Economia

Não comungamos com a tese ortodoxa de que o “inferno” (recessão e desemprego) é o único caminho para o “céu” (desenvolvimento e melhoria das condições sociais)

Preferimos a flexibilidade econômica, com balanceamento adequado do ajuste das contas públicas e da preservação do mínimo indispensável de crescimento e de políticas sociais, evitando a piora do quadro social. Ao contrário do discurso neoliberal, esse caminho, além de menos perverso, é também o mais rápido para o crescimento, graças à manutenção do potencial interno de consumo como base para a retomada da atividade econômica e dos empregos

Como reverter as expectativas pessimistas para 2016 e iniciar a recuperação econ

Como reverter as expectativas pessimistas para 2016 e iniciar a recuperação econômica. Ilustração: Michal Zacharzewski/Freeimages.com)

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Definitivamente, 2015 não foi bom para a economia brasileira. De janeiro a dezembro, o ambiente econômico piorou gradativamente ao longo do ano. A revisão periódica dos indicadores públicos e privados, quase sempre no sentido da piora destes, somada ao conturbado quadro político nacional explicam as expectativas pessimistas que se espraiaram entre os agentes econômicos em 2015. Incertezas quanto ao futuro e pessimismo tiveram o efeito de uma fila de pedras de dominó em queda: retração de investimentos, queda da produção, diminuição de consumo, redução de vendas, aumento do desemprego, contração da renda, retração de investimentos... Um círculo vicioso e descendente.

Neste artigo, apresentamos, na primeira parte, alguns dos principais indicadores da economia brasileira, que nos ajudam a traçar um quadro do que foi esse ano que, para usar uma expressão popular, deveria ser esquecido. Em seguida, fazemos algumas considerações sobre como o governo poderia reverter as expectativas também pessimistas para 2016 e iniciar um processo de recuperação de nossa economia. Nessa parte, recorremos a trechos de artigos anteriores de nossa autoria sobre o assunto.

De início cabe deixar claro nossa visão de que a crise econômica vivida em 2015 foi amplificada em grande medida pela crise política, em que pesem eventuais erros cometidos na condução da política econômica recente. E mais: infelizmente, embora derrotado nas urnas em 2014, o discurso da oposição, amplamente propagado à população, com forte apoio da mídia, quer fazer crer que a crise seria supostamente uma irresponsabilidade das políticas desenvolvimentistas implementadas nos últimos anos (desde o governo Lula) e da corrupção cometida “exclusivamente” nos governos petistas.

Fatores importantes como o cenário externo de desaceleração, a queda dos preços das commodities, o esgotamento do padrão de crescimento centrado no consumo interno e o excesso de desonerações tributárias, especialmente na forma de incentivos fiscais ao setor privado, são “esquecidos” ou minimizados por esse discurso. Entretanto, governo e economistas ligados ao atual modelo não conseguiram enfrentar os ataques vindos de várias frentes. Mais ainda: o governo, acuado pelo rápido agravamento dos indicadores no final de 2014 e pelo discurso do “cenário caótico”, viu-se na condição de dar resposta à crise por meio de uma política de ajuste fiscal draconiana, que agravou o cenário recessivo. Voltaremos a esse ponto mais adiante.

a) Economia internacional

As baixas taxas de crescimento das economias avançadas nos últimos anos são agora acompanhadas de um elemento adicional de dificuldades para o Brasil no período recente: a desaceleração do crescimento da China (cujas taxas de crescimento do PIB caíram de 9% ao ano em média para os atuais 6,5%), com reflexos no fluxo de comércio internacional e na redução dos preços das commodities (produtos primários com preços internacionais, como é o caso da soja e do minério de ferro). A recuperação dos EUA tarda em mostrar robustez, enquanto a Europa, exceto a Alemanha, patina e o mesmo ocorre no Japão. Por fim, nossos parceiros do Mercosul não apresentam desempenho animador. Esse quadro indica a necessidade de, além de apostar nas exportações, também reforçar o mercado interno para sairmos da recessão.

b) PIB e PIB per capita

No contexto de baixo crescimento das economias dos países avançados, a economia brasileira mostrou um encolhimento proporcionalmente ainda maior. O Produto Interno Bruto (PIB), que é o somatório econômico de toda a produção de bens e serviços realizada no país, deverá apresentar “crescimento negativo” superior a 3% em 2015. É como se toda a massa do “bolo” produzido no Brasil tivesse diminuído em 3% comparado a 2014. Esse resultado é o pior apresentado pelo Brasil nos últimos 25 anos. Em 1990, a queda foi de 4,35%.

Levantamento realizado pela Agência Rating mostra que, para 42 países que já divulgaram o resultado do PIB até o terceiro trimestre do ano, houve um crescimento médio de 3,1%. Portanto, bem acima do desempenho brasileiro. No grupo analisado, países da América do Sul como Peru e Chile tiveram performance também melhor que a nossa: 2,9% e 2,2%, respectivamente.

Como o PIB do Brasil cairá em torno de 3% e a população brasileira crescerá algo próximo de 1% em 2015, o país sofrerá uma queda em seu PIB per capita (por pessoa) superior a 4% no ano.

c) Nível de atividade por setor

Vejamos a retração da atividade por setor.

A indústria de transformação foi o setor a apresentar a maior queda em sua produção. De acordo com os indicadores do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no geral a produção industrial cairá em torno de 7,7% em 2015. Entretanto, visto por categoria de uso, a retração apresenta uma variação bastante grande: enquanto a indústria de bens intermediários deverá reduzir algo próximo a 4,5%, a indústria de bens de capital sofrerá retração de 24,2% e a de bens de consumo, queda de 9,5%. Entre os bens de consumo, a indústria de bens de consumo duráveis é a que apresentará maior queda, 17,2%, enquanto a de bens de consumo não duráveis terá diminuição da produção em 7,2%.

Essa recessão vivida pelo setor industrial pode ser medida também por outros indicadores, como o da utilização média da capacidade instalada, calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV). Em outubro de 2014, o grau médio de utilização da indústria de transformação brasileira era de 83,2%; um ano depois (outubro de 2015), o grau médio caiu para 77,7%.

A queda acentuada da produção do setor industrial – com especial destaque para as retrações das indústrias de bens de capital e de bens de consumo duráveis, como apontadas acima – é explicada pela forte queda dos investimentos e do consumo de itens de maior valor.

Especificamente em relação às inversões, setor público e setor privado literalmente “pisaram no freio”. Além da já mencionada queda da produção de bens de capital em 24,2%, o fenômeno da retração dos investimentos pode ser medido também pela queda das importações de bens de capital, em 18,5%, e pela retração da produção de insumos para a construção civil, em 12,3%.

Como o setor de serviços é fortemente dependente do nível de renda, também viveu retração em 2015. Até outubro, o IBGE calculava uma queda de 2,5% no nível de atividade desse setor. Especialistas estimam que, no ano como um todo, os serviços deverão cair em mais de 3,5%. E isso em praticamente todos os segmentos que o compõem: serviços profissionais, administrativos, complementares, entre outros.

Dos três setores de atividade (indústria, serviços e agropecuária), a agropecuária é a única que apresentará crescimento em 2015. De acordo com a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), a agropecuária deverá crescer 2,4% em 2015, em grande parte devido ao aumento do faturamento da pecuária. Também foram importantes as exportações do agronegócio, favorecidas pela desvalorização do real. As exportações de soja, milho e produtos florestais subiram em até 16%. Entretanto, o agronegócio continua a enfrentar a queda dos preços internacionais das commodities. Conforme informações veiculadas pela CNA, entre as dezessete culturas acompanhadas pela entidade, aumentaram o faturamento em 2015: cebola (116%), batata (16%), laranja (9%), café (4%), cana-de-açúcar (1%) e fumo (1%). Segundo a entidade, apenas café e batata ampliaram seu faturamento como resultado da elevação da cotação (respectivamente, 7% e 19%).

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d) Exportações, importações e saldo da balança comercial

A retração da atividade no Brasil não foi ainda pior porque o setor externo ajudou a reduzir o impacto negativo sobre essas variáveis. Esse foi um dos efeitos benéficos da expressiva desvalorização cambial em 2015.

A taxa R$/US$, que era de 2,6556 em janeiro de 2014, fechou o ano em 3,9017. Considerando-se junho de 1994 como índice 100, a taxa de câmbio real passou do índice de 96,7 em dezembro de 2014 para 121,1 em novembro de 2015. Por conseguinte, houve uma desvalorização efetiva de 24,4%. Em tese, uma desvalorização dessa natureza contribui para estimular as exportações e desestimular as importações.

No caso brasileiro, em 2015, o impacto positivo da desvalorização se deu, em realidade, na geração de saldo positivo na balança comercial brasileira (diferença entre exportações e importações), da ordem de US$ 19,7 bilhões (no acumulado do ano), contra um déficit de US$ 4,0 bilhões em 2014. Isso significa que houve um “deslocamento” de parte das importações pela produção nacional. O superávit de 2015 foi o maior desde 2011.

Entretanto, em termos de valores brutos, tanto as exportações quanto as importações caíram. A média diária das exportações foi de US$ 764,5 milhões, 14,1% abaixo da média diária registrada no ano anterior (US$ 889,7 milhões). Já a média diária das importações foi de US$ 685,8 milhões, desempenho 24,3% menor que o registrado em 2014 (US$ 905,7 milhões, em média, por dia útil). Esses números corroboram a retração do mercado externo para as commodities brasileiras, que avançaram 10% em quantidade, mas perderam 22% nos preços internacionais. Ao mesmo tempo, eles indicam a recessão e o encarecimento do dólar como fatores de queda das importações.

A melhora dos saldos comerciais do Brasil, graças à desvalorização cambial, pode ser um dos eixos de recuperação econômica. Entretanto, esses saldos comerciais não têm a mesma solidez da década passada, em virtude da redução das importações chinesas e da fraqueza econômica de outros nossos importantes parceiros comerciais

e) Emprego

A retração da atividade econômica, gerada pela redução dos investimentos, produção e consumo, refletiu-se na piora dos indicadores de emprego. De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego, o índice de nível de emprego formal no Brasil, em 2015, mostrou piora no total em cerca de 1,86%. Apenas o setor de serviços apresentou pequena expansão, com taxa positiva de 0,21%. Os setores de construção civil (-10,41%) e indústria de transformação (-4,68%) foram os que apresentaram maiores queda do nível de emprego formal. O comércio teve retração do nível de emprego em 0,28%.

A taxa de desemprego é outro indicador preocupante. A taxa de desemprego aberto, medida pelo IBGE em seis regiões metropolitanas do país (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife e Salvador), passou de 4,3% em média em dezembro de 2014 para 7,5% em novembro de 2015 (sendo 12,% em Salvador; 10,8% no Recife; 7,4% em São Paulo; 6,7% em Porto Alegre; 6,1% em Belo Horizonte; e 5,9% no Rio de Janeiro).

f) Inflação

Além do nível de atividade em recessão, a economia brasileira voltou a conviver, em 2015, com inflação anual acumulada superior a dois dígitos. Em 2015, o IPCA deverá registrar aproximadamente 10,7% de janeiro a dezembro. O acumulado da inflação não superava os dois dígitos desde 2002, quando o índice atingiu 12,53%. Em 2015, a alta expressiva de preços foi puxada pelos preços administrados (energia, água, telefone, combustível, tarifa de ônibus) e pelos serviços em geral.

O Brasil adota o sistema de metas de inflação. No início de 2015, o Banco Central almejava alcançar uma meta de 4,5% de inflação anual, com intervalo de tolerância de 2% para mais ou para menos. Portanto, para a autoridade monetária seria aceitável uma inflação em 2015 entre 2,5% e 6,5%. A provável taxa de 10,7% ao ano representará uma superação do teto da meta pela primeira vez desde 2003. Isso significa que, pelo mecanismo de funcionamento atual do sistema de metas, e mantendo-se a meta de 4,5% em 2016, o Banco Central deverá prosseguir com uma política monetária restritiva, baseada em juros altos e controle do crédito.

g) Consumo das famílias

Que efeitos imediatos esse quadro econômico negativo, de retração da atividade econômica e aumento dos preços, teve sobre as famílias?

O primeiro deles foi a retração do consumo. De acordo com o IBGE, o consumo das famílias, de janeiro a setembro, reduziu em 3%. Até mesmo as vendas dos supermercados tiveram retração de 1,6% no ano, tomando como base os dados da Abras, Fecom-RJ e Fecom-MG.

Infelizmente, porém, o empobrecimento das famílias é ainda maior que a queda do PIB per capita (por pessoa) porque os entes das esferas governamentais (união, estados e municípios), diante da crise fiscal, passam a buscar parcelas ainda maiores do PIB, na forma do aumento da carga tributária.

Registrem-se ainda a redução na poupança e o crescimento do endividamento e da inadimplência das famílias. No Brasil, informações do Banco Central apontam que em setembro de 2015 o percentual de cheques devolvidos por insuficiência de fundos / cheques compensados foi de 7,2%, contra 5,9% em setembro de 2014. Ressalve-se que este indicador de 7,2% é médio. O percentual é mais elevado em regiões como o Nordeste, Norte e Centro-Oeste.

h) Finanças públicas

O primeiro indicador importante é o resultado primário, que representa a economia de recursos arrecadados pelo governo para pagar o serviço da dívida pública. Considerando o setor público consolidado, isto é, a União, os estados e os municípios, o resultado primário acumulado no ano foi deficitário em R$ 20 bilhões até outubro de 2015, ante déficit de R$ 11,6 bilhões no mesmo período de 2014. No acumulado em doze meses (nov./2014 a out./2015), registrou-se déficit primário de R$ 40,9 bilhões (0,71% do PIB), comparativamente a déficit de R$ 25,7 bilhões (0,45% do PIB) em setembro.

No acumulado no ano, os juros nominais alcançaram R$ 426,2 bilhões, comparativamente a R$ 230,7 bilhões no mesmo período do ano anterior. Esse aumento está relacionado à elevação da taxa Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom). Essa taxa é a que o governo paga aos detentores de títulos da dívida pública. Em doze meses, os juros nominais (isto é, sem considerar a inflação) atingiram R$ 506,9 bilhões (8,79% do PIB). O aumento da taxa Selic é a principal – na verdade, quase a única – medida de combate à inflação em uso pelo governo. Dessa forma, são transferidos recursos vultosos do orçamento público, financiado por todos os contribuintes de impostos (pessoas físicas e jurídicas), aos possuidores de títulos públicos, que constituem uma camada restrita da sociedade, parte deles no exterior.

O volume dos juros tem excedido a reserva de recursos para o seu pagamento, por meio do superávit primário. Assim, parte dos juros é capitalizada, isto é, transforma-se em nova dívida. Isso pode ser observado no desempenho do resultado nominal, que inclui o resultado primário e os juros nominais apropriados. Em 2015, até outubro, o déficit nominal totalizou R$ 446,2 bilhões, comparativamente ao déficit de R$ 242,2 bilhões no mesmo período de 2014. No acumulado em doze meses, o resultado nominal registrou déficit de R$ 547,9 bilhões (9,50% do PIB) (informações extraídas do site do Banco Central).

Vale ressaltar que até novembro, em termos reais (isto é, descontada a inflação), a arrecadação total do governo federal, tomada isoladamente, registrou redução de 6,6%, explicada principalmente pela evolução dos indicadores macroeconômicos relevantes para arrecadação de tributos, desonerações tributárias, compensações tributárias e queda na receita de dividendos. As despesas totais no acumulado do ano em termos reais apresentaram redução de 3,4%, especialmente as despesas de custeio e capital (informações extraídas do site do Tesouro Federal). A queda da arrecadação expressa claramente o impacto da recessão. Por sua vez, as despesas, mesmo sofrendo também os efeitos da economia em queda, são mais rígidas, em virtude dos gastos obrigatórios do governo, determinados por lei, e pelos compromissos do governo com políticas sociais como o aumento real do salário mínimo e o Programa Bolsa Família.

Como resultado dessa trajetória das receitas e despesas, a dívida pública tem sofrido uma piora, embora não atinja as proporções dramáticas que alguns anunciadores de catástrofes têm alardeado. A dívida líquida do setor público (DLSP) alcançou R$ 1.972,5 bilhões em outubro, o que representa 34,2% do PIB – taxa muito inferior à de muitos países desenvolvidos e muitos países de renda intermediária, mesma classificação do Brasil.

No ano, a relação DLSP/PIB, que relaciona a dívida com a riqueza produzida, elevou-se 0,1 ponto percentual (p.p.), o que é uma notícia negativa, mas de pequena expressão. Ela foi influenciada pela incorporação de juros (+7,4 p.p.), isto é, a parcela de juros não paga e capitalizada (somada à dívida preexistente); pelo déficit primário (+0,3 p.p.); pelo impacto da desvalorização cambial acumulada de 45,3% no período (-6,4 p.p.) – em vista do fato de parte da dívida pública ser externa; pelo efeito do decréscimo do PIB nominal (-1,5 p.p.); e por um fator residual (informações extraídas do site do Banco Central).

Caberá ao governo, agora que alterou o comando da economia, definir uma estratégia que, ao mesmo tempo, melhore o resultado das contas públicas, preserve os programas sociais essenciais e permita criar condições para o investimento público. O consumo e o investimento, combinados com uma gestão fiscal prudente e eficaz, têm maior capacidade de ajustar as finanças públicas em um círculo virtuoso do que o uso intensivo da recessão como instrumento de ajuste, que leva a atividade econômica, o emprego e as expectativas sociais a percorrerem uma espiral descendente. Para que essa estratégia seja bem-sucedida, é necessário produzir uma reversão das expectativas negativas da sociedade, para a qual contribuíram tanto o catastrofismo da mídia quanto as conspirações golpistas e sua propaganda nas redes sociais.

Grupos econômicos que seriam favorecidos pelas políticas mais recessivas, ou que esperam tirar mais proveito se os derrotados de ontem assumirem o poder por meio do “golpe paraguaio” – cuja tentativa arrefeceu, mas não morreu –, estiveram por trás de algumas das manobras e manifestações nesse sentido. Evidentemente, parte do desempenho negativo tem suas próprias razões, explicadas aqui sinteticamente, mas os fatores mencionados acima amplificaram muito o seu impacto.

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i) Reservas cambiais

O Brasil teve seu crescimento recente assentado, em parte, na exportação de commodities, que permitiram uma inédita folga na posição cambial do país, com reservas em moeda forte superiores a US$ 360 bilhões em 2014. Essas reservas cobrem toda a dívida externa brasileira e ainda dão uma folga, estimada pelo Banco Central em US$ 46,8 bilhões em setembro de 2015. Essa folga já foi maior: ao final de 2014, era de US$ 94,4 bilhões.

O país continua em situação “tranquila” neste aspecto, mas os números mostram uma piora. A valorização do real em relação ao dólar, ocorrida até 2013, prejudicou nossas exportações e fez aumentarem as importações, causando dificuldades tanto às empresas exportadoras quanto àquelas voltadas ao mercado interno, assediadas por importações mais baratas. O cenário mudou em 2014, desde que o dólar voltou a se valorizar. Em consequência, como já dito, o saldo do comércio exterior melhorou no ano que se encerra, apesar das condições mundiais desfavoráveis.

j) Crise política, Operação Lava-Jato e crise econômica

Não é objetivo deste artigo tratar da crise política. Aqui cabe apenas registrar que ela foi, sem dúvida, fator importante no agravamento da crise econômica. Entre outros motivos, porque ficou bem clara, ao longo de todo o ano, a grande dificuldade do governo em aprovar qualquer projeto seu no Congresso Nacional, no atual quadro de correlação de forças. Uma visão rápida do ano mostra o seguinte: a derrota do candidato do governo (Arlindo Chinaglia, PT-SP) para o candidato Eduardo Cunha (PMDB-RJ) nas eleições à Presidência da Câmara; a derrota do governo na votação do Projeto de Lei da Terceirização (PL nº 4330/04), com a não inclusão por Eduardo Cunha das propostas apresentadas pelo Palácio do Planalto; a retomada da “PEC da Bengala” e a extensão da nova regra da idade mínima da aposentadoria do Judiciário para todos os servidores; a derrota na votação da maioridade penal, após manobra do presidente da Câmara Eduardo Cunha (que, após perder a votação, colocou o projeto em votação novamente no dia seguinte); a derrota do governo no PL nº 5069, de autoria de Eduardo Cunha, que dificulta o aborto após estupro; a abertura de processo de impeachment da presidenta Dilma. É como se, em 2015, o país vivesse uma espécie de “terceiro turno”, após o acirrado segundo turno ocorrido nas eleições para a Presidência da República, em 2014.

Esse quadro de embate entre governo e frações importantes do Congresso Nacional, inclusive com membros que supostamente fariam parte de sua base aliada, somou-se ao bombardeio de informações quase diárias provenientes da Operação Lava-Jato da Polícia Federal, com divulgação e investigação de lista de políticos suspeitos de envolvimento com esquema de corrupção na Petrobras. Evidentemente, a crise política no Congresso e a crise gerada pelas consequências da Lava-Jato se mesclaram profundamente. O próprio presidente da Câmara, Eduardo Cunha, é um dos suspeitos de ser beneficiário de esquema de corrupção na Petrobras e o Conselho de Ética da Câmara discute a cassação de seu mandato de deputado.

Sem entrar no mérito da Operação Lava-Jato, o fato é que ela também contribuiu para aprofundar a crise econômica. Grandes empreiteiras do país tiveram membros da sua mais alta direção investigados, e alguns presos. Além da escassez de recursos, muitas obras públicas em andamento ou em processo de tramitação no país foram paralisadas, diante desse quadro de incertezas. Em dezembro, a presidenta Dilma editou medida provisória para acelerar acordos de leniência com empresas investigadas em casos de corrupção.

Nesse ambiente de conflito acirrado entre Executivo e Legislativo e de permanente fluxo de novas informações da Lava-Jato, o governo enfrentou grandes dificuldades de tramitação, no Congresso, de sua proposta de ajuste fiscal. Na prática, as principais medidas tiveram suas decisões adiadas para 2016, tais como a da reintrodução da CPMF; dos novos impostos sobre bebidas, produtos de informática e venda de imóveis; a prorrogação e ampliação das Desvinculações sobre Receitas da União (DRU); as novas regras para pagamento de cobrança de débitos tributários, entre outras.
Vale registrar também que, fora do Congresso, o forte ajuste fiscal proposto pelo governo sofreu, evidentemente, críticas dos diversos setores da sociedade brasileira, mas as motivações foram distintas. Entidades como a CUT criticam o formato recessivo do ajuste e defendem a necessidade de uma reforma tributária que leve a maior justiça social. Por outro lado, o sistema Fiesp-Ciesp e outras entidades patronais, com campanhas como “Eu não vou pagar o pato”, centram suas críticas exclusivamente sobre a carga tributária, ao mesmo tempo que, paradoxalmente, pedem maiores investimentos públicos em infraestrutura. Esse tipo de visão elitista sobre a questão tributária levou, por exemplo, a Fiesp a posicionar-se contra a inédita e avançada política do IPTU Progressivo defendida pelo prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, em 2013.

Outra consequência importante da combinação explosiva da crise política com a crise econômica foi o rebaixamento da nota do Brasil pelas principais agências internacionais de avaliação de risco de investimentos estrangeiros nos países. Em setembro, a Standard and Poors, uma das três grandes (as outras duas são a Fitch Rating e a Moody’s), anunciou que a nota do Brasil cairia de “BBB-” para “BB+”, com viés negativo. O fundamental é que a nota dessas agências é uma espécie de “selo” que garante ao país em questão a qualidade de bom pagador de seus débitos. Em outras palavras, a nota orienta os investidores internacionais em seus investimentos no exterior. Quanto melhor a nota, menor o risco de calote no pagamento dos títulos adquiridos em cada país.

Se a nota do país é rebaixada, alguns fundos internacionais não podem, pelas leis e regulamentos dos países dos investidores, aplicar dinheiro nos títulos do país em questão. É possível também uma espécie de “fuga” de investimentos já aplicados no país. Menos entradas e maiores saídas de capitais significam também pressões permanentes sobre o preço do dólar, que deve permanecer em patamares altos no próximo período. É o que acontece com o Brasil neste momento.

No rebaixamento da nota do Brasil, a S&P alegou a grande dificuldade do governo em aprovar proposta consistente de orçamento no Congresso, capaz de, em última instância, garantir o equilíbrio das contas públicas (e, por essa via, o compromisso com o pagamento dos títulos públicos).

O Brasil havia adquirido uma nota alta (“grau de investimento”) pela S&P e Fitch Rating em 2008, e pela Moody’s em 2009.

Caminhos alternativos para 2016

As consultorias financeiras costumam divulgar regularmente os seus cenários e as suas projeções econômicas. Há certa homogeneidade em relação às perspectivas para 2016. Em grandes números, projetam-se: uma retração do PIB do Brasil entre 2,5% e 3%; inflação (IPCA) em torno de 7%; taxa de juros Selic entre 12% e 16,5%; taxa de câmbio (R$/US$) entre 4,2 e 4,4; exportações anuais subindo para US$ 209 bilhões; importações mantendo-se em torno do mesmo patamar de 2015 (US$ 170 bilhões); aumento do saldo da balança comercial para US$ 36 bilhões (contra os US$ 19,7 bilhões de 2015); resultado primário do governo negativo em 0,9% (contra -2,1 % em 2015); dívida líquida do setor público passando a 36,2% do PIB (contra 33,7% em 2015). Por conseguinte, trata-se de um cenário ainda recessivo para a economia brasileira.

Mas não nos consideramos neutros nessa história. Somos todos atores políticos participantes de um processo histórico. Nesse sentido, ousamos apresentar alguns caminhos alternativos que poderiam ser trilhados com o objetivo de recolocar o Brasil na rota do desenvolvimento. Para isso, sintetizamos o diagnóstico da última década e apontamos saídas viáveis.

No Brasil de hoje, o avanço dos direitos sociais desde a "Constituição cidadã" de 1988 e mais ainda as conquistas sociais nos últimos doze anos (2003-2015) não eliminaram a necessidade de prosseguir a luta pela inclusão social. Esses avanços e conquistas do período recente trouxeram ao primeiro plano as demandas de segmentos desde sempre marginalizados, massacrados ou discriminados: negros, mulheres, minorias sexuais, povos indígenas. O Brasil precisa retomar o desenvolvimento, readquirido nas gestões do presidente Lula (2003-2010), após o longo domínio de políticas neoliberais do período FHC (1995-2002). Isso somente ocorrerá se a presidenta Dilma recolocar na ordem do dia uma agenda positiva de crescimento, que traga otimismo e unidade mínima entre as várias frações da sociedade brasileira.

O período que vai de 2003 a 2014 teve o PT como partido principal na condução da economia do país. Não é objeto deste artigo tratar dos erros cometidos nesse processo. O objetivo é destacar que houve de fato um processo de inclusão das camadas mais pobres, por meio de programas como a política de valorização do salário mínimo, o Programa Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, a construção de um milhão de cisternas no Nordeste, o Prouni, a ampliação do Fies e a utilização do Enem nas universidades públicas, entre outros. Associado à vigorosa expansão do emprego (em contraste com os 20 anos anteriores) e também à forte ampliação da rede de escolas técnicas federais e universidades públicas, essas políticas geraram um grande mercado consumidor interno, redução da pobreza, ampliação das oportunidades socioprofissionais e queda na desigualdade. Expressão maior desse processo foi a exclusão do Brasil do Mapa da Fome no Mundo em 2014, motivo de orgulho para todos os brasileiros.

O crescimento econômico, a expansão dos negócios e a geração de lucros em geral foram decisivos para reduzir as críticas da elite brasileira a essas políticas de inclusão social das camadas mais pobres. No entanto, quando, nos últimos dois anos, o país passou a enfrentar reduções na taxa de crescimento e, mais recentemente, taxas negativas do PIB, as críticas voltaram com força. A insatisfação das elites com as políticas de inclusão está estampada nas manifestações e nas redes sociais, bem como nos veículos de comunicação controlados pelo oligopólio da mídia, sempre hostil àquelas políticas e aos governantes que as implantaram.

Na atualidade, a elite empresarial não é homogênea. Parte dela valoriza os avanços sociais e compreende a insustentabilidade de uma sociedade em que o fosso entre ricos e pobres se amplia, como era o Brasil até 2002, com raras exceções em sua história. Uma parcela ainda expressiva desse segmento social não simpatiza com os avanços, mas não expressa diretamente seus preconceitos. Uma minoria se exprime por meio de falsa indignação moral – falsa porque é seletiva e porque poupa notórios corruptos e atos de corrupção de políticos não pertencentes ao PT – ou por meio do financiamento a grupos agressivos, defensores de golpes institucionais ou militares, como faz o principal integrante brasileiro da lista de bilionários da revista Forbes.

Assim, as manifestações mais explícitas de inconformismo com a ascensão social dos pobres acabam ficando por conta de membros da elite mais em evidência por suas posições de prestígio no meio acadêmico, artístico ou jornalístico. Três exemplos: a comparação pejorativa entre aeroporto e rodoviária por uma diretora da PUC-RJ, endossada por outros colegas de docência; a reclamação de colunista de tradicional jornal paulista sobre a “perda da graça” de viajar a Nova York ou Paris, dada a possibilidade de se encontrar com o porteiro de seu prédio; ou recente postagem de conhecido autor de novelas globais contra a nova classe média motorizada da era Lula.

É possível concluir, a partir de breves observações sobre o comportamento da elite brasileira, que:

• o crescimento é condição essencial para a realização de políticas que visem reduzir a pobreza e a desigualdade no Brasil;

• é importante institucionalizar (muitas vezes isso significa transformar em lei) as conquistas sociais alcançadas, com vistas à colocação de travas a eventuais retrocessos em função da conjuntura econômica ou de mudanças na composição política dos governos;

• é essencial resgatar e rememorar com frequência as transformações recentes, especialmente para os mais jovens, que não vivenciaram os períodos de desemprego em massa e elevada exclusão social e inclusive acadêmica, estimulando a valorização dessas conquistas pela sociedade, para além de preferências partidárias;

• é premente a necessidade de evitar retrocessos sociais em função de ajustes econômicos.

Posto isso, cabe tecer agora algumas possibilidades para a retomada do crescimento do setor industrial, especialmente porque, como vimos, este foi o setor mais atingido pela crise de 2015.

Em uma conjuntura em que a política econômica considera como “dada” a necessidade premente da elevação de tributos, manutenção de juros altos, elevação das tarifas públicas e redução dos investimentos públicos, há um estreitamento das políticas possíveis. Salvo no caso em que explicitamente se pretenda utilizar a política industrial como instrumento “anticíclico” de combate à recessão e de retomada do crescimento, essa política tem dificuldades de conviver com uma economia desaquecida e em processo de ajuste fiscal.

Não é nossa intenção entrar no debate sobre o ajuste fiscal. Temos, sim, ponderações quanto ao tamanho e forma do ajuste em curso. Este artigo é escrito em momento de mudança no comando da economia, em que o novo titular da Fazenda reafirma a necessidade do ajuste, mas, por outro lado, é visto como adepto do desenvolvimentismo e mais afinado com as ideias da presidenta Dilma. Consideramos pragmaticamente que as linhas gerais do ajuste serão mantidas, mas poderá haver certa flexibilidade para evitar o aprofundamento da recessão e o sacrifício das políticas sociais mais estruturantes. Acreditamos que, ainda assim, isso não significa que não se pode fazer nada em termos de política industrial. Entendemos que, nesse cenário, a política industrial deve buscar o “diálogo” com a política econômica, que é a do ajuste fiscal.

Assim, um dos itens prioritários deveria ser aprofundar ao extremo a estratégia de incremento das exportações e de substituição de importações (nacionalização de produtos completos, componentes e partes), tendo em conta que a melhoria do balanço de pagamentos também é uma das prioridades atuais do governo.

A desvalorização do câmbio certamente é um dos instrumentos mais importantes para atingir esses objetivos em relação ao comércio exterior. Mas não é o único. A ousadia de inovar é bem-vinda nessa área. Entendemos que a adoção da experiência do câmbio múltiplo deveria ser tentada. O Brasil já viveu, com relativo sucesso, essa prática na década de 1950.

O câmbio múltiplo estabelece valores distintos para a compra do dólar de acordo com a essencialidade do produto e as metas a serem atingidas. Ele permite uma utilização mais “cirúrgica” do câmbio como ferramenta de política industrial.

Retomar, sob a coordenação do governo, as câmaras setoriais (com a participação de entidades representativas de empresários, de trabalhadores e de outras instituições, como as universidades e centros de pesquisa), para discutir essa estratégia de aprofundamento do comércio exterior brasileiro, faz parte também do conjunto de medidas da política industrial em tempos de crise. Discutir com profundidade as ações em ambas as direções (incremento de exportações e substituição de importações) pode gerar uma profícua e duradoura pauta de competitividade nacional dialogada entre os atores envolvidos.

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[nextpage title="p4" ]É preciso ousar também no campo tributário. Uma possibilidade – já mencionada em artigo anterior de nossa autoria – é “abrir” o leque dos impostos indiretos, de forma que os produtos e serviços consumidos pelas camadas sociais mais ricas da população sejam mais taxados, ao passo que os produtos e serviços da população de menor renda tenham suas alíquotas mantidas baixas ou até mesmo reduzidas.É essencial realizar estudos que analisem, setor a setor, essa possibilidade. Sabe-se que os produtos e serviços das camadas mais ricas são menos sensíveis ao aumento de impostos. Assim, por exemplo, poder-se-ia estudar a viabilidade de, no segmento automobilístico, aumentar a tributação dos veículos mais luxuosos, ao passo que se manteriam ou até mesmo se reduziriam as alíquotas tributárias sobre os veículos mais básicos. Caberia investigar os efeitos de uma política desse tipo sobre a arrecadação. O sucesso de uma ação dessa natureza, nesse e em outros setores, poderia ser importante para a retomada da produção e do emprego, sem que isso representasse uma política contraditória com o ajuste fiscal.

De outro lado, somos favoráveis à proposta que acaba de ser apresentada pela bancada do PT na Câmara Federal, de maior progressividade nas alíquotas do IRPF e restabelecimento da tributação sobre lucros e dividendos, cuja isenção desde o governo FHC nos deixa na incômoda companhia exclusiva da Estônia, entre os países da OCDE. Em momento em que até o Fundo Monetário Internacional (FMI), em estudo divulgado em junho de 2015, contesta o benefício econômico do alívio tributário aos mais ricos, tão caro aos argumentos neoliberais, não é cabível pensar um ajuste fiscal que perpetue as injustiças tributárias até hoje inalteradas.

Diante do agravamento da crise e da elevação da taxa de desemprego, a política industrial deve também ter como meta a manutenção e geração de empregos. Assim, além de apoiar a adoção de programas como o Programa de Proteção ao Emprego (PPE) antes de qualquer demissão massiva, a política industrial deve cobrar que as empresas beneficiárias se comprometam com a preservação e ampliação de empregos.

As políticas de crédito das instituições financeiras públicas (como o BNDES) devem estar associadas à fixação de metas de emprego por parte das empresas beneficiárias dos financiamentos.

Ainda visando a geração de postos de trabalho, o governo poderia enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei alterando, por tempo determinado, a lei de licitações (Lei nº 8666), de modo a constituir um percentual mínimo obrigatório de compras governamentais destinado às empresas instaladas no país, sejam nacionais ou estrangeiras. Trata-se de uma margem de preferência, com tempo determinado, para a produção nacional.

Por fim, um dos pontos estruturais de “estrangulamento” da economia brasileira reside na dissociação entre instituições financeiras privadas e crédito ao setor industrial. A expansão dos lucros dos bancos não pode se dar “descolada” do fortalecimento da indústria. Não cabe apenas ao BNDES apoiar o setor industrial. Esta também deve ser uma tarefa obrigatória dos bancos comerciais privados. É fundamental estabelecer as regras do crédito dirigido para apoio ao setor industrial.

As diretrizes de políticas apontadas brevemente neste artigo não resolverão sozinhas os graves problemas atuais da economia brasileira. Elas podem, no entanto, ajudar a criar um horizonte de saída para a crise sem afetar a estratégia austera da atual política econômica. E permitem abrir o debate sobre um conjunto mais robusto de medidas que combinem o ajuste fiscal e a retomada do crescimento. Para tanto, é essencial uma flexibilidade da equipe que conduz a política econômica, o que torna auspiciosa a indicação do ministro Nelson Barbosa, que já se mostrou cioso da responsabilidade fiscal, sem se deixar escravizar aos férreos princípios de uma ortodoxia monetarista.

Como evidenciado ao longo de todo o artigo (e dos anteriores de nossa autoria), não comungamos com a tese ortodoxa de que o “inferno” (recessão e desemprego) é o único caminho para o “céu” (desenvolvimento e melhoria das condições sociais). Preferimos a flexibilidade econômica, com balanceamento adequado do ajuste das contas públicas e da preservação do mínimo indispensável de crescimento e de políticas sociais, evitando a piora do quadro social. Ao contrário do discurso neoliberal, esse caminho por nós defendido, além de menos perverso, é também o mais rápido para o crescimento, graças à manutenção do potencial interno de consumo como base para a retomada da atividade econômica e dos empregos, ainda mais em vista das limitações do mercado externo neste momento. E, mesmo muito tardio, é bem-vindo o estudo do FMI citado, em que os autores sugerem que, em vez de concentrar esforços em medidas de austeridade, cujos efeitos prejudicam os setores mais vulneráveis da sociedade, o caminho para o mundo voltar a crescer estaria nas mãos dos pobres e da classe média, cuja privação da capacidade de consumirem afeta o consumo, o que resulta em um baixo crescimento econômico.

Adotado esse caminho, assim que retomado o crescimento, será necessário prosseguir nos avanços sociais e na redução das desigualdades, tendo em vista que o passivo social acumulado ao longo de cinco séculos apenas começou a ser enfrentado. Ainda temos um longo caminho a percorrer nessa direção.
Referências

CONCEIÇÃO, Jefferson José da; ANAV, Roberto Vital. “JK e o exemplo de como virar a página”. ABCDMaior, 26/10/2015. Disponível em  http://www.abcdmaior.com.br/materias/blogs/jk-e-o-exemplo-de-como-virar-a-pagina

______.;______. “O combate dos de cima quando os de baixo, por direito, sobem”. ABCDMaior, 3/11/2015. Disponível em: http://www.abcdmaior.com.br/materias/blogs/o-combate-dos-de-cima-quando-os-de-baixo-por-direito-sobem

CONCEIÇÃO, Jefferson José da. “Propostas para uma política industrial em tempos de crise”. ABCDMaior, 10/11/2015. Disponível em: http://www.abcdmaior.com.br/materias/blogs/propostas-para-uma-politica-industrial-em-tempos-de-crise

______. “Sete erros capitais da Fiesp com o impeachment”. ABCDMaior, 21/12/2015. Disponível em: http://www.abcdmaior.com.br/materias/blogs/sete-erros-capitais-da-fiesp-com-o-impeachment

Jefferson José da Conceição é professor doutor na Universidade Municipal de São Caetano do Sul ([email protected])

Roberto Vital Anav é professor mestre na Universidade Municipal de São Caetano do Sul e doutorando na UFABC ([email protected]). Ambos, juntamente com Nilza de Oliveira e Jeroen Klink, são autores do livro A Cidade Desenvolvimentista: crescimento e diálogo social em São Bernardo, 2009-2015, lançado em dezembro de 2015 pela Fundação Perseu Abramo.

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