Agora o país precisa de estruturas mais democráticas e participativas, de modo que toda a sociedade tenha acesso às informações e instâncias de governança
Agora o país precisa de estruturas mais democráticas e participativas, de modo que toda a sociedade tenha acesso às informações e instâncias de governança
A combinação de ação política entre os militantes do PT e os da CUT abriu o caminho para a eleição do primeiro presidente operário da história do Brasil, que mostrou ser capaz de superar momentos dificílimos na gestão da economia nacional, gerar empregos, garantir a participação dos trabalhadores na administração pública, realizar mais de trinta conferências nas quais todos os segmentos da sociedade tiveram o direito de apresentar e defender suas posições
Para muitos brasileiros e brasileiras, o primeiro voto na vida foi em Luiz Inácio Lula da Silva. Para os mais velhos, que construíram o PT, elegê-lo e reelegê-lo presidente da República e, depois, participar da campanha de Dilma Rousseff e conduzir a primeira mulher ao governo do país foram momentos de imensa alegria. Mas o que não tem preço foi ver Lula transformar-se no melhor presidente da história do Brasil!
Estamos falando de um país sem tradição democrática que, por quinhentos anos, relegou ao segundo plano os pobres, os negros, as mulheres, os migrantes nordestinos, os trabalhadores rurais e reprimiu violentamente todas as tentativas de organização da classe trabalhadora. Em 1964, quando os trabalhadores se organizavam em ligas camponesas e sindicatos, os militares foram chamados pelos conservadores da época, com o apoio dos Estados Unidos, para acabar com a tênue democracia existente. No final dos anos 1970, apesar da forte repressão, os trabalhadores e trabalhadoras reagiram, voltaram a se mobilizar e reconquistaram os sindicatos que estavam nas mãos dos pelegos e interventores. Em todo o Brasil, camponeses, operários, trabalhadores nos setores de serviços, funcionários públicos, jornalistas, profissionais liberais e professores universitários, enfim, todos passaram a exigir democracia e melhores condições de vida.
A esperança vence o medo
Nesse processo de mobilizações da sociedade civil, surgiu o PT – partido de massa, estruturado em todo o território nacional, com apoio internacional e em plena legalidade. A criação do Partido dos Trabalhadores deu início a uma nova era na organização dos(as) trabalhadores(as) brasileiros(as), que, quase paralelamente, há trinta anos, davam outro passo para a conquista de seus direitos históricos: fundavam a Central Única dos Trabalhadores (CUT). Pela primeira vez na história do Brasil se conformava nacionalmente uma central sindical, com atuação no campo e na cidade.
A combinação de ação política entre os militantes do PT e os da CUT possibilitou a eleição de novos(as) parlamentares, prefeitos(as) e governadores(as) do partido. Tanto o PT quanto Lula amadureciam, ganhavam experiência com campanhas e estratégias de marketing eleitorais. Estava aberto o caminho para a eleição do primeiro presidente operário da história do Brasil. E, finalmente, chegou 2002. O que a grande maioria não imaginava é que esse líder tivesse a capacidade de superar momentos dificílimos na gestão da economia nacional e ainda controlar a inflação, gerar mais empregos, garantir a participação dos trabalhadores em todas as áreas da administração pública, realizar mais de trinta conferências nas quais todos os segmentos da sociedade tiveram o direito de apresentar e defender suas posições.
Lula enfrentou as marolinhas e as tempestades financeiras, superou a guerra suja desencadeada por parte da imprensa brasileira. Apesar de toda a pressão conservadora, graças às políticas voltadas para beneficiar principalmente os segmentos mais pobres da sociedade, foi reeleito em 2006, fez um segundo mandato ainda melhor que o primeiro e, assim, credenciou-se para indicar uma mulher, sem experiência eleitoral, como candidata a sua sucessão na Presidência da República.
Lula terminou o segundo mandato com 80% de aprovação nas pesquisas de opinião. Como ele mesmo diz: “Nunca na história deste país um presidente da República acabou o mandato com tamanha aprovação”. Dilma, como presidenta do Brasil, vem dando continuidade ao governo Lula, até porque foi ministra fundamental em seu governo e essa convivência possibilita unir a capacidade do líder com a capacidade gestora.
Dez anos de governo do PT
Nestes dez anos de governo petista tivemos melhorias para os trabalhadores e trabalhadoras, entre as quais recuperação do poder de compra do salário mínimo, aumento real nas campanhas salariais, dignidade para os aposentados do campo e da cidade, o programa Luz para Todos, principalmente para as comunidades rurais, o Programa Minha Casa, Minha Vida, com quase 2 milhões de unidades construídas e entregues.
Outro destaque foi a grande distribuição de renda que alavancou mais de 40 milhões de pessoas que estavam nas faixas mais baixas da renda nacional. É importante ressaltar que houve redistribuição da renda e crescimento econômico permanente, ou seja, todos se beneficiaram. Nunca os banqueiros, as montadoras, os comerciantes e os agricultores ganharam tanto dinheiro na vida. Nunca a classe média viu seu poder aquisitivo melhorar tanto.
Mais importante ainda, do ponto de vista da formação do país, foi o grande investimento que os governos petistas fizeram em educação, ampliando o número de universidades públicas e escolas técnicas e possibilitando, por meio do programa Bolsa Família, que os filhos da população de baixa renda pudessem estudar. Não podemos deixar de citar o ProUni, que deu a milhões de jovens acesso às universidades.
Para completar o bom desempenho dos governos petistas, Lula, com sua liderança e simpatia, conseguiu trazer para o Brasil dois eventos de primeira grandeza: a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016.
Precisamos de estruturas mais democráticas e participativas
Mesmo sendo o melhor da história do Brasil, o governo poderia fazer mais algumas mudanças relevantes, em pelo menos cinco áreas de atuação:
1 – A estrutura sindical brasileira ainda está baseada na Consolidação das Leis de Trabalho (CLT). Tanto empresários quanto trabalhadores estão subordinados a uma estrutura sindical que depende do Ministério do Trabalho e é fiscalizada pelo Estado.
Não há plena liberdade de organização sindical, em função seja da ausência da organização por local de trabalho, seja pela existência do imposto sindical e do sistema “S”, que possibilitam dinheiro compulsório, mas retiram a plena liberdade de uso dos recursos. Por mais que Lula tenha autorizado uma reforma sindical, os setores conservadores do empresariado, dos pelegos e do Congresso Nacional foram contra, preferindo manter a estrutura atual.
2 – O conteúdo do ensino brasileiro continua omitindo as contribuições importantes dos negros, dos índios e dos trabalhadores. Pouco se ensina sobre cooperativismo, economia solidária e liberdade e organização dos trabalhadores. O ensino segue classista, do ponto de vista da hegemonia histórica da classe dominante nacional. É essencial que seja garantindo o ensino universal a toda a população, mas seu conteúdo é determinante para que tenhamos um país livre, competitivo e consciente de que todos são importantes, além de atuante no cenário internacional.
3 – Os poderes judiciários permanecem elitizados e conservadores. Este é um dos maiores problemas do Brasil. Pior do que as estruturas do Legislativo e do Executivo é o arcabouço jurídico do país. Essa herança monarquista precisa ser democratizada e passar a ter gestão compartilhada. A Justiça precisa estar a serviço de todos e ser para todos.
4 – Democratização dos meios de comunicação. Informação é poder. Além das reformas do conteúdo do sistema educacional e do Poder Judiciário, é mais do que necessária uma grande reforma nos meios de comunicação nacionais. Se na República Velha não era recomendável que uma mesma família fosse proprietária de rádios e jornais, no mundo moderno, integrado por computadores e em redes internacionais instantâneas, a democratização do acesso e do direito a informar e ser informado é condição imprescindível para que a sociedade possa ser reconhecida como democrática.
5 – Da democracia representativa para a democracia participativa. O Brasil permanece um país de grandes contradições. Pode ser considerado um dos mais democráticos do mundo, com eleições livres e liberdade de expressão. A imprensa pode criticar quem quiser e até caluniar os opositores, mas sem risco de ser julgada e condenada. Em um país mais sério, jamais uma revista de circulação semanal em todo o território nacional poderia caluniar tanto sem ser punida juridicamente.
Temos cerca de trinta partidos. Isso não é sinônimo de qualidade de representação. O voto ainda é obrigatório e os partidos funcionam, em boa parte, como legendas de aluguel. Precisamos de uma nova Constituição e de uma nova forma de representação parlamentar.
O Brasil moderno precisa ter estruturas mais democráticas e participativas, de modo a garantir que todos os segmentos da sociedade, incluindo as minorias, tenham acesso às informações e às instâncias de governança.
Como presidente da CUT, sou testemunha do sucesso desses dez anos de governo petista, mas quero lembrar aos companheiros e companheiras do partido que ainda há muito a ser feito. E, como cidadão brasileiro, quero dar um grande voto de confiança a Dilma, para que ela continue sua missão de fazer deste Brasil um país de uma enorme classe média, educada, culta, com renda, emprego decente e dignidade.
Vagner Freitas é presidente Nacional da Central Única dos Trabalhadores