Cultura

A cultura não foi assumida efetivamente pelo partido, quase não aparece em seus principais documentos partidários. A cultura hoje adquire centralidade em muitos campos das atividades partidárias

Encontro de Lula com produtores culturais em São Paulo (julho, 2021). Foto: Ricardo Stuckert

 

O PT vive hoje, como a sociedade brasileira, perplexidade e enormes desafios.

A situação internacional e o panorama nacional apresentam grande complexidade.

O equacionamento e enfrentamento de tais circunstâncias torna-se vital.

A sociedade e o PT vivem também outros dilemas e paradoxos.

Trato no texto de um deles.

O paradoxo do partido envolvido em cultura que não assumiu a cultura como política.

Cabe perguntar: ainda?

A cultura permeia o PT.

Na presença de muitos intelectuais, artistas e fazedores de cultura no seu processo de fundação e na sua vida até hoje.

Na influência que exerceu e exerce nos mais diversos segmentos do campo cultural.

Nas inúmeras experiências exitosas e inovadoras de políticas e gestão culturais.

Na formulação setorial de inspiradores documentos, a exemplo de Política Cultural (1984) e A Imaginação a Serviço do Brasil (2002).

Na atuação de alguns de seus gestores e parlamentares na área cultural.

Na defesa das instituições e dos trabalhadores da cultura.

Na luta pela democracia, pelos direitos, pelas liberdades e pela diversidade cultural.

Na participação de filiados em suas organizações setoriais de cultura.

Na numerosa opção de seus filiados recentemente pelo setorial de cultura.

O contraste entre esta rica dinâmica e a pobre presença da cultura na política partidária é assustador e gritante.

A cultura não foi assumida efetivamente pelo partido.

A cultura quase não aparece nos principais documentos partidários. Neles, a cultura só está presente de forma diminuta, em suas margens, sempre nas últimas páginas.

A cultura não tem lugar importante nos fóruns e instâncias partidárias de direção.

A cultura não dispõe de políticas assumidas, cultivadas e deliberadas pelo partido.

A cultura ocupa sempre lugar secundário na atuação e nas atividades do partido.

A cultura não tem o destaque que merece no projeto do partido para a sociedade brasileira.

A cultura não está assumida no processo de transformação democrática da nação.

O paradoxo é insustentável diante dos desafios da atualidade internacional e nacional.

A cultura hoje adquire centralidade em muitos campos das atividades partidárias.

A cultura é imprescindível para a luta democrática no mundo e no Brasil atuais.

A cultura democrática é vital para a existência da democracia.

A cultura é indispensável para a transformação socialista e democrática da sociedade.

A cultura é fundamental para a disputa de hegemonia político-ideológica.

A cultura tornou-se fator econômico potente no século 21. Ele assiste uma expansão enorme da economia da cultura e da culturalização da economia.

A cultura fortalece comunidades e indivíduos através do desenvolvimento da autoestima, da identidade e da diversidade.

A cultura empodera comunidades e indivíduos formando cidadãos.

A cultura muda as relações entre sociedade e natureza e possibilita uma visão ecológica do meio ambiente.

A cultura é parceira umbilical da educação na atualização e reencantamento da escola.

A cultura configura pensamentos, sensibilidades, emoções e utopias emancipadoras, vitais para a imaginação e conquista de uma sociedade melhor, mais humana, menos desigual, mais feliz, menos opressora, mais solidária, menos competitiva, mais criativa e menos medíocre.

Diante dos gigantescos desafios e dilemas de um mundo planetário, em tempo real, cada vez mais glocalizado, rico e desigual, o PT deve se colocar sempre a favor da diversidade social e cultural, contra os monopólios da monocultura, simbioticamente autoritária e neoliberal, que domina o cenário internacional e nacional.

Na cena brasileiro, a situação é mais grave, com a tomada do poder nacional pela extrema-direita, como seu autoritarismo em busca da ditadura e do ultraneoliberalismo.

A guerra cultural bolsonarista, apoiada por fundamentalistas, militares, milicianos e empresários, colocou a cultura no centro do enfrentamento político-ideológico.

A guerra cultural visa destruir democracia, direitos, civilidade, culturas democráticas, educação, universidade, artes e ciências, em sua pluralidade de tonalidades.

A guerra cultural visa impor uma monocultura autoritária, repleta de comportamentos e valores autocráticos.

Eis o programa cultural da extrema-direita bolsonarista.

O panorama se agrava devido à visão colonizada, subalterna e tacanha das classes dominantes brasileiras.

Elas não possuem compromissos com a nação, a democracia, a cultura e a civilidade.

Elas abandonaram a cultura e áreas afins à guerra cultural bolsonarista.

Neste cenário, os desafios e as demandas também se tornam gigantescas.

Lutamos para que o PT se torne no partido da cultura brasileira e mundial.

Partido da democracia que garanta direitos da população.

Partido das liberdades. da igualdade, do pluralismo e das diversidades sociais e culturais.

Partido do aprimoramento coletivo e individual.

Partido do Brasil mais democrático, solidário, equânime, igualitário, diverso e criativo.

 

Antonio Albino Canelas Rubim é pesquisador do CNPq e professor da UFBA. Ex-secretário de Cultura da Bahia