Economia

O setor de turismo encontra-se entre os mais afetados pela pandemia. Por não contar com apoio das políticas públicas emergenciais do governo, a destruição de ocupações no setor poderá atingir 1,2 milhão de trabalhadores

A previsão é que o peso do turismo no PIB deva ser reduzido em quase 40% em 2020. Foto: Marcello Casal Jr./ABr

Neste primeiro semestre de 2020, as perspectivas para a classe trabalhadora se mostraram nada animadoras. A rápida e profunda ampliação do desemprego, da precarização nas ocupações e da queda no rendimento e nas condições de vida acompanham a difusão inédita e gravíssima da onda viral de dimensão mundial.

Em virtude disso, as perdas econômicas apresentam-se gigantescas a quase toda a sociedade. O setor de turismo, responsável por quase 11% do Produto Interno Bruto (PIB) e cerca de 10% da ocupação mundial, tem sido, por exemplo, um dos mais atingidos pela desistência dos dois principais tipos de turistas.

De um lado, aqueles relacionados ao turismo de negócios devido à suspensão de feiras, congressos, convenções e demais eventos, e de outro, o turista convencional tradicional atingido pelo cancelamento individual ou coletivo das viagens de lazer e entretenimento. Somente no segmento do transporte aéreo, que envolve as 290 maiores companhias no mundo, a abrupta e inédita queda na quantidade de mais de quatro quintos dos passageiros resultou na redução alarmante dos voos e, consequentemente, perda da receita, demissões de trabalhadores e risco da quebra das empresas, segundo a Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata).

A tragédia no transporte aéreo também se alastrou para os empreendimentos do turismo nas vias marítima e terrestre, contaminando crescentemente a tradicional rede hoteleira e alastrando-se por agências de viagens, bares, restaurantes e demais formas de prestação de serviços turísticos. Por força disso, as estimativas alcançam cerca de um terço das receitas perdidas em 2020, podendo destruir 75 milhões de empregos que representam um quarto do total da ocupação no setor do turismo mundial, conforme informes recentes da Organização Mundial do Turismo (OMT) e do Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC).

No caso brasileiro, o turismo vinha se apresentando como um dos poucos setores econômicos a ter a sua atividade recuperada, pois se aproximava do nível alcançado em 2014. Mas com a pandemia do coronavírus o retrocesso voltou a rapidamente a aparecer.

Ainda que o setor de turismo detenha participações relativas no PIB e na ocupação do Brasil inferiores a um terço do observado na média da experiência internacional, o impacto negativo da onda viral apresenta-se superior ao previsto no mundo. A expectativa é que o peso do turismo no PIB deva ser reduzido em quase 40% no ano de 2020.

Em termos ocupacionais, a perspectiva é a de queda similar, uma vez que as atividades de turismo constituem importantes alocadoras de mão de obra em todos os segmentos de rendimento, inclusive entre aqueles de menor qualificação. Assim, a destruição de ocupações no setor poderá atingir 1,2 milhão de trabalhadores.

Pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por exemplo, o setor do turismo no Brasil concentra-se nos pequenos negócios, organizado a partir dos seguintes componentes e composição: bares e restaurantes que respondem por 37,5% do total; transportes rodoviário e aéreo (19,2%); atividades recreativas, culturais e desportivas (17,9%); outros transportes e serviços auxiliares (9,9%); hotéis e pousadas (7,1%);serviços de agências e organizadores de viagens (2,73%) e serviços de aluguel de bens móveis (2,7%).

Diante da brutal retração na demanda por turismo, a temporalidade da pandemia do coronavírus no Brasil avança para além do constatado em outros países, colocando em risco a confiança na segurança sanitária de possíveis destinos a serem visitados. As medidas governamentais consideradas mais urgentes para manter vivo o setor mostraram-se até o presente momento frustradas, como a concessão de crédito para capital de giro que, além de insuficientes, seguem empossadas nos grandes bancos.

Em especial os pequenos negócios ficam distantes de maior atenção. Assim, o crédito deixa de ser facilitado, inexistindo subsídios eficazes às atividades, entre outras ações necessárias para o setor não se inviabilizar consideravelmente no país.

Destoando parcialmente da realidade geral do setor de turismo, destaca-se quase como exceção, no setor de restaurantes, o avanço dos serviços de entrega no esquema de delivery. Também no âmbito da hospedagem, constata-se o aparecimento das reservas de aluguéis residenciais por temporadas maiores na plataforma do Airbnb.

Apesar disso, o setor de turismo encontra-se entre os mais afetados negativamente pela pandemia da covid-19. Por não poder contar com apoio fundamental das políticas públicas emergenciais de parte governamental, deverá demorar mais tempo ainda para se recuperar dos impactos do coronavírus.

Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da Universidade Estadual de Campinas