarchy. London, Basil Blackwell.

Marlise Matos é professora-adjunta e chefe do Departamento de Ciência Política da UFMG, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher e do Centro do Interesse Feminista e de Gênero da UFMG

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