Tramita no Senado Federal, desde 13/11/2013, a Proposta de Emenda à Constituição nº 63, de 2013, tendo como primeiro signatário o então senador Gim Argello.
A PEC 63/2013 propõe alteração ao artigo 39 da Constituição, inserindo novo § 9º, para assegurar aos membros da Magistratura e do Ministério Público o pagamento mensal de “parcela indenizatória de valorização do tempo de exercício” nessas atividades, calculada à razão de 5% do subsídio do respectivo cargo a cada quinquênio de efetivo exercício, até o máximo de 7, totalizando, assim, 35% sobre o subsídio. O novo § 10 assegura a contagem, para esse fim, do tempo de exercício anterior em “carreiras jurídicas”, bem como na advocacia privada.
Segundo o autor, diversamente do que ocorre no Executivo, no qual as carreiras exclusivas de Estado, remuneradas por meio de subsídio, na forma do § 4º do art. 39 da CF, e com fundamento no § 8º do mesmo artigo, têm “tabelas de retribuição em valores crescentes, a partir do nível inicial até o nível final da carreira, incorporando, desse modo, também a parcela devida pelo tempo no cargo ou na carreira”, no Judiciário não haveria esse “reconhecimento”, o que demandaria introduzir “real diferenciação baseada no tempo de serviço”, superando a “igualdade salarial, independentemente do tempo de serviço”. Assim, afirma, os magistrados, “mesmo que permaneçam uma década no cargo, percebem hoje o mesmo subsídio daquele que detém apenas um ano no mesmo cargo”, o que representaria “quebra de isonomia”. Não haveria, portanto, “valorização, em seus planos de carreira, do tempo de serviço prestado”, gerando desestímulo à permanência no cargo. Pelas mesmas razões, o direito seria assegurado aos membros do Ministério Público, mantendo-se a simetria remuneratória entre os cargos.
Ela foi, inicialmente, relatada pelo senador Blairo Maggi que, em 19/02/2014, ofereceu parecer pela aprovação, explicitando a sua extensão aos magistrados e membros do Ministério Público aposentados e aos seus pensionistas abrangidos pelos arts. 6º-A, parágrafo único, e 7º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, e pelos arts. 2º e 3º, parágrafo único, da Emenda Constitucional nº 47, de 5 de julho de 2005. Embora tenha o Relator excluído a classificação da vantagem como “indenizatórias”, foi mantida a sua não sujeição ao limite previsto no art. 37, XI.
A matéria foi redistribuída, em 19/03/2014, ao senador Vital do Rego, atualmente ministro do Tribunal de Contas da União, que apresentou parecer à CCJC em 24.03.2014, com teor idêntico ao parecer anterior.
Em 21/12/2018, a PEC 63/2013 foi arquivada, em razão do final da legislatura. Todavia, em 29/03/2019, foi aprovado requerimento de desarquivamento da senadora Juíza Selma.
Após quase três anos paralisada, em 15/03/2022, a matéria voltou a ser objeto de atenção pelo Senado.
Foi então apresentada a Emenda nº 3, da senadora Soraya Thronicke, estendendo a vantagem aos Defensores Públicos.
Em 18/03/2022, o senador Rogério Carvalho apresentou a Emenda nº 4, estendendo a vantagem aos advogados e defensores públicos, e o senador Humberto Costa apresentou a Emenda nº 5, estendendo o direito aos advogados e procuradores da AGU e defensores públicos da União e delegados de polícia federal, e facultando a sua extensão aos advogados públicos, defensores púbicos e delegados de polícia civil, por lei dos respectivos entes.
Em 12/04/2022, o senador Humberto Costa apresentou a Emenda nº 6, para estender a vantagem apenas aos advogados públicos.
Em 22/03/22, foi apresentada a Emenda nº 7, do senador Alessandro Vieira, para assegurar a todos os agentes públicos efetivos a vantagem, incidente sobre a remuneração. Em 07/04/22, foi protocolizada a Emenda nº 8, do senador Lucas Barreto, para estender o direito aos membros dos Tribunais de Contas e, em 08/04, a Emenda nº 9, do senador Giordano, estendendo-o aos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil. Outras emendas ainda não obtiveram o apoiamento necessário, com a do senador Telmário Mota, para estender o direito aos membros da AGU e procuradorias dos Estados e defensores públicos; a do senador Weverton Rocha, para estender a vantagem a todos os policiais federais (delegados, agentes, peritos, escrivães e papiloscopistas); e do senador Randolfe, para estender a vantagem a advogados públicos e defensores públicos.
A matéria acha-se em vias de ser novamente incluída na ordem do dia do plenário, oportunidade em que será designado novo relator.
O adicional por tempo de serviço é uma vantagem cuja finalidade é, efetivamente, valorizar e reconhecer o tempo de serviço público, embora, não necessariamente, na carreira em que esteja eventualmente investido o servidor. Trata-se de vantagem que, embora não seja vedada na esfera privada, não é assegurada aos trabalhadores regidos pela CLT1.
Segundo destaca Hely Lopes Meirelles, essa vantagem tem sua origem histórica na Lei de 14/10/1827, interpretada pelo Aviso Imperial 35, de 10.2.1854, e tinha com fim "remunerar serviços já prestados”2.
No plano federal, o Decreto-Lei nº 1.713, de 28 de outubro de 1939, que foi o primeiro estatuto dos funcionários públicos federais, previa, em seu art. 214, o pagamento do adicional por tempo de serviço, sem, contudo, dispor sobre o seu valor.
A norma foi mantida pelo segundo estatuto (Lei nº 1.711, de 18 de outubro de 1952), e disciplinada pelos art. 145, XI, e 146. Era devida, então, ao funcionário que completasse vinte anos de serviço público efetivo, no percentual de 15% do respectivo vencimento, podendo ser elevada para 25% quando o tempo de serviço do funcionário fosse de 25 anos completos.
A Lei nº 8.112, de 11 de novembro de 1990, previu o adicional no art. 61, III, e no art. 67, assegurando-o ao servidor efetivo à razão de 1% por ano de serviço público efetivo, incidente sobre o vencimento. Em 1997, a Lei nº 9.527, de 10 de dezembro, alterou as regras de concessão: passou a ser devido à razão de 5% a cada cinco anos de serviço público efetivo prestado à União, às autarquias e às fundações públicas federais, observado o limite máximo de 35%. Assim, além de limitar o direito ao tempo de serviço prestado à União, desconsiderando o tempo de serviço prestado a outros entes, passou a evitar o aumento anual do percentual devido.
Em 1999, porém, a Medida Provisória nº 1.909-15, de 29 de junho, revogou, de forma abrupta e imediata, o inciso III do art. 61 e o art. 67 da Lei nº 8.112, de 1990, respeitadas as situações constituídas até 8 de março de 1999. Essa Medida Provisória foi sucessivamente reeditada até a edição da Medida Provisória nº 2.225-45, de 4 de setembro de 2001, até o presente não apreciada pelo Congresso Nacional, mas que teve a sua vigência preservada pelo art. 2º da Emenda Constitucional nº 32, de 20013.
Com a implementação do regime de subsídio4, deixaram diversas carreiras e seus integrantes de perceber, inclusive, a parcela até então devida a título de vantagem pessoal, calculada com base no percentual devido a título do adicional por tempo de serviço à data da publicação da Medida Provisória nº 1.909-15, de 1999, ou com base no Estatuto da Magistratura e do Ministério Público.
A extinção deu-se, também, relativamente aos militares das Forças Armadas, a partir de 30 de dezembro de 2000, em face do disposto no art. 30 da Medida Provisória nº 2.131, de 28 de dezembro de 2000, ainda vigente na forma da Medida Provisória nº 2.215-10, de 31 de agosto de 2001.
Desde então, diversos entes da federação seguiram o mesmo caminho, extinguindo o adicional por tempo de serviço. Contudo, muitos ainda o mantêm em suas legislações, com denominações diversas (anuênios, quinquênios, triênios, sexta parte etc.). Todavia, a Lei Complementar nº 159, de 19 de maio de 2017, previu em seu art. 2º, como condição para a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal dos Estados e do Distrito Federal, a adoção, pelo ente, de lei promovendo a revisão do regime jurídico único dos servidores estaduais da administração pública direta, autárquica e fundacional para suprimir benefícios ou vantagens não previstos no regime jurídico único dos servidores públicos da União. A Lei Complementar nº 178, de 2021, passou a prever a possibilidade de “revisão dos regimes jurídicos de servidores da administração pública direta, autárquica e fundacional para reduzir benefícios ou vantagens não previstos no regime jurídico único dos servidores públicos da União”, ou seja, atenuando a regra, mas excluiu a possibilidade de o ente, em substituição à extinção das vantagens não previstas no RJU federal, “aprovar lei de responsabilidade fiscal estadual que conterá regras para disciplinar o crescimento das despesas obrigatórias”, passando a ser previsto que as medidas poderiam ser consideradas implementadas “caso o Estado demonstre, nos termos de regulamento, ser desnecessário editar legislação adicional para seu atendimento durante a vigência do Regime.”
Assim, vigora um quadro normativo em que o adicional por tempo de serviço, independentemente de suas características e razões que justifiquem a sua manutenção ou criação, passa a ser visto como algo a ser extirpado do ordenamento jurídico, um “anacronismo”, um “penduricalho”, nada mais que um mero fruto do corporativismo.
Não obstante, assiste razão ao autor da PEC 63/2013, quando afirma que a carreira da magistratura não permite a valorização do tempo de serviço. De fato, trata-se de carreira composta por apenas três classes (juiz substitutivo, juiz titular e desembargador), sendo que o acesso ao cargo de desembargador limitado, numericamente, à composição dos Tribunais Regionais, ou Tribunais de Justiça.
Essa dificuldade, contudo, decorre da própria estrutura da carreira, uma vez que o regime de subsídio, em face do disposto no art. 93, VI da Constituição, deve observar o escalonamento, em nível federal e estadual, conforme as respectivas categorias da estrutura judiciária nacional, não podendo a diferença entre uma e outra ser superior a 10% ou inferior a 5%, nem exceder a noventa e cinco por cento do subsídio mensal dos Ministros dos Tribunais Superiores. A Lei nº 9.655, de 2 de junho de 1998, estabeleceu em seu art. 2º que os subsídios dos juízes dos Tribunais Regionais correspondem a 90% dos subsídios dos ministros dos Tribunais Superiores, mantido idêntico referencial, sucessivamente, entre os subsídios daqueles e os dos cargos de juízes e de juízes substitutos, da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho.
Ademais, trata-se de problema que é comum a outros cargos e carreiras no serviço público federal: as carreiras da advocacia pública, por definição legal, são estruturadas em apenas três classes, sem padrões, e com percursos de carreira curtos, o que permite que o servidor atinja a classe final, e o subsídio máximo permitido por lei, em menos de 10 anos. O mesmo ocorre com a carreira policial federal, ou carreiras, visto que inexiste promoção entre os diversos cargos que a compõem. O cargo de delegado da Polícia Federal é estruturado em carreira com apenas quatro classes, sem padrões internos. Também a carreira de diplomata segue essa estrutura, sendo composta por seis classes, mas, nesse caso, o percurso entre a classe inicial (Terceiro Secretário) e final (Ministro de Primeira Classe) é longo, e condicionado a existência de vaga para a promoção5.
A ausência de diretrizes, ou regramentos para a estruturação de carreiras, leva a que, muitas vezes, pressões sejam exercidas para que as suas estruturas sejam encurtadas, visando, precisamente, à rapidez no alcance do vencimento mais elevado da carreira. Isso se dá, inclusive, sem que haja, entre classes da mesma carreira, definições de atribuições em níveis de complexidade crescentes, que justifiquem o “encarreiramento” e as promoções com base em critérios como antiguidade e mérito.
A recriação do adicional por tempo de serviço, assim, vem no sentido de atenuar os efeitos deletérios dessas situações, e restabelecer mecanismo que, no passado, serviu para valorizar e recompensar o tempo de serviço e a experiência, de forma proporcional. Mas, dada a existência no serviço público, até recentemente, de tabelas de vencimentos com valores irrisórios, complementados por gratificações e adicionais, a relevância do adicional por tempo de serviço se reduziu, inclusive por se tratar de vantagem que deve ser, de forma inarredável, assegurada aos aposentados.
A solução dada pelo relator da PEC 63/2013, ao afastar o “caráter indenizatório” do adicional por tempo de serviço é correta, também, sob o prisma da forma. Atribuir, ainda que por meio de Emenda à Constituição, caráter indenizatório a uma parcela que tem nítido caráter remuneratório, com o fim de contornar a sua sujeição ao teto de remuneração de que trata o art. 37, XI, dado que, na forma do § 11 do art. 37, não serão computadas, para efeito dos limites remuneratórios de que trata o inciso XI as parcelas de caráter indenizatório previstas em lei, configuraria burla escancarada ao próprio teto.
Já a proposta de que seja computado para esse fim o tempo de atividade na advocacia, inclusive privada, desborda totalmente do sentido dessa vantagem: ao permitir que um advogado com 10 ou 15 anos de atividade privada, ao ingressar em cargo público na magistratura ou Ministério Público, compute esse tempo para fins de uma vantagem devida em razão do cargo de carreira, além da oneração aos cofres públicos, distorce, integralmente, a própria razão de ser do benefício, que é o de valorizar e recompensar a experiência e dedicação ao cargo público.
No entanto, a solução, apoiada e patrocinada pela magistratura e membros do Ministério Público, e apoiada por suas entidades de classe e pelo próprio presidente do Conselho Nacional de Justiça, tem também um segundo propósito: assegurar aumentos para essas carreiras, em vista da insuficiente correção inflacionária do subsídio dos Ministros do STF, que acarreta perdas elevadas a toda a magistratura nacional.
Observa-se que, desde 2005, ano em que foram fixados os subsídios da magistratura, houve prolongados períodos de congelamento, ou de reajustes insuficientes. Contudo, essas perdas se mostram mais evidentes quanto os valores em cada data são atualizados pelo IPCA, medido pelo IBGE, até janeiro de 2022. No caso da magistratura, apenas para recompor o valor alcançado em janeiro de 2007, seria necessário, em janeiro de 2022, um reajuste de 45,92%. E, desde janeiro de 2019, data em que ocorreu o último reajuste de subsídios, seria necessário um reajuste de 19,99%, com base na inflação medida pelo IPCA.
A mesma perda afeta a todos os servidores federais; e cerca de 50% da força de trabalho do Executivo tem perdas de 28,15%, pois desde janeiro de 2017 não tiveram qualquer reajuste. A recomposição de 5%, cogitada pelo Presidente da República, é irrisória, à luz dessas perdas, e sequer recuperará a perda acumulada ao longo do primeiro semestre de 2022.
A utilização da PEC 63/2013 para elidir ou afastar a urgente necessidade de uma recomposição dessas perdas, mas com foco apenas nos magistrados e membros do ministério público, assim, revela-se casuísta e oportunista, e, mais do que tudo, ilícita à luz da necessidade de um tratamento equitativo no serviço público.
Por fim, há que se registrar que a proposta de “recriação” do ATS com foco na magistratura também foi objeto da minuta de projeto de lei orgânica da magistratura, ratificada por dez ministros do STF em 20166, a qual previa em seu art. 100 a criação de uma “gratificação por tempo de serviço” para os magistrados, devida no montante de 5%, a cada cinco anos de serviço, e limitada a um máximo de 35%. Naquela oportunidade, porém, a vantagem estaria sujeita ao teto de remuneração. Tal solução, contudo, contraria expressamente o próprio art. 39, § 4º da CF, segundo o qual o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os ministros de Estado e os secretários estaduais e municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.
A PEC 63/2013, por ter caráter nitidamente corporativo, visto que voltada a carreiras “jurídicas”, indispensáveis à função jurisdicional do Estado e à ordem jurídica, teve como efeito imediato a apresentação de propostas, por meio de emendas, que assegurem o mesmo tratamento às demais “carreiras jurídicas”, ou cujos membro exercem “atividade jurídica”.
Assim, nada mais natural do que as emendas apresentadas, visando a sua extensão às carreiras da advocacia pública e defensoria pública.
A extensão aos delegados de polícia decorre do mesmo juízo, na medida em que a própria Lei nº 9.266, de 15 de março de 1996, reconhece em seu art. 2º-A, com a redação dada pela Lei nº 13.047, de 2014, que “os ocupantes do cargo de Delegado de Polícia Federal, autoridades policiais no âmbito da polícia judiciária da União, são responsáveis pela direção das atividades do órgão e exercem função de natureza jurídica e policial, essencial e exclusiva de Estado.”
Ademais, há que considerar que há cargos e carreiras que, à luz de entendimentos do Conselho Nacional de Justiça, têm, igualmente, “natureza jurídica”, embora não sejam compostas por cargos privativos de bacharel em direito.
Contudo, essa caracterização acaba por gerar distorções, visto que a “natureza jurídica” não pode ser razão suficiente para tal diferenciação de direitos, tanto mais quando se trata de vantagem que, até 1999, tinha caráter universal, e ainda o tem em vários entes federativos.
Exemplo dessa situação seria considerar, como atividade jurídica, com direito ao anuênio, os delegados de polícia, mas não os demais policiais (peritos criminais, agentes etc.); ou os policiais rodoviários federais. Tal solução geraria grave desequilíbrio e conflito interno nas instituições.
As demais carreiras retribuídas por meio de subsídio, igualmente, ver-se-iam prejudicadas, pois a vantagem, mesmo que “congelada” no percentual devido em 1999, foi-lhes suprimida, por incorporação ao subsídio, e não poderia ser restabelecida. E, ainda que o fosse, no caso de retorno ao regime vencimental, estaria sujeita ao teto remuneratório.
Desse modo, o conteúdo da PEC 63/2013 revela-se, quanto ao seu alcance, insuficiente, o que deverá levar à aprovação de emendas, entre as já apresentadas ou em fase de coleta de assinaturas, mas com elevado impacto fiscal.
Não se pode ignorar que a PEC 63/2013 teria impactos significativos, podendo, inclusive, gerar excesso de gastos que acarretem o acionamento das medidas de contenção de despesas previstas no art. 169 da Constituição, por excesso de despesas com pessoal, ou, de forma mais imediata, o descumprimento do limite de despesas primárias, fixado pelo art. 107 do ADCT ou do limite de despesas obrigatórias, estabelecido pelo art. 109 do ADCT.
Examinando-se o conteúdo da PEC 63/2013, em sua redação primitiva, e tendo em vista que a vantagem não se submeteria ao teto, pode-se estimar, considerando-se a distribuição de magistrados em atuação na primeira e segunda instância e tribunais superiores no Poder Judiciário, segundo o Relatório Justiça em Números de 2021, publicado pelo Conselho Nacional de Justiça, aumentos na despesa com ativos da ordem de R$ 692 milhões anuais, na magistratura federal, e outros R$ 321 milhões, no Ministério Público Federal. No âmbito da magistratura estadual, o acréscimo, com ativos, poderia chegar a R$ 1,4 bilhões/ano. No Ministério Público estadual, seriam cerca de R$ 1,2 bilhões/ano, considerado os valores de subsídios dos membros ativos. Considerando-se que a proporção de despesas médias em que a despesa com inativos e pensionistas, em geral, equivale à despesa com ativos, o impacto total estimado da PEC 63 poderia, facilmente, superar R$ 7,5 bilhões/ano, uma vez que o impacto total com ativos seria de cerca de R$ 3,6 bilhões anuais.
Caso incluídas as carreiras da advocacia pública federal, defensores públicos federais e delegados da Polícia Federal, objetos da maioria das emendas já formalizadas à PEC 63/2013, considerando-se os quantitativos existentes em dezembro de 2021 de ativos, inativos e pensionistas, e respectivos subsídios, os impactos, apenas na esfera federal, poderiam chegar a outros R$ 1,6 bilhões/ano.
No caso da extensão ao conjunto dos servidores públicos federais civis ativos, aposentados e pensionistas, considerados os quantitativos existentes em dezembro de 2021, e as despesas com pessoal apuradas nos Relatórios de Gestão Fiscal por poder e órgão, e considerado o percentual de CPSS médio de 22%, e a incidência sobre a totalidade da remuneração (excetuadas, apenas, parcelas indenizatórias e eventuais), o impacto poderia chegar a R$ 42,7 bilhões/ano.
Tais impactos dizem respeito, exclusivamente, aos servidores civis. Caso a vantagem venha a ser estendida aos militares das Forças Armadas, e como parcela extrateto, com repercussões sobre proventos de reforma e pensões militares, pode-se estimar um impacto adicional que poderia chegar a cerca de R$ 17 bilhões/anuais, visto que a despesa com militares correspondeu, em 2021, a cerca de 41,4% da despesa realizada com o pagamento de civis da administração direta, autárquica e fundacional.
Ainda que as estimativas relativas aos entes subnacionais devam levar em conta médias salariais mais baixas que as da União, e que a força de trabalho, notadamente nos municípios, sejam mais jovem, com menor proporção de inativos e pensionistas em relação aos ativos e com média de tempo de serviço público menor do que 20% para ativos e 25% para inativos, não seria exagerado supor, dado o elevado número de vínculos a considerar, que o impacto total da extensão do adicional a todos os agentes públicos efetivos, nos três níveis de governo, alcançasse R$ 84 bilhões/ano.
Embora a discussão sobre o restabelecimento do adicional por tempo de serviço seja pertinente, não se pode negar que, no presente contexto das finanças públicas, inexiste espaço fiscal suficiente à aprovação da PEC 63/2013 em bases justas e razoáveis.
Essa recriação, nos termos e forma propostos, poderá ter consequências indesejáveis, inclusive no sentido de inviabilizar reajustes e provimentos de cargos públicos, comprometendo a racionalidade administrativa e a própria prestação de serviços à população, e produzindo uma “bola de neve” com consequências imprevisíveis.
Além disso, a recriação do adicional por tempo de serviço, para um grupo reduzido de carreiras, caracterizadas como “carreiras jurídicas”, embora dotado de razoabilidade à luz da sua estrutura, colide com questões centrais: além de se tratar de parcela “extratexto”, eventualmente incidente sobre a totalidade da remuneração, o que pode abrir espaço a descontroles na execução dessa despesa, notadamente no âmbito subnacional, ela se revestiria de nítido caráter de “privilégio”. O fato de magistrados e membros do ministério público, que já percebem subsídios que são fixados a partir do teto remuneratório, não contarem com parcela que reflita o tempo de serviço na carreira, não é exclusividade desses agentes, e uma solução para tal problema envolve temas como a repercussão que a medida teria sobre carreiras do Poder Executivo ou do Poder Legislativo nos três níveis federativos, fomentando pleitos por isonomia.
Ademais, há enorme dificuldade de aferição desses impactos financeiros, dada a dificuldade de acesso a dados pormenorizados quanto à composição da força de trabalho nos três níveis da Federação, suas estruturas remuneratórias e despesas com pessoal ativo, inativos e pensionistas.
A alteração contida no art. 39, § 4º da CF, que instituiu o regime de subsídio, do qual decorreu a extinção do adicional para as carreiras jurídicas e demais remuneradas por subsídio, não foi precedida de exames cuidadosos quanto ao seu alcance. Ela se inseria, na verdade, em uma proposta mais ampla de simplificação das estruturas remuneratórias, que, contudo, não foi aprovada pelo Congresso Nacional. As medidas adotadas, no plano legal, para promover a extinção de forma geral no serviço público, o foram em contexto de ajuste fiscal, e, igualmente, sem levar em conta a função do adicional como componente do sistema remuneratório. Foi, meramente, a tentativa de “evitar” ou “interromper” o “crescimento vegetativo” da despesa com pessoal. Sua recriação, porém, passados 23 anos, requer cautela e estudos aprofundados quanto aos seus impactos.
Enquanto isso, permanece ignorada – inclusive pelo Poder Judiciário – a taxatividade do art. 37, X da CF, que determina a revisão geral anual dos vencimentos e subsídios. Ao contrário, o Poder Judiciário tem adotado interpretações que, virtualmente, nulificaram o dispositivo, impedindo a força normativa da Constituição, e negado a própria “vontade da Constituição”. Segundo Konrad Hesse, “se o direito e, sobretudo, a Constituição têm a sua eficácia condicionada pelos fatos concretos da vida, não se afigura possível que a interpretação faça deles tábula rasa”7.
É, lamentavelmente, o que vem fazendo o Supremo Tribunal Federal, ao submeter a validade do art. 37, X à discricionariedade do chefe do Executivo, e afastar o próprio sentido da “revisão geral” como forma de assegurar a recomposição da perda inflacionária, e reduzindo a norma constitucional à “reserva do possível”, ou seja, se o Executivo não consignar recursos no orçamento, e alegar que há outras necessidades ou prioridades, não haverá reajuste anual para o servidor público8.
A PEC 63/2013, em tramitação há quase 9 anos, volta à tona em um momento crítico, ao final do mandato presidencial, em período pré-eleitoral, e motivada por pressões e interesse imediato de seus beneficiários. Ainda que seja legítimo o pleito por reajuste, parece-nos que a solução sob exame não pode ser aprovada sem amplo debate e exame de seus impactos fiscais, e sem considerar o conjunto do serviço público, nos três níveis de governo.
Luiz Alberto dos Santos é advogado, doutor em Ciências Sociais/Estudos Comparados e mestre em Administração, consultor legislativo. Professor colaborador da Ebape/FGV