O ponto de partida de um projeto de relações no trabalho está na formulação inicial do Contrato Coletivo de Trabalho sugerido no final da década de 80, pelo movimento sindical cutista1. Naquele momento, a CUT propôs o Contrato Coletivo de Trabalho como instrumento de modificação da concepção do modelo corporativista vigente, bem como de todo arcabouço legal que o regula e sustenta não apenas a negociação coletiva de trabalho, mas também todos os aspectos das relações trabalhistas no país (leis do trabalho, organização sindical, representação dos trabalhadores por local de trabalho, estrutura, forma e níveis da negociação coletiva, direito de greve, solução dos conflitos individuais e coletivos, Poder Judiciário trabalhista e fiscalização do trabalho).
É neste contexto que o ministro Walter Barelli, ao assumir a pasta do Trabalho em outubro de 1992, sugeriu aos diversos atores sociais, relacionados com o universo trabalhista, o aprofundamento da discussão sobre o Contrato Coletivo de Trabalho. O resultado foi uma série de contribuições - oriundas de organizações de trabalhadores, de empregadores e de instituições do Estado vinculadas ao mundo do trabalho -, que apontam, apesar das diferenças, a possibilidade de se estabelecer um projeto nacional democrático de relações de trabalho.
As propostas apresentadas mostram que existem, basicamente três concepções no que diz respeito ao Contrato Coletivo de Trabalho.
A primeira o entende como um grande documento de abrangência nacional por categorias ou intercategorias, destinado a regular aspectos gerais das relações de trabalho, podendo ser descentralizado por estados, regiões, municípios, chegando até os locais de trabalho, sem contudo promover qualquer alteração estrutural no sistema de relações vigente.
Uma segunda proposta defende que o Contrato Coletivo de Trabalho seja uma regulamentação de caráter nacional, destinada apenas a determinar os procedimentos de negociação, como estrutura, níveis, vigências dos instrumentos normativos decorrentes da negociação etc. Nesta proposta, as negociações de conteúdo ficariam basicamente em nível das empresas ou unidades de trabalho.
A terceira concepção enxerga o Contrato Coletivo de Trabalho como conseqüência da efetiva negociação coletiva, cuja existência decorre necessariamente de um sistema democrático de relações de trabalho que possibilita o aparecimento dos contratos coletivos porque incentiva e sustenta a própria negociação coletiva. A idéia é a reformulação total do sistema vigente, através de um processo cuidadoso de transição para o sistema democrático, calcado na participação efetiva dos trabalhadores; na liberdade e autonomia sindical, na representação por local de trabalho: no exercício da negociação coletiva como instrumento efetivo de regulação bilateral do trabalho, na garantia do direito de greve; na desburocratização das leis trabalhistas; na rápida solução dos conflitos; nas alternativas voluntárias de composição de conflitos coletivos, enfim, no redimensionamento do papel do Estado, que se tornaria apenas o regulador, organizador e fiador da efetiva liberdade sindical, abandonando assim seu caráter intervencionista. Na verdade, esta é a proposta que impulsionou todo o processo do Contrato Coletivo de Trabalho no Brasil. E é a esta concepção que nos filiamos, por entender que as relações individuais e coletivas, as normas administrativas e processuais do trabalho devem compor um todo harmônico entre si e não um conjunto de regulamentações fragmentado e desconectado da realidade.
As bases do corporativismo
A forte incidência de normas estatais em contraposição à realização da efetiva contratação coletiva de trabalho e de seus instrumentos normativos é a característica fundamental das relações de trabalho e do Direito do Trabalho no Brasil. A conseqüência dessa combinação é a existência de um arcabouço legal que: protege cada vez menos os trabalhadores; não responde com agilidade e segurança à dinâmica e às transformações recentes do processo de trabalho; é ineficaz no tocante à geração de instrumentos normativos de regulação autônoma (fundamentalmente porque a essência do ordenamento legal ainda mantém o controle e o intervencionismo estatal em relação à organização sindical, limita a abrangência da contratação coletiva e reprime e desqualifica o exercício do direito de greve).
Não obstante, as alterações ocorridas no sistema de relações de trabalho ao longo dos anos, desde a sua instauração no início da década de 30, ainda apresentam-se como um conjunto de regras de cunho estatalista, com grande intervenção legislativa, com negociação coletiva escassa, e com fraco alcance de globalização de seus efeitos. Trata-se do corporativismo sindical com influência direta do sistema fascista italiano. A lógica é manter as relações coletivas atreladas, controladas e reprimidas, enquanto promove a atuação de normas estatais de caráter individual para "suprimir" a ausência das normas resultantes da autonomia privada coletiva. Sempre visando preservar os interesses "superiores da Nação". A doutrina corporativa constitui-se portanto em uma concepção global de sociedade, na qual a iniciativa privada, os trabalhadores e os sindicatos sujeitam-se aos superiores fins nacionais. A colaboração econômica é o núcleo teórico do corporativismo2.
Assim, ao mesmo tempo em que as relações são inviabilizadas, existe um conjunto de leis trabalhistas regulando as relações individuais de maneira bastante detalhada, minuciosa e até mesmo inflexível e burocrática. De todas as leis do trabalho, a CLT é a mais significativa, porque, além de ser a mais antiga, incide sobre o maior contigente de trabalhadores. A CLT é a primeira lei geral, que se aplica a todos os trabalhadores sem distinção entre a natureza do trabalho técnico, manual ou intelectual. Esta lei não é um código, porque, não obstante a sua apreciável dimensão criativa, sua principal função foi a de reunião das leis existentes e não a criação, como um código, de leis novas3.
Apesar da incongruência do corporativismo sindical, o Direito do Trabalho brasileiro, no tocante às relações individuais, sempre foi concebido apesar de discussões teóricas atualmente irrelevantes - como um ordenamento normativo unilateralmente protetor do trabalhador. Acompanhando a doutrina protecionista tradicional, sua função seria a de compensar o hipossuficiente e, na medida do possível, diminuir o desnível ocasionado pelo poder econômico do empregador em relação ao trabalhador. A vitalidade dessa compensação explícita das relações individuais em detrimento das coletivas, salvo esparsos momentos de nossa história, tem permanecido relativamente eficaz, muito embora com alguns estremecimentos nos últimos anos, sem comprometer, na essência, sua fundamentação.
O rompimento com o autoritarismo, no entanto, deu-se a partir das greves do ABC paulista em 1978, que catalisaram o espírito de abertura democrática latente naquela ocasião. Tais greves foram desenvolvidas num cenário de exacerbação de legislação proibida4. Os acontecimentos de 1978 produziram conseqüências palpáveis na sociedade brasileira, contribuindo decisivamente para a redemocratização do país.
A partir de 1978, registrou-se um rompimento de parte expressiva do movimento sindical com a tradicional submissão à estrutura corporativa. Mas, o processo permanece inconcluso. Todo o esforço de conquista da liberdade sindical, iniciado com a criação das centrais, esbarrou na estrutura corporativista dos sindicatos. Isto determina uma ambigüidade: uma estrutura de cúpula autônoma assentada sobre uma base organizada nos moldes do velho sindicalismo oficial. Isto faz com que ocorra uma desigual distribuição de poder no interior das centrais, permitindo que alguns grandes sindicatos corporativos - circunscritos preponderantemente pela base de representação territorial e não por ramo de atividade - limitem a autonomia das centrais, posto que possuem maior estrutura funcional, administrativa e política. Tal ambigüidade compromete decisivamente a concepção de liberdade e autonomia sindical.
Mesmo com a Constituição de 1988, as relações de trabalho não conseguiram sair do jugo do Estado. O texto constitucional, apesar de enunciar a liberdade sindical, manteve as bases de sustentação do sistema corporativista. Conservou institutos básicos da antiga organização sindical (base territorial, enquadramento por categoria, imposto sindical), ignorando totalmente as possibilidades de autonomia. O quadro sindical atual é alarmante. Apesar de vedada a intervenção estatal nos sindicatos, a Constituição manteve o princípio da unicidade (monopólio da representação). Essa unicidade "por categoria", assegurada pela exacerbação privatista, redundou na pulverização da organização sindical, fazendo com que hoje tenhamos aproximadamente 14 mil sindicatos, na sua maioria pequenos e fracos, realidade inconcebível em qualquer país de pluralismo.
A interferência repressiva do Estado impossibilita a regulamentação autônoma do trabalho. Há muitas leis e pouca contratação. Pouca negociação entre trabalhadores e empregadores e as que existem estão calcadas nas questões salariais, sem aprofundar temas mais estruturais. Não há interlocução assegurada de maneira livre entre as partes. Não se tem garantias de que o diálogo possa convergir para objetivos claramente definidos. Em geral, o empregador brasileiro procura o trabalhador apenas para discutir a crise. Não se tem um processo permanente sobre administração cotidiana do trabalho, ganhos reais ou até mesmo questões macroeconômicas. Não há mecanismos e instrumentos jurídicos capazes de assegurar o equilíbrio de forças entre os atores da negociação coletiva.
A conseqüência das carências apontadas é o grande número de conflitos trabalhistas individuais e coletivos existentes no Brasil. Uma reclamação trabalhista elementar demora em média sete anos para ser julgada. A Justiça do Trabalho está absolutamente abarrotada de processos concernentes a diferenças rescisórias, horas extras e tantas outras questões que poderiam facilmente ser resolvidas diretamente pelas partes (com assessoria dos respectivos sindicatos), rapidamente e sem qualquer tipo de burocracia.
No campo das relações coletivas porém, além da pouca incidência das negociações, a lei de greve existente funciona como um portentoso instrumento de repressão à ação coletiva dos trabalhadores, porque possibilita o julgamento sobre o momento e a oportunidade dos movimentos grevistas, valendo-se apenas de critérios formais de cumprimento legal. Assim, a greve perde sua capacidade latente de causar prejuízo à contraparte através de seu exercício. Esta característica é fundamental para que o direito de greve se transforme em um instrumento de pressão ao empregador, para que o mesmo aceite a negociação coletiva, salvo justificado motivo. As limitações ao exercício do direito de greve, somadas ao tipo de sindicato que temos no Brasil (organizado por categoria, limitado por sua representação por base territorial municipal, pequeno e fraco), impedem a negociação coletiva, preconizada enquanto alternativa ao sistema corporativista. Isto porque a negociação coletiva descentralizada a partir de patamares nacionais, por ramo de atividade econômica, exige outro tipo de estruturação desses sindicatos.
As bases da mudança
Para romper com esse ciclo crônico de ineficiência, tanto nas relações individuais quanto coletivas, é necessário refletir em profundidade sobre a questão da transformação do sistema brasileiro de relações de trabalho, de acordo com os princípios de liberdade e autonomia sindical; das especificidades do trabalho urbano, rural e do serviço público; da representação dos trabalhadores por local de trabalho; da valorização da negociação coletiva de trabalho; da mudança do papel do Estado; da redefinição da legislação do trabalho; da agilidade na solução dos conflitos individuais e coletivos; do estímulo às soluções de conflitos coletivos voluntárias, com o conseqüente término das soluções compulsórias e de requisição unilateral. Neste diapasão, a adequação da agenda de debates é fundamental.
O primeiro grande problema refere-se à unicidade sindical, mantida pela Constituição de 1988. A unicidade sindical ou monopólio de representação é a determinação legal da impossibilidade de existência de mais de um sindicato de categoria por base territorial. Quando se quebra esse monopólio, insere-se o debate político, exigindo dos sindicatos representatividade. Os que não forem representativos, na perspectiva da liberdade sindical, fatalmente acabarão. Isso se aplica, certamente, a mais de 90% dos sindicatos brasileiros. É óbvio que esse tema tem um potencial explosivo de polêmica, porque em palavras bem objetivas, estamos negociando com os que hoje estão, bem ou mal, representando oficialmente os trabalhadores. E quando se diz que vai haver liberdade, eles sabem que seus sindicatos correm o risco de acabar. Isto também se dá em nível da sustentação econômica. Novamente fica ameaçada a autonomia sindical, já que o sistema vigente garante a manutenção econômica e financeira dos sindicatos graças ao imposto (contribuição) sindical compulsório. Ou seja, é impossível chegar facilmente a um consenso neste debate.
No entanto, é preciso saber que tipo de sindicato se espera. Se a perspectiva é termos um sindicato de Estado, é óbvio que a opção recairá sobre a unicidade sindical. Todavia, se a perspectiva for a de construir um Estado mais democrático, deve-se optar, necessariamente, pela livre organização dos sindicatos. A nossa opção é pela liberdade sindical. As forças responsáveis e progressistas do país têm que defender e enfrentar esse debate. A resistência à liberdade sindical manifesta-se até nos postos mais avançados do sindicalismo brasileiro e deve ser enfrentada, porque o que está em debate é a nova conformação do cenário sindical.
Vamos ou não implodir a geografia sindical? Mantendo-a, continuaremos com sindicatos débeis, sujeitos à interferência repressiva e sem capacidade para enfrentar, em condições mínimas, o impacto dos novos desafios políticos, econômicos e produtivos.
Apesar do texto constitucional, vivemos franco processo de pulverização (não pluralismo) sindical. Ninguém pode, em sã consciência, afirmar que, com a existência de 14 mil sindicatos, prepondera o sindicato único.
A liberdade sindical não é imperativa de pluralismo sindical. É a garantia do direito de filiar-se ou não a sindicatos sem qualquer interferência, inclusive no que se refere à estrutura dos sindicatos. A liberdade sindical efetivamente possibilita a criação de sindicatos novos quando os existentes não correspondem aos anseios de parcela significativa dos trabalhadores. Assim, ela libera a camisa-de-força da unicidade, na qual a guerra para a manutenção do aparelho, nas eleições sindicais, ganha proporções alarmantes. Possibilita também a constituição do sindicato da forma que os interessados desejarem e estabelecerem em seus estatutos.
A unicidade sindical, por sua vez, mantém o velho sistema de controle sobre a organização do sindicato, através de um eficiente sistema jurídico que assegura o artificialismo da representação; a repressão das forças autênticas de representação por local de trabalho; a pulverização da representação sindical por local de trabalho (sindicato dos metalúrgicos, médicos, motoristas etc., numa mesma unidade); a inibição do aparecimento de novas lideranças; um processo inadequado para trabalhar com novas realidades e a inaptidão para a contratação coletiva.
É exatamente contra essa expressão corporativista que defendemos um sistema democrático, em que a possibilidade da pluralidade seja real, assim como a representação dos trabalhadores por local de trabalho, que se constitui num instrumento para combater o corporativismo e garantir a democracia, com a participação dos trabalhadores no desenvolvimento econômico. A busca da unidade sindical dos trabalhadores deve ser resultado de suas políticas, suas discussões e lutas, e não de uma legislação que crie uma unidade artificial e, como já vimos, autoritária.
Solução dos conflitos
A estrutura e a forma da negociação coletiva também são fatores importantes para um sistema de relações de trabalho democrático. A negociação no Brasil é realizada, geralmente, uma vez por ano, de acordo com a data base de negociação de cada categoria profissional. Além de ampliar a fragmentação das negociações, a data base é o referencial para solucionar eventuais impasses. Havendo impasse, os envolvidos podem manter os efeitos jurídicos dos instrumentos em vias de vencimento, ajuizando um dissídio coletivo de trabalho, que vem a ser o pedido de julgamento da negociação coletiva. Assim, é a Justiça do Trabalho que vai "decidir" se os trabalhadores terão direito à comissão de fábrica, a que tipo de reajuste salarial etc. Portanto, salvo raríssimas exceções, a interferência do Poder Judiciário na solução dos conflitos coletivos de trabalho acaba restringindo-se a reajustes salariais. A negociação coletiva, que é um conflito de interesses, transforma-se, por força da interferência da Justiça do Trabalho, em um conflito meramente jurídico.
Neste sentido, para modernizar e democratizar as relações de trabalho no Brasil, temos que acabar com a interferência obrigatória do Poder Judiciário trabalhista na solução dos conflitos coletivos (poder normativo ou solução jurisdicional), que se materializa através das sentenças normativas. A intervenção jurisdicional obrigatória, além de inibir o processo de contratação coletiva - pelo seu caráter intrinsecamente vinculado ao sistema corporativista -, conduz a uma série de problemas: restringe o conteúdo das contratações (face às limitações típicas do Poder Judiciário); desqualifica a própria participação do Poder Judiciário enquanto formador de padrões de condutas refletidas pelo uso e pela prática social; inibe as contratações autônomas e, conseqüentemente, as fontes autônomas do Direito do Trabalho (que se traduz na capacidade de criar normas próprias entre trabalhadores e empregadores) e nivela as concessões pelas realidades mais desprotegidas.
Há uma falsa idéia de que o fim do dissídio coletivo acabaria com os sindicatos pequenos e fracos - o que de todo não seria ruim, porque sindicato pequeno e fraco é um contra-senso, já que os sindicatos devem ser representativos e fortes. A sobrevivência dos sindicatos não deve estar atrelada ao sistema de solução dos conflitos, mas sim, à organização sindical, que deverá superar os problemas específicos, ampliar sua representação, estruturar seu sistema confederativo etc.
Os conflitos coletivos nascem dos impasses na negociação. No sistema vigente no Brasil, como vimos, a Justiça do Trabalho é que possui poderes para solucioná-los compulsoriamente, independente da vontade das partes. Num sistema verdadeiramente democrático, as formas de composição dos conflitos devem ser voluntárias5.
No Brasil, os instrumentos jurídicos geram efeitos apenas no período de vigência. O ideal é que os efeitos sejam permanentes até que um novo instrumento revogue o antigo, ou a demonstração de onerosidade seja declarada em processo de renúncia, movido pelo interessado. Esta é a tendência mais marcante nos países com experiências trabalhistas mais democráticas e perenes.
Os níveis de negociação também merecem ressalva. Nas experiências trabalhistas, em que a preocupação com a globalização dos efeitos das negociações coletivas é preponderante, o sistema funciona de maneira descentralizada a partir do nível de negociação por ramo de atividade até a empresa ou local de trabalho. No momento em que se atinge um mínimo, é disparado o processo de especificidade, pelo qual se chega aos pontos máximos e específicos em nível das empresas ou local de trabalho.
O que acontece no Brasil é o contrário. A negociação começa por regiões, com ênfase em empresas. Parte-se então do nível intermediário e do específico para o geral. Esta equação impede qualquer tipo de globalização de efeito perene, mesmo entre categorias fortes. Os metalúrgicos, por exemplo, raramente conseguem globalizar os ganhos dos pólos mais avançados estendendo os para outras realidades metalúrgicas do Estado.
Papel do Estado
Com a mudança do sistema de trabalho, muda-se conseqüentemente o papel do Estado, que deixa a função intervencionista repressora e passa a exercer o papel de organizador do sistema e fiador da liberdade sindical.
Além disso, cabe ressaltar o papel do Estado enquanto balizador da globalização dos efeitos das negociações coletivas. Na maioria dos países desenvolvidos tem-se processado nos últimos anos uma diminuição significativa na taxa de sindicalização. Porém, os efeitos das negociações permanecem inalterados. Isto se deve ao poder que os ministérios do Trabalho possuem de estender cláusulas de instrumentos normativos a categorias equivalentes quando se constata qualquer tipo de resistência maliciosa por parte dos empregadores. O resultado concreto dessa prerrogativa do Ministério do Trabalho é a garantia da globalização dos efeitos da negociação coletiva para realidades compatíveis. Esse poder, contudo, é mais eficiente para a negociação coletiva em nível nacional. Este procedimento acaba influenciando a própria atuação do Poder Judiciário, que aplica os direitos decorrentes da negociação mais próxima quando o trabalhador reclama judicialmente qualquer direito. Como se vê, opera-se um processo articulado de valorização e de globalização da negociação coletiva. Onde a negociação é fragmentada, como no caso dos Estados Unidos, o processo de extensão é realizado informalmente pelas próprias empresas atingidas por mobilizações dos trabalhadores.
Conclusão
A disposição de alcançar o Contrato Coletivo de Trabalho não significa a mera apologia do documento, do instrumento normativo e sim as condições para o seu desenvolvimento e a transformação de todo o sistema de relações de trabalho. Trata-se, portanto, de uma tarefa extensa e complexa. Para chegarmos ao desenvolvimento efetivo de um sistema de relações trabalhistas participativo é preciso efetuar mudanças radicais, dirigindo os objetivos para a consolidação de um sistema que: proteja cada vez mais os trabalhadores; responda com agilidade e segurança à dinâmica do processo de trabalho e às transformações econômicas, possibilitando adaptações e flexibilizações negociadas; seja eficaz em relação à criação de instrumentos normativos autônomos, garantindo a liberdade e autonomia sindical, estimulando e globalizando os efeitos da negociação coletiva e assegurando o exercício do direito de greve.
José Francisco Siqueira Neto é advogado trabalhista e sindical, mestre em Direito do Trabalho, pesquisador do CESIT e assessor especial do ministro Barelli para assuntos de Contrato Coletivo de Trabalho
Notas
1. Siqueira Neto, José Francisco, Contrato de Trabalho. Perspectiva de rompimento com a legalidade repressiva, São Paulo, LTr editora, 1991, págs. 180 a 209
2. Pergolesi, F., Instituzioni di Diritto Corporativo, Bologna, Nicola Zanichelli Editore, 1940, pág. 18
3. Nascimento, Amauri Mascaro, Iniciação ao Direito do Trabalho, São Paulo, LTr Editora, 1992, pág. 33
4. Magano, Octavio Bueno, Manual de Direito do Trabalho. Parte Geral, São Paulo, LTr editora, 1991
5.A própria estrutura do Poder Judiciário trabalhista pode ser alternativa razoável. Existem, atualmente, tribunais regionais do Trabalho em todas as capitais e na cidade de Campinas. Todos possuem um Grupo Normativo encarregado de proferir as sentenças normativas. Na hipótese de criar-se mecanismos voluntários de solução dos conflitos coletivos, pode ser conveniente a transformação de Grupos Normativos em Grupos de Arbitragem Pública Voluntária. Além disso, no âmbito administrativo, o Ministério do Trabalho poderá estabelecer órgãos de conciliação e mediação.