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O atual cenário requer esforços para superar questões ainda não resolvidas; destaca-se a exclusão dos menos favorecidos, nas áreas urbanas de periferia, do campo, da floresta e das águas

As universidades federais têm importante papel para desenhar o modelo de estudo relacionado com a produção. Foto: UFAC

Pensar sobre a educação e trabalho no desenvolvimento do estado do Acre é resgatar a história de luta que permeia a construção do estado de direito com seus avanços sociais, culturais, educacionais, políticos e econômicos. Dentre esses avanços citamos a área da educação, durante os governos da Frente Popular do Acre tivemos importantes avanços quanto à ampliação de vagas, estrutura e financiamento das escolas, além do projeto de formação de professores junto a universidade. No entanto, o atual cenário requer esforços para superar questões ainda não resolvidas; destaca-se a exclusão dos menos favorecidos, especialmente nas áreas urbanas de periferia, do campo, da floresta e das águas. A segunda questão é a necessidade de potencializar os métodos de ensino que reconheçam as atividades produtivas importantes no desenvolvimento social e econômico das famílias e dos estudantes.

Nesse sentido apontamos alguns caminhos fundamentais para o desenvolvimento socioeconômico das pessoas do estado do Acre tendo como princípio a educação e o trabalho.

- Mapear as condições objetivas do contexto acreano, a fim de identificar as atividades e necessidades de trabalho, de modo a conhecer essa realidade para possibilitar o acesso ao conhecimento aos que estão na exclusão social;
- Fomentar um processo de trabalho colaborativo com as comunidades envolvidas sobre seu papel social, cultural, econômico e político frente à necessidade da humanidade de cada um em ação coletiva;
- Desenvolver um processo de formação de saberes profissionais pela ação educativa por meio de uma metodologia que enfatize a pedagogia da prática.

Com base nesses caminhos traçamos nosso objetivo e iniciamos de forma colaborativa, mas com o intuito de desenvolver Comunidades de Prática/CoP (WENGER, 2001) em cada localidade que essa ação de trabalho e educação será constituída. Wenger apud Crecci e Fiorentini argumenta que a perspectiva da CoP possui três características básicas do que se constitui como comunidades de prática: o compromisso mútuo, uma prática conjunta e o interesse comum que une os membros participantes. (CRECCI; FIORENTINI, p.4, 2018). Essas características permitem a construção de um projeto que inclua a participação de forma ativa e prática.

Desde 1922 (100 anos), a Universidade Federal de Viçosa (UFV) escreveu, nos quatro pilares do prédio-sede, as palavras: Estudar, Saber, Agir e Vencer. A coluna (pilar) escrita agir atualizada no sentido de realizar. Esta estratégia didático-pedagógica é inversa ao modelo que sustenta as estratégias de ensino focada numa pedagogia tradicional centrada nos estudos teóricos.

Assim, superar essa dicotomia entre teoria e a prática, é a busca de um processo de formação que considere a práxis social. Desse modo, propomos para o Acre que uma metodologia que permita a criatividade, a crítica e a transformação do sujeito em suas possibilidades, estimulando o protagonismo dos empreendedores, trabalhadores e da juventude; facilite a integração das mulheres, a formação sociocultural das pessoas e comunidades; uma estratégia que o trabalho seja parte do processo ensino-aprendizagem.

Ao considerar a pedagogia da prática, balizada pelo aprender fazendo como o desvelamento da realidade concreta e na sua inteireza que como instrumento de modernização, evolução e melhores condições de vida das pessoas se relaciona com outras construções em curso que visam a interação entre universidade, indústria e governo como chave para inovação numa economia baseada no conhecimento.

Etzkowitz (2017) as universidades compõem o princípio gerador, a indústria o lócus da produção e o governo a fonte de relações contratuais criando uma engrenagem denominada hélice tríplice. Universidades, empresas e governos “assumem o papel do outro”, nas interações da hélice tríplice. A universidade e governos estimulam o desenvolvimento de novos empreendimentos por transferência de tecnologias ou incubação, as empresas são espaços privilegiados da prática curricular.

A sociedade precisa estar aberta para fonte de novos conhecimentos dando ao indivíduo a oportunidade de contínua evolução e novas configurações da educação, trabalho e cultura.

As novas ideias mudam o mundo

Por exemplo, a aplicação do soro caseiro ajudou a salvar a vida de milhões de crianças, ideias novas e simples têm impacto positivo (mudam o mundo). A filosofia de Paulo Freire tinha no diálogo entre professor e aluno, algo óbvio, suas propostas relacionadas à alfabetização revolucionam a educação. Milton Santos, geógrafo e professor, disse que toda ação humana é trabalho. Não há produção que não seja produção no espaço, a forma de vida do homem é o processo de criação de espaços. O homem, no decorrer da sua história, acumula experiência e inova. O futuro é que constitui o domínio da vontade e é sobre ela que devemos centrar nossos esforços, de modo a tornar possível e eficaz a nossa ação.

As universidades federais têm importante papel para desenhar o modelo de estudo relacionado com a produção (aprender fazendo); por exemplo, no Estatuto da UFAC consta que a indissolubilidade do Ensino, Pesquisa e Extensão é mais coerente com a aplicação das estratégias pedagógicas do aprender/fazendo.

Outro exemplo é a Embrapa que desenvolve as suas pesquisas em parceria com produtores, nas cadeias produtivas, com a participação dos mesmos, procurando mais e melhores resultados.

Chico Mendes, seringueiro e líder sindical no processo para defender os interesses dos povos da floresta, identificou que esta causa é da humanidade, pois a defesa das florestas e meio ambiente é de interesse de toda humanidade; organizou um movimento ambientalista propondo que a produção deve ser limpa em todas as cadeias produtivas. Chico Mendes deixa um legado importante para a reflexão sobre a interação do homem natureza, uma ideia que vem contribuindo para mudar o mundo.

Sugestões de como operar na realidade

- Formar uma comissão de trabalho;

- Selecionar as localidades e as demandas onde será organizado um polo, de modo que as pessoas associadas às atividades de redes produtivas sejam incluídas (polo: espaço físico, mobiliário, com acesso à internet de boa qualidade, espaço de lazer e cultural etc.); os alunos de graduação vinculados à região serão incentivados ao acesso e permanência nos cursos;

- Fazer diagnóstico rápido, inicial das localidades, observando o perfil da população local nos aspectos educacionais, saúde, trabalho, moradia, conectividade e acesso a transporte para a sede do município;

- Os cursos de nível superior selecionados devem ter seus docentes capacitados para a nova metodologia;

- O projeto de formação voltado para atender o desenvolvimento do Acre será coordenado por consórcio das instituições de ensino e pesquisa e representantes da juventude, sindicatos patronais e dos trabalhadores. Parcerias com municípios, estados brasileiros e fronteiriços;

- Este programa estimulará parceria com outras instituições regionais, nacionais e internacionais comprometidas com ações sociais educativas relacionadas e construção da equidade;

- Integrar as atividades dos programas de mestrado e doutorado com os cursos de graduação, desde a definição dos temas, perguntas e desenvolvimento das pesquisas; bem como os alunos de pós-graduação para desenvolver outras atividades docentes com suporte de bolsas.

Conclusão

Neste texto, estamos apresentando uma proposta que apoiará as famílias carentes e em vulnerabilidade social a produzir e prestar serviços públicos e privados, gerando oportunidades de emprego e renda para a juventude e famílias residentes no Acre.

Produzindo para o consumo interno, planejando e negociando sua produção com outros estados/países, ao mesmo tempo, os jovens poderão cursar o terceiro grau, pós-graduação (mestrados e doutorados) voltada para apresentar maiores e melhores resultados nas cadeias produtivas.

Sibá Machado está presente na maioria dos projetos de expansão da UFAC e criação do IFAC. Geógrafo e mestre em Desenvolvimento Regional pela UFAC, articulador do encontro SBPC do Acre; articulador no Congresso Nacional da aprovação do Código Brasileiro da Ciência. Foi secretário de Desenvolvimento do Acre; deputado e senador pelo estado; presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais; membro da Pastoral da Terra da Igreja Católica; filho de família de pequenos produtores rurais

Pascoal Muniz é doutor pela FSP-USP

Marcos Alexandre é engenheiro civil, ex-prefeito de Rio Branco

Manoel Lima é ex-diretor do Sinteac e CNTE, mestrando em Educação

Franciana Castro é professora da UFAC e doutora em Educação pela PUC/SP

Maria Rainilda N Muniz é mestranda em gestão negócios Turísticos UECE

Referências bibliográficas:

Etzkowitz Henry. Hélice Tríplice. Universidade-Indústria-Governo: Inovação na Universidade Brasileira. Editora Voo, Curitiba, 2017.

Milton Santos. Coleção Caros Amigos: Grandes cientistas brasileiros. São Paulo. Editora Casa Amarela, 2000

Milton Santos. Metamorfose do Espaço Habitado. Editora Hucitec. São Paulo

Paulo Freire. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. São Paulo. Paz e Terra, 2000

Vanessa Moreira Crecci e Dario Fiorentini. Desenvolvimento Profissional em Comunidades de Aprendizagem Docente. Educação em Revista [online]. 2018, v. 34 [Acessado 1º de Maio de 2022]. Disponível em: . Epub 18 Jan 2018. ISSN 1982-6621.