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A campanha de 2022 conjuga ódio, medo e violência em patamar nunca visto no Brasil. Cabe aos setores democráticos derrotar o fascismo e sua fábrica de medo e ódio

O medo produzido pela ameaça simbólica e física tornada cotidiana, assim como o ódio, são componentes umbilicais do fascismo. Reprodução/Brasil de Fato

Em memorável campanha, Lula, sem medo de ser feliz, enfrentou o medo fomentado, de modo intenso, pelas classes dominantes e seus muitos aparelhos ideológicos. Apesar de sua versão paz e amor, medo do Lula “radical” foi propagado para barrar o inusitado de um trabalhador governar o país. A Presidência era propriedade, lugar exclusivo dos donos do poder. Para eles, trabalhador na Presidência era perigo inaceitável.

Agora, em campanha que pode ser memorável, Lula recorre ao amor para vencer o ódio. Enorme ódio fabricado desde seu governo. Ódio, por vezes subterrâneo, por vezes escancarado, contra ele, lideranças do PT e da esquerda. Ódio de classe. Ódio dos dominantes contra aqueles que tentam, com altos e baixos, mudar o desigual lugar destinado aos explorados e aos oprimidos na sociedade brasileira, produtora febril de gigantescos privilégios.

Medo e ódio acionados nas campanhas eleitorais como modos de paralisar o debate dos projetos para o país, que deveriam marcar o momento eleitoral em uma situação democrática, mesmo na frágil democracia brasileira, sempre limitada por golpes, tutelas militares, amplas desigualdades socioeconômicas e comunicacionais, que turvam a vida democrática.

Medo e ódio hoje vivenciados em outras tonalidades distintas daquelas de antes do golpe midiático-jurídico-parlamentar de 2016 e das eleições antidemocráticas de 2018, quando o Brasil vivia sua frágil democracia. As circunstâncias na atualidade são outras. Mais drásticas para a disputa eleitoral que as anteriores. No novo cenário, medo e ódio, marcam presença, a ferro e fogo, de maneira mais brutal.

O ódio construído e sistemático desde 2005 tentou liquidar Lula e a esquerda. Ele invadiu a sociedade, tomou corações e mentes, mesmo de pessoas distantes da cena política, dilacerou famílias, serviu para a extrema-direita tomar o poder e no governo federal instalar a barbárie, promover o genocídio, aplicar o ultraneoliberalismo, militarizar o Estado, destruir as políticas públicas, corroer/corromper as instituições, ampliar desigualdades, exclusões e opressões, alargar os privilégios e reforçar o autoritarismo do governo e na sociedade brasileira.

O ódio, farto nos gabinetes do ódio montados, transformou o medo. De medo antes quase simbólico, ele se transmutou no cenário atual em violência simbólica e física. A morte de Marielle Franco é sua expressão emblemática. Mas as ameaças e os assassinatos atingiram em profusão lideranças populares, indígenas, rurais, periféricas, políticas, sociais, culturais etc. O ódio, mobilizando pessoas, por vezes até inesperadas, propiciou a grave mutação: a civilidade, que sempre foi frágil na sociedade e política brasileiras, desapareceu da cena nacional. Em seu lugar, ódio, brutalidade, violências.

O medo produzido pela ameaça simbólica e física tornada cotidiana, assim como o ódio, são componentes umbilicais do fascismo. As hordas nazistas disseminaram sua ideologia por meio de gigantesca propaganda política, da produção cotidiana do ódio contra adversários, reais e imaginários, transformados em inimigos a serem destruídos. Judeus, comunistas, esquerdistas, homossexuais, ciganos, deficientes e todos aqueles que o regime nazifascista tornasse inimigos a serem aniquilados.

A campanha eleitoral de 2022 está submersa no cenário de autoritarismo e violência. Com a extrema-direita fascista se armando, por meio de suas milícias, forças militares e bandos; com o ódio propagando em fake news e no fanatismo de suas religiões fundamentalistas; com os ultraneoliberais agarrados ao projeto de destruir e roubar o estado; com os políticos do centrão na rapinagem dos recursos públicos; enfim com a mobilização de todos os setores autoritários e antidemocráticos, que, sem escrúpulos, farão tudo para manter o genocida no poder.

A campanha de 2022 conjuga ódio, medo e violência em patamar nunca visto no Brasil. Cabe aos setores democráticos derrotar o fascismo e sua fábrica de medo e ódio.

Antonio Albino Canelas Rubim é pesquisador e professor da UFBA