Foto: Agência Estado
Quarenta anos se passaram e 1968 continua presente em Osasco, o palco de uma das mais significativas experiências do movimento operário e sindical do Brasil. A maioria das lideranças da greve dos metalúrgicos de Osasco, realizada em julho de 1968, convive ainda nos mesmos espaços, compartilhando os mesmos ideiais de emancipação dos trabalhadores, liberdade e justiça social.
A dinâmica do movimento social que se desenvolveu em Osasco foi dada pela relação entre dois grupos hegemônicos em diferentes momentos. Trata-se da Frente Nacional do Trabalho (FNT) que, entre tantos outros, teve o mérito de liderar a construção da Comissão de Fábrica da Cobrasma, a maior empresa metalúrgica da região na época, e o Grupo de Esquerda, composto principalmente por jovens, muitos dos quais trabalhavam durante o dia nas fábricas e freqüentavam o curso secundário à noite.
A visão dos grupos quanto ao papel do movimento operário e sindical, naquela conjuntura, tinha muitos elementos em comum, como a necessidade de democratização do movimento sindical organizando os trabalhadores por meio das comissões de fábrica, rompendo com o burocratismo sindical e sua ligação ao Estado, conquistando sua autonomia. Também os unificava a luta contra o arrocho salarial, contra o autoritarismo e a repressão, por liberdades democráticas e justiça social.
As diferenças entre os dois grupos decorriam de suas visões políticas em um plano mais amplo. A FNT mantinha-se fiel aos princípios de organização e conscientização dos trabalhadores para lutar por seus direitos. O Grupo de Esquerda tinha como objetivo central contribuir para que se desencadeasse um movimento social de contestação da ditadura, contemplando as mais diferentes formas de luta. Visões políticas tão diferentes chocavam-se quando se tratava de conduzir lutas concretas. As divergências se colocavam mais em relação às formas de luta, mas sempre foram resolvidas de forma democráticas.
Os antecedentes da greve
Enquanto organização para-sindical, que se propunha a organizar e conscientizar os trabalhadores para defender seus direitos, a FNT aglutinou grande número de trabalhadores da Cobrasma e de várias outras empresas. Já em 1962 conseguiu a oficialização da Comissão dos Onze como interlocutora dos operários junto à direção da empresa.
Nos primeiros anos a FNT manteve a hegemonia na comissão que, desde o primeiro momento, além de seu reconhecimento, obteve outras conquistas, contando com a participação de integrantes do Grupo de Esquerda. A ampliação da representatividade da comissão foi fruto desse trabalho conjunto, que resultou na conquista de uma Comissão de Fábrica com estatuto aprovado pelos trabalhadores, que passaram a eleger diretamente um representante e um suplente para compor a comissão, em 1965, nos dezoito setores em que a fábrica foi dividida.
Em 1966, na segunda eleição, a FNT perdeu sua hegemonia, mesmo permanecendo como força fundamental no desenvolvimento do trabalho na empresa. Nesse pleito, José Ibrahim foi eleito presidente da Comissão e eu secretário, ambos do Grupo de Esquerda.
A organização de base
O princípio que unia e orientava o conjunto das lideranças do movimento era o fortalecimento das organizações por empresa. Para contemplar as opiniões das bases em suas decisões, muitas assembléias foram realizadas em Osasco. Para garantir sua hegemonia no processo, tanto a FNT como o Grupo de Esquerda procuraram consolidar seus trabalhos nas principais empresas da base do sindicato.
Outro princípio comum a todas as principais lideranças era a democracia. Por mais que o Grupo de Esquerda tivesse uma orientação estratégica definida, contemplando a luta armada para derrotar a ditadura, sua atuação em Osasco tinha a defesa dos interesses e reivindicações dos trabalhadores como fundamental, inclusive para conquistar o apoio e a participação dos mesmos.
Em 1966 o Grupo de Esquerda conquistou a hegemonia no movimento, não só operário-sindical, mas também no movimento estudantil secundarista, dirigido por operários-estudantes.
A conquista do sindicato
José Ibrahim é eleito presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco em setembro de 1967, consolidando a aliança com a FNT, que passou a ter maioria na diretoria do sindicato, mesmo não tendo a presidência. Ibrahim foi substituído na presidência da Comissão da Cobrasma por José Groff, um dos principais líderes da FNT. Com a eleição da nova diretoria, o sindicato passou a ter outra dinâmica, sendo o principal pólo de uma nova concepção de ação sindical, referência para as oposições sindicais e seus dirigentes.
Enquanto a FNT continuava desenvolvendo seu trabalho nas fábricas, o Grupo de Esquerda - com a participação de vários grupos, como a Dissidência da Política Operária (Polop), que estava envolvida na organização da VPR, a própria Polop, a Ação Popular (AP), a Ação Libertadora Nacional (ALN) etc. - intensificou a organização de grupos de operários por empresa, que passaram a ter papel importante nas mobilizações do sindicato e, em decorrência, em suas próprias decisões, muitas das quais tomadas em reuniões ampliadas ou mesmo em assembléias.