Economia

A intenção de investimento das indústrias no Brasil revela que, a curto prazo, não será alterada a forte preponderância de São Paulo na indústria brasileira. Mas há sinais de mudanças importantes, com a criação do eixo Rio de Janeiro-Espírito Santo-Bahia

O objetivo deste artigo é analisar as mudanças recentes na distribuição regional das atividades industriais que estão ocorrendo no Brasil e, particularmente, no estado de São Paulo.

Trabalha-se com a hipótese de que apesar das mudanças que ocorreram nos últimos quinze anos a participação do estado de São Paulo na produção industrial brasileira continua elevada e não se vislumbra, no conjunto das forças que vêm impulsionando esse processo de transformação na década de 90, elementos capazes de promover alterações significativas nesse quadro, pelo menos a curto prazo. Se de um lado existem forças poderosas que apontam no sentido da desconcentração industrial, particularmente em relação à Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), de outro existem vetores não menos poderosos que refreiam esse processo. A resultante final é o espraiamento limitado da mancha industrial outrora concentrada na RMSP num raio de aproximadamente 150 km em torno da capital paulista. Os principais beneficiários desse processo são principalmente as cidades médias situadas no interior do estado. Num segundo plano vêm as cidades do estado do Rio de Janeiro situadas no eixo Rio-São Paulo e a região sul de Minas Gerais, que se articula em torno desse eixo. Já o impulso industrial das cidades da região Sul, particularmente as regiões metropolitanas de Curitiba e Porto Alegre, é um fenômeno de outra natureza. São pólos industriais já com certa tradição que estão sendo alavancados pela criação do Mercosul e, mais do que beneficiários do processo de migração industrial que se verifica a partir da RMSP, se apresentam como localizações alternativas para novos investimentos, particularmente para empresas com processos produtivos integrados com unidades localizadas em outros países do Mercosul.

A falta de dados estatísticos que permitam caracterizar com maior precisão o fenômeno estudado leva a que a análise se torne, inevitavelmente, um pouco impressionista. Procurou-se, entretanto, lançar mão de todas as informações estatísticas disponíveis que direta ou indiretamente possam jogar luz sobre o objeto de análise e, ressalvada a precariedade dos dados, a conclusão a que se chega parece estar razoavelmente de acordo com a hipótese inicial.

Em 1980, o estado de São Paulo respondia por 53% do valor adicionado bruto da indústria de transformação brasileira. Desse total, a Região Metropolitana de São Paulo-RMSP1 respondia por cerca de 64%, dos quais a cidade de São Paulo, sozinha, contribuía com 36% e a região do ABC 2 com 17%. Para o interior do estado3 restavam, assim, 36% da produção industrial paulista.

Passados 15 anos, em 1995 a participação do estado no valor adicionado bruto da indústria de transformação brasileira caiu para 49%. Desse total a contribuição da RMSP caiu para 52%. A capital ficou com 22% e a região do ABC com 16%. A participação das cidades do interior na produção industrial do estado subiu, assim, para 48%.

Observando-se esses números percebe-se que, ao longo do período considerado, o estado de São Paulo perdeu cerca de 4% de participação no PIB industrial brasileiro. Essa queda não afetou o estado de maneira uniforme. Enquanto em 1980 a capital paulista respondia por cerca de 20% do PIB industrial brasileiro, em 1995, essa participação havia caído para algo em torno de 11%. A região do ABC, que respondia, em 1980, por cerca de 9% da produção industrial brasileira, passou a contribuir, em 1995, com um pouco menos: 8%. No sentido oposto, o conjunto das cidades do interior de São Paulo que em 1980 contribuíam com cerca de 20% da produção industrial nacional, ou seja, a mesma participação que a capital isoladamente, elevou sua participação para 23,5%, enquanto a participação da capital despencava para menos da metade desse valor.

Participação paulista

A participação da indústria paulista no PIB industrial brasileiro apresentou, entre 1980 e 1995, uma ligeira tendência de queda. Como é possível observar, em 1980 o estado de São Paulo participava com cerca de 53% do valor adicionado bruto da indústria brasileira de transformação. Em 1995 essa participação havia caído para cerca de 49%, portanto, uma queda de 4%.

É preciso observar, contudo, que essa queda de participação do estado no PIB da indústria de transformação brasileira, que designaremos genericamente por PIB industrial, não foi, no período considerado, nem uniforme no tempo e muito menos no que diz respeito aos diversos gêneros industriais. Além disso, foi bem menos expressiva que a perda de participação paulista no PIB total que, além da atividade industrial, inclui as demais classes e ramos da atividade econômica. Faz-se necessário, assim, qualificar essa variação, para que se possa melhor compreender o seu real significado.

Uma primeira observação diz respeito à magnitude da queda da participação do estado de São Paulo no PIB industrial vis à vis à sua queda da participação no PIB total do país. A queda de participação do estado de São Paulo no PIB da indústria de transformação brasileira foi menor que a queda na participação do estado no PIB total. Enquanto a participação paulista no PIB da indústria brasileira de transformação caiu, entre 1980 e 1995, de 53% para 49%, a participação do estado no PIB total caiu, no mesmo período, de 40% para 34%, ou seja, 6%. Quando se considera o total de indústria que, além da indústria de transformação propriamente dita, inclui a extração mineral, os serviços de utilidade pública (produção de energia elétrica, água tratada etc.) e a construção civil, a queda também foi de 6% (de 46% para 40%). Os números revelam duas coisas. Primeiramente, que a participação do estado de São Paulo na indústria de transformação brasileira caiu menos que a sua participação no conjunto das atividades econômicas. Em segundo lugar, mesmo com uma certa queda, a participação paulista na indústria brasileira de transformação continua extremamente elevada, beirando ainda os 50%. Se consideramos que São Paulo, com seus 34 milhões de habitantes, abriga apenas 22% da população brasileira, é flagrante a desproporção existente em relação aos demais estados.

A segunda observação diz respeito à não uniformidade na queda da participação paulista no PIB industrial quando se consideram os diferentes gêneros industriais. Em alguns gêneros da indústria de transformação (minerais não-metálicos, papel e papelão, química, produtos farmacêuticos e veterinários, perfumaria, produtos de matérias plásticas, bebidas, editorial e gráfica), a participação da indústria paulista não só não diminuiu como aumentou, chegando, em alguns casos, a mais de 70% da produção nacional. Em outros gêneros, embora tenha havido queda, a participação de São Paulo continuava, em 1995, superior a 50% da produção brasileira (mecânica, têxtil). Na indústria de material de transporte, embora a participação do estado tenha caído 4% no período considerado, ainda assim era de 62%. Quando se observa o conjunto dos gêneros industriais é possível constatar que os setores mais modernos, portadores do progresso técnico, com exceção da indústria de material elétrico e comunicação, continuam de maneira geral concentrados no estado de São Paulo.

O terceiro fato a observar é que, com poucas exceções, na maioria dos gêneros industriais a queda mais expressiva na participação paulista, no período em análise, ocorreu entre 1980 e 1990, tendo se estabilizado na primeira metade da década de 90. Essa relativa estabilização não é um fenômeno que diz respeito apenas à indústria de transformação, mas ao conjunto da atividade econômica. Entre 1990 e 1995 a participação de São Paulo no valor adicionado bruto da indústria de transformação brasileira se estabilizou em 49%. No mesmo período, a participação do estado no PIB total caiu apenas 1% - de 35% para 34% -, enquanto entre 1980 e 1990 a queda foi de 3%. Esse quadro de relativa estabilização na década de 90, associado ao aumento de participação do estado em alguns gêneros industriais, não está, portanto, totalmente de acordo com a visão, às vezes exagerada, veiculada pela mídia de que estaria havendo uma fuga generalizada das indústrias do estado de São Paulo. Mesmo se considerarmos os últimos dois anos, não cobertos pelos dados até aqui apresentados, verificaremos que as informações disponíveis sobre as intenções de investimento não confirmam essa percepção impressionista.

Produção industrial4

Na falta de indicadores mais precisos para analisar a distribuição intra-estadual das atividades industriais utilizaremos o Valor Adicionado Fiscal (VA). No caso específico da indústria de transformação, considera-se ser este um indicador razoavelmente confiável da participação efetiva das diversas regiões na produção industrial do estado.

Se a participação do estado de São Paulo no PIB da indústria de transformação brasileira não apresentou mudanças tão significativas como freqüentemente se supõe, o mesmo não é possível se dizer quanto à distribuição dessas atividades entre as diversas regiões do estado, principalmente quando se toma como referencial analítico o corte Região Metropolitana de São Paulo/interior do estado e dentro da RMSP a cidade de São Paulo em particular.

Entre 1980 e 1995, a Região Metropolitana de São Paulo perdeu mais de 12% de participação na produção industrial do estado. De 64%, em 1980, no valor adicionado fiscal da indústria paulista, despencou para pouco menos de 52%, em 1990. Simetricamente, o interior do estado elevou sua participação de 36%, em 1980, para pouco mais de 48%, em 1995.

Esse aumento de 12% na participação do interior do estado no valor adicionado fiscal da indústria paulista não alterou, porém, de maneira significativa o padrão de distribuição das atividades industriais prevalecentes no interior. Em 1980, as regiões de Campinas, São José dos Campos, Sorocaba e Santos respondiam juntas por 28,38% do valor adicionado fiscal da indústria de transformação paulista. Somados aos 64,01% da RMSP, essas quatro regiões mais a RMSP concentravam 92,39% da atividade industrial do estado. Passados quinze anos, em 1995 as mesmas quatro regiões elevaram sua participação para 38,73%. Somados aos 51,79% da RMSP, essas cinco regiões continuavam a concentrar, em 1995, 90,52% da atividade industrial do estado. De maneira geral é possível dizer que a perda de participação da RMSP se deu em benefício dessas quatro regiões que ganharam 10,35% dos 12% perdidos pela RMSP no valor adicionado da indústria.

Embora as atividades industriais do estado continuem relativamente concentradas nessas quatro regiões do interior mais a RMSP - o que tem levado alguns analistas a denominarem esse espaço de aproximadamente 150 km em torno da capital de região metropolitana expandida - não se deve menosprezar as mudanças que vêm ocorrendo dentro dele, bem como o fato de algumas outras regiões, embora com uma participação relativa bem menor, estarem aumentando sua participação na produção industrial do estado.

Quando se observa o padrão de distribuição interregional das atividades industriais no interior de São Paulo, o fato que mais chama atenção é a participação crescente da região de Campinas, que de uma participação de 15,09% no valor adicionado fiscal da indústria, em 1980, passou a responder, em 1995, por 21,47% - um aumento, portanto, de 42,28%. Logo atrás vem a região de São José dos Campos, que de uma participação de 4,98%, em 1980, saltou para 8,75% em 1995. Embora com uma participação significativamente menor, o que chama atenção nesta região é seu rápido aumento: 75,70% entre 1980 e 1995. As regiões de Sorocaba e Santos vêm em seguida. A primeira aumentou sua participação de 3,98% para 5,29% - um aumento de 32,91% - e Santos, embora tenha diminuído sua participação de 4,33% para 3,22% - uma queda, portanto, de 25,64% -, continua ocupando o quarto lugar entre as regiões do interior.

Quanto às demais regiões do estado chamam atenção Ribeirão Preto, que elevou sua participação, entre 1980 e 1995, de 1,12% para 1,90% do valor adicionado fiscal da indústria paulista - aumento de 69,64%; São José do Rio Preto, que de 0,56% subiu para 1,00% - aumento de 78,57%; Araçatuba, que de 0,33% subiu para 0,65% - aumento de 96,97%, e Marília, que de 0,54% subiu para 0,81% - aumento de 50%. Outras regiões que, embora sem o mesmo dinamismo das citadas, apresentam um participação importante na produção industrial do interior do estado são a região Central (Araraquara e São Carlos), que em 1995 respondia por 1,78% e a região de Bauru que respondia por 1,51%. Das regiões mencionadas as únicas que apresentaram taxas positivas de crescimento entre 1990 e 1995 foram São José do Rio Preto e Bauru. As outras ou estabilizaram-se ou apresentaram taxas negativas. Quanto às demais regiões (Franca, Barretos, Presidente Prudente e Registro), além de apresentarem uma participação pouco expressiva (menor que 1%) apresentaram um comportamento pouco dinâmico no período considerado.

Quando se observam as mudanças intra-região metropolitana, as maiores perdas ficam com a capital do estado, que de cerca de 36% do valor adicionado da indústria, em 1980, passou a responder, em 1995, por menos de 22%, ou seja, uma queda de mais de 14%. O ABC, tradicional região industrial e principal pólo da indústria automobilística da América do Sul, manteve sua participação na produção industrial do estado relativamente estável. A participação da região no valor adicionado fiscal da indústria caiu menos de 1% no período considerado. Tal fato não significa, evidentemente, que não houve perdas naquela região. Afinal, a participação do estado de São Paulo no PIB industrial brasileiro caiu, no período em estudo, de 53% para 49%. Se a participação da região do ABC no valor adicionado fiscal da indústria do estado de São Paulo caiu, no mesmo período, de 17% para 16%, isso significa que, em 1980, o ABC respondia por 9% do PIB industrial brasileiro e que, em 1995, passou a responder por apenas 8%. A perda de 1% num PIB industrial de cerca de US$ 270 bilhões representa quase US$ 3 bilhões, mais do que todo o faturamento da Mercedes Benz, ou quase a metade de todo o faturamento da General Motors do Brasil em 1997. De todo modo, entretanto, a grande perdedora foi a cidade de São Paulo que viu sua participação no PIB industrial brasileiro despencar de mais de 19% para menos de 11%, uma perda, considerado o PIB industrial de 1997, de quase US$ 22 bilhões.

Intenções de investimento

Aproximadamente 30% das intenções de investimento no Brasil declaradas pela indústria para o período 1996/2000 têm como destino o estado de São Paulo. Contudo, se considerarmos que em 1995 o estado participava com 49,2% do valor adicionado bruto da indústria de transformação e 40% do valor adicionado bruto da indústria como um todo (o que inclui extração mineral, serviços de utilidade pública e construção civil) e supondo que essa participação de algum modo está correlacionada com o tamanho do parque industrial instalado, essa desproporção entre a participação de São Paulo nas intenções de investimento para os próximos cinco anos e sua atual participação no PIB industrial aponta para a continuidade da tendência de descentralização industrial, com o aumento da participação relativa de outros estados da federação na produção industrial brasileira.

Se tomarmos como exemplo a indústria de material de transportes, um gênero industrial com grande peso na formação do PIB industrial brasileiro (aproximadamente 10%), verifica-se que de um total de US$ 4,869 milhões a serem investidos nos próximos três anos pelas novas montadoras de automóveis que estão se instalando no país, somente US$ 348 milhões, ou 7,1% do total, estão destinados a São Paulo. O Paraná, com pouca tradição no setor, deverá receber investimentos de US$ 2,315 milhões, ou 47,5% do total, o Rio de Janeiro US$ 600 milhões, ou 12,3%, Minas Gerais US$ 820 milhões, ou 16,8%, e a Bahia US$ 786 milhões, ou 16,1%. Evidentemente os novos investimentos da indústria automobilística não se resumem a isso. As montadoras já instaladas no Brasil, com forte presença no estado de São Paulo, estão também planejando grandes investimentos para enfrentar a nova concorrência - cerca de US$ 4,5 bilhões até o ano 2000, só no estado de São Paulo. O fato, entretanto, de parcela expressiva das novas montadoras que estão chegando no mercado brasileiro estarem optando por instalarem-se fora de São Paulo e em estados relativamente com pouca tradição industrial, como Paraná, Rio de Janeiro e Bahia, é sem dúvida um sinal de que estão ocorrendo mudanças importantes no panorama industrial do país.

Rodrigues (1998:11) observa que o estado do Rio de Janeiro, com US$ 7,4 bilhões de intenções de investimentos, é um rico exemplo da possibilidade de alteração do perfil industrial atualmente instituído - principalmente nos pólos metalmecânicos do Rio de Janeiro, Niterói, Resende e Volta Redonda; farmacêutico, higiene e limpeza do Rio de Janeiro; e petroquímicos de Campos e Duque de Caxias. A autora observa movimentos semelhantes em outros estados da federação, como o caso de Minas Gerais, com intenções de investimentos de quase US$ 13 bilhões nos próximos cinco anos, principalmente nos pólos metalmecânicos de Belo Horizonte, Betim, Contagem, Juiz de Fora e Itajubá; siderúrgicos de Ouro Branco e Ipatinga; alimentícios de Poços de Caldas, Sete Lagoas, Uberlândia e Patos de Minas; têxteis de Alfenas, Pirapora, Poços de Caldas e Passos; mineradores de Belo Horizonte e norte do estado; e químico e de fertilizantes em Uberaba. Destaca, no caso do Paraná, investimentos da ordem de US$ 5 bilhões a se realizarem na Grande Curitiba pela Renault, Volkswagen-Audi, Volvo, Eletrolux-Prosdócimo, Scania e Refripar. No caso do Rio Grande do Sul, boa parte dos US$5,6 bilhões de intenções de investimento destinam-se à expansão das indústrias químicas e petroquímicas no pólo de Triunfo na Grande Porto Alegre, à instalação de uma nova unidade da General Motors em Gravataí, além dos investimentos no setor fumageiro em Santa Cruz do Sul. No caso da Bahia, além dos investimentos da indústria automobilística já mencionados, destaque-se, por exemplo, o fato da Toshiba ter investido US$ 50 milhões na construção de uma nova fábrica em Salvador para onde está transferindo sua produção de notebooks para o mercado brasileiro, antes realizada em São Paulo5. Nada disso, provavelmente, irá alterar, no curto prazo, a forte predominância do estado de São Paulo na produção industrial brasileira. É preciso notar, contudo, como destaca Rodrigues (1998:12), que particularmente a retomada da atividade industrial no Rio de Janeiro, aparentemente interrompendo um longo processo de decadência econômica, e a sua extensão para o eixo Rio de Janeiro-Espírito Santo-Bahia por si só já significam uma mudança importante num padrão de desenvolvimento que nos últimos anos passava ao largo dessas duas regiões do país, concentrado, como observou Diniz  no polígono constituído pela área compreendida pelos municípios de Belo Horizonte, Uberlândia, Londrina/Maringá, Porto Alegre, Florianópolis, São José dos Campos e Belo Horizonte.

Investimento em São Paulo

Dos US$ 24,1 bilhões de intenções de investimento da indústria de São Paulo para o período 1995/2000, registrados pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do estado, cerca de 22% destinam-se aos municípios situados na RMSP, o que representa algo em torno de US$ 5,4 bilhões. Os restantes 78% destinam-se ao interior. A região de Campinas será o principal destino da maior parte desses investimentos - 31% do total ou US$ 7,6 bilhões. Logo em seguida vem a região de São José dos Campos, com 22% do total ou US$ 5,2 bilhões. A região de Sorocaba aparece em terceiro lugar com cerca de 8% das intenções de investimento ou US$ 2 bilhões e a de Santos aparece na quarta colocação com pouco mais de 3% das intenções de investimento, o que equivale a cerca de US$ 800 milhões. Essas quatro regiões respondem, juntas, por cerca de 65% das intenções de investimentos da indústria. Somados aos 22% da RMSP chega-se a 88%. Repete-se, assim, o mesmo padrão de distribuição do valor adicionado fiscal da indústria verificado, ou seja, a RMSP somada a essas quatro regiões que estão no seu entorno, formando uma mancha de aproximadamente 150 km em torno da cidade de São Paulo, concentram e continuarão concentrando nos próximos anos cerca de 90% de toda atividade industrial do estado.

Deve-se ressalvar, contudo, que apesar desse padrão de distribuição dos investimentos ser relativamente concentrado, o número de cidades que aparece nessas intenções de investimento ultrapassa uma centena, sendo algumas delas localizadas a distâncias relativamente grandes da RMSP como, por exemplo, as cidades de Valparaíso (624 km) com US$ 55 milhões; Bauru (343 km) com US$ 85 milhões; Pederneiras (324 km) com US$ 128 milhões; São Carlos (305 km) com US$ 305 milhões; Ribeirão Preto (313 km) com US$ 242 milhões; e São José do Rio Preto (441 km) com US$ 74 milhões. Nesses casos, a hidrovia Tietê-Paraná e o gasoduto Brasil-Bolívia, que cortam boa parte do interior paulista, e as oportunidades de negócios na área do agrobusiness - principalmente no chamado corredor agrícola do estado que atravessa as regiões de Araçatuba, São José do Rio Preto, Ribeirão Preto e Campinas - têm se constituído em vetores que estimulam o desenvolvimento industrial de regiões mais distantes da capital.

Apesar das mudanças que ocorreram nos últimos quinze anos a participação do estado de São Paulo na produção industrial brasileira continua elevada. No plano intra-estadual, observa-se um espraiamento limitado da mancha industrial, outrora concentrada na Região Metropolitana de São Paulo, para uma área mais ampla com um raio de aproximadamente 150 km em torno da capital paulista. Os novos elementos que podem ser acrescentados a esse quadro são o ressurgimento industrial do estado do Rio de Janeiro, a formação de um novo pólo da indústria automobilística na Região Metropolitana de Curitiba e a inclusão do eixo Rio de Janeiro-Espírito Santo-Bahia na rota dos novos investimentos industriais. As intenções de investimento da indústria para Minas apenas confirmam a posição já consolidada daquele estado, como o segundo PIB industrial brasileiro. No que diz respeito especificamente a São Paulo, um fato importante a notar é o grande número de cidades do interior que aparecem nas intenções de investimento da indústria, algumas a distâncias relativamente grandes da capital.

Discernir as forças por trás de todo esse processo não é tarefa simples e foge do escopo deste artigo. É importante, contudo, à guisa de conclusão, destacar que das forças que agem sobre esse processo, não raro com sentidos opostos, algumas têm um caráter mais estrutural e delas se espera um efeito mais duradouro. Outras podem não se sustentar no longo prazo, levando a que tendências aparentemente irreversíveis percam o fôlego num prazo relativamente curto.

Dentre as primeiras é preciso separar as que impulsionam o processo de desconcentração industrial daquelas que o limitam. Apontando no sentido da continuidade do espraiamento da mancha industrial outrora concentrada na RMSP militam aqueles fatores que genericamente se designa por "deseconomias de aglomeração", ou seja, congestionamentos urbanos, poluição ambiental, saturação da infra-estrutura, preço elevado dos terrenos, restrições ambientais etc. que desestimulam novos investimentos industriais. No sentido inverso, impedindo que essa mancha industrial se estenda além de um certo limite há forças não menos poderosas.

O tamanho do mercado contido na RMSP e no seu entorno é possivelmente a principal delas. A Região Metropolitana de São Paulo é o maior mercado do Brasil e do Mercosul. Com 10,6% da população nacional, ali se realizam, em média, 20% das vendas de varejo no Brasil. Dos 631.501 pontos de vendas existentes no Brasil em 1996/97, 9,2% se encontram na região. Além da capital, que é o grande centro comercial do país, os demais municípios da região vêm atraindo grandes redes comerciais e de serviços. Somando-se os 9,8 milhões de pessoas que vivem na cidade de São Paulo com a população residente nos outros 38 municípios que formam a RMSP chega-se a 16,6 milhões de pessoas vivendo numa área urbanizada de 1.747 km2, algo como 120 mil quarteirões. É um mercado gigantesco. Das famílias que vivem na região, quase 40% (1996) têm renda média mensal superior a mil dólares. A renda per capita da região, em 1997 - cerca de US$ 9 mil -, era quase o dobro da média nacional. Circulam na cidade de São Paulo 4,6 milhões de veículos, quase um automóvel para cada dois habitantes, média semelhante às da Alemanha, Grã-Bretanha e Bélgica, contra uma média nacional de onze habitantes por veículo.

As empresas têm procurado não ficar tão perto para fugir dos problemas inerentes às grandes metrópoles mundiais, mas não tão longe a ponto de se distanciar em demasia de seu grande mercado consumidor.

Outro elemento importante na contenção da evasão industrial são as novas tecnologias sociais de organização da produção, particularmente o sistema conhecido por just in time, associado ao fato de que grandes empresas, principalmente as do setor automotivo, têm grandes investimentos realizados na RMSP não desmobilizáveis a não ser a grandes custos (os chamados sunk cost). Essas novas formas de organização da produção formam redes de empresas que necessitam da proximidade física para funcionarem a contento. Dessa forma, a não ser que a empresa que é o centro do sistema se mude, as demais participantes da rede de fornecedores e subfornecedores necessitam manter-se fisicamente próximos. Essas mesmas tecnologias, ao reduzirem a necessidade de espaço físico para estoques, acabam também minimizando o problema do espaço físico, coisa escassa em regiões densamente ocupadas. Não é por outro motivo que, apesar de todos os problemas que apresenta, a RMSP aparece nas intenções de investimento da indústria no estado de São Paulo em segundo lugar, com 22%, algo em torno de US$ 5,4 bilhões.

Note-se ainda que no estado de São Paulo, entre os novos vetores que podem vir a ter um sentido mais estrutural e duradouro no processo de desconcentração industrial, estão a hidrovia Tietê-Paraná, uma rota natural de integração do Mercosul que percorre todo o interior e o gasoduto Brasil-Bolívia, que segue paralelo à hidrovia.

Quanto àquelas forças indutoras de descentralização industrial de efeito efêmero e duvidoso, a principal é a chamada "guerra fiscal" travada entre estados para atração de novos investimentos. A tendência é que a concessão generalizada de incentivos para a localização de empresas acabe levando à sua própria anulação enquanto elemento diferenciador das decisões de investimentos e deixe, no final das contas, os estados sem recursos necessários para investir na oferta de infra-estrutura, educação, formação profissional, saúde pública, coisa que nenhuma empresa privada está disposta a bancar por conta própria, mas cuja existência é fundamental para que o capital privado coloque seus recursos.

É preciso ter claro, enfim, que o padrão atual de concentração regional e pessoal de renda atua severamente contra o processo de descentralização das atividades industriais no país e sem uma clara política de desenvolvimento regional - e não pelo processo autofágico da guerra fiscal - dificilmente haverá mudanças de grande monta no panorama industrial brasileiro.

Bibliografia

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SEADE - Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. Guia de Investimentos e Geração de Empregos.

Luís Antônio Paulino é mestre em Administração Pública pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, doutor em economia pela Unicamp e analista da Fundação Seade.