Debater Amazônia e desenvolvimento nos coloca grandes desafios e deve abranger um novo modelo de ocupação para a região, com ideias inovadoras a partir da sustentabilidade ambiental, econômica, social e cultural, inclusive utilizando a experiência petista no Acre
Sempre foi um enorme desafio discutir a Amazônia por ser uma das regiões mais especiais do nosso planeta. Foi assim no século 19. Foi assim especialmente no século 20, ainda muito presente em nossa memória. Nosso desafio agora é como pensá-la para o século 21, no pós-Copenhague. E aí creio ser bom refletirmos um pouco sobre o que ocorreu na Amazônia nos últimos quarenta anos. Vejamos o exemplo do Acre. As mudanças e transformações que aconteceram no estado são fruto de um movimento que foi, inicialmente, de resistência e denúncia. Teve como base um movimento social forte, organizado a partir da Igreja Católica (Comunidades Eclesiais de Base), que criou condições para a organização dos sindicatos rurais convencionais. O movimento ganhou força com o envolvimento de lideranças visionárias como Chico Mendes e o próprio Lula, que estimulou muito esse novo caminho. Uma singularidade que, embora ainda não esteja devidamente registrada pelos pesquisadores e cientistas, a história já faz por onde registrar. O que era no início um movimento de denúncia e de resistência, sob certo aspecto convencional, transformou-se em um movimento propositivo, em defesa de um novo modelo de ocupação e desenvolvimento para a Amazônia, com propostas de políticas públicas inovadoras, que passaram inclusive a integrar a plataforma política do PT, que nascia no mesmo período.
Já vivíamos o período da redemocratização do país, mas isso não significou uma mudança na visão da política oficial brasileira em relação à Amazônia. As denúncias contra as políticas públicas brasileiras continuavam crescendo no mundo, e o desmatamento crescia em igual proporção. A novidade é que começaram a surgir movimentos políticos partidários, capitaneados pelo PT. O movimento ganhou força e, no caso do Acre, suas propostas foram transformadas em políticas públicas a partir de 1993, quando o PT assumiu a Prefeitura de Rio Branco. Alguns mandatos parlamentares também incorporaram os conceitos desse novo modelo, a partir da eleição de Marina Silva e depois do senador Tião Viana. E, logo em seguida, no governo estadual, em 1999 (o primeiro governo do PT na Amazônia).
A experiência vivida pelo PT no Acre está no seu terceiro mandato na administração estadual e tem uma singularidade: fugiu da luta política convencional, tendo nos ideais de Chico Mendes e na luta dos movimentos sociais a base de seu modelo de desenvolvimento. Um modelo de desenvolvimento que tem como princípio a sustentabilidade ambiental, econômica, social, cultural, política e ética.
A força maior desse movimento que hoje governa o Acre se sustenta em três bases, sob o ponto de vista da gestão: ter ideias inovadoras que se legitimem na sociedade; reunir pessoas capazes para executar ou pôr em prática essas ideias; reunir as condições para que essas ideias sejam implementadas.
A economia pós-Copenhague
Desde a COP 15, tenho dito que o Acre já vive uma espécie de pós-Copenhague, exatamente porque ainda no século passado a nossa agenda já registrava e priorizava temas que só agora, na primeira década do novo milênio, estão sendo priorizados por outros estados, por outros governos e até pelo Brasil. O Acre vive esse pós-Copenhague, por toda a sua história de resistência e de luta em defesa da floresta e do uso consciente dos seus recursos naturais.
Claro que os desafios se mantêm enormes, maiores ainda, porque estamos vivendo a fase da materialização desses ideais. Mas é inegável que o modelo de desenvolvimento em andamento no Acre responde positivamente do ponto de vista econômico, por ser competitivo; responde positivamente do ponto de vista social, por ser includente; responde essencialmente do ponto de vista ambiental, porque é sustentável.
Esse novo modelo precisa levar sempre em conta as populações tradicionais e a biodiversidade e ter como linha mestra a ideia de se consolidar na Amazônia uma economia de baixo carbono com alta inclusão social.
O ordenamento territorial se torna fundamental nesse processo e considero um grande equívoco tratar desse tema de forma convencional. No Acre, realizamos o zoneamento ecológico e econômico, que não foi imposto por lei, mas feito a partir de um pacto com a sociedade. Esse modelo deveria ser reproduzido em todo o território Amazônico, associando os interesses dos que vivem na Amazônia com os interesses nacionais, e deveria, sobretudo, ter como foco não o uso da terra, e sim o uso dos recursos naturais que estão abaixo e acima da terra.
É preciso compreender que na Amazônia devemos fortalecer o círculo virtuoso de que a floresta faz bem para a economia e a economia de base florestal é importante para a sustentabilidade. Usar com sabedoria nossa biodiversidade, com certificação dos produtos e agregação de valor, deve ser a base para uma economia de baixo carbono e alta inclusão social.