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A confusão entre os conceitos tem alimentado o debate acirrado sobre o corte de investimentos no ensino superior, mas os cálculos mostram que o perfil dos estudantes destas instituições não é privilegiado em termos econômicos

As universidades federais constituíam-se, em 2017, de um conjunto de 63 instituições presentes em todo o país e que desempenham um importante papel de desenvolver atividades em todo o território nacional. Foto: Mídia Ninja/Facebook

As universidades federais constituíam-se, em 2017, de um conjunto de 63 instituições presentes em todo o país. Foto: Mídia Ninja/Facebook

É recorrente na discussão do financiamento das universidades federais brasileiras (UFs) a presença de uma “confusão” entre gasto anual por aluno e custo anual do aluno. Em momentos muito recentes dois documentos importantes abordaram novamente essa discussão.

O Grupo Banco Mundial divulgou em novembro de 2017 o texto “Um ajuste justo: análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil”, que em um de seus capítulos trata da educação brasileira e, em especial, do seu financiamento. O título do capítulo é: “Gastar mais ou melhor? Eficiência e equidade da educação pública”, e num dos trechos afirma: “Além do mais, alunos das universidades públicas brasileiras em média custam de duas a três vezes mais do que alunos matriculados em universidades privadas” (BM, p.123, 2017).

O documento “Manifesto à nação: o Brasil para os brasileiros”, divulgado pela Frente Parlamentar Evangélica (FPE) em 24 de outubro de 2018, assinado por 180 deputados federais, se baseia no documento do Banco Mundial para reforçar a mesma afirmação: “Os alunos nas universidades públicas custam, em média, duas a três vezes mais do que os alunos matriculados nas universidades privadas” (FPE, 2018, p. 58).

O documento do Banco Mundial carrega a força de um organismo multilateral que possui a tradição da emissão de documentos/relatórios que sinalizam ações a serem implementadas em países considerados “pobres” ou “em desenvolvimento”, que é o caso do Brasil.

Por sua vez, documento da bancada evangélica no Congresso Nacional foi assinado por 180 parlamentares que apoiam o governo Bolsonaro. Deve-se ressaltar que esse documento adotou integralmente aquele do Banco Mundial, já referenciado, para efetivar diversas propostas para a área educacional. As referências feitas nesses documentos dizem respeito ao gasto anual por aluno ou ao custo anual do aluno? Qual a diferença entre eles?

Concatenada à “confusão” existente entre esses dois conceitos acoplam-se alguns mitos: o custo do aluno das UFs é muito maior do que aqueles de instituições de educação superior privadas; o perfil socioeconômico dos estudantes das UFs é composto por pessoas que se originam de famílias mais ricas da sociedade; a maioria dos estudantes estudou em escolas privadas de ensino médio; os recursos financeiros aplicados nas UFs, se diminuídos, poderiam melhorar muito a educação básica.

A apresentação de outros mitos existentes sobre o financiamento da educação brasileira e que merecem análises completas e detalhadas foge ao escopo desse estudo. Nos deteremos aqui com mais detalhes à explicitação da diferença entre gasto anual por aluno e custo anual do aluno e dos mitos que foram explicitados. Faremos o cálculo do custo dos alunos das UFs nos anos de 2005 e 2017, dois anos importantes, pois o ano de 2005 é aquele imediatamente anterior ao início das expansões propiciadas por programas governamentais, o primeiro iniciado em 2006 com a expansão dos campi existentes no interior dos estados, e o segundo, o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), lançado em 2007, e o ano de 2017, último ano em que se encontra disponível o Censo da Educação Superior e que também já apresenta repercussões da vigência da Emenda Constitucional no 95 aprovada em 2016, que congelou as despesas primárias do Poder Executivo até 2036 (BRASIL. EC 95, 2016).

Iremos, em primeiro lugar, explicitar a diferença entre gasto por aluno e custo do aluno e apresentar uma metodologia que foi desenvolvida para efetivar o cálculo do custo médio anual do aluno. Em seguida, serão apresentadas as informações que serão utilizadas para o cálculo do custo nos anos de 2005 e 2017, aplicando-se a modelagem para a obtenção do custo médio do aluno das universidades federais. Finalmente, nas considerações finais serão discutidos os mitos que associamos a essa temática.

O gasto anual por aluno e o custo anual do aluno

É preciso estar atento à diferença entre o gasto anual por aluno e o custo anual do aluno. O gasto por aluno é obtido simplesmente dividindo-se o volume total de recursos financeiros aplicados nas instituições de educação superior em um determinado ano e o número de estudantes matriculados naquele ano. A Organização para a Coordenação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulga esse indicador e a tabela 1 mostra os seus valores para o Brasil e países selecionados, membros da OCDE.

Verifica-se que o Brasil possui um gasto anual por aluno na educação superior de US$/PPC 13.540,00, que está abaixo do valor médio dos países membros da OCDE, de US$/PPC 15.772,00. Entretanto, há países que aplicam valores bem mais elevados que o valor médio: Austrália (US$/PPC 18.337,00), Canadá (US$/PPP 21.458,00), Japão (US$/PPC 17.883,00), Noruega (US$/PPC 20.379,00), Suíça (US$/PPC 25.744,00) e EUA (US$/PPC 27.924,00).

Há, entretanto, que se tomar muita cautela com essas comparações internacionais e, nesse caso em especial, é preciso perguntar sobre a estrutura orçamentária nos diversos países, uma vez que as UFs brasileiras possuem hospitais, museus, orquestras, rádios, televisões, fazendas, centros de eventos, aposentados e pensionistas nas folhas de pagamento etc. Corre-se o risco de se efetivar comparações indevidas entre os países (SHEEHAN, 1996, p. 25).

Além disso, as UFs realizam intensa atividade de pesquisa e extensão, e também atividades de ensino. Considerando o montante de recursos alocados para o financiamento das atividades de ensino, pesquisa e extensão das UFs, qual seria então o custo anual do aluno, que está relacionado especificamente às atividades de ensino, devendo-se excluir o financiamento das atividades de pesquisa ou extensão?

O valor do custo anual do aluno discutido neste estudo se refere a um custo médio anual, considerando-se o total de estudantes de graduação e de pós-graduação stricto sensu, utilizando-se as informações do Censo da Educação Superior divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e os dados da pós-graduação stricto sensu divulgados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Devido à inexistência de banco de dados oficiais, não serão considerados, portanto, os estudantes dos cursos de pós-graduação lato sensu, os dos cursos de extensão nem os da educação básica e profissional que são ofertados pelas UFs. É bom lembrar que o valor do custo anual do aluno obtido aqui será maior do que aquele a ser obtido se tivéssemos informações sistematizadas para todos esses casos.

No cálculo do custo anual do aluno é preciso que retiremos dos recursos totais aplicados nas instituições, num determinado ano, aqueles que se dirigem ao pagamento de aposentados e pensionistas – por não mais participarem diretamente da formação dos estudantes – e o equivalente a 65% dos recursos aplicados nos hospitais universitários (HUs), que se dirigem à prestação de serviços de saúde à população, considerando-se parâmetro estabelecido pelo Tribunal de Contas da União (TCU) (BRASIL. TCU, 2004, p. 4). Portanto, nessa metodologia, 35% dos recursos dos HUs são considerados para as atividades de ensino, pesquisa e extensão.

Além dessas considerações é preciso que retiremos dos recursos resultantes aqueles que se dirigem às atividades de pesquisa e extensão, para obtermos o volume de recursos financeiros que foram efetivamente aplicados na formação do aluno com o ensino, o que caracteriza o custo anual do aluno. Isso será realizado por meio de uma metodologia adaptada de Amaral e Pinto, que considerará as seguintes premissas básicas para o cálculo do percentual das despesas que se dirigem às atividades de pesquisa e extensão (AMARAL e PINTO, 2010):

1) Existe uma relação direta entre as despesas com pesquisa ou extensão e a quantidade de professores que trabalham em tempo integral nas instituições.

Na modelagem será considerado que a UF que tiver 100% de seus professores em tempo integral (TI) dedicará 5% dos seus recursos financeiros para as atividades de pesquisa e extensão. Valores entre 0% e 100% de professores em TI significarão, proporcionalmente, gastos com pesquisa ou extensão entre 0% e 5%.

2) Existe uma relação direta entre o percentual das despesas que se destinam à pesquisa ou à extensão e o número de mestres e doutores.

Nesse caso, a UF que tiver 100% de seus professores com titulação de mestre ou doutor dedicará 30% de suas despesas para pesquisa ou extensão e aplicará 0% em pesquisa ou extensão se não tiver algum de seus professores com essas titulações. Valores entre 0% e 100% de professores mestres ou doutores significarão, proporcionalmente, gastos com pesquisa ou extensão entre 0% e 30%.

3) Existe uma relação direta entre as despesas com pesquisa ou extensão e o percentual de alunos de pós-graduação stricto sensu em relação ao total de alunos das instituições – os de graduação presencial adicionados aos de pós-graduação stricto sensu.

Nessa premissa, a UF que tiver 50% de seus estudantes como os de pós-graduação stricto sensu dedicará 10% de suas despesas para pesquisa ou extensão. Os valores entre 0% e 50% de estudantes como de pós-graduação stricto sensu dedicarão, proporcionalmente, gastos com pesquisa ou extensão entre 0% e 10%.

4) Existe uma relação direta entre as despesas com pesquisa ou extensão e o tamanho da pós-graduação stricto sensu.

A modelagem considera que se a UF tiver o quantitativo de cursos de mestrado ou doutorado menor ou igual a 10, o percentual para pesquisa ou extensão será de 2%; se for maior do que 10 e menor ou igual a 30, 4%; se for maior que 30 e menor ou igual a 60, 6%; se maior que 60 e menor ou igual a 100, 8%; e se maior que 100, 10%.

5) Existe uma relação direta entre as despesas com pesquisa ou extensão e a avaliação Capes de seus programas de pós-graduação stricto sensu.

Essa modelagem considera que se a média do conceito Capes dos programas de pós-graduação for igual a 7, 5% dos recursos das instituições se dirigem à pesquisa ou à extensão; se a média for menor ou igual a 3, 1% dos recursos se dirige à pesquisa ou à extensão, relativizado pelo FTI. Valores médios dos conceitos Capes entre 3 e 7 significarão, proporcionalmente, gastos com pesquisa ou extensão entre 1% e 5%.

Os percentuais associados às cinco premissas da metodologia são, então, adicionados. Dessa forma, a universidade federal que tiver 100% dos professores em tempo integral, 100% dos professores mestres ou doutores, 50% dos estudantes de pós-graduação stricto sensu significarem 50% do total de estudantes, adicionando-se os de graduação com os de pós-graduação stricto sensu, mais de 100 cursos de mestrado ou doutorado, e todos esses cursos possuírem conceito 7 na Capes, terá especificado que 60% dos seus recursos se dirigiriam às suas atividades de pesquisa e extensão, após a retirada daqueles associados aos aposentados e pensionistas e 65% dos recursos dos HUs.

O custo médio do aluno das UFs nos anos de 2005 e 2017

As universidades federais brasileiras constituíam-se, em 2017, de um conjunto de 63 instituições presentes em todo o país e que desempenham um importante papel de desenvolver atividades em todo o território nacional, qualificando recursos humanos e desenvolvendo pesquisas que colaboram para a solução de problemas existentes na sociedade e propiciando que novas fronteiras do conhecimento sejam expandidas.

Esse perfil determinado historicamente pode ser visualizado na tabela 2 que mostra o quantitativo de programas de pós-graduação stricto sensu (mestrado ou doutorado) existentes em cada um dos estados e no DF, nos âmbitos federal, estadual, municipal e privado. No âmbito federal, estão separados os programas existentes nas universidades federais daqueles das outras instituições federais que ofertam a pós-graduação stricto sensu (Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, Centros Federais de Educação Tecnológica, Escola Nacional de Ciências Estatísticas, Instituto Militar de Engenharia e Instituto Tecnológico da Aeronáutica).

Verifica-se, portanto, que é o conjunto de universidades federais, instaladas em todos os estados brasileiros e DF que promove, em seus 2.180 programas de pós-graduação stricto sensu, pesquisa e extensão, que procuram diminuir as assimetrias regionais e a desigualdade brasileira. Na Região Norte, as universidades federais são responsáveis por 88% dos programas de pós-graduação stricto sensu; na Região Nordeste, 75%; na Região Centro-Oeste; 72%, na Região Sudeste 54%; e na Região Sul, 46%. Ressalte-se que a única região em que as universidades federais não ultrapassam os 50% é a Sul.

O cálculo do custo do aluno nos anos de 2005 e 2017, que será o custo anual médio do aluno dos diferentes cursos ofertados pelas instituições, utilizando-se a metodologia apresentada neste estudo, nos leva a apurar os seguintes indicadores nesses anos: o número de professores no conjunto das UFs; o número de professores em tempo integral; o número de professores com o título de mestre; o número de professores com o título de doutor; o número de estudantes de graduação em cursos presenciais e a distância; o número de estudantes de pós-graduação stricto sensu; o número de cursos de pós-graduação stricto sensu; e o conceito médio Capes.

A tabela 3 apresenta esses indicadores para os anos de 2005 e 2017 e suas variações nesse período.

Verifica-se que houve, em geral, grandes variações nos indicadores; apenas a média dos conceitos Capes dos cursos de mestrado e doutorado permaneceu constante e de valor médio 3,89, numa escala de 1 a 7. Pode-se concluir que os cursos existentes antes da grande expansão da pós-graduação stricto sensu no período tiveram seus conceitos elevados pois, em geral, os novos cursos são autorizados com o conceito 3,00. O número de alunos de mestrado ou doutorado se elevou em 163,6%, o número de docentes com a titulação de doutorado, em 189,5%, o número de alunos de graduação passou de 549.809 para 1.120.804, 103,9% de aumento. O número de docentes sofreu uma elevação menor que esses percentuais, 88%.

Os cinco componentes descritos na metodologia a serem considerados para o cálculo dos percentuais dos recursos que se dirigem à pesquisa e à extensão são calculados a partir das informações da tabela 3 e estão elencados na tabela 4.

Portanto, houve uma elevação de +11,80 pontos percentuais nos recursos financeiros que se dirigiram à pesquisa e à extensão.
Dessa forma, considerando a metodologia utilizada, os recursos associados à pesquisa e à extensão no ano de 2005 totalizaram 30,25% do total de recursos após descontar o pagamento de aposentados e pensionistas e 65% daqueles vinculados aos HUs, e em 2017 esse número atingiu o valor de 42,05%. Como consequência, se dirigiram à formação dos estudantes nas atividades associados diretamente ao ensino, o equivalente a 69,75% em 2005 e 58,95% em 2017.

No ano de 2005 o conjunto das UFs teve um orçamento total liquidado no valor de R$ 14.651.748.428,00, tendo sido retirados R$ 6.804.210.323,00, que foram as despesas com aposentados e pensionistas e 65% de R$ 152.629.763,00 aplicados nos HUs, (a preços de janeiro de 2017, corrigido pelo IPCA), e em 2017 esse valor foi de R$ 33.987.834.113,00. Esse valor já é o resultado do valor total, retirando-se R$ 12.481.452.648,00 que foram pagos a aposentados e pensionistas e 65% de R$ 4.657.109.681,00 que foram executados nos HUs.

O custo anual do aluno das UFs, valor médio de todas as UFs, para os anos de 2005 e 2017, conforme foi estabelecido pela metodologia apresentada neste estudo foi o da tabela 5. O quantitativo de estudantes em 2005 foi de 607.945 e em 2017, 1.274.048, adicionando-se os de graduação aos de pós-graduação stricto sensu explicitados na tabela 3.

Houve, portanto, uma queda no custo do aluno, de -24,7%, resultado da combinação de um complexo de variações das informações relativas aos professores, estudantes de graduação e de cursos de pós-graduação stricto sensu, constituintes da metodologia utilizada.

Considerações finais: a “confusão” entre gasto por aluno e custo do aluno e uma breve análise dos mitos acoplados a ela

O detalhamento de uma metodologia para o cálculo do custo médio anual do aluno das UFs não deixa dúvidas sobre a sua diferença com o cálculo simplista que é o de dividir o total de recursos financeiros aplicados nas instituições pelo total de estudantes. Estes não permitem uma comparação com os custos anuais dos alunos das instituições privadas e que, em geral, não possuem intensas atividades de pesquisa e extensão como as UFs.

Note-se que se dividirmos o custo médio dos alunos das universidades federais de 2017 por 12, resultará em um valor de R$ 1.279,96, compatível com as mensalidades médias de instituições universitárias privadas que ofertam cursos em diversas áreas do conhecimento. É preciso sempre lembrar que as UFs ofertam cursos em todas as áreas do conhecimento, e dentre eles aqueles que exigem um maior volume de infraestrutura laboratorial e de campo para que as suas atividades de ensino sejam realizadas com qualidade. Portanto, pode-se considerar um mito a afirmação de que o custo do aluno das UFs é muito maior do que aquele de instituições privadas de ensino superior.

O perfil socioeconômico e cultural dos estudantes das universidades federais foi analisado no estudo V Pesquisa do Perfil Socioeconômico e Cultura dos Estudantes das Universidades Federais, divulgado em 2019, que utilizou informações obtidas no ano de 2018 e encontrou o perfil da renda bruta familiar dos seus estudantes. A tabela 6 mostra o perfil socioeconômico dos estudantes, segundo a renda bruta familiar em faixas salariais referenciadas ao salário mínimo (S.M.).

Pertencem aos estratos mais baixos de renda, considerando até 1,5 salário mínimo, 70,2%. Pode-se dizer, portanto, que está aqui mais um mito ao se afirmar que os estudantes das universidades federais pertencem aos estratos de renda mais elevados da sociedade.

Como consequência desse perfil socioeconômico dos estudantes pode-se examinar a origem educacional deles, distribuída entre terem cursado o ensino médio integralmente ou a maior parte em escolas públicas ou escolas privadas. A tabela 7 mostra esse resultado, registrado na V Pesquisa do Perfil Socioeconômico e Cultura dos Estudantes de Graduação das Universidades Federais.

Essa pesquisa, divulgada em 2019, mostra que 64% dos estudantes matriculados nas UFs tinham realizado seus estudos do ensino médio integralmente, ou a maior parte, em escolas públicas, e, portanto, temos aqui a comprovação de mais um mito que é a afirmação de que os estudantes que conseguem entrar nas universidades federais são aqueles oriundos de escolas privadas.

Finalmente, há que se verificar qual o significado de se retirar recursos da educação superior federal para a educação básica. O Inep divulga o total dos recursos financeiros públicos aplicados tanto no setor público quanto no setor privado separando-os por nível educacional (BRASIL. Inep, 2019). Em 2014 foram aplicados na educação básica o equivalente a 4,9% do PIB, o que significa um montante de R$ 265 bilhões. Em 2014 o número de estudantes na educação básica era de 49.771.371, o que resulta em R$ 5.324,00 por aluno.

Neste mesmo ano de 2014 foram aplicados R$ 36 bilhões em recursos do Tesouro nas universidades federais. Supondo que a metade desses recursos fossem transferidos para a educação básica, o valor por aluno passaria de R$ 5.324,00 para R$ 5.684,00, um aumento de 6,8%.

Pode-se concluir, portanto, que a educação básica poderia melhorar muito pouco se essa ação fosse realizada. O que ocorreria com as 63 universidades federais? Podemos afirmar que seriam destruídas. Portanto, aqui está a presença de mais um mito: “A educação básica poderia melhorar muito se fossem transferidos recursos das universidades federais para esse nível educacional”.

Mas é preciso não fazer “confusão” entre gasto por aluno e custo do aluno, que sempre aparecem acoplados a diversos mitos relacionados ao financiamento da educação. Alguns deles analisamos neste estudo: o custo do aluno das UFs é muito maior do que aquele de instituições de educação superior privadas; o perfil socioeconômico dos estudantes das UFs é daquelas pessoas que se originam de famílias mais ricas da sociedade; a maioria dos estudantes estudou em escolas privadas de ensino médio; os recursos financeiros aplicados nas UFs, se diminuídos poderiam melhorar muito a educação básica. Como verificamos, todos eles são falsos.

Referências

AMARAL, N. C.; PINTO, J. M. de R. O financiamento das IEs brasileiras em 2005: recursos públicos, privados e custo dos alunos. Série-Estudos – Periódico do Mestrado em Educação da UCDB, Dossiê: Política de Educação Superior no Brasil Pós-LDB/1996, Campo Grande-MS, n. 30, p. 51-70, jul./dez. 2010.

ANDIFES. V Pesquisa do Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação das Universidades Federais – 2018. Disponível em: <www.andifes.org.be/wp-content/uploads/2019/05/V-Pesquisa-do-Perfil-Socieconômico-dos-Estudantes-de-graduacao-das-Universidades-Federais-1.pdf>. Acesso em: 30 mai. 2019.

BM. Um Ajuste Justo – Análise da Eficiência e Equidade do Gasto Público no Brasil (2017). Disponível em: <https://www.worldbank.org/pt/country/brazil/publication/brazil-expenditure-review-report>. Acesso em: 20 jun. 2019.

BRASIL. Capes. Sistema de Informações Georreferenciadas – Geocapes. Disponível em: <https://geocapes.gov.br/geocapes/> Acesso em: 15 mai. 2019.

BRASIL. EC 95. Altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para Instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências (2016). Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc95.htm>. Acesso em: 20 mai. 2019.

BRASIL. Inep. Censo da Educação Superior – 2005 e 2017. Disponível em: <www.inep.gov.br>. Acesso em: 10 out. 2018.

BRASIL. Inep. Estimativa do Percentual do Investimento Público Total em Educação em Relação ao Produto Interno Bruto (PIB), por Nível de Ensino – Brasil 2000-2015. Disponível em: <portal.inep.gov.br/indicadores-financeiros-educacionais>. Acesso em: 15 jun. 2019.

BRASIL. TCU. Orientações para o cálculo dos indicadores de gestão – Decisão n. 408/2002 – Versão revisada em março de 2004 – Plenário. Disponível em: <portal.mec.gov.br/sesu/arquivos/pdf/indicadores.pdf>. Acesso em: 19 mai. 2019.

FPE. Manifesto à Nação (2018). Disponível em: https://static.poder360.com.br/2018/10/Manifesto-a-Nacao-frente-evangelica-outubro2018.pdf. Acesso em: 20 jun. 2019.

OCDE. Education at a Glance 2016 - OECD INDICATORS. Disponível em: <https://download.ei-ie.org/Docs/WebDepot/EaG2016_EN.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2019.

SHEEHAN, J. Modelos para la asignación de los fondos publicos entre las universidades. Em: Nuevas Direcciones en el Financiamiento de la Educación Superior: Modelos de asignación del aporte publico. DELFINO, J. A. & GERTEL, H. R. (Edits.). Ministerio de Cultura y Educación. Buenos Aires: Ministerio de Cultura y Educación, 1996.

Nelson Cardoso Amaral é doutor em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep) e professor na Universidade Federal de Goiás (UFG)