Estante

A participação social no NordesteOs conselhos de políti­cas públicas ou de direitos e os orçamentos par­ticipativos são os principais instrumentos institucionais de democracia participativa existentes hoje no Brasil. Jun­tos, configuram importantes espaços públicos de co-ges­tão, aproximando a socieda­de civil da sociedade política para a deliberação conjunta sobre as políticas e as prio­ridades a serem assumidas pelo Estado, bem como para seu posterior acompanha­mento e fiscalização.

A Participação Social no Nordeste, organizado por Leo­nardo Avritzer, oferece uma valorosa contribuição ao de­bate democrático brasileiro contemporâneo. Tendo como foco de análise conselhos municipais e orçamentos par­ticipativos, em 22 municípios nordestinos, preenche uma histórica lacuna da literatura, tornando-se um trabalho sis­temático e de referência para estudos futuros. A pesquisa amplia a compreensão dos sentidos e das possibilidades da democracia e da participação, permitindo uma relei­tura da temática na Região Nordeste.

De um lado, as análises dos resultados derrubam o mito de um Nordeste homogêneo, marcado por um suposto padrão econômico, cultural e político. De outro, reforçam as mesmas questões trazidas pe­los estudos de participação e democracia em outras regiões do país. Os aspectos-chave envolvidos nas pesquisas so­bre conselhos e orçamentos participativos são variáveis co­muns que importam indepen­dentemente da região. Entre tais aspectos estão o grau de associativismo do município, o efetivo poder deliberativo de cada conselho, a estrutura de sua composição e os proble­mas da representatividade, o impacto na distribuição de re­cursos públicos e a vontade política do gestor para forta­lecer o conselho e os demais instrumentos de participação existentes.

A variável regional não altera substancialmente as análises sobre esses espa­ços de co-gestão, não sendo possível relacionar o grau de desenvolvimento e moderni­zação de uma região ao índi­ce de participação democrá­tica da sociedade.

A grande novidade é a desmistificação da idéia de um Nordeste homogêneo, constituído por condições pouco propícias à partici­pação democrática, quando comparado ao Sudeste e ao Sul. Trata-se, de acordo com o estudo, de uma região diversificada em função de dis­tintos panoramas políticos, sociais, econômicos e cultu­rais. Essas especificidades levaram à formação de rea­lidades marcadas por uma cidadania mais ativa, como ocorre em Pernambuco, e ao mesmo tempo de ambientes caracterizados por um mani­festo perfil antiparticipativo e relações mais hierárquicas, como a Bahia. Para qualifi­car essa visão complexa do quadro político nordestino, a pesquisa recorre a análises empíricas teórica e metodo­logicamente rigorosas, que comprovam a tese e enriquecem o repertório dos estudos de caso sobre experiências participativas no país.

O livro apresenta-se divi­dido em onze artigos e três partes. A primeira dá ao leitor a apresentação geral da pes­quisa e a contextualização histórica e política dos três estados investigados, Bahia, Pernambuco e Ceará, iden­tificando as semelhanças e particularidades da história política dos respectivos mu­nicípios. A segunda parte compõe-se da apresentação e discussão dos resultados da pesquisa, abordando, a partir de três trabalhos dis­tintos, aspectos centrais do debate sobre participação: a análise da estrutura normati­va e do desenho institucional dos conselhos nos municí­pios selecionados; a análise do efetivo poder deliberativo dos conselhos a partir da ve­rificação da capacidade de vocalização e de agenda de seus integrantes; e a discus­são sobre os efeitos reais da participação sobre as práti­cas de governo e suas rela­ções com a modernização da gestão pública.

A terceira parte reúne qua­tro textos externos à pesquisa, mas complementares à temá­tica central do livro, abordando aspectos como o associativis­mo étnico em Salvador, parti­cipação e gênero, participação e ação pública local na Bahia e reflexões sobre as questões de A Participação Social no Nordeste a partir de um estu­do sobre os conselhos de po­líticas sociais de Curitiba.

Denise Vitale é doutora em Direito, professora e pesquisadora do Mestrado em Políticas Sociais e Cidadania da Universidade Católica de Salvador (BA) e pesquisadora do Cebrap (SP).