Mundo do Trabalho

Os ataques neoliberais à organização sindical e a ofensiva ideológica contra as garantias previstas na legislação trabalhista aumentaram a urgência de uma reforma sindical

A Central Única dos Trabalhadores (CUT) foi fundada em 1983 com a bandeira da luta contra a “estrutura sindical oficial” (a unicidade sindical, o imposto sindical, a prerrogativa do Ministério do Trabalho de intervir nos sindicatos, o poder “normativo” da Justiça do Trabalho utilizado para interferir nos conflitos, entre outros pontos relativos a esse debate). Graças ao grande impulso das mobilizações sindicais dos anos 80, algumas alterações foram introduzidas pela Constituição Federal de 1988 na estrutura sindical até então vigente.

Mas a democratização da legislação sindical ficou truncada, incompleta. Expressão disso é que há hoje mais de 14 mil sindicatos de trabalhadores oficialmente registrados, a maioria dos quais apenas “de carimbo”, para usufruto de algumas vantagens por parte de suas direções, que não desenvolvem nenhuma ação sindical relevante. Pelas regras atuais, a existência de tal legislação impede que se consti­tuam nessas categorias/regiões verdadeiras organizações representativas dos trabalhadores – malgrado a vontade de parcelas expressivas delas.

Por isso, era uma obrigação política e moral da Central, na nova conjuntura aberta com o governo Lula, reapresentar a questão – e nisso houve sintonia com o governo desde o começo. No entanto, sabemos que as reivindicações da classe trabalhadora enfrentam grandes dificuldades na atual conjuntura, em virtude das concessões que o governo tem feito aos interesses do capital para tentar “estabilizar” a economia, manter a “governabilidade” etc. Nesse contexto, as políticas do governo são elaboradas sob pressão, de um lado, das exigências do capital e, de outro, das reivindicações populares.

Esse cenário impõe que, a cada momento, se faça um balanço concreto dos avanços, impasses e recuos nas reivindicações sindicais e populares para definir a posição política que a Central irá assumir em determinada questão.

No tema da “reforma sindical” que agora analisamos destaca-se este ponto principal: o que está sendo proposto no Fórum Nacional do Trabalho (FNT) é melhor ou pior que a estrutura sindical hoje vigente? Serve ou não serve às aspirações de ampliação da liberdade de organização sindical dos trabalhadores?

Embora existam essas ressalvas, o que foi elaborado no âmbito do Fórum permite uma resposta positiva às perguntas acima, desde que não se “abaixe a guarda” e isso seja considerado apenas uma fase da intensa disputa política, ainda não concluída, pela democratização da vida sindical no país.

A Central Única dos Trabalhadores (CUT) foi fundada em 1983 com a bandeira da luta contra a “estrutura sindical oficial” (a unicidade sindical, o imposto sindical, a prerrogativa do Ministério do Trabalho de intervir nos sindicatos, o poder “normativo” da Justiça do Trabalho utilizado para interferir nos conflitos, entre outros pontos relativos a esse debate). Graças ao grande impulso das mobilizações sindicais dos anos 80, algumas alterações foram introduzidas pela Constituição Federal de 1988 na estrutura sindical até então vigente.

Mas a democratização da legislação sindical ficou truncada, incompleta. Expressão disso é que há hoje mais de 14 mil sindicatos de trabalhadores oficialmente registrados, a maioria dos quais apenas “de carimbo”, para usufruto de algumas vantagens por parte de suas direções, que não desenvolvem nenhuma ação sindical relevante. Pelas regras atuais, a existência de tal legislação impede que se consti­tuam nessas categorias/regiões verdadeiras organizações representativas dos trabalhadores – malgrado a vontade de parcelas expressivas delas.

Por isso, era uma obrigação política e moral da Central, na nova conjuntura aberta com o governo Lula, reapresentar a questão – e nisso houve sintonia com o governo desde o começo. No entanto, sabemos que as reivindicações da classe trabalhadora enfrentam grandes dificuldades na atual conjuntura, em virtude das concessões que o governo tem feito aos interesses do capital para tentar “estabilizar” a economia, manter a “governabilidade” etc. Nesse contexto, as políticas do governo são elaboradas sob pressão, de um lado, das exigências do capital e, de outro, das reivindicações populares.

Esse cenário impõe que, a cada momento, se faça um balanço concreto dos avanços, impasses e recuos nas reivindicações sindicais e populares para definir a posição política que a Central irá assumir em determinada questão.

No tema da “reforma sindical” que agora analisamos destaca-se este ponto principal: o que está sendo proposto no Fórum Nacional do Trabalho (FNT) é melhor ou pior que a estrutura sindical hoje vigente? Serve ou não serve às aspirações de ampliação da liberdade de organização sindical dos trabalhadores?

Embora existam essas ressalvas, o que foi elaborado no âmbito do Fórum permite uma resposta positiva às perguntas acima, desde que não se “abaixe a guarda” e isso seja considerado apenas uma fase da intensa disputa política, ainda não concluída, pela democratização da vida sindical no país.

As condições do projeto

A Central defende a reforma sindical porque julga essencial mudar a estrutura do sindicalismo brasileiro para que se avance na democratização do país. O projeto de reforma sindical entrou no Congresso Nacional em março e deu novo fôlego a esse debate. A garantia da liberdade e da autonomia sindical será um impulso no fortalecimento da organização dos trabalhadores, condição indispensável para enfrentar o neoliberalismo, em busca de sua superação.

A reivindicação da liberdade sindical é uma luta histórica dos trabalhadores, ainda, em nossos dias, cerceada pela estrutura oficial herdada do período varguista. A esses limites se somaram, desde a década de 90, os ataques neoliberais à organização sindical e a ofensiva ideo­ló­gica contra as garantias previstas na legislação trabalhista, cujo resultado foi o agravamento da precarização nas relações de trabalho.

Esse quadro aumentou a urgência de uma reforma sindical que contribua para a democratização das relações capital-trabalho, garantindo o direito de organização dos trabalhadores e trabalhadoras nos locais de trabalho. No entanto, tal perspectiva somente será obtida se for criado um ambiente político em que os direitos sindicais sejam entendidos como conquistas democráticas da sociedade.

Obstáculo para isso é o empenho das forças conservadoras, que buscam fazer do Congresso Nacional uma “caixa de ressonância” de seus ataques aos direitos da classe trabalhadora. O fato de o tema da reforma provocar polêmicas no movimento sindical, em grande medida por uma intoxicação de informações falsas, piora a situação.

Além da Proposta de Emenda Constitucional (PEC), já encaminhada ao Congresso, a de reforma sindical igualmente prevê um projeto de lei. A minuta em debate traz avanços importantes em vários pontos, mas o apoio a sua tramitação no Congresso deve passar por uma avaliação da conjuntura, garantindo o que é fundamental e impedindo que vinguem os pontos negativos.

A construção de uma conjuntura favorável será resultado também da ação sindical. Um dos pontos-chave é conquistar a adesão popular na defesa de um novo modelo econômico cujo eixo seja a valorização do trabalho. Para tanto, deve-se fazer uma ampla campanha articulada com a Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) e, em paralelo, constituir uma campanha nacional pelo Direito à Organização Sindical.

A missão da proposta na CUT, no PT e nos movimentos sociais é desenvolver uma luta política na sociedade e no Congresso Nacional para ampliar os horizontes dos direitos coletivos da classe trabalhadora no país. Destravar o cenário para que setores de trabalhadores organizem-se em instituições ativas e representativas poderá significar um salto de qualidade no processo de construção do sindicalismo classista, democrático, de massas e pela base, representado pela CUT.

Plataforma básica

Diante desse quadro, a Central definiu uma série de ações que permite encarar as diversas frentes de oposição a mudanças. A primeira delas: a Plataforma Democrática Básica, que dialoga com a proposta histórica da Central, de um sindicalismo classista, democrático e construído pela base. A segunda: a busca de que essa plataforma seja assumida solidariamente pelo conjunto do Partido dos Trabalhadores. Isso significaria uma vitória também na luta pela independência do partido ante o governo.

Além disso, existe o objetivo de alcançar os demais partidos progressistas – traçando uma estratégia conjunta de ação no Parlamento –, o que lhes impõe o compromisso de tentar aprovar os pontos dessa plataforma no Congresso ou, se estes forem prejudicados, bloquear sua tramitação.

É preciso, no entanto, ir muito além das vias institucionais: no movimento sindical, sobretudo na base, procurando ampliar a compreensão e o apoio à plataforma. Além disso, sendo de interesse de toda a sociedade, deve-se debater com outros movimentos sociais e organizações populares, buscando explicitar a importância da plataforma e dos pontos ali definidos. Ao estender a discussão, estabelece-se também uma contraposição ao discurso das forças conservadoras, que acaba encontrando eco no Congresso Nacional. Para além do enfrentamento no Parlamento, a reforma deve ser pautada na sociedade.

A definição de uma plataforma básica fortalece politicamente as posições da CUT e possibilita uma agenda comum da esquerda na reforma sindical. As bases da formulação cutista vêm da proposta do Sistema Democrático de Relações de Trabalho (SDRT), construída em 1992, em que se conformou uma visão de liberdade e autonomia sindical articulada com um formato para a organização, a negociação coletiva e a solução de conflitos. Uma segunda síntese foi elaborada a partir dos debates da bancada sindical e da delegação cutista presentes no Fórum Nacional do Trabalho.

Nas definições da Central, a reforma sindical só faz sentido se introduzir de forma clara o direito à Organização nos Locais de Trabalho (OLT), isto é, se derrubar a “cerca” que a propriedade privada colocou para impedir a organização dos trabalhadores nas empresas. Para além disso, ela deve significar avanços na liberdade sindical, ao mesmo tempo não questionando os direitos trabalhistas já conquistados.

A plataforma da Central alterou os termos do debate político no sindicalismo brasileiro. Por um lado, setores sindicais tradicionalmente ligados à herança da estrutura sindical oficial – como a Corrente Sindical Classista (CSC) na CUT –, que no entanto identificam impasses na atual legislação sindical, alteraram sua postura política, passando a defender uma reforma sindical baseada na Plataforma.

Com esses setores, foi estabelecido um compromisso, expresso no segundo item da Plataforma Democrática Básica: “Manutenção da estrutura atual nos sindicatos de base (...)”. Essa formulação é uma garantia de que as mudanças não se farão dissolvendo e desorganizando o atual sindicato de base, o que para muitos trazia o risco de que a atual organização fosse substituída por nenhuma organização.

Mas esses mesmos setores aceitaram que posto esse ponto de partida, para fazer avançar a organização sindical e superar as atuais fragilidades, deveriam ser alcançados novos consensos. Por isso, a plataforma lança o desafio de formulá-los em relação a vários pontos – reproduzidos abaixo tal como aparecem no documento:

Reconhecimento das Centrais Sindicais com liberdade na estrutura vertical. Reconhecimento da “pluralidade sindical” que já existe de fato nas organizações de “segundo grau” para cima (ou seja, desde as federações estaduais para cima);

Manutenção da estrutura atual nos sindicatos de base, condicionada a critérios de representatividade e democratização dos estatutos. A formulação complementa que a estrutura (que se “mantém”) deverá responder a exigências de democracia e representatividade hoje inexistentes;

Organização Sindical por Setores e Ramos de Atividade. O documento aponta para um sindicalismo que supere a atual organização “por categorias profissionais”;

Fim do Imposto Sindical (contribuição compulsória) e das taxas confederativa e assistencial e instituição da Con­tribuição Negocial. Esse item é coerente com o ponto de “manutenção da estrutura atual nos sindicatos de base, condicionada...”, já que a atual forma de financiamento (imposto, taxas) é parte fundamental de um sindicalismo sem representatividade e antidemocrático;

Direito de Organização por Local de Trabalho (OLT). Coloca na ordem do dia a conquista desse direito político, fundamental para a construção de um sindicalismo combativo.

Não-intervenção do Estado na organização sindical. Rejeita a proposta elaborada pelo Ministério do Trabalho de dar superpoderes ao ministro.

Para nós da CSD, a plataforma traduz muitos elementos da nossa formulação de “sindicato unitário” proposta no SDRT.

Para além dos temas “organizativos”, a plataforma também trabalha algumas questões-chave para o avanço nos direitos de negociação coletiva. Defende:

Direito de Negociação e Greve no Setor Público nas três esferas e nos três poderes, hoje ausente na legislação;

Ultratividade dos Contratos. As cláusulas só perdem vigência quando substituídas por novos acordos entre as partes – este tema é urgente, uma vez que a reforma do Judiciário já suprimiu o Poder Normativo da Justiça do Trabalho.

Contrato Coletivo Nacional por Ramo. Significa o reconhecimento das negociações nacionais por ramo.
 

O documento ainda destaca três temas fundamentais: Substituição Processual; Coibição das práticas anti-sindicais; e Ratificação da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) – que impede a dispensa imotivada.

A mobilização em torno da Plataforma Democrática Básica deve ser combinada com uma campanha pela valorização do trabalho, garantindo os direitos sociais e trabalhistas já conquistados, o aumento do salário mínimo e a redução da jornada de trabalho sem diminuição de salários.

Em suma, trata-se de uma pauta de interesse do sindicalismo brasileiro, com base em que é possível construir maior unidade.

Rosane da Silva é secretária de Política Sindical da Central Única dos Trabalhadores (CUT)