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O caminho é conseguir usar todas as formas de energia, construindo uma matriz energética diversificada, sem impor grandes danos à sociedade e ao ambiente

O país deve dominar todas as formas de energia transformáveis em energia elétrica, construindo uma matriz energética diversificada. Nessa discussão talvez seja bom abandonar preconceitos e utopismos e ter como foco o desenvolvimento econômico e social do Brasil.

Vista área da usina nuclear Angra 3

É um erro desconsiderar a energia nuclear na geração de energia elétrica Foto: Eletronuclear

Antes mesmo do acidente nuclear de Fukushima, no Japão, resultante de um terremoto, seguido de um tsunami, o debate sobre a questão energética já se encontrava em curso no Brasil, tendo como focos a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte e da usina nuclear Angra 3. Os argumentos principais contra tais construções se relacionavam, e ainda se relacionam, no caso de Belo Monte, aos danos ambientais e sociais que tal construção causará e, no caso de Angra 3, aos perigos do uso da energia nuclear.

Grande parte dos críticos ao uso dessas formas de energia argumenta que a demanda de energia do Brasil pode ser suprida com energias alternativas limpas, como a eólica, a solar e a de biomassa. O que, em teoria, tem alguma procedência. O potencial de energia eólica apenas no Nordeste, medido a 50 metros, é de cerca de 75 GW (gigawatt), ou 75 mil MW (megawatt). Esta é quase a potência total instalada hoje no Brasil, a partir de fontes hidráulicas e térmicas.

A insolação do território brasileiro também é extremamente favorável à ampla utilização de energia solar, sendo incalculável seu potencial. E os exemplos de cogeração e geração, a partir do bagaço da cana e de outras biomassas, mostram que há um enorme potencial a ser aproveitado. No entanto, de imediato é preciso desfazer alguns equívocos. Nenhuma dessas formas de energia é realmente “limpa”.

A energia eólica, para ser transformada em elétrica, precisa contar com equipamentos que incluem torres, turbinas, geradores, caixas de engrenagens e pás, que são produzidas com aço, cobre, compostos de carbono e outros materiais cuja fabricação envolve processos poluentes. O mesmo ocorre com a fabricação de placas fotovoltaicas, para os sistemas de aquecedores solares. Esses são comprovadamente úteis para a economia energética, mas não para a geração elétrica em larga escala.

Os sistemas termo-solares de geração, que coletam os raios solares por meio de uma combinação de lentes e espelhos e vaporizam água para o funcionamento de turbinas a vapor e geradores elétricos, necessitam que todos esses equipamentos sejam fabricados, assim como óleos ou sais especiais, envolvendo processos dificilmente limpos. Algo idêntico acontece com a fabricação dos componentes mecânicos e elétricos de geração a partir da biomassa.

Portanto, todas essas alternativas, aparentemente limpas, compreendem processos que afetam, de uma forma ou outra, o meio ambiente e o meio social. As fazendas de energia eólica, mesmo de baixo potencial, precisam de áreas amplas, e não podem estar muito próximas de aglomerados urbanos, em virtude dos decibéis gerados por suas pás. Mas não há estudos sobre a interferência das torres e aerogeradores sobre as rotas de migração de aves.

Os sistemas termo-solares de geração elétrica também necessitam de áreas relativamente extensas, que precisam ser aplainadas de forma a que as lentes captem os raios de forma adequada e os espelhos os reflitam precisamente para as torres de aquecimento e produção de vapor. E a geração de energia por biomassa, embora possa produzir relativamente poucos gases, os produz em  certa escala.

Antes mesmo do acidente nuclear de Fukushima, no Japão, resultante de um terremoto, seguido de um tsunami, o debate sobre a questão energética já se encontrava em curso no Brasil, tendo como focos a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte e da usina nuclear Angra 3. Os argumentos principais contra tais construções se relacionavam, e ainda se relacionam, no caso de Belo Monte, aos danos ambientais e sociais que tal construção causará e, no caso de Angra 3, aos perigos do uso da energia nuclear.

Grande parte dos críticos ao uso dessas formas de energia argumenta que a demanda de energia do Brasil pode ser suprida com energias alternativas limpas, como a eólica, a solar e a de biomassa. O que, em teoria, tem alguma procedência. O potencial de energia eólica apenas no Nordeste, medido a 50 metros, é de cerca de 75 GW (gigawatt), ou 75 mil MW (megawatt). Esta é quase a potência total instalada hoje no Brasil, a partir de fontes hidráulicas e térmicas.

A insolação do território brasileiro também é extremamente favorável à ampla utilização de energia solar, sendo incalculável seu potencial. E os exemplos de cogeração e geração, a partir do bagaço da cana e de outras biomassas, mostram que há um enorme potencial a ser aproveitado. No entanto, de imediato é preciso desfazer alguns equívocos. Nenhuma dessas formas de energia é realmente “limpa”.

A energia eólica, para ser transformada em elétrica, precisa contar com equipamentos que incluem torres, turbinas, geradores, caixas de engrenagens e pás, que são produzidas com aço, cobre, compostos de carbono e outros materiais cuja fabricação envolve processos poluentes. O mesmo ocorre com a fabricação de placas fotovoltaicas, para os sistemas de aquecedores solares. Esses são comprovadamente úteis para a economia energética, mas não para a geração elétrica em larga escala.

Os sistemas termo-solares de geração, que coletam os raios solares por meio de uma combinação de lentes e espelhos e vaporizam água para o funcionamento de turbinas a vapor e geradores elétricos, necessitam que todos esses equipamentos sejam fabricados, assim como óleos ou sais especiais, envolvendo processos dificilmente limpos. Algo idêntico acontece com a fabricação dos componentes mecânicos e elétricos de geração a partir da biomassa.

Portanto, todas essas alternativas, aparentemente limpas, compreendem processos que afetam, de uma forma ou outra, o meio ambiente e o meio social. As fazendas de energia eólica, mesmo de baixo potencial, precisam de áreas amplas, e não podem estar muito próximas de aglomerados urbanos, em virtude dos decibéis gerados por suas pás. Mas não há estudos sobre a interferência das torres e aerogeradores sobre as rotas de migração de aves.

Os sistemas termo-solares de geração elétrica também necessitam de áreas relativamente extensas, que precisam ser aplainadas de forma a que as lentes captem os raios de forma adequada e os espelhos os reflitam precisamente para as torres de aquecimento e produção de vapor. E a geração de energia por biomassa, embora possa produzir relativamente poucos gases, os produz em  certa escala.

Ameaças e riscos

Em relação a ameaças e riscos, não é apenas a energia nuclear que contém perigos. No passado, rompimentos de barragens para geração elétrica também causaram desastres de vulto, tanto nos Estados Unidos, quanto em outros países. Foi o desenvolvimento da tecnologia de concreto que permitiu construir represas relativamente seguras, com controle permanente de suas condições físicas, embora ninguém esteja totalmente a salvo das vinganças da natureza, como abalos sísmicos, erupções vulcânicas, trombas d’água, enchentes, deslizamentos de terras e tsunamis.

A produção de energia a partir de fontes eólicas e solares é relativamente recente e parece não apresentar os mesmos perigos da energia nuclear. No entanto, seria útil considerar que esta, comparada aos riscos, danos e mortes causados por veículos terrestres, em praticamente todos os países do mundo, é um mar tranquilo e seguro. O número de mortos e feridos em acidentes de trânsito no Brasil, a cada ano, é algumas vezes superior ao número de mortos e feridos nos acidentes de Three Miles Island, Chernobil e Fukushima, juntos.

Do ponto de vista econômico, é preciso levar em conta que as tecnologias relacionadas à geração elétrica a partir da energia eólica e solar são relativamente novas e, portanto, mais caras do que as tecnologias tradicionais de geração hidráulica e térmica a vapor. A maior parte das turbinas eólicas ainda está limitada a 1,5 MW e 2 MW de potência, só agora estando em desenvolvimento experiências com turbinas de 2,5 MW a 5 MW de potência. E os parques termo-solares ainda enfrentam problemas técnicos variados para obter potências elevadas.

Fazendas eólicas ou parques solares para produzirem, por exemplo, o mesmo que a usina de Belo Monte está programada para gerar, além dos custos, talvez causem problemas ambientais e sociais de magnitude igual ou maior. Além disso, há problemas relacionados com a constância da geração eólica e solar, em virtude dos momentos em que os ventos param ou reduzem sua velocidade, ou em que a noite cai ou multiplicam-se dias chuvosos, impondo questões técnicas de armazenagem da eletricidade e de seu despacho pelas linhas de transmissão.

Energia e desenvolvimento

Seria conveniente que todos esses aspectos fossem levados em conta na discussão sobre o desenvolvimento energético brasileiro. O fornecimento de energia elétrica está relacionado à expectativa de que todos os brasileiros tenham luz a qualquer hora da noite e do dia, e possam ter acesso aos bens eletroeletrônicos de trabalho e lazer. Além disso, sem energia elétrica não se pode pensar seriamente no desenvolvimento industrial do próprio país, condição material básica para a independência econômica e política no contexto internacional.

Para crescer de 5% a 7% ao ano, o Brasil precisa elevar sua capacidade instalada em cerca de 30 GW a 50 GW também a cada ano, mas para que essa capacidade de geração ocorra, contribuindo ao mesmo tempo para a industrialização, será necessário ampliar o parque de fabricação de turbinas e geradores hidráulicos, eólicos e a vapor, assim como de lentes e espelhos solares, cabos de transmissão, transformadores e outros componentes e dispositivos elétricos. A não ser que queiramos continuar, eternamente, como importadores desses equipamentos.

Nesse sentido, os casos das usinas de Belo Monte, no rio Xingu, e Santo Antonio e Jirau, no rio Madeira, podem ser paradigmáticos, por se encontrarem na região amazônica, em rios de fauna abundante, florestas circundantes e populações ribeirinhas de pequena densidade. Para reduzir consideravelmente os impactos ambientais do alagamento, as três usinas terão represas de pequena altura, utilizando turbinas de nova tecnologia, que funcionam praticamente ao nível da lâmina d’água.

Além disso, corrigem os erros do passado, em que os projetos das represas não previam eclusas para o tráfego fluvial, nem sistemas de degraus de água para o movimento dos peixes no período da desova. E têm todas as condições de solucionar adequadamente os problemas sociais, tendo em conta a disposição governamental de realizar debates, não apenas com as populações diretamente envolvidas, mas com todas as camadas sociais do país, já que se tratam de projetos nacionais.

Em termos gerais, o que mais deve interessar ao Brasil é dominar todas as formas de energia transformáveis em energia elétrica, construindo uma matriz energética diversificada, na qual a energia hidráulica continue desempenhando o papel principal. É nesse setor que o país tem uma vasta experiência, já havendo aprendido a utilizar a energia hidráulica sem impor grandes danos à sociedade e ao ambiente.

O país também sabe que o emprego de grandes geradores a óleo pesado ou a diesel, ainda hoje jogando papel importante no fornecimento de energia para as regiões Norte e Centro-Oeste, é caro e altamente poluente, só devendo ser usado em casos emergenciais. Ganhou alguma experiência com as térmicas a gás natural, a carvão e a biomassa, sabendo que elas são complementos necessários para períodos de vazantes das hidrelétricas. E está avançando na ampliação das fazendas eólicas e no conhecimento dos problemas que envolvem esse tipo de geração.

Por um lado, o Brasil também tem avançado na utilização de placas fotovoltaicas para uso em aquecedores e outros dispositivos elétricos de pequena potência, como lâmpadas de iluminação urbana, controle de sinais de trânsito etc., contribuindo para economizar o uso da eletricidade. Por outro, está apenas dando os primeiros passos para dominar a tecnologia de geração termo-solar, mas numa perspectiva de utilizar amplamente sua alta insolação.

Finalmente, seria um erro científico e tecnológico desconsiderar a importância da energia nuclear na geração elétrica, como complemento importante aos sistemas de fornecimento para algumas áreas regionais, e como base importante no desenvolvimento da física, da química, da medicina e de outros ramos científicos.

Portanto, nessa discussão talvez seja bom abandonar preconceitos e utopismos e ter como foco o desenvolvimento econômico e social do Brasil como um todo.

Wladimir Pomar é membro do Conselho de Redação de Teoria e Debate