Nacional

Devemos reconhecer que o neoliberalismo venceu e que essa vitória empurra os trabalhadores para a resistência e para a esquerda

Para enfrentar os desafios de 2002, devemos primeiro reconhecer que o neoliberalismo foi vitorioso em nosso país. Sua ideologia ainda detém a hegemonia. Sua política de privatizações, desemprego, pauperização e fragmentação crescente da classe trabalhadora e da classe média, concentração da riqueza nas elites burguesas e destruição do meio ambiente foi vitoriosa. E o capitalismo corporativo transnacional conquistou a supremacia no rearranjo do pacto de dominação sobre nossa sociedade.

O neoliberalismo, ou o capitalismo em sua forma neoliberal, elevou as forças produtivas a um alto nível e tornou o mercado mundial um oligopólio corporativo e um cassino especulativo. No Brasil, ele concentrou suas empresas de alta tecnologia em alguns pólos, quebrou o antigo parque industrial e tecnológico, causou regressão nas cadeias produtivas, destruiu imensas forças produtivas e criou um exército industrial de reserva miserável, de dimensões até então desconhecidas em nossa história.

Fez tudo isso sem uma resistência séria, em virtude do seu sucesso ideológico. Agora, porém, sucumbe sob seu próprio peso. De sustentado pelo trabalho dos operários, o capital se vê diante da necessidade de sustentar seus ex-escravos ou deixá-los morrer de fome epidêmica.

O absurdo de riquezas colossais coexistindo com imensas massas proletárias pauperizadas tinha que colocar os miseráveis ante a opção de morrer no desamparo ou resistir e lutar.

Esse outro lado do sucesso neoliberal empurra as classes populares para a luta e a esquerda para a esquerda. São trabalhadores que assumem empresas falidas em autogestão para reproduzir-se. Ou setores da sociedade em grandes manifestações contra o neoliberalismo e/ou contra o capitalismo, como o Fórum Social Mundial. Ou governos pobres que se articulam regional, nacional e internacionalmente para desenvolver-se. Ou o eleitorado que leva partidos de esquerda a governar municípios e estados, num fenômeno também desconhecido na história brasileira.

As eleições de 2000 expressaram esse crescimento da resistência política das classes populares. São sinais promissores que podem diluir-se, porém, se não forem catalisados por uma estratégia adequada às possibilidades históricas da sociedade brasileira, e por táticas capazes de mudar a correlação de forças vigente.

Não há saída para a crise social dentro do capitalismo. Este pode até encontrar um substituto para o neoliberalismo, mas não solucionará o desemprego e a miséria, duas chagas funcionais do capital corporativo. Mesmo que ingresse em nova via, esta acabará por reproduzir os mesmos graves problemas. Paralelamente, a destruição do parque produtivo nacional e a necessidade de criar milhões de empregos e acabar com a miséria, exigem a utilização de todas as formas de propriedade capazes de desenvolver as forças produtivas do país.

Para enfrentar os desafios de 2002, devemos primeiro reconhecer que o neoliberalismo foi vitorioso em nosso país. Sua ideologia ainda detém a hegemonia. Sua política de privatizações, desemprego, pauperização e fragmentação crescente da classe trabalhadora e da classe média, concentração da riqueza nas elites burguesas e destruição do meio ambiente foi vitoriosa. E o capitalismo corporativo transnacional conquistou a supremacia no rearranjo do pacto de dominação sobre nossa sociedade.

O neoliberalismo, ou o capitalismo em sua forma neoliberal, elevou as forças produtivas a um alto nível e tornou o mercado mundial um oligopólio corporativo e um cassino especulativo. No Brasil, ele concentrou suas empresas de alta tecnologia em alguns pólos, quebrou o antigo parque industrial e tecnológico, causou regressão nas cadeias produtivas, destruiu imensas forças produtivas e criou um exército industrial de reserva miserável, de dimensões até então desconhecidas em nossa história.

Fez tudo isso sem uma resistência séria, em virtude do seu sucesso ideológico. Agora, porém, sucumbe sob seu próprio peso. De sustentado pelo trabalho dos operários, o capital se vê diante da necessidade de sustentar seus ex-escravos ou deixá-los morrer de fome epidêmica.

O absurdo de riquezas colossais coexistindo com imensas massas proletárias pauperizadas tinha que colocar os miseráveis ante a opção de morrer no desamparo ou resistir e lutar.

Esse outro lado do sucesso neoliberal empurra as classes populares para a luta e a esquerda para a esquerda. São trabalhadores que assumem empresas falidas em autogestão para reproduzir-se. Ou setores da sociedade em grandes manifestações contra o neoliberalismo e/ou contra o capitalismo, como o Fórum Social Mundial. Ou governos pobres que se articulam regional, nacional e internacionalmente para desenvolver-se. Ou o eleitorado que leva partidos de esquerda a governar municípios e estados, num fenômeno também desconhecido na história brasileira.

As eleições de 2000 expressaram esse crescimento da resistência política das classes populares. São sinais promissores que podem diluir-se, porém, se não forem catalisados por uma estratégia adequada às possibilidades históricas da sociedade brasileira, e por táticas capazes de mudar a correlação de forças vigente.

Não há saída para a crise social dentro do capitalismo. Este pode até encontrar um substituto para o neoliberalismo, mas não solucionará o desemprego e a miséria, duas chagas funcionais do capital corporativo. Mesmo que ingresse em nova via, esta acabará por reproduzir os mesmos graves problemas. Paralelamente, a destruição do parque produtivo nacional e a necessidade de criar milhões de empregos e acabar com a miséria, exigem a utilização de todas as formas de propriedade capazes de desenvolver as forças produtivas do país.

É essa peculiaridade que coloca na ordem do dia da estratégia tanto a necessidade do socialismo para superar o capitalismo, quanto o aproveitamento de formas capitalistas para o desenvolvimento das forças produtivas. O socialismo, relacionado às formas sociais de resistência contra o capital, não pode ser desligado da reconstrução agrícola e industrial, da superação do desemprego e da miséria, da defesa da independência nacional e da democratização do poder. Sem ter uma perspectiva desse tipo, estaremos fadados a vagar nos labirintos das vias puramente capitalistas.

Por outro lado, a conjuntura evolui para uma situação idêntica à de 1989. Há os mesmos sinais de divisão na burguesia, de perda da iniciativa política do governo e de uma clara tendência de votação na esquerda, com a adição de movimentações esporádicas, mas crescentes, das camadas populares. E, como então, a conquista do voto das grandes massas trabalhadoras e marginalizadas ainda é o desafio maior, embora a presente fragmentação dessas classes leve muitos a supor que a conquista do voto e da simpatia da classe média e de setores burgueses seja o fundamental em 2002.

A classe média e setores da burguesia adotam a neutralidade ou são atraídos pela esquerda apenas quando esta tem força social e política. Embora programas amplos ajudem, o fator decisivo para compor alianças com esses setores é a força dos setores populares. É isso que coloca diante do PT e da esquerda a necessidade imediata de reconstituir a força social dos trabalhadores, como condição para a mudança da correlação de forças. Com a classe trabalhadora e os marginalizados fragmentados não é possível travar uma batalha séria pelo governo no Brasil.

Hoje contamos, para essa reconstituição, com um instrumento e uma novidade histórica que não dispúnhamos há dez anos: muitos governos populares. Estes, a não ser que queiram apenas administrar o capitalismo, deveriam ter como tarefa imediata implementar modelos alternativos massivos de desenvolvimento, com base na economia familiar rural e na economia informal urbana, de modo a estimular tanto experiências embrionariamente socialistas (autogestão, associativismo, cooperativismo, gestão democrática de estatais etc), quanto a criação de um vasto capitalismo democrático de micro e pequenos empresários, ambos gerando um grande contingente de trabalhadores capazes de resgatar sua dignidade de classe social independente.

No entanto, se essa é uma tarefa imprescindível, ela não é suficiente. Desde agora, o PT e seu candidato mais provável precisam ter um discurso e uma ação cujos eixos operem, no simbolismo das grandes camadas populares, seu desejo de mudança e o sentido que pretendem para essas mudanças.

Um discurso e uma ação que correspondam, em primeiro lugar, à necessidade de um novo modelo de desenvolvimento, propondo assentar um milhão de famílias rurais a curto prazo, combinando reforma agrária, colonizações agrícolas populares, fomento à agricultura e à agroindústria familiares e ao cooperativismo rural e outras ações que a iniciativa popular aponte. E liberar e ajudar os milhões de microempresários e trabalhadores que sobrevivem na clandestinidade da economia informal, fazendo-os desenvolver-se, aumentar sua produção, criar novos empregos e ampliar o mercado interno.

Um discurso e uma ação que correspondam, em segundo lugar, à necessidade de reconquistar nossa independência nacional, com a negativa de participar da Alca, o reforço do sistema financeiro público para estimular o desenvolvimento interno, a suspensão do pagamento da dívida externa, o estabelecimento de contratos de benefício mútuo para os investimentos estrangeiros, a reconstrução das estatais nos setores estratégicos da economia e a luta por uma nova ordem política e econômica mundial de igualdade e de paz.

Um discurso e uma ação, em terceiro lugar, que correspondam à profunda aspiração de democracia, com mecanismos de participação popular e a substituição do monstrengo jurídico em que foi transformada a atual Constituição. A convocação de uma Assembléia Constituinte, eleita exclusivamente para debater e aprovar uma nova Constituição, é condição essencial para um governo de mudanças democráticas e populares.

Um discurso e uma ação, em quarto lugar, que correspondam ao arraigado desejo popular de combate férreo à corrupção, através da democratização das estatais, do controle social sobre os órgãos públicos – executivos, legislativos e judiciários – e de uma legislação que torne as penas tão mais pesadas quanto mais elevados forem os postos ocupados pelos corruptores e corrompidos.

Desenvolvimento para criar empregos, reduzir a miséria e a violência e dar segurança a todos; soberania nacional para defender os interesses da nação e de seu povo; democracia com participação popular e uma Assembléia Constituinte, para ter uma Constituição que defenda os pobres e oprimidos; e, combate à corrupção com leis mais severas contra os delitos dos ricos e poderosos. Esses os quatro eixos que deveriam marcar o discurso e a ação tática do PT e orientar nosso programa de governo, de modo a contribuir real e praticamente para conquistar o coração e a mente dos trabalhadores e marginalizados, os que verdadeiramente decidem as eleições no Brasil.

Finalmente, há uma crise séria no horizonte e é preciso impedir as tentativas de resolvê-la com a mesma receita do FMI que está destruindo nossa economia e nossas classes populares. Aprendendo com 1994 e com a experiência argentina, deveríamos apresentar um plano emergencial anticrise, tendo como base justamente os eixos acima, que permita ao PT manter a iniciativa política e estar preparado para cenários turbulentos.

Wladimir Pomar é jornalista, membro do Conselho de Redação de TD