Política

A manutenção das conquistas obtidas ao longo dos dez anos de governos do PT passa pela fidelização ideológica do eleitorado e pela renovação dos quadros eleitorais

O partido que detém a maior bancada no Congresso, a segunda maior no Senado e milhares de filiados Brasil afora tem a responsabilidade de catalisar a construção de uma sociedade civil organizada a partir das relações de vizinhança

O PT se diferenciou dos outros partidos ao optar pela organização das massas

O PT se diferenciou dos outros partidos ao optar por escrever sua história baseado na organização das massas. Ilustração: Acervo CSBH

Em seu artigo “Partido para o país avançar”, parafraseando o presidente nacional do PT, o deputado  Pedro Eugênio (PT-PE) identificou alguns temas importantes para a atuação do Partido dos Trabalhadores no quadro político nacional. Todos estão relacionados a ações e diretrizes que permitam ao país avançar na direção de um modelo de desenvolvimento fortemente dotado de mecanismos democratizantes, “que redistribuam renda, riqueza e poder aos que compõem classes sociais submetidas, segmentos sociais historicamente marginalizados e populações que vivem em territórios discriminados.

Referindo-se especificamente a bandeiras emblemáticas possíveis de serem transformadas em realidade e outras que ainda terão de passar por processos longos de acumulação de forças, o companheiro Eugênio diagnosticou com precisão as ameaças à materialização de tais ações e diretrizes: nossa capacidade de articulação no plano político-institucional e nossa capacidade de mobilizar na base social.

O foco deste artigo está no que Eugênio chamou de mobilização da base social, que prefiro chamar de o problema da fidelização eleitoral. Afinal, o que significa mobilizar na base social? Aqui, o problema da fidelização eleitoral será analisado a partir de uma dupla perspectiva, devido à pirâmide da representatividade política intrapartidária: a disseminação da ideologia do PT na contemporaneidade e a renovação de seus quadros eleitorais.

A pirâmide da representatividade política intrapartidária

Essa expressão refere-se à carreira política, às diferentes funções ocupadas pelos quadros eleitorais do partido em sua trajetória política e às atividades e atribuições correspondentes. Sua caracterização é essencial para a análise do problema da fidelização eleitoral, pois, à medida que um quadro eleitoral do partido transita de uma função para outra, corre-se o risco da vacância da antiga função. Por exemplo: quando um líder comunitário vence as eleições para vereador e assume sua cadeira na Câmara municipal, corre-se o risco da função de líder comunitário ser assumida por uma liderança com ideias políticas divergentes da ideologia do partido. Da mesma forma, quando um vereador do partido vence uma eleição para deputado ou assume um cargo de confiança, a ocupação da função vacante por outro quadro do PT igualmente preparado deve fazer parte do cálculo político local, o que implica a necessidade de o partido planejar a renovação de seus quadros eleitorais.

A renovação dos quadros eleitorais do partido

Focalizando o problema da fidelização eleitoral, verifica-se que, geralmente, lideranças políticas emergem como produto de mobilizações populares provocadas por necessidades. “O PT entende (...) que sua existência responde à necessidade que os trabalhadores sentem de um partido que se construa intimamente ligado com o processo de organização popular, nos locais de trabalho e de moradia. Nesse sentido, o PT proclama que sua participação em eleições e suas atividades parlamentares se subordinarão a seu objetivo maior, que é estimular e aprofundar a organização das massas exploradas”, afirma a Carta de Princípios do partido.

Em outras palavras, o PT se diferenciou dos outros partidos políticos ao optar por escrever sua história baseado no processo de organização das massas exploradas. Entretanto, ao assumir o governo, distanciou-se de seu objetivo maior, negligenciando a preparação dos agentes que estimulam e aprofundam a organização das massas, essas lideranças que emergem das mobilizações populares provocadas por necessidades e são, em última análise, seus melhores quadros eleitorais. Abandonar a renovação dos quadros eleitorais do partido é condená-lo à extinção, tanto enquanto governo como enquanto agente de promoção da sociedade civil.

A disseminação da ideologia do partido

É preciso analisar o problema da fidelização eleitoral sob as lentes firmadas na Carta de Princípios, que estabelece a “organização das massas” como objetivo maior: nessa perspectiva, o processo de disseminação da ideologia do partido se realiza através de outro, o processo de organização da sociedade civil, do qual emergem as lideranças comunitárias e os novos quadros eleitorais do partido.

Nessa lógica linear, extremamente simplificada para fins didáticos, está contido um raciocínio não linear, que se fundamenta no Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001). Este estabelece que o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana deve ser compartilhado pela administração com a população e associações representativas dos vários segmentos da comunidade. Em termos práticos, isso se traduz na inclusão de demandas comunitárias na Lei do Orçamento anual, cujas dotações orçamentárias produzem mudanças na estrutura física da vizinhança.

Assim, se a satisfação de necessidades populares depende de recursos financeiros obtidos através do orçamento participativo, mais do que justificada está a necessidade de o partido retomar a frente do  processo de organização da população, por vizinhanças. Reduzindo-se esse processo à vizinhança, multiplica-se exponencialmente o número de lideranças potenciais, maximiza-se a possibilidade de disseminação ideológica do partido e, em última instância, fideliza-se o eleitorado.

O PT da fidelização eleitoral

Um modelo de desenvolvimento social fortemente dotado de mecanismos democratizantes, que produzam distribuição de renda, riqueza e poder, no sentido da paráfrase do presidente nacional do PT, impõe uma sociedade civil organizada e responsável por seu futuro. Nesse sentido, esta reflexão reuniu elementos necessários para argumentar que grupos humanos que enfrentam dificuldades para ter acesso aos benefícios da vida urbana e rural contemporânea carecem urgentemente de organização.

O Partido dos Trabalhadores, que detém a maior bancada no Congresso, a segunda maior no Senado e  milhares de filiados Brasil afora tem a responsabilidade de catalisar a construção de uma sociedade civil organizada a partir das relações de vizinhança. Uma vizinhança organizada apresenta menores índices de criminalidade, tem maior êxito na inclusão de demandas na Lei do Orçamento anual, tem ganhos correspondentes em qualidade de vida e sofre menos abusos das classes economicamente dominantes. A disseminação desse fragmento da ideologia partidária para a população explorada, associada com a formação de lideranças comunitárias comprometidas com o princípio da gestão democrática da cidade, garante a manutenção das transformações produzidas pelo PT ao longo dos dez anos de governo federal e a fidelização do eleitorado.

Ricardo Carlos Hartmann é psicólogo, especialista em cidade, meio ambiente e políticas públicas e mestre em Arquitetura e Urbanismo. Atualmente trabalha na Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Pinhais (PR).

Diogo Marques Cardoso é graduando em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Paraná. Atualmente trabalha na Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Pinhais.