Nacional

A vitória do partido neste ano virá somente se mantiver alto grau de organização, logística adequada e principalmente boa sintonia do conjunto da equipe petista, que atingiu a marca de 600 mil filiados.

Vinte e quatro anos após aquele memorável domingo no Colégio Sion, em São Paulo, onde 242 delegados de dezoito estados, acompanhados de centenas de militantes, assinaram o Manifesto de Fundação do Partido dos Trabalhadores, estamos vivendo mais uma etapa importante na evolução desse jovem partido. Estamos nos preparando para o primeiro embate eleitoral após a grande vitória de 2002, quando elegemos o presidente da República e a maior bancada de deputados federais e estaduais, consolidando nossa presença em todo o território brasileiro.

Este será um embate particularmente importante. Após as eleições de 2002, que coroaram um processo contínuo de crescimento do PT, há uma grande expectativa, dentro e fora do partido, por uma vitória de igual porte nas eleições municipais de 2004. Embora haja condições objetivas para que isso venha a acontecer, não será uma tarefa simples. O PT conquistou ampla hegemonia nas capitais e nos grandes municípios, mas, em nível municipal, ainda tem muito a crescer.

Governamos atualmente 201 dos 5.564 municípios brasileiros1, o que representa apenas 3,6% dos municípios do país, mas aproximadamente 20% da população brasileira – fato que demonstra estar nossa força concentrada nos grandes centros. O processo eleitoral de 2002 certamente aumentou a simpatia da população pelo PT nos pequenos e médios municípios. Mas a vantagem, neste terreno, ainda está com partidos como PMDB, PFL e PSDB, que elegeram, juntos, 3.275 prefeituras em 2000 – quase 60% dos municípios brasileiros.

As eleições de 2004 apresentam-se, portanto, como uma grande oportunidade para o PT avançar fortemente nos médios e pequenos municípios, sem obviamente descuidar de manter e até mesmo ampliar sua hegemonia nos grandes centros. Mas serão 5.564 batalhas, em sua grande maioria com os adversários ocupando a sede do governo.

Temos de estar preparados para pelejas muito duras, disputadas até o último minuto. A vitória virá somente se mantivermos, além da indispensável garra petista, um alto grau de organização, uma logística adequada e, principalmente, boa sintonia do conjunto da equipe do PT, que atingiu em fevereiro a marca de 600 mil filiados de carteirinha, liderados por aproximadamente 60 mil dirigentes municipais.

Das metrópoles para o interior

Desde sua criação, em 10 de fevereiro de 1980, o PT vem acumulando vitórias eleitorais, ou seja, vem gradativamente obtendo a adesão do povo brasileiro a suas propostas de transformação do Brasil num país justo, igualitário, fraterno e solidário.

O cientista político e jornalista André Singer, em seu livro O PT, cita a título de comparação o também cientista político Adam Przeworski, em Capitalismo e Social-Democracia, para quem “os partidos operários surgidos na Alemanha, na França e nos países nórdicos durante o século XIX por muito tempo consideraram a participação eleitoral como mera propaganda do socialismo. Havia neles o temor de que valorizar os postos representativos levasse à perda do ‘ideal da revolução social’ e de que a busca de reformas absorvesse todo o interesse dos trabalhadores”2. Singer nos lembra que “o PT nunca hesitou em disputar eleições”, embora não tenha sido “uma decisão isenta de tensões. Os grupos de esquerda presentes na criação do partido sempre procuraram contrabalançar a ênfase pragmática na busca do sufrágio com a insistência no papel dos movimentos sociais”3.

De fato, o Manifesto de Fundação do PT explicita essa tensão. Ao mesmo tempo que afirma que “o PT quer atuar não apenas nos momentos de eleições, mas principalmente no dia-a-dia de todos os trabalhadores, pois só assim será possível construir uma nova forma de democracia”, ao final conclui que o partido “pretende chegar ao governo e à direção do Estado para realizar uma política democrática, do ponto de vista dos trabalhadores, tanto no plano econômico quanto no plano social.”4 Na prática, o PT sempre disputou as eleições com vontade de ganhar.

Disputou e venceu cada vez mais. Os gráficos que acompanham este artigo ilustram, além da gradual e sistemática nacionalização do PT, sua trajetória ascendente nos diferentes âmbitos de governo a partir de 1982, quando enfrentou sua primeira disputa eleitoral. Naquele ano, os resultados ficaram aquém do esperado – foram eleitos oito deputados federais, doze estaduais, dois prefeitos (em Diadema-SP e Santa Quitéria-MA) e 118 vereadores. Foi a partir de 1985, após a campanha das Diretas Já, que o partido começou a crescer nas urnas. E, de 1988 para a frente, deixou de ser predominantemente paulista para ganhar o território brasileiro.

Durante as duas décadas de existência, seu crescimento é permanente e culmina, nas eleições de 2002, com a consolidação do PT como um dos maiores partidos brasileiros – e, mais importante, realmente implantado em todo o território nacional. Lula vence as eleições com votação recorde. Na eleição parlamentar, elegemos a maior bancada na Câmara dos Deputados e também nas Assembléias Legislativas. No Senado, passamos a ter a terceira maior bancada.

Breve análise das eleições de 2000

Mantendo a tendência ascendente da trajetória do PT desde sua fundação, as eleições municipais de 2004 apresentam-se como oportunidade ímpar para aumentarmos significativamente nossa capilaridade, avançando nos pequenos e médios municípios e criando, assim, melhores condições para a disputa de hegemonia neste país continental.

A grande diferença do processo eleitoral deste ano é que o PT disputará na condição de partido do governo federal, situação que poderá contribuir muito para essa penetração, haja vista a grande visibilidade que proporciona. O sucesso da implementação das ações necessárias para a retomada do crescimento e a geração de empregos, como todos os indicativos nos levam a crer e confiar, também influirá nos rumos da eleição.

Não podemos esquecer, porém, que o mando de campo está com os adversários. Em 2000, o PT assumiu a quarta posição em número de votos conquistados, mas esse resultado não se refletiu no número de prefeitos e vereadores eleitos, em função da forte concentração de nossos votos nas regiões metropolitanas. O partido elegeu prefeitos de seis capitais, o vice-prefeito em Belo Horizonte (MG) e outros doze municípios acima de 200 mil eleitores. Nos pequenos municípios, o PMDB, o PFL e o PSDB, somados, venceram em 3.275 prefeituras, representando 59% do total.

Lançamos somente 1.316 candidatos a prefeito em apenas 23,7% do total dos municípios brasileiros. O PMDB lançou 2.842, mais que o dobro do PT. Elegemos 187 prefeitos e 139 vice-prefeitos em coligações e obtivemos 14,1% dos votos válidos. O PFL, por exemplo, com somente 10% a mais de votos que o PT, elegeu cinco vezes mais prefeitos.

O desempenho de nossos 1.316 candidatos não foi dos melhores. Praticamente a metade deles (47,5%) não logrou alcançar 10% dos votos válidos. Somente em 509 municípios (38,7%) tivemos mais de 20% dos votos válidos, percentual que indicaria competitividade. Na disputa para as Câmaras de Vereadores, elegemos candidatos em 26,7% dos municípios e obtivemos 9,4% dos votos válidos. O PSDB, com somente 20% a mais de votos que o PT, elegeu 3,5 vezes mais vereadores.Os números que aqui apresentamos mostram, portanto, que esta não será uma eleição fácil. Temos possibilidades de vitória, mas há muito que trabalhar.

Para vencer em 2004

A tática eleitoral do PT para as eleições 2004, em discussão no Grupo de Trabalho Eleitoral (GTE) Nacional desde julho de 2003, foi aprovada pelo Diretório Nacional em 14/12/035. O objetivo central do partido consiste em vencer as eleições, o que se traduz basicamente em três metas a ser perseguidas: manter e aumentar as administrações petistas nas capitais e nos grandes centros urbanos; avançar nos médios e pequenos municípios; e aumentar o número de vereadores eleitos.

Mas vencer as eleições, para o PT, significa também agregar aliados, consolidar alianças e aumentar o grau de apoio político e social ao governo Lula. Significa ainda espraiar a influência política e a presença institucional do partido, visando realizar as transformações sociais, econômicas, políticas e culturais de que o Brasil precisa.

Para atingir tais metas, o partido vem se preparando desde o início de 2003. A primeira operação foi intensificar a organização do PT pelo território brasileiro, ampliando sua representação para 96% dos municípios do país.

Uma segunda importante operação foi o lançamento da Campanha Nacional de Filiação em outubro de 2003. A campanha, que visa consolidar a presença do PT nos movimentos sociais e expandi-la a novos setores da sociedade, certamente aumentará nosso poder de fogo nas eleições. Em janeiro de 2004, atingimos a marca de 596 mil filiados e pretendemos atingir 800 mil filiados até junho de 2004.

Preocupados com a formação desses novos quadros partidários que se incorporam ao PT, mantemos como uma de nossas prioridades a qualificação dos petistas. Por isso, iniciamos, em 2003, um processo de formação política e técnica de nossos dirigentes municipais e pré-candidatos, com a realização de seminários estaduais de planejamento eleitoral em dezesseis estados até agora. Os seminários permitiram a sincronização das estratégias estaduais com a nacional e instrução sobre a elaboração de programa de governo, planejamento e gestão de campanhas, comunicação e marketing político, pesquisas eleitorais e aspectos da legislação eleitoral.

Para manter nossa hegemonia nos grandes centros urbanos, o GTE elegeu como municípios prioritários as capitais dos Estados e as cidades com mais de 150 mil eleitores. Nesses municípios, o PT está realizando um monitoramento do processo de definição de candidatos petistas e da montagem do arco de alianças. A operação subsidiará a atuação da direção nacional no sentido de criar condições favoráveis a nossos candidatos.

Já para atingir a meta de ampliação do partido nos médios e pequenos municípios, uma das estratégias previstas é a implantação de quatrocentos pólos de macrorregiões estaduais, cada uma responsável por cerca de quinze municípios. Nesses pólos, estarão posicionados nossos dirigentes mais experientes e os técnicos capacitados nas várias áreas necessárias à campanha. Os pólos serão aparelhados com equipamentos de informática e telecomunicações modernos, e as equipes receberão treinamento e capacitação para difundir rápida e eficazmente as informações e orientações nacionais aos municípios abrangidos.

Este plano combina-se com a informatização dos diretórios municipais, outro projeto também em implantação, que dotará todas as instâncias municipais do PT com equipamentos modernos de informática. Concluída essa etapa, estará disponível um sistema de difusão de informações dos governos do PT, na internet, para municiar nossos candidatos e o conjunto da militância com as realizações dos governos federal, estaduais e municipais do PT.

Pretendemos, também, dar um tratamento especial à campanha de vereadores, para possibilitar um aumento significativo de nossa bancada em todo o país. Além de um curso de formação para pré-candidatos, está prevista uma campanha institucional para estimular o voto em nossos vereadores, bem como a elaboração de materiais padronizados, para garantir um “padrão PT de qualidade” e reduzir custos.

E, finalmente, como forma de uniformizar as estratégias, será realizada em 2004, em Brasília, a Conferência Eleitoral Nacional, com a presença dos candidatos a prefeito e vereador de todo o país. O evento, que visa também elevar o ânimo da militância, marcará a largada rumo à vitória eleitoral.

O espírito é ganhar

O PT está partindo para o processo eleitoral para ganhar. É com esse espírito que vem transformando suas estratégias em ação, organizando o partido em todo o país, informatizando diretórios, oferecendo formação política a seus quadros e intensificando o acompanhamento dos municípios prioritários.

Embora o eixo principal dessa eleição seja a busca de soluções para os problemas municipais, é provável que, principalmente nos grandes centros, ocorra simultaneamente um debate sobre temas nacionais relevantes – como violência ou desemprego – e sobre a eficácia do governo federal para tratar dessas questões. Como o PT disputa na condição de ser governo federal, temos de partir para o debate de maneira ofensiva, munidos de argumentos e com discurso unificado.

Temos boas expectativas em relação ao desempenho do governo do PT. Estamos confiantes em que 2004 será o ano da retomada do desenvolvimento sustentado, com geração de empregos, distribuição de renda e promoção da inclusão social.

O partido vai mostrar, também em nível nacional, que veio para realmente transformar. Estamos construindo um arco de alianças não somente para vencer as eleições, mas para implantar o projeto estratégico do PT, cientes de que o Brasil é um país em disputa, que vencemos a eleição presidencial, porém sozinhos não temos a hegemonia política e a correlação de forças interna e externa não nos é favorável. Além disso, vamos revitalizar o diálogo com os movimentos sociais. O PT saberá combinar a experiência de ser governo e, ao mesmo tempo, canalizar os anseios dos movimentos sociais.

Estamos preparados. Nossa estratégia exige bons candidatos, boas propostas e boas alianças. Mas ainda temos muito trabalho pela frente e dependemos, acima de tudo, de uma militância estimulada, forte e unida.

Silvio Pereira é secretário nacional de Organização do PT e coordenador nacional do Grupo de Trabalho Eleitoral 2004