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Após mais de um ano desde a implementação dessas estruturas, é crucial avaliar seu impacto no projeto estratégico do governo, que tem por objetivo criar um governo efetivo e inclusivo, uma sociedade ativa e diversa e um mercado economicamente competitivo e produtivo

O governo do Presidente Lula tem feito um enorme esforço para construir uma gestão participativa e inclusiva, a partir de dois objetivos centrais: 1) instituir uma relação de causalidade entre gestão democrática e desenvolvimento; e 2) estabelecer um convívio respeitoso e participativo do governo federal com os três setores do sistema social: o Estado, o mercado e a sociedade. Para tanto, estabeleceu diretrizes e princípios, além de ter criado diversos espaços de diálogo e participação ou reativado alguns que tinham sido extintos nas gestões anteriores. Mas o grande desafio é tornar esses espaços efetivos na busca de pacificar o país e na aderência desses setores à agenda governamental.

Diferente de seus dois antecessores, o governo Lula possui diretrizes claras no sentido de promover a atuação conjunta entre órgãos governamentais e os três setores do sistema social, com a valorização do consenso, da legitimidade das políticas públicas e da solução de conflitos com a participação de todos os afetados, inclusive como forma de validar políticas públicas e atos governamentais. Os princípios que devem nortear essa estratégia são transparência, diálogo, participação, equidade e accountability (conjunto de práticas éticas, prestação de contas e responsabilização do governo perante a sociedade).

Para cada um dos setores, houve a institucionalização de espaços de diálogo com o objetivo de viabilizar consensos e buscar resolver, de maneira pacífica e pactuada, os problemas e conflitos próprios das sociedades democráticas. No desenho governamental, foram organizados instâncias e órgãos para tratar dessa relação, com a divisão de atribuições e responsabilidades, de acordo com as competências dos órgãos e as habilidades e perfil dos titulares desses espaços de concertação e escuta social.

A relação com a sociedade, uma das prioridades do governo, ficou predominantemente a cargo da Secretaria-Geral da Presidência, que ganhou novas atribuições com a finalidade de coordenar a política e o sistema nacional de participação social e articular as relações políticas do governo com os diferentes segmentos da sociedade e juventude, além de cooperar com os movimentos sociais na articulação das agendas e ações que fomentem o diálogo, a participação social e a educação popular, e incentivar, junto aos demais órgãos do governo federal, a interlocução, a elaboração e a implementação de políticas públicas em colaboração e diálogo com a sociedade civil e com a juventude.

A Secretaria-Geral também ficou com a incumbência de retomar as Conferências Nacionais temáticas e para este ano de 2024 já estão programadas sete: 1) a 5ª Conferência Nacional de Educação; 2) a 5ª Conferência Nacional dos Direitos de Pessoas com Deficiência; 3) a 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial; 4) a 12ª Conferência Nacional dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes; 5) a 4ª Conferência Nacional de Cultura; 6) a 5ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia; e 7) a 6ª Conferência Nacional das Cidades.

Além disso, como órgão setorial do Sistema de Participação Social, o governo instituiu na estrutura básica de todos os ministérios a Assessoria Especial de Participação Social e Diversidade, coordenada pela Secretaria-Geral da Presidência da República, com três compromissos: 1) fazer a relação do ministério com os movimentos sociais; 2) fortalecer e coordenar as instâncias democráticas de diálogos, e 3) fomentar e estabelecer diretrizes e orientações à gestão de parcerias e relações governamentais com a sociedade civil, além de assessorar o ministro de Estado no combate às desigualdades.

Ainda no campo do diálogo com a sociedade, o governo fortaleceu as o6uvidorias, que promovem a participação dos usuários dos serviços públicos, com a missão de acompanhar a prestação de serviços, receber e processar reclamações da sociedade, além de propor o aperfeiçoamento dos serviços prestados, promover a adoção de mediação e conciliação entre usuário e órgãos ou entidades públicas. Elas também auxiliam na prevenção e correção dos atos e procedimentos incompatíveis com os princípios estabelecidos em lei.

Para estreitar a relação com o mercado, o governo criou o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável, o Conselhão, retomando e ampliando a iniciativa que havia adotado em 2003, quando foi criado o então Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, com a presença de todos os setores da sociedade, com forte presença do setor empresarial, e fortaleceu o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, com a criação de secretarias voltadas para as demandas do setor produtivo e criação e instalação do Conselho de Desenvolvimento Industrial, com a participação das principais representações da indústria nacional.

O Conselhão tem a missão de reunir os diversos segmentos sociais e econômicos para propor ideias e sugestões que contribuam com o Poder Executivo e os entes subnacionais na formulação de políticas públicas e “promover a articulação da sociedade civil para a consecução de um modelo de desenvolvimento configurador de um novo e amplo contrato social”.

O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MIDC), por sua vez, conta com uma estrutura de quatro secretarias que fazem interlocução com o setor produtivo: 1) Secretaria de Comércio Exterior; 2) Secretaria de Desenvolvimento Industrial, Inovação, Comércio e Serviços; 3) Secretaria de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria; 4) Secretaria de Competitividade e Política Regulatória, bem como de instâncias colegiadas, como os quatro conselhos e um comitê: conselhos 1) Nacional de Desenvolvimento Industrial; 2) de Metrologia, Normatização e Qualificação; 3) das Zonas de Processamento de Exportação; 4) de Participação em Fundo.

Após mais de um ano desde a implementação dessas estruturas, é crucial avaliar seu impacto no projeto estratégico do governo, que tem por objetivo criar um governo efetivo e inclusivo, uma sociedade ativa e diversa e um mercado economicamente competitivo e produtivo. Será necessário, ainda, retomar a iniciativa dos mandatos anteriores no sentido de promover a qualificação dos atores sociais para a participação social, notadamente a formação de conselheiros nacionais de políticas públicas, e assegurar que suas propostas sejam, de fato, incorporadas à agenda de políticas públicas, contornando a crítica de que se trataria, apenas, de espaços de “domesticação” ou “cooptação” da cidadania

Avaliar a efetividade desses espaços e instância de diálogo, e valorizar suas contribuições, é fundamental para o esforço de reconstrução e pacificação do país, uma das principais missões do Presidente Lula.

Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, consultor e analista político, diretor licenciado do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) e sócio-diretor da Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governamentais