Nacional

Visibilidade política de Brasília pedia de seu movimento estudantil atuação enfocada nas grandes questões nacionais

A UnB era um sonho em 1968, há 40 anos. Ainda é. Era o sonho da inovação, da renovação, desta que é uma instituição medieval, conservadora e corporativista, que sobrevive há quase mil anos desde a criação da Universidade de Bolonha, na Europa1. O sonho da universidade brasileira, em construção.

Fui para Brasília em 1966, aprovado em dois vestibulares da UFMG, em Belo Horizonte, queria estudar na UnB, reaberta depois da invasão das tropas da ditadura militar em 1965. A UnB era isso, sonho que chamava, mobilizava, clamava, paixão à primeira vista. Estudantes vinham de todo o Brasil, todos queriam ajudar a construir a universidade que Juscelino Kubitschek demorou a aceitar, precocemente em ruínas de concreto. Construção interrompida pelos militares de então, o “minhocão” – ICC, que hoje é espinha dorsal da universidade, era estrutura de concreto abandonada; o Centro Olímpico se resumia a barracões de madeira à beira do lago Paranoá, que ocupamos em 1967 como moradia estudantil; o Instituto de Teologia – hoje Fundação Educacional do Distrito Federal, espigão de cimento armado invadido pelo mato. Tudo era sonho, provisório, estruturas de madeira, poeira vermelha que nos coloria e dava vida à UnB.

O Movimento Estudantil se organizou desde o seu nascedouro, com a construção da Federação dos Estudantes Universitários de Brasília (Feub). A Feub lutou pela consolidação da UnB, resistiu ao golpe de 1964, às invasões policial-militares. Os melhores estudantes dirigiram a Feub, entre eles Honestino Monteiro Guimarães, seu presidente em 1968, morto covardemente no pau-de-arara em 1973. Estudante de Geologia, aprovado em primeiro lugar no vestibular da UnB aos 17 anos, Honestino mostrava com seu carisma o que todos queríamos da UnB: comprometimento com nossos grandes sonhos: redemocratização do país, fim da ditadura, construção de um Brasil mais justo e solidário para todos os brasileiros.

Manifestação após a morte de Edson Luís mobilizaram várias capitais brasileiras. Foto: Acervo Iconographia

As assembléias da Feub mobilizavam o conjunto dos estudantes. Todos queriam participar. O auditório Dois Candangos era pequeno para a UnB de 1968. A morte do estudante Edson Luiz, no Restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro, foi o estopim da indignação de todos. A UnB foi novamente invadida, Honestino foi preso, quando o substituí como presidente da Feub em julho de 1968. Levamos a voz livre e solta dos estudantes para a Esplanada dos Ministérios, para o Teatro Nacional, para o Congresso Nacional: Abaixo a Ditadura! Ninguém discordava, o consenso era de todos.

A visibilidade política de Brasília pedia de seu movimento estudantil atuação focada nas grandes questões nacionais. Sua arquitetura, distante das grandes praças e avenidas do Rio e São Paulo, exigia criatividade, que mostramos diante das representações diplomáticas do imperialismo norte-americano, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal; diante do MEC e do próprio ministro da Educação. Liderados pela Feub, os estudantes da UnB deram seu recado na luta em torno das grandes questões nacionais pela redemocratização do Brasil. Democracia, sempre!

Paulo Speller, estudante de psicologia na UnB de 1968, é professor e reitor da Universidade Federal do Mato Grosso