Sociedade

Resultado da construção coletiva, o Estatuto da Juventude será o marco jurídico que consolidará os direitos dos e das jovens como uma questão de Estado

A negação histórica da existência de um povo palestino, necessária para afirmar o status da terra como res nullius, como uma terra sem povo destinada ao povo a que fora prometida, mantém-se constante até hoje e é acompanhada da vilificação daqueles que estão “do outro lado”, daqueles menos civilizados, dos radicais, dos amantes da morte

Os jovens são incansáveis na defesa de seus direitos e continuam lutando

Os jovens são incansáveis na defesa de seus direitos e continuam lutando para garantir que o Estatuto atenda aos seus anseios. Foto: José Cruz/ABr

Na histórica noite de 16 de abril, o plenário do Senado Federal aprovou o Estatuto da Juventude (PLC 98/2011), que consolida e amplia significativamente os direitos dos brasileiros e das brasileiras de 15 a 29 anos. Nove anos passados desde que nasceu na Câmara dos Deputados, o projeto agora retorna à Casa para seus trâmites finais, e a expectativa é de que a presidenta Dilma Rousseff possa sancioná-lo até julho deste ano.

Os últimos dez anos, de fato, foram um período rico em conquistas e avanços para a juventude brasileira. A iminente aprovação do Estatuto da Juventude representará um marco importantíssimo nesse processo, uma vez que pavimentará o caminho para todas as iniciativas dos anos vindouros.

O exame da trajetória do estatuto na Câmara e no Senado, paralelamente ao registro de outras iniciativas voltadas para os direitos da juventude na última década, dará a noção dos esforços empregados para que os jovens brasileiros tenham seus direitos garantidos e consolidados de uma forma que faça jus à sua importância para a história e o desenvolvimento presente e futuro do nosso Brasil.

O embrião do Estatuto da Juventude surgiu em maio de 2003, há exatos dez anos, quando foi instalada, na Câmara dos Deputados, a Comissão Especial da Juventude, encarregada de elaborar propostas de políticas públicas para os jovens brasileiros. Em novembro do ano seguinte, como conclusão de seus trabalhos – que incluíram diversas audiências públicas, viagens de estudo ao exterior e encontros regionais na maioria dos estados brasileiros –, a comissão apresentou importantes propostas. Entre estas, destacam-se a criação, pelo Poder Executivo, do Conselho Nacional da Juventude, da Secretaria Especial de Políticas de Juventude e do Instituto Brasileiro de Juventude; a realização, a cada dois anos, de Conferências Nacionais da Juventude; e, no âmbito das proposições legislativas, o projeto de lei que dispõe sobre o Estatuto da Juventude e a Proposta de Emenda à Constituição que inclui o termo “jovem” na denominação do Capítulo VII e no artigo 227 da Carta Magna, reconhecendo o jovem como sujeito de direitos em nível constitucional.

As sugestões da comissão, no que se refere às providências de competência do Poder Executivo, coincidiram plenamente com as conclusões do Grupo Interministerial, composto por representantes de dezenove ministérios, que se reuniu em 2004 para elaborar um programa de governo voltado para os jovens. Resultou dessa movimentação a Lei nº 11.129 de 30 de junho de 2005, que criou a Secretaria Nacional da Juventude (SNJ), o Conselho Nacional da Juventude (Conjuve) e o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem).

A Secretaria Nacional de Juventude, vinculada à Secretaria-Geral da Presidência da República, tem a responsabilidade de integrar e coordenar as políticas públicas e os programas de cooperação voltados para os jovens.

O Conjuve, por sua vez, propõe diretrizes para essas políticas e programas, realiza estudos e pesquisas sobre a realidade socioeconômica do jovem brasileiro e promove intercâmbio entre as entidades juvenis nacionais e internacionais. É importante frisar que quarenta dos sessenta membros do conselho são representantes da sociedade civil.

E o Projovem tem como meta a reintegração dos jovens de 15 a 24 anos que não concluíram o ensino fundamental. Em 2007, cresceu e se tornou o Projovem Integrado, que unificou o programa original a outros cinco. Atualmente, desdobra-se em quatro modalidades – Urbano, Campo, Trabalhador e Adolescente –, executadas pelos Ministérios da Educação, do Trabalho e Emprego e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

Também se realizaram, a partir das sugestões da comissão, duas Conferências Nacionais da Juventude – em 2008 e em 2011 –, cujas recomendações conseguiram se materializar nas modificações que o Estatuto sofreu no Senado, baseadas que são nos anseios de dezenas de entidades representativas da juventude que participaram de ambas.

As proposições da Comissão Especial da Juventude, portanto, foram bem-sucedidas no âmbito do Poder Executivo. Felizmente, o mesmo pode ser dito no âmbito legislativo, em relação às que emanaram do relatório final da comissão.

A sugestão de incluir o jovem como sujeito de direitos no artigo 227 da Constituição veio ao encontro da PEC nº 138 de 2003 (no Senado, PEC nº 42 de 2008), mais conhecida como PEC da Juventude. A proposta foi aprovada e gerou a Emenda Constitucional nº 65 de 2010, que renomeou o Capítulo VII da nossa Constituição para “Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso”, incluindo o jovem como  sujeito prioritário dos direitos elencados no artigo 227 e estabelecendo, ainda, em seu parágrafo 8º, a instituição do Estatuto da Juventude, destinado a regular o direito dos jovens. Essa talvez seja a recomendação mais importante dentre as que foram feitas pela Comissão Especial da Juventude. O Estatuto da Juventude é o marco fundamental dos direitos da juventude, a ferramenta a ser mais intensamente empregada, daqui em diante, tanto pelos jovens, na luta permanente por seus direitos, quanto pela SNJ, o Conjuve e os demais órgãos e entidades de Estado envolvidos na execução da Política Nacional de Juventude.

Sua trajetória até aqui foi fruto de muita discussão, com ampla participação da própria juventude e de todos os atores envolvidos. Na Câmara, onde tramitou por sete anos, foi objeto de vários seminários e audiências públicas e aprovado sob a relatoria da deputada Manuela D’Ávila.

No Senado, antes de ser aprovado no plenário, tramitou em duas comissões: na de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), com relatoria do senador Randolfe Rodrigues, e na de Assuntos Sociais (CAS), com nossa relatoria.

A forma que o projeto tomou na CAS é fruto de uma ampla discussão com a juventude brasileira. Realizamos audiências públicas em que discutimos exaustivamente o projeto com representantes de cerca de oitenta entidades de jovens de todo o país. Todos os líderes partidários da Casa acompanharam de perto o desenrolar das negociações.

Dessa forma, construímos na CAS um substitutivo de 48 artigos, que, ao mesmo tempo em que resguardava as conquistas obtidas nas fases anteriores da tramitação do Estatuto, ampliava ainda mais os direitos da juventude, aproximando sobremaneira o projeto das expectativas dos jovens brasileiros. Destacamos a garantia de duas passagens gratuitas e duas com 50% de desconto para jovens de baixa renda, no transporte interestadual.

A legitimidade de que o projeto se revestiu foi confirmada quando ele foi a plenário, após a aprovação de um requerimento de urgência. O substitutivo da CAS foi aprovado praticamente na íntegra, com apenas uma emenda aditiva, que reinseriu a limitação para meia-entrada que havíamos suprimido na comissão. Aliás, nosso posicionamento desde o início das discussões foi pela meia-entrada para todos, sem estipular percentual.

O Estatuto da Juventude que se apresenta agora à análise da Câmara dos Deputados, portanto, em muito se aproxima das expectativas e dos desejos da juventude brasileira. É resultado de uma construção coletiva e conta com o respaldo das principais entidades representativas da juventude, que, aliás, foram exemplares em sua intensa participação ao longo de toda a tramitação do projeto.

Portanto, parabéns aos jovens brasileiros, que passarão em breve a contar com um marco jurídico que encara a juventude como uma questão de Estado, e não deste ou daquele governo; amplia o conceito de juventude – não mais uma fase de incertezas entre a infância e o mundo adulto, mas uma categoria geracional com direitos específicos; integra as políticas de municípios, estados e União em um todo coeso e coordenado, por meio do Sistema Nacional da Juventude; garante benefícios imediatos, como a meia-entrada e a meia-passagem, aos nossos jovens, sobretudo os carentes; e, pela primeira vez no ordenamento jurídico brasileiro, aponta para um Brasil mais tolerante às diferentes orientações sexuais, ao garantir que os jovens usufruam total liberdade em relação a suas opções em termos de sexualidade.

Nossa luta ainda não acabou. Agora, é preciso garantir que, na Câmara dos Deputados, o projeto não perca a legitimidade e o respaldo construídos no Senado. Nossos jovens são incansáveis na defesa dos seus direitos e continuarão lutando para garantir que o Estatuto da Juventude sancionado pela presidenta Dilma Rousseff dentro em breve corresponda aos anseios de todos eles no Brasil.

Paulo Paim é senador da República (PT-RS)