Política

PT 30 anos: depoimento de Lincoln Secco

PT 30 anos: depoimento de Lincoln Secco

O PT atual é um partido muito diferente daquele que seus militantes conheceram nos anos 80. Hoje é inteiramente institucional, eleitoral, de governo e parte integrante da ordem estabelecida. Nessa perspectiva, e somente nela, é que podemos prognosticar seus próximos trinta anos.

Sua base social se ampliou para os estratos historicamente desorganizados da população brasileira. Essa população de baixa renda sempre fora um desafio ao partido. Restrito aos trabalhadores urbanos sindicalizados e a setores radicalizados da classe média, o PT a enxergava como um enigma que só demagogos de direita sabiam decifrar. Com a ascensão de Lula em 2002, finalmente a esquerda conseguiu um apoio consistente daquelas populações desprotegidas, através de uma adequada política social. Mas também teve dificuldade em manter o respaldo da velha classe média.

O impacto disso no PT ainda não pode ser compreendido. A entrada de novos atores no partido, desvinculados de sua história, de seu modus operandi, de seu jargão e de seus símbolos e rituais, causará um estranhamento cada vez maior, se não forem tomadas três medidas imprescindíveis: educação política dos novos filiados, invenção de novos institutos de democracia interna e uma rigorosa aplicação do código de ética. E não me refiro aqui, necessariamente, aos mais pobres que porventura se inscrevam, mas àqueles políticos que oportunamente buscam o seu voto ingressando no partido.

São fortes as possibilidades de o PT, nascido no solo histórico da América Latina, simplesmente se confundir com a máquina governamental e se tornar uma simples agremiação eleitoral e de distribuição de cargos (o que, dentro de certos limites, todo partido precisa ser). Nesse caso, ele se pareceria cada vez mais com o PRI mexicano ou o PMDB.

Todavia, com vocação já demonstrada para o governo, o PT pode seguir um caminho "chinês" e se tornar a ponta de lança de um capitalismo de Estado brasileiro (evidentemente, em condições democráticas). Seria um partido altamente identificado com o desenvolvimento econômico nacional e com o reposicionamento estratégico do Brasil na geopolítica mundial ou ao menos latino-americana.

Esses dois cenários não dependem apenas de opções dos dirigentes do PT. Contar sua história ou prognosticar o seu futuro é, em boa medida, pensar no Brasil. As chances do partido são as do país. No governo Lula, o Brasil completou sua transição da periferia à semiperiferia e exerce uma liderança regional. Em tais circunstâncias, um "partido de Estado", mas com origens operárias, pode soldar-se às classes trabalhadoras latino-americanas e, recalibrando seu discurso e corrigindo seus desvios, reafirmar o seu compromisso com os valores socialistas.

Lincoln Secco, membro do Conselho de Redação de Teoria e Debate