Nacional

Para romper com a lógica da exclusão, administração petista aposta na educação, no convívio com a floresta, respeitando a biodiversidade e leis da natureza

Em 2005, a Prefeitura de Santarém deu início ao Programa Escola da Gente, que trabalhou para melhorar a qualidade do ensino-aprendizado a partir do tripé aluno-professor-infraestrutura, convivendo e aprendendo na floresta e com a floresta, respeitando a biodiversidade e leis da natureza

Mais qualidade no ensino, equipamentos e investimento nos professores

Mais qualidade no ensino, equipamentos e investimento nos professores. Fotos: Arquivo

Banhada pelo Rio Tapajós, um dos afluentes do Amazonas, Santarém (PA) tem 350 anos de idade e há quase oito é governada pelo PT. O partido venceu as eleições ali pela primeira vez em 2004 e assumiu em janeiro de 2005, com a certeza de que era indispensável romper a lógica perversa da exclusão, investindo em educação, não a tradicional, mas “a educação que liberta”, que transforma e inclui.

Pensar essa síntese foi mais fácil do que “meter a mão na massa” e tentar resolver o caminhão de problemas e desafios encontrados: os professores estavam com o salário de dezembro e 40% do décimo terceiro atrasados e não havia diálogo nem sistema de qualificação continuada. Também não havia um sistema de alimentação que fizesse com que a merenda chegasse a todos os locais, e a que conseguia chegar só dava para quinze dias, acrescentando mais uma razão à evasão escolar. A maioria das escolas funcionava em regime multisseriado, isto é, todos os alunos de todas as séries nas salas de aula. E havia a lógica dos anexos, salas de aula improvisadas, alugadas, sem o mínimo padrão de qualidade.

salario_profs.jpgquant_profs.jpg

Aprender na floresta com a floresta

Já em 2005 entrou em ação o Programa Escola da Gente, que trabalhou para melhorar a qualidade do ensino-aprendizado a partir do tripé aluno-professor-infraestrutura, convivendo e aprendendo na floresta e com a floresta, respeitando a biodiversidade e leis da natureza. Depois de desapropriar uma área do centro da cidade que vivia às escuras, a prefeitura criou o Parque da Cidade e implantou ali educação ambiental na Escola do Parque, para as crianças das séries iniciais do ensino fundamental. Já os alunos do 6º ao 9º ano aprendem na Escola da Floresta práticas ambientais, manejo de horta, manutenção de apiário, ecossistemas florestais e fluviais, além do aprendizado na casa de farinha. A Escola da Floresta é uma parceria do Conselho Nacional dos Seringueiros com a prefeitura.

Em 2012, o modelo da “educação que liberta” deu mais um salto de qualidade. A prefeitura comprou uma área em Alter do Chão e criou no local a Escola do Campo, cujo ensino tem tudo a ver com a realidade amazônica e de convivência com a biodiversidade. Em tempo integral, crianças que moram no campo aprenderão, além da educação formal, técnica de horta, pomar, jardinagem. Também farão o inventário de todas as espécies de fauna e flora existentes, com o apoio de universidades federais. Por enquanto, há apenas uma turma com 35 alunos, dois de cada comunidade rural. Mas em agosto, quando ficarem prontas as oito salas de aula previstas no projeto em construção, serão 240.

Investimento no ensino a partir da infraestrutura Ronaldo Ferreira

Antes de partir para o campo, foi instalada em Santarém, na sede, a Escola de Tempo Integral Frei Fabiano Mers, que alia o aprendizado em sala de aula a atividades extracurriculares como reforço escolar, xadrez, teatro, dança, música, educação física e inglês. O resultado disso? No segundo ano de funcionamento, os alunos tiveram nada menos que 100% de aproveitamento, ou seja, zero de evasão. “A gente gasta muita gasolina, mas, se o aluno falta, vamos à casa dele”, diz a diretora Maria Estela Silva e Silva, uma entusiasta da educação em tempo integral.

Vanusa Oliveira de Lima, mãe de oito filhos que tem uma de suas crianças na escola em tempo integral a considera um grande acerto: “Quero ver se arranjo vaga para mais dois filhos, porque os professores tratam bem meu filho, que está aprendendo bem. Vai de manhã e só volta de tarde, já banhado, almoçado, lá tem merenda, farda e ele já sabe até inglês. É uma bênção essa escola”.

"Na cidade há mais seis unidades de ensino em construção e, dessas, há grande chance de termos mais duas em tempo integral”, informa o assessor especial Rivelino Lacerda Cardoso.

O rio é quem manda

A maioria dos quase 63 mil alunos da rede municipal hoje estuda nas áreas de rios, várzea e planalto, exigindo da gestão esforços redobrados para dar ensino de qualidade dentro da diversidade social e geográfica: quilombolas, indígenas, educação especial e, em determinadas épocas do ano, o município ter os rios como ruas.

É essa realidade dos rios, que enchem e vazam periodicamente, que leva Santarém a ter dois calendários letivos: o geral, que segue a regra de todo o Brasil, de fevereiro a dezembro, e o ditado pela realidade amazônica da cheia dos rios, que abrange as áreas de várzea e vai de agosto a abril, chegando inclusive a antecipá-lo para março.

Quando isso ocorre, os alunos passam a ter aulas de manhã e de tarde para cumprir o ano letivo. “Quem manda é o rio, e sabemos conviver com essa nossa realidade: mesmo que as águas levem a escola, como já aconteceu algumas vezes em que a terra desbarrancou, o ensino, a educação e a merenda precisam chegar a cada comunidade, a cada aluno”, diz a educadora Núbia Malcher. E complementa: “Nessas localidades, um grande desafio é formar professor na comunidade e ampliar o transporte escolar, pois há um período em que o aluno viaja nas bajaras, nos barcos e um tempo de carro, de bicicleta ou mesmo a pé. É preciso estar atento e ter políticas públicas também para esse tempo”.