Nacional

Os teóricos marxistas podem não aprovar com louvor, mas o projeto de reforma agrária do Governo Paralelo é a primeira tentativa consistente de articular, num programa, as demandas das lutas sociais no campo com a necessária dimensão institucional da redistribuição da terra

A Esfinge está de volta. Ela se põe diante de nós e nos desafia. Acuada, a esquerda se vê na necessidade de decifrá-la no contexto da ofensiva ideológica neoliberal. Não há como fugir à necessidade de debater a reforma agrária como parte essencial do quebra-cabeça da questão nacional. Não é possível discutir a sério a retomada do crescimento com distribuição de renda sem discutir reforma agrária. Não é possível discutir política industrial, baixos salários, o desemprego e o subemprego crônicos, o inchaço das cidades e a carência dos equipamentos urbanos, a fome, a tragédia dos meninos e meninas de rua, a violência de classe, seletiva e impune contra os trabalhadores rurais, a qualidade de vida, o valor universal da democracia sem discutir a reforma agrária. Aqui está ela, de volta, recém-saída das páginas policiais, para pôr os pés nos salões da Casa Grande da política.

O triunfo da cerca

A votação de 10 de maio de 87 foi emblemática. Exatamente um ano depois do assassinato do padre Josimo Tavares, líder religioso dos posseiros do Bico do Papagaio, as forças políticas pró e contra reforma agrária se confrontaram no plenário do Congresso Constituinte. Ali se votou o que seria, no texto final, o artigo 185 da Constituição. Trata das desapropriações para fins de reforma agrária. Todo o poderio do conservadorismo brasileiro traduzido na sua expressão político-parlamentar, o "Centrão", foi mobilizado em defesa do latifúndio. O velho e o moderno. Resultado: vestido com a armadura da "propriedade produtiva", o latifúndio foi posto acima da lei. Tornou-se "insuscetível de desapropriação". Esta votação é síntese de um processo anterior, longo e contraditório.

O golpe de 64 não representou apenas a derrota do Projeto Nacional Populista defendido por Jango e pelas forças sociais que o sustentavam. Foram postas em xeque não apenas as reformas de base, a reforma agrária entre elas. O alvo principal do golpe eram as organizações sindicais e políticas dos trabalhadores que, de um modo ou de outro, lhe davam suporte. No que diz respeito ao campo, a estratégia dos militares foi de terra arrasada. A destruição sumária das Ligas Camponesas, o terror e a submissão rasa da Contag recém-fundada, das federações e dos sindicatos.

A apresentação do Estatuto da Terra como programa de reforma agrária, ainda em novembro de 64, buscava responder, ao modo dos militares, a uma aspiração da sociedade. Essa resposta trouxe consigo a ilusão de "despolitizar" a questão da reforma agrária e uma segunda ilusão autoritária de que seria possível fazer a reforma agrária exclusivamente a partir da ação do Estado, sem a participação ativa e organizada dos trabalhadores.

O Estatuto da Terra, que em larga medida balizou o debate da questão agrária no Brasil no último quarto de século, não morreu por seus avanços ou mesmo por suas ambigüidades. Morreu de outra morte. Não há programa, ambíguo ou não, que resista se não houver força social organizada que faça dele parcela do seu sonho e o empunhe como uma questão de vida ou morte. Isto vale para o Estatuto da Terra e para os programas populares. A repressão sobre os movimentos sociais no campo, desencadeada pela ditadura militar, devolveu-os à idade da pedra. Às lutas mais primitivas. Às pequenas guerras familiares contra o senhor de terras. Foi neste estado de dispersão - em 87 foram registrados 782 conflitos de diversos tipos no campo - que a Nova República encontrou as lutas dos trabalhadores rurais.

O fracasso do Plano Nacional de Reforma Agrária da Nova República, em que pese seu caráter limitado, reside no descompasso existente entre a proposta de reforma agrária e a base de sustentação política do governo Sarney. O discurso da reforma agrária da Nova República apresentado em maio de 85 no IV Congresso dos Trabalhadores Rurais era coerente com a campanha das Diretas-Já. Na sua elaboração foram consultados os representantes dos trabalhadores, movimento sindical, movimento dos sem-terra, entidades da sociedade civil.

O decreto de 10 de outubro de 85, que traduziu em lei o discurso da Nova República, foi coerente com o Colégio Eleitoral e com a base social e política do conservadorismo que determinou a trajetória do governo Sarney.

O que ocorreu um ano e sete meses mais tarde, no plenário do Congresso Constituinte, foi a confirmação e o desfecho de um processo econômico e político que operou profundas mudanças na agricultura brasileira. Monitorado pela política agrícola do regime militar, o processo de desenvolvimento do capitalismo unificou e submeteu os interesses dos latifundiários e empresários rurais aos interesses do capital industrial e financeiro. Lançou as bases para a expansão dos complexos agroindustriais e da chamada modernização conservadora, e realizou a costura política necessária para fazer prevalecer esse conjunto de interesses nos centros de decisão do Estado.

Os embates do Congresso Constituinte os encontrou com grande capacidade de ação política frente aos trabalhadores que, naquele momento, além das urgências das lutas de massas, tinham que dar conta materialmente da reconstrução de suas organizações e da formulação do seu próprio projeto.

É útil lembrar aqui o esforço de mobilização dos trabalhadores rurais no processo constituinte para desfazer injustiças e corrigir equívocos de análise muito freqüentes entre nós. Poucos setores populares se mobilizaram tanto quanto os trabalhadores do campo. A campanha que recolheu 1,2 milhão de assinaturas e a marcha de 8 a 11 de outubro de 87 a Brasília são exemplos daquele esforço.

Ali compreendemos o significado mais profundo do que o peruano Manoel Scorza nos conta em seu livro A história de Garabombo, o invisível. Como os índios peruanos, os camponeses brasileiros são invisíveis para a sociedade dos "patrícios". Oito mil lavradores acamparam na capital da República, durante quatro dias, visitaram ministérios, fizeram manifestação em frente à Embaixada dos Estados Unidos, ocuparam os gabinetes de deputados e senadores no Congresso Nacional e ninguém os viu. Alcançaram o benefício dos holofotes das emissoras de TV no breve momento da audiência com o presidente do Congresso Constituinte, deputado Ulysses Guimarães. O resto foi um estrondoso silêncio.

Por que destaquei este fato? Porque ele lança alguma luz sobre as mediações sociais e políticas vigentes na sociedade brasileira quando se trata da relação entre a luta direta pela terra e as lutas institucionais pela reforma agrária. Este fato nos ajuda a compreender melhor como a sociedade brasileira, conduzida por suas elites, se move diante daquilo que ela considera a "insurgência" dos excluídos.

Resultou transparente no final do processo constituinte e depois dele que a modernização conservadora da agricultura reforçou o círculo de ferro do poder local oligárquico e sua capacidade de articulação e produção de políticas em âmbito nacional. A cerca triunfou sobre o sonho da terra livre.

O novo projeto de reforma agrária

Da emenda popular à Constituinte que recolheu 1,2 milhão de assinaturas à proposta do Governo Paralelo há um processo de discussão extremamente fecundo, no âmbito do Partido dos Trabalhadores. Não vou considerar neste texto as repercussões dele em outros partidos de esquerda e instituições identificadas com a luta pela reforma agrária.

Este período marcou, digamos, uma aproximação mais orgânica do PT - um partido de berço urbano - com os movimentos sociais no campo, os trabalhadores rurais e, por força de sua interiorização no país, com o tema da reforma agrária. Evidentemente este não é um processo contínuo, linear, nem obedece a uma curva sempre ascendente.

Os resultados eleitorais de 88 converteram abruptamente os vagos sonhos da candidatura Lula Presidente, alimentados desde o 5° Encontro Nacional do PT, em realidade política.

Depois de um quarto de século de ditadura, os setores populares reuniam as condições básicas para disputar o governo da República. Um movimento sindical combativo e em ascensão, movimentos sociais amplos no campo e na cidade, um partido democrático, socialista e de massas, uma liderança profundamente enraizada entre os trabalhadores e credenciada diante da sociedade para o embate. Faltava materializar uma política de alianças que resultou, não sem dificuldades, na Frente Brasil Popular e um programa que exprimisse os anseios populares trabalhados desde a retomada do movimento operário em 78.

O Partido dos Trabalhadores deveria pôr-se de pé diante do desafio de formular propostas para ser governo já, a partir de março de 90, e enquadrado na moldura de uma constituição conservadora. O PT, o enfant terrible da política brasileira, aos nove anos, estava sendo convocado para assumir um país naufragado numa conjunção de crises.

É ocioso falar do calafrio na espinha dos dirigentes diante das imensas dificuldades encontradas na formulação de um projeto democrático e popular - e não apenas petista- que fosse sendo montado coerentemente para as diversas políticas públicas. Eram evidentes muitos vazios neste quebra-cabeça, em assuntos essenciais que o PT jamais se debruçara para debater.

No que diz respeito ao Programa Agrário do PAG (Plano de Ação de Governo), o PT soube incorporar as demandas dos movimentos sociais do campo, soube ser herdeiro atento daquilo que foi produzido a partir das lutas recentes e da elaboração política do pensamento de esquerda. De modo precário, como precária era a qualidade da informação que recebíamos - trabalhamos com dados do censo agropecuário de 85 -aliada às nossas próprias debilidades de análise. Soubemos romper com certos vícios do pensamento tradicional da esquerda, escapamos da visão de um reforma agrária de caráter assistencialista voltada para atender camadas marginais da população, integramos a reforma agrária no âmbito das reformas estruturais do Governo Democrático Popular.

Onde residia a maior debilidade do PAG agrário/agrícola? Na precariedade das informações que lhe davam suporte? Não. Elas eram as informações disponíveis na sociedade. A principal debilidade é que o PAG não era um programa de governo. Estava longe de sê-lo. Só com ele Lula não governaria. Não faria reforma agrária nenhuma. O Programa Agrário não conseguia, em muitos aspectos, ir além das generalidades e do discurso ideológico. Avançamos com ele? Avançamos. Diante da penúria anterior. Mas seria necessário, ou um governo presidido por Lula que aprofundasse a crise do Estado brasileiro e apontasse a alternativa democrático-popular, ou a derrota frente à proposta neoliberal para que pudéssemos convertê-lo efetivamente num programa de governo.

Um programa de governo para o campo

O PT, como todo o movimento social que foi gestado e ascendeu desde o final da década de 70 no Brasil, quebrou-se contra o rochedo do conservadorismo das urnas de dezembro de 89. As elites demonstraram capacidade de lançar a massa desorganizada da sociedade contra a massa organizada nos sindicatos, associações, na sociedade civil e quebraram um movimento que crescia, quase sem interrupções, desde 78.

Terminado o segundo turno, passado o período imediato de desmoralização e dispersão de forças, recolhemos os cacos de algumas vaidades e ilusões e voltamos ao trabalho.

Lançada a idéia de um Governo Paralelo que pudesse unificar as propostas de oposição ao governo Collor, qualificá-las e apresentá-las como alternativas para a sociedade, a área agrária/agrícola coordenada pelo Dr. José Gomes da Silva pôs-se a trabalhar.Apesar da derrota eleitoral - convém lembrar que foi estreita a margem de votos -, o PT emergiu como um partido nacional apto a apresentar-se como pólo de atração dos setores oposicionistas. Pelo menos momentaneamente. Esta condição permitiu-lhe trabalhar em estreita ligação com os movimentos sociais no campo, particularmente o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra e a CUT, via Departamento Rural, e com um grande número de entidades de apoio à luta pela reforma agrária, estudiosos e técnicos que individualmente se dispuseram a contribuir na elaboração do projeto. Reunir esses movimentos, entidades e pessoas só foi possível graças à tenacidade, maturidade e competência política do Dr. José Gomes.

O que se produziu foi um meticuloso processo de consultas, um exercício de democracia na construção de algo que se pode efetivamente chamar de um programa de governo democrático e popular para o campo. Esse exercício preocupou-se menos com os avanços na elaboração intelectual do plano e mais com a identificação precisa das demandas dos atores sociais que dirigem a luta pela terra no Brasil para traduzi-las com fidelidade no Plano Nacional da Reforma Agrária (PNRA) -um projeto popular para agricultores sem-terra e minifundistas. No cerne daquela preocupação se encontra a determinação de não permitir que se abra um fosso entre o horizonte do programa e o volume real das lutas sociais que se travam no país.

"Uma verdadeira reforma agrária precisa afetar grandes espaços - municípios inteiros, microrregiões homogêneas, regiões geoeconômicas e estados - , de modo a permitir a instalação de estruturas próprias (cooperativas integrais de reforma agrária, sistemas de irrigação, organização de beneficiários, armazéns, silos e agroindústrias, escolas, creches e hospitais), compondo todo um setor reformado".

"Apenas uma reforma agrária com dimensões significativas poderá retirar do preço das terras o valor especulativo que possuem hoje, fazendo com que deixem de ser um ativo no porta-fólio dos agentes econômicos. Desapropriações isoladas ou com indenizações sobrevalorizadas (como aconteceu em certa fase do governo Sarney), ou aquisições a preço de mercado (como tem feito o governo do Rio Grande do Sul) apenas dinamizam o mercado de terras, valorizando-as ainda mais".

"É preciso esclarecer que a meta indicativa de 3.039.000 famílias, aqui adotada, mais que aumentar o número de novos proprietários rurais, preocupa-se em transformar minifundiários, predaristas e trabalhadores rurais volantes em agricultores socialmente amparados, economicamente viáveis e politicamente independentes".

Estes três parágrafos do PNRA mostram de qual reforma agrária estamos falando. Alguém em sã consciência tem dúvidas sobre o potencial de mobilização social que um plano de reforma agrária que alcançará 3.039.000 famílias de trabalhadores pode despertar na sociedade brasileira? A proposta deixa claro que a "reforma agrária precisa, igualmente, ser desencadeada numa dimensão que permita a criação de uma dinâmica própria, impedindo a ação da contra-reforma e tornando o processo irreversível".

Voltamos aqui ao elemento chave que busco trazer a este debate: a interação de iniciativas dos movimentos sociais existentes com a ação do governo democrático popular, com o objetivo de potencializar e generalizar em escala nacional a luta pela terra será fator essencial à realização da reforma agrária. Dito de outro modo, a luta pela terra potencializada pela ação do governo democrático popular será traduzida na reforma agrária que vai romper com o monopólio da terra e o poder político dos latifundiários.

"O presente Plano Nacional de Reforma Agrária manifesta abertamente sua motivação social, privilegiando os extratos de baixa renda (os 51 % de pobres do Brasil, que a agricultura abriga, sendo 69% no Nordeste), procurando dar lhes uma ocupação produtiva e adequadas condições de moradia, saúde, educação etc."

"Mas não coloca em segundo plano a importância econômica da reforma agrária proposta, tendo em conta os seguintes argumentos:

- A experiência histórica de países como Itália, Japão, Taiwan, Coréia do Sul e outros, onde a reforma agrária desempenhou importante papel na viabilização de um expressivo crescimento econômico, assim como a experiência de países não-capitalistas;

- Os aumentos obtidos na produção e produtividade agrícolas nas reformas agrárias do México, Itália, Japão, Venezuela, Espanha (Plan Badajoz) etc;

- Mesmo admitindo o argumento de que mudanças na estrutura fundiária não necessariamente conduzem a aumentos na produção de alimentos, a reforma agrária ganha importância diante da possibilidade de ocorrerem elevações substanciais no seu consumo (principalmente dos protéicos de origem animal). É preciso registrar, ainda, que o setor agrícola constribuiu com cerca de 15 % do PIB, cifra que quase triplica se considerado o conjunto da agroindústria e dos insumos, sendo um setor estratégico por sua participação nas exportações e na produção de alimentos, fibras e matérias-primas;

- A configuração do espaço fundiário está na base da acumulação capitalista".

Escapamos da proposta de reforma agrária como condição para o desenvolvimento capitalista, tal como era entendida nos anos 50, dentro do projeto nacional-populista, para formulá-la a partir da leitura de um país que experimentou um extraordinário crescimento industrial; que reduziu a atividade agrícola a 15 % do PIB; que em 30 anos deslocou um contingente de população de cerca de 30 milhões de pessoas do campo para a cidade e operou uma inversão populacional. Passados 25 anos, apenas 26,7% dos brasileiros permanecem no campo. Os outros três quartos se amontoam em condições subumanas nas cidades, alimentando uma crise social crônica. O PNRA do Governo Paralelo procura contribuir para dar respostas a este Brasil, um país que desenvolveu sua agricultura - ainda que de modo perverso - sem necessitar da reforma agrária, pelo contrário, recusando-a, concentrando terra, renda e tecnologia e perpetuando as mais brutais formas de exploração da força de trabalho, incluídas aí a exploração de mão-de-obra escrava.

"A reforma agrária propicia também importantes efeitos políticos, na medida que ajuda a construir a democracia a partir da base física da Nação (o substrato fundiário), contribui para a consecução da cidadania e fortalece os direitos individuais. Em termos conjunturais, a reforma agrária desempenha ainda, no Brasil de hoje, um outro importante papel político: ajuda a compor uma solução alternativa à atual ofensiva neoliberal".

"Por fim, é preciso levar em conta que a atual estrutura agrária brasileira é a principal alimentadora da crescente violência que se abate sobre os trabalhadores rurais, com uma cifra alarmante de assassinatos. O processo de reforma agrária será fundamental para romper os laços de subordinação das autoridades públicas locais (prefeitos, vereadores, juízes, delegados etc) e mesmo diversas instâncias estaduais e federais aos grandes proprietários de terra, subordinação que faz muitas vezes o Estado brasileiro assumir perfis de mera extensão dos interesses econômicos daqueles".

"Nas atuais condições da sociedade brasileira, entremeada ainda por fortes raízes agrárias e exibindo clara superposição entre os diversos setores da economia, a reforma agrária aparece como pré-condição para a consolidação da democracia. (...)"

"Em síntese, a deflagração de um abrangente processo nacional de reforma agrária produzirá impactos de alcance estratégico em toda a configuração econômica, social e política do Brasil, sendo um passo indispensável e inadiável na busca do desenvolvimento em bases consistentes, o que implica um radical rompimento com os modelos elitistas injustos ao longo de nossa história".

"O objetivo deste Plano Nacional de Reforma Agrária é apresentar à sociedade brasileira uma proposta concreta elaborada com a contribuição de importantes organizações da classe trabalhadora, e formulada sob a ótica de seus interesses imediatos e históricos, para equacionar os graves problemas do campo brasileiro e boa parte dos estrangulamentos vividos também pelas populações urbanas."

"Sua concretização pode ser iniciada nos marcos da atual estrutura jurídica do país, mas sua ultimação implicará a superação de fortes limitações introduzidas pelos setores conservadores na Constituição vigente. Sua conquista deve exigir uma atuação unificada de todas as forças progressistas da Nação, através de um amplo movimento de massas, no campo e nas cidades. Seu desenvolvimento integral vai demandar a superação do predomínio conservador no Poder Legislativo e só será plenamente viável nos marcos de um autêntico governo popular democrático".

Com o PNRA - um projeto popular para agricultores sem terra e minifundistas - a reforma agrária volta a assumir seu caráter estratégico no conjunto das transformações estruturais que o Partido dos Trabalhadores propõe para a sociedade brasileira. E com o grau de radicalidade necessário. Este é um avanço programático, no conteúdo. Um partido de berço urbano, que durante muitos anos encarou a reforma agrária como uma questão corporativa, como assunto de lavradores, cumpriu uma trajetória de estudos e discussão, exercitou longamente o diálogo com os movimentos sociais, confrontou suas demandas com a análise dos técnicos e estudiosos e apresentou à sociedade um documento coerente que sintetiza a primeira tentativa de articular num programa as demandas das lutas sociais no campo com a necessária dimensão institucional da reforma agrária.

Sem ceder à tentação do antiintelectualismo eu ousaria dizer que o programa agrário do Governo Paralelo provavelmente não seria aprovado com louvor nos exames finais de teoria marxista da faculdade, mas está credenciado para o embate com os liberais, os neoliberais, os subliberais e deseja ser testado na prova das lutas sociais.

Hamilton Pereira (Pedro Tierra) é secretário Agrário Nacional do PT.