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O colapso da economia norte-americana mostra uma profunda crise da globalização nos moldes do Consenso de Washington

O colapso da economia norte-americana mostra uma profunda crise da globalização nos moldes do Consenso de Washington e exigirá do novo governo soluções e mudanças concretas também no plano ideológico

 

Um espírito jubiloso de "Sim, nós fizemos!" tomou conta dos 2 milhões de pessoas congregadas em Washington D.C. para a cerimônia de posse de Barack Hussein Obama. Era uma celebração popular do final do desastroso segundo termo da dinastia Bush, que fez o país se esvair em sangue em guerras desnecessárias1, desgraçou os melhores de nossos valores e nos deixou como herança o colapso da economia norte-americana. Desde janeiro, a situação econômica entrou numa espiral cada vez mais ameaçadora e fora de controle, e a nova administração teve de lidar com o desafio de restaurar a estabilidade enquanto virava a página dos fracassos sistêmicos herdados.

O presidente Obama, no dia 24 de fevereiro, iniciou seu discurso ao Congresso norte-americano observando que "a situação em que se encontra nossa economia é uma preocupação superior a todas as outras" e ninguém precisa de "novas estatísticas para convencer-se de que nossa economia" está por um fio. Todo dia traz aos cidadãos americanos noites maldormidas, enquanto dezenas de milhões encaram a perda do emprego, da hipoteca, têm a aposentadoria ameaçada e o sempre presente risco de adoecer sem um seguro de saúde que os possa proteger. Mas o presidente Obama foi, também, muito claro ao afirmar que sobrevivemos a uma era que recompensava ganhos em curto prazo em prejuízo de uma prosperidade amplamente compartilhada, na qual políticos procuraram "desculpas" para "transferir riqueza aos ricos" e "regulamentações foram devastadas em nome do lucro rápido". O desperdício de bilhões de dólares no Iraque e no orçamento da defesa foi enfatizado, enquanto ele prometia finalmente acabar com "os benefícios fiscais para os 2% mais ricos dos Estados Unidos... (e) para corporações que levam nossos empregos além-mar".

Fica claro que um novo dia começou, embora as principais nomeações do presidente tenham mostrado pouca ousadia. A política econômica permanece nas mãos de veteranos de Wall Street e de Larry Somers, o guru da globalização neoliberal da era Clinton. Como ocorria com Bush, centenas de bilhões de dólares dos contribuintes continuam sendo desperdiçados com as fraudes e os criminosos que colocaram as principais financeiras e seguradoras de joelhos. Um Departamento de Estado fortalecido está nas mãos de Hillary Clinton, a ex-rival de Obama no Partido Democrata, uma pessoa que não é conhecida por sua coragem ao tratar seja do tema do Iraque, seja do de Israel. E o Departamento de Defesa segue nas mãos de um indicado por Bush. Os últimos planos de Obama para o Iraque mantêm até 50 mil soldados americanos lá por tempo indeterminado e o presidente, numa tentativa fútil de provar que é durão, optou por uma escalada na guerra no Afeganistão. Enquanto isso, a classe trabalhadora organizada tem de se contentar com a nomeação de uma congressista pró-sindical da Califórnia para um departamento do trabalho com pequena influência ou poder.

Porém, a impressão de continuidade não capta as mudanças dramáticas ocorridas nos últimos seis meses: uma profunda crise da globalização neoliberal tanto no plano ideológico quanto no concreto. Ao longo dessa era de neoliberalismo bipartidário, ninguém jamais tinha ouvido um político proeminente - muito menos um republicano como George W. Bush - reclamar melancolicamente que muitos estão "reduzindo o sistema da iniciativa privada a ganância, exploração e fracassos... "O capitalismo do livre-mercado" alegou ele, em meados de novembro de 2008, "é muito mais que teoria econômica" e "seria um terrível erro permitir que alguns poucos meses de crise minassem sessenta anos de sucesso" somente porque "o capitalismo não é perfeito". Nem se poderia esperar que um poderoso ex-presidente do Banco Central norte-americano, Alan Greenspan, admitisse no mês anterior que estava em um estado de "choque de incredulidade... "Eu encontrei um defeito em meu modelo (de mercado)... Cometi um erro ao presumir que o interesse próprio "funcionava excepcionalmente bem e de forma segura".