Figura de destaque no PT do Rio de Janeiro desde sua fundação e deputado federal há mais de seis anos
Figura de destaque no PT do Rio de Janeiro desde sua fundação e deputado federal há mais de seis anos
Vladimir Palmeira, 48 anos, pai de duas filhas, é hoje uma estrela em ascensão no PT. Coincidentemente, logo após o momento de Anos Rebeldes e dos caras-pintadas, este ex-líder estudantil de 68 (talvez o de maior destaque na época) tornou-se líder da bancada federal do PT, derrotando por apenas um voto seu antigo companheiro, amigo (e/ou concorrente?) José Dirceu.
Figura de destaque no PT do Rio de Janeiro desde sua fundação e deputado federal há mais de seis anos, até o fim do ano passado Vladimir nunca desempenhara um papel de primeira linha nas articulações do PT no plano nacional, agindo muito mais como franco-atirador (termo, aliás, que ele não aprecia). Todavia, este ano ele vem se destacando não apenas como líder da bancada e ativíssimo defensor do presidencialismo, mas também como figura de proa na luta política interna, aparecendo como uma grande referência política para todo o novo campo.
T&D ouviu este alagoano de Maceió (AL) sobre os anos rebeldes e o PT de hoje.
Você é filho de uma tradicional família alagoana. Seu pai, o senador Rui Palmeira, foi um dos líderes maiores da UDN e seu irmão, Guilherme Palmeira, foi governador de Alagoas pela Arena e hoje é senador pelo PFL. Como você se tornou de esquerda?
Vladimir Palmeira — Eu fazia parte da revista Seiva, no meu colégio, criada na década de 1950.
Em Maceió?
Não, foi no Rio. Saí de Maceió com 6 anos de idade, em 1951. A revista promovia debates de ordem cultural, política, literária. Víamos o constante choque entre o que aprendíamos em casa e a própria vida. Um amigo meu, o Sérgio Otero, de família comunista, viajou a Cuba e fez para a revista um artigo a favor da Revolução Cubana. Escrevi um artigo contra. A diretora da escola exigiu que a gente retirasse o artigo sobre Cuba, dizendo que aquilo era comunismo. Então fechamos a revista, porque não admitíamos censura.
Em que ano isso aconteceu e em que colégio você estudava?
Foi em 1961, 1962, e eu estudava no Mallet Soares. Aí começaram as disputas mais fascinantes da vida brasileira, no período imediatamente anterior ao golpe. Era a luta pela reforma agrária, pela reforma urbana, muita greve, um movimento estudantil muito oficialista, mas presente, um movimento operário muito forte no Rio. O movimento começou a crescer, e fui progressivamente para a esquerda. Já tinha gente mais à esquerda do que eu, como o Daniel Aarão Reis, que era meu amigo. Em 1962, formamos um grêmio no colégio, o Centro Cívico Olavo Bilac. Nesse mesmo ano comecei a militar na Ames — Associação Metropolitana dos Estudantes Secundaristas. Em 1961, no Congresso Regional do Rio, votei com a direita. Em 1962 já votávamos com a esquerda. Foi o momento de ruptura.
Houve choque com a família tradicional de Alagoas?
Nunca houve problema. Eu tinha uma participação política limitada. A família só foi se preocupar quando eu comecei a aparecer em jornais. Em 1965 ou 1966, eu estava numa movimentação estudantil e saí no Última Hora. As amigas ligaram para minha mãe e, pela primeira vez, ela me disse para tomar cuidado.
Qual foi o impacto do golpe de 1964 sobre você?
Foi grande. Eu tinha feito vestibular para a Faculdade Nacional de Direito. O Caco (Centro Acadêmico Cândido de Oliveira) era o mais tradicional do país. No dia 31 de março ficamos em vigília. Em 1º de abril a polícia invadiu a sede, deu uns tiros, matou gente. Eu estava exatamente nas escadarias, na entrada, ao lado do Renée, filho do Apolonio de Carvalho, quando eles atacaram.
Ele também estudava lá?
Não. Ele estava ali para se reunir com todo mundo. A [faculdade de] filosofia já tinha sido atacada, decidimos fazer do Caco o último reduto.
Vocês se identificavam com o governo do Jango [João Goulart], com a luta pelas reformas?
Eu me identificava com o [Miguel] Arraes [então governador de Pernambuco], com a luta armada. Naquele momento, tinha de tudo no seu governo: trotskistas, gente da AP (Ação Popular), do Partidão. O Nordeste era um caldeirão. Eu concluí que aquele movimento no Brasil não ia dar em nada se não houvesse uma preparação para a luta armada, para defender o governo legal. Eu era da ala mais radical, mas era um radical independente.
Cuba era uma referência para você?
Para mim nunca foi. Eu acho que sou um caso à parte.
E o Brizola?
O Brizola era. Eu cheguei a participar de uma reunião do Grupo dos Onze*. Era uma palhaçada. Com um pouco de bom senso se via que aquilo não ia dar certo.
E depois do golpe, como você retomou o movimento estudantil (ME)?
Logo depois do golpe ficou difícil fazer movimento estudantil. Foram abertos inquéritos policiais militares, inclusive no Caco. O clima na escola era de terror absoluto. De forma que eu só estudava. Mas iniciei e participei de um grupo de resistência. Todo mundo estava perdido, o Partidão estava quebrado, a AP e a Polop [Política Operária] tinham sido quebradas parcialmente. Esse povo perdido se juntou para formar um grupo. Não tínhamos nenhuma identidade política mas resolvemos lutar contra a ditadura. Fazíamos panfletagens clandestinas na avenida Rio Branco de cima de prédios. Era um sucesso. O pessoal parava, corria para pegar o papel e a gente se sentia gratificado. Tornei-me um especialista nos edifícios do centro do Rio de Janeiro.
Como foi o processo de reorganização?
Em 1965, as organizações voltaram a se recompor. E começaram as diferenças ideológicas no grupo, que acabou se dissolvendo. Nessa época o pessoal do movimento estudantil (ME) estava se reorganizando e me chamou para militar. Eu dizia “não milito em movimento pequeno-burguês”. Minha idéia era de que estava fazendo revolução. Mas não me restou outro caminho senão começar a militar no ME. Em 1964, houve eleição para o Caco, a primeira eleição democrática no Brasil depois do golpe militar. Basta dizer que foi manchete do Última Hora. Nossa chapa era “Pelas Liberdades Democráticas”, evidentemente sob a égide do Partidão. Ganhamos e 15 dias depois a polícia invadiu a faculdade.