Cultura

Editora Ouro sobre Azul reedita mais livros do renomado crítico literário. São as obras Tese e Antítese, Literatura e Sociedade, A Educação pela Noite, Ficção e Confissão, O Método Crítico de Sílvio Romero e Formação da Literatura Brasileira

A editora Ana Luisa Escorel, da Ouro Sobre Azul, não cessa de surpreender o leitor. Depois de publicar um pacote de sete livros de seu pai, Antonio Candido (ver Teoria e Debate 63, julho/ agosto 2005), brinda-nos agora com mais seis, todos em reedição.

Três são as renomadas e muito reeditadas coletâneas de ensaios. A primeira, pela ordem, é Tese e Antítese (1964), em 5ª edição, que analisa a figura do duplo, ou do outro, que emerge do próprio indivíduo e o põe em xeque, dilaceramento que aparece em romances de Alexandre Dumas, Eça de Queirós, Joseph Conrad, Graciliano Ramos e Guimarães Rosa. Completa-os mais um sobre os dons unificadores da música em Stendhal.

Em seguida vem Literatura e Sociedade (1965), em 9ª edição, que, ao discutir as relações entre ambas, mostra, através de exemplos submetidos a um crivo conceitual preciso, como se tensionam mutuamente. Alguns ensaios balizam as idéias do autor, que as está clarificando naquele passo. Outros aplicam essas idéias ao estudo de escritores, obras e períodos, seja nossa literatura colonial, seja aquela produzida em São Paulo pelos estudantes de Direito no Oitocentos, ou ainda a dos grupos iletrados.

Depois, bem mais recente, A Educação pela Noite (1989), em 5ª edição. Uma primeira parte medita sobre biografia e autobiografia; a segunda reúne trabalhos sobre alçada e funções da crítica; a terceira tem cunho mais histórico, sobretudo da vida brasileira.

Dois dos demais volumes se concentram em Graciliano Ramos e em Sílvio Romero. Ficção e Confissão, em 3ª edição, traz quatro ensaios sobre o romancista, dos quais o primeiro e maior, que serviu de prefácio a suas obras, data de 1955. O outro é a tese de livre-docência, O Método Crítico de Sílvio Romero (1945), em 4ª edição, na qual esse grande antecessor é examinado na fecundidade de suas intuições e nos impasses que a inadequação de seus instrumentos acarretou.

O sexto livro é a monumental Formação da Literatura Brasileira (1959), que marcou indelevelmente o pensamento em nosso país. O volume, de quase oitocentas páginas, trata, conforme o subtítulo, dos momentos decisivos que vincaram nossa literatura, afeiçoando-a naquilo em que se tornaria.

A inovação desse livro é que acompanhou, esmiuçando-o mesmo nas obras menos logradas e em autores obscuros como o Sapateiro Silva, o processo de constituição da literatura e da Nação. Mostra como ambas, longe de se erigirem em entidades ou essências, são projetos que aos poucos se constroem, dando concretude ao desejo dos brasileiros de terem uma literatura autônoma, a qual, embora na mesma língua que a portuguesa, seria outra coisa inteiramente. O anseio de independência nacional e literária correu paralelo na mentalidade de nossas elites. E, nesse processo, as cristalizações e as metamorfoses dependeram da interação entre o autor, a obra e o público, formando o sistema que vai criar a tradição. Dois movimentos contraditórios, diferentemente combinados a cada momento, são dissecados com especial acuidade no Arcadismo e no Romantismo: o impulso centrípeto do particularismo e o impulso centrífugo do universalismo.

Os cuidados editoriais inserem na orelha de cada livro uma nota preciosa sobre o momento da vida do autor em que foi escrito, relacionando-o a outras realizações e atividades profissionais ou políticas no mesmo período. Assim, vai-se desdobrando ante o leitor um panorama bastante completo da trajetória de Antonio Candido e do andamento da cultura no país.

Walnice Nogueira Galvão é crítica literária, integra o Conselho de Redação de Teoria e Debate