Mundo do Trabalho

As cenas de pancadaria entre os delegados do 4° Congresso da CUT, servidas em horário nobre, contribuíram para acentuar o sentimento de que a esquerda não tem saídas para a crise nacional. É fundamental reverter essa situação.

 

 

O 4° Congresso da CUT foi a oportunidade perdida para começarmos a reformular nossa política de enfrentamento da ofensiva neoliberal. Saímos dele completamente mudos sobre as alternativas que o movimento sindical cutista tem para a crise brasileira.

As cenas de pancadaria entre delegados, servidas aos trabalhadores e opinião pública em horário nobre da TV, não apenas depuseram contra nossa central, mas contribuíram para reforçar o sentimento de que a esquerda seria incompetente para formular políticas concretas, neste momento de grave crise nacional.

Fomos incapazes de trazer propostas para a superação da miséria que vem se agravando com a política recessiva do governo Collor. Ainda não conseguimos transformar a CUT numa instituição efetivamente capaz de dirigir os trabalhadores no resgate de seus direitos mais elementares.

Em síntese, o 4° Concut não significou um desastre irremediável, mas, sem dúvida, foi o sinal mais evidente de que se esgotou de vez o primeiro ciclo de crescimento e de elaboração da Central.

O Brasil enfrenta hoje o esgotamento do projeto de desenvolvimento econômico imposto nas últimas décadas. O timoneiro Collor de Mello, derrotado nas eleições de 90 e carregando o peso de dois planos de combate à inflação redondamente fracassados, abandonou o barco à deriva. Assim navega a crise nacional. Como pano de fundo, temos um cenário internacional totalmente reformulado, com o fim do equilíbrio internacional estabelecido após a Segunda Guerra. Consolidam-se três grandes blocos capitalistas dominantes.

O rearranjo internacional resulta, sobretudo, da necessidade que os países ricos têm de responder aos novos desafios criados pelo próprio processo de produção e concentração de despesas. Implica a necessidade crescente de acumular capital e tecnologia, para não perder a disputa comercial interblocos ou internações.

Assistiremos em breve à maior deflagração de guerras comerciais que o mundo moderno já viu. Esse processo tende a gerar novos patamares de produtividade e tecnologia, que farão avançar ainda mais a chamada Terceira Revolução Industrial, com a introdução permanente de novos esquemas de gestão.

Temos assim uma poderosa máquina de transferência de riquezas. O acúmulo de capital e de tecnologia nesses blocos aumentará ainda mais as desigualdades existentes entre tais países e o Terceiro Mundo. Se, no passado, o potencial do mercado interno e a mão-de-obra barata eram atrativos para investimentos em nosso país, com as novas tecnologias e as elevadas taxas de desemprego nos países ricos esse elemento tende a perder força.

Com a atual divisão internacional de papéis econômicos, o Brasil entra no século XXI tendo seu destino traçado pelo receituário do FMI e do Banco Mundial. Querem nos condenar a sermos um mercado interno restrito de consumo, com grande capacidade de exportar produtos agrícolas, manufaturados de baixa tecnologia e processados minerais altamente poluentes. Mantendo-se tal divisão internacional de funções econômicas, estará sepultado de vez o sonho de resgatar a dívida social e a cidadania para milhões de brasileiros.

Acreditar que as elites brasileiras tomarão iniciativas para alterar em profundidade esse quadro, criando as condições para uma nova ordem econômica mundial, com o Brasil alinhado ao Primeiro Mundo, é desconhecer globalmente o caráter mesquinho que as classes dominantes têm mostrado ao longo de nossa história.

Incapaz de gestar um projeto para estancar a crise brasileira, a burguesia dispõe de menos chances de fazê-lo agora, quando o avanço da classe trabalhadora obriga qualquer projeto a buscar apoio de parcelas importantes da sociedade, em especial de setores organizados.

Apavorada e covarde, a burguesia, sem interlocutores representativos, vê o país afundar, mas não se arrisca a construir um projeto novo, fazendo concessões aos setores explorados. Cabe, portanto, aos setores democráticos e progressistas a tarefa histórica de construir um projeto nacional, a partir de amplas consultas à sociedade, para impô-lo às elites num processo contínuo de mobilização, retomando a ofensiva política.

Os movimentos sindical e popular, ao lado de outros setores progressistas, jogaram um papel decisivo na democratização do país, enfrentando a ditadura e alterando os rumos que a direita desenhava. Somos produto direto de um acúmulo de experiências e lutas que fizeram surgir, de uma só fornada, a CUT e o PT, fruto de um projeto político que representa hoje as esperanças de uma camada expressiva da classe trabalhadora.

Foram forjados assim, a ferro e fogo, os nossos principais dirigentes sindicais e políticos: filhos de movimentos contra a carestia, pela Anistia, contra os decretos-leis, pela reposição salarial e pelas diretas-já. Firmamos boa parte de nossa concepção e métodos de luta, ao longo de anos de enfrentamento contra o Estado autoritário. Essa realidade propiciou o desenvolvimento de um movimento sindical com prática e concepção imediatistas.

Tal contexto histórico impediu que tivéssemos, até hoje, um acúmulo expressivo no que se refere à estratégia de articular o movimento sindical com outras instituições da sociedade, mediante políticas de curto, médio ou longo prazo. Isto tem restringido a atuação do movimento sindical cutista à política de resistência, de denúncias e de convocação de greves gerais.

Essa foi a tática possível em determinada etapa de nossa história. Com ela pudemos construir a nossa central e nosso partido, legitimando-nos perante os trabalhadores. Na realidade complexa vivida hoje pelo Brasil, dentro do novo panorama internacional, essa tática já não é suficiente e precisa ser superada.

O acúmulo de problemas internos que temos enfrentado, seja no partido ou no movimento sindical, as disputas mesquinhas por cargos de direção ou por aparelhos, a tendência burocratizante observada em muitos de nossos instrumentos de luta, a incompreensão da política gestada nas cúpulas e o distanciamento das bases são sinais mais que evidentes de que se esgotaram o método e a forma de se fazer política e luta sindical em nosso campo.

O mesmo processo que se esgota, produz, dialeticamente, novos métodos de luta e elaboração, que precisam ser aperfeiçoados e transformados em prática sistemática entre nós.