Sociedade

A luta pela consolidação das políticas públicas

Seu reconhecimento como sujeito de direitos credencia a juventude do país a vislumbrar a consolidação de políticas públicas voltadas aos seus interesses. Essa luta ganha novo fôlego com a eleição de Dilma Rousseff e apresenta desafios a serem encarados no próximo período

A juventude brasileira alcançou nos últimos dez anos um novo espaço de reconhecimento de suas identidades. Estamos falando de uma primeira etapa da caminhada que sugere um debate em torno da consolidação das políticas públicas.

O ciclo iniciado por pesquisadores, militantes e movimentos juvenis hasteou a bandeira do reconhecimento da juventude enquanto sujeitos de direitos. Essa pauta foi permeada por uma série de debates, lutas e conquistas no campo das Políticas Públicas de Juventude (PPJ).

O primeiro debate – o da participação – foi por muito tempo o mais forte, principalmente quando o eco na sociedade era não apenas garantir políticas específicas para a juventude, mas, sobretudo, que os sujeitos em questão pudessem participar da elaboração dessas políticas com espaços reservados para esse fim.

Assim, diversas institucionalidades, como assessorias, coordenadorias, secretarias, comitês territoriais e conselhos de juventude foram criados com a perspectiva de garantir o que se denominou políticas de/para/com a juventude.

Mesmo diante dessas institucionalidades, a juventude organizada tem se questionado se esses espaços têm dado conta de inseri-la não apenas na pauta como sujeitos sociais transversais no âmbito das políticas públicas, mas como um público com políticas destinadas a inverter prioridades e modificar a vida, dando oportunidade a novos sonhos e vida digna.

Esses questionamentos voltam à tona nessa fase de Momento da Consolidação das Políticas Públicas, dando corpo à segunda fase, que estamos chamando de inclusão social.

Importante contribuição de Gregory Carvalho e Iraj Roberto Egharari (2010), no estudo “Orçamento Juventude 2003-2010: Uma proposta metodológica para o controle social das políticas públicas de juventude”, constatou a existência de 124 programas de juventude, dos quais apenas 15 têm impacto direto na vida da juventude brasileira.

Ao mesmo tempo que esse dado nos leva a constatar um enorme  avanço, é inegável o grande desafio de consolidar os demais 109 programas em políticas e transformá-los em ações que atinjam de forma direta a juventude.

Outro dado curioso apontado por essa pesquisa é a divisão desses programas em 13 áreas, a saber: Educação, Trabalho e Renda, Ciência e Tecnologia, Meio Ambiente, Cultura, Esporte, Saúde, Benefícios Estatais, Garantias e Direitos, Segurança Pública, Desenvolvimento Agrário, Participação e Controle Social e Juventude Diretamente.

Entendemos que no campo institucional temos ganhado aliados e, por que não dizer, espaços importantes. No entanto, esses espaços ainda são desafiados a incorporar elementos que vão além da representação política, como as decisões da juventude, para que tenhamos, por exemplo, as propostas aprovadas na Conferência Nacional de Juventude, dentro dos programas que possuem orçamento direto.

Para que esse projeto se materialize, é preciso organizar a juventude com o mesmo espírito da juventude petista, para garantir uma disputa na sociedade, dialogando e agregando ao debate outras juventudes partidárias.

A eleição de Dilma

Iniciamos 2010 como o ano em que teríamos a eleição de nossa vida. O projeto vitorioso levado à Presidência da República e encabeçado por Lula alcançava recordes sucessivos de popularidade. Capaz de tirar milhões de brasileiros da miséria, atingiu em cheio a juventude brasileira. Milhares de vagas para estudantes de baixa renda no ensino superior, outros milhares aprendendo uma profissão nas escolas técnicas.

Com esse espírito de legado a ser assegurado e desafios a serem alcançados, a JPT começou a se organizar ainda em 2009 no seminário das juventudes partidárias “A juventude e o desenvolvimento nacional”.

Através de uma grande articulação interna, realizamos no começo de fevereiro o Encontro Nacional da JPT, com mais de 600 jovens, que demarcou positivamente nossa organização, pois propiciou a elaboração inicial sobre o programa de governo de juventude.

A presença de Dilma Rousseff animou a militância a voltar para os estados e produzir um grande processo de mobilização, além de abrir com ela no início da pré-campanha o debate sobre juventude.

Começamos então a articulação com os demais partidos da base aliada para a elaboração do programa de governo, que contemplou a maior parte das demandas e percepções sobre as políticas de juventude dos participantes. Vale destacar que, além dos partidos, contamos com a contribuição de especialistas, membros do governo e movimentos sociais nesse processo.

As eleições de 2010 deram à juventude um ânimo novo, inerente ao próprio PT, que completa um ciclo de trinta anos. Para essa juventude atual é fundamental pautar o PT por mais trinta anos, mas, sobretudo, pensar o país para a juventude de hoje e para as novas gerações.

Foi com esse espírito de compromisso que a juventude organizou a campanha Dilma Presidente e com muito entusiasmo “a galera da Dilma” fez rejuvenescer a luta nas ruas, nas comunidades, nas portas de escolas e universidades, nos sinais, nas caminhadas, adesivagens, bandeiraços, bicicletadas, caravanas e comícios, tanto nas capitais como em diversas cidades do interior, além de um ato com nossa então candidata na Cidade de Deus.

A avaliação da executiva da JPT é de que, para dentro da nossa organização, essa foi a melhor campanha de juventude que já realizamos, por sua unidade, mobilização nos estados, condição de suporte e subsídios produzidos pelo Comitê de Juventude Nacional – foram mais de trezentas atividades com articulação nacional.

Acrescentamos a esse debate e intervenção suprapartidária a criação de mais de quarenta comitês nos diversos estados, garantindo maior agilidade ao fluxo de informações e à mobilização. Assim, reforçamos a importância de ter contado, em conjunto, com a juventude petista, com a participação das seguintes juventudes partidárias: PSB, PMDB, PDT, PPL e UJS, que contribuíram para tornar o processo de mobilização mais amplo e forte.

É possível registrar que essa foi uma grande campanha, entusiasta, mobilizada, mas, sobretudo, uma campanha de juventude pautada em muito conteúdo, comprometida com a necessidade de que o Brasil possa seguir mudando, que possa garantir a continuidade das conquistas já estabelecidas e ampliar o acesso da juventude às políticas públicas.

Houve, no entanto, uma dificuldade grande da campanha de incorporar essa temática mais estrategicamente. Por isso os desafios que pautam nossa organização pós-campanha devem ser o centro de nossa organização no próximo período.

Precisamos intensificar o debate com o novo governo sobre a importância da juventude no desenvolvimento do país e garantir que os compromissos sejam incorporados e que aproveitemos as oportunidades derivadas do chamado “bônus demográfico”, pois a temática ultrapassa o escopo das ações de inclusão para assumir uma dimensão estratégica no desenvolvimento do país. Segundo dados e projeções da Pnad/IBGE, o Brasil vive, entre os anos de 2010 e 2030, a condição demográfica mais favorável de sua história.

Nesse período, considerando-se segmentos da população por faixa etária, o país contará com dois cidadãos em idade produtiva (15 a 64 anos) para cada cidadão dependente (idosos e crianças). Essa é uma condição ideal para o avanço de um projeto de desenvolvimento nacional e uma janela de oportunidade única na história.

Todos os grandes desafios da sociedade brasileira têm ligação íntima com as condições de vida de seus jovens no presente e no futuro, pois uma sociedade é mais justa e igualitária à medida que seus jovens encontram condições dignas de acesso à educação, formação profissional e inserção no mercado de trabalho. O projeto de desenvolvimento nacional, portanto, passa necessariamente pela integração das novas gerações, num contexto de construção constante e contínua da cidadania e do Estado democrático.

Desafios

O governo Lula mudou a visão governamental da juventude como objeto da política pública no Brasil, substituindo o enfoque das ações de contenção e repressão, comum até o final dos anos 90, por um enfoque de política de inclusão social e participação.

Os avanços foram muitos: os jovens, que eram imensa maioria entre os desempregados, foram os que mais se ocuparam dos 14 milhões de postos gerados nestes oito anos; 700 mil acessaram o ensino superior privado pelo ProUni; de 2006 a 2010, as vagas nas universidades federais aumentaram 63%, por meio do Reuni e da duplicação da oferta de vagas em cursos noturnos; com a derrubada da proibição de expansão do ensino técnico, herança do governo anterior, 214 escolas técnicas federais foram criadas; milhões de jovens foram incluídos pelo Bolsa Família ou por meio de uma das modalidades do Projovem.

A Lei nº 11.129/2005 instituiu a Política Nacional de Juventude com a criação da Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) e do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), ambos no âmbito da Secretaria-Geral da Presidência da República, e pela primeira vez o Brasil passou a ter um espaço governamental para tratar da temática no âmbito federal.

Agora é preciso avançar e, com esse objetivo, a juventude do PT sugere a observância dos seguintes aspectos:

- a política de juventude tem caráter transversal e intersetorial, com ações distribuídas em praticamente todas as áreas de governo;

- a melhor chave de compreensão para a gestão compartilhada entre distintos organismos de governo, como é o caso da juventude, é o território, o que equivale dizer que uma política pública para o setor deve buscar a integração “na ponta” entre as políticas públicas no campo do trabalho, educação, cultura, esporte, lazer, saúde e segurança;

- a política de juventude deve enfrentar a questão da evasão no ensino médio como desafio prioritário a ser superado para a integração das novas gerações e o aproveitamento do “bônus demográfico”;

- é fundamental a manutenção de um espaço articulador da política de juventude no governo federal e a constituição de novos instrumentos de gestão que sustentem a coordenação entre as ações em suas distintas áreas, bem como entre este e os demais entes federados;

- o fortalecimento e ampliação dos espaços de participação da sociedade civil (Conjuve), bem como o aprimoramento dos mecanismos participativos, como a Conferência Nacional de Juventude, são elementos indissociáveis de uma Política Nacional de Juventude;

- Embora a SNJ e o Conjuve sejam dotados de linhas orçamentárias próprias, ainda carecem de dotação de instrumentos de gestão e execução orçamentária que permitam um menor grau de dependência de outros órgãos de governo, o que garantirá maior eficiência na execução;

- a compreensão de que a adoção de uma lógica como a do PAC para o acompanhamento, monitoramento e avaliação das ações de governo dirigidas aos jovens representaria um avanço institucional, ao passo que a vinculação da política de juventude a um ministério setorial seria uma involução do desenho concebido pela Lei nº 11.129/2005;

- O reconhecimento de que, atualmente, a emancipação dos jovens tem entre seus elementos centrais a educação e o trabalho exige que os programas de juventude voltados para esses temas devam ir além da garantia do primeiro emprego ou de qualificação profissional. É preciso criar as condições para que os jovens, principalmente os oriundos de famílias de baixa renda, possam concluir os estudos e ingressar em postos de trabalho decentes.

Os desafios citados nos alertam que, apesar da campanha vitoriosa que tivemos, os embates ainda serão grandes e 2011 deve se descortinar como um divisor de águas para a juventude petista, que tem o seu II Congresso para o fortalecimento partidário, bem como o aprofundamento da relação com os movimentos juvenis.

Nesse sentido, de um lado, será preciso avançar rumo à consolidação da Política Nacional de Juventude. De outro, fortalecer a organização da juventude, fundamental para colher conquistas para os jovens brasileiros.

Para isso, desafios internos terão de ser garantidos: aumentar o reconhecimento do PT sobre a importância da juventude no seu interior,  fortalecer a rede organizacional da JPT, criando uma dinâmica maior de funcionamento entre todas as instâncias da juventude, assim como conectá-las entre si – tanto com as redes sociais como em relação às demais instâncias partidárias, como as próprias setoriais, que realizarão encontros no início de 2011.

Se o I Congresso foi um marco de mudança na forma como se organizam os jovens dentro do PT e como se relacionam com a sociedade, o II será um marco ainda maior, pois representará a consolidação da organização da juventude dentro e fora do PT. Esta com muito mais acúmulo, principalmente nos últimos anos.

Assim, o II Congresso da Juventude do PT, convocado pela Executiva Nacional da JPT, de 12 a 15 de novembro de 2011, será um grande momento, pois ao longo de todo o ano o partido fortalecerá sua relação com os movimentos juvenis, através da realização de debates preparatórios, e ampliará e qualificará sua participação nos espaços de políticas públicas, principalmente com a intervenção organizada na II Conferência Nacional de Juventude do Governo Federal, na participação no 52º Congresso da União Nacional dos Estudantes e na realização de uma grande articulação pela defesa da reforma política.

Em suma, o ano de 2011 será crucial para a juventude avançar, no Brasil e no PT. E essas questões não estão dissociadas. Um partido com uma juventude cada vez mais forte e organizada terá as condições necessárias para fazer do Brasil um país onde os jovens tenham uma vida cada vez melhor, pois eles foram às urnas para garantir o exercício da democracia e, como conquista, foi eleita Dilma, a primeira mulher presidenta do país, com a contribuição e a cara da juventude.

A eleição de Dilma representa para a juventude o desafio de avançar, fortalecendo os espaços de participação social, mas também criando condições de vida adequadas para a juventude, com o reconhecimento de que esse segmento é estratégico para o projeto nacional de desenvolvimento, que leve em conta a integração das novas gerações, num contexto de construção constante e contínua da cidadania e do Estado democrático.

Severine Macedo é secretária Nacional de Juventude do PT