Monica Bufon
No meio rural a gente vem enfrentando antigos e novos desafios. Ainda é muito alto o índice de informalidade no campo brasileiro, mais de 80%. Temos de avançar nesse ponto para que a agricultura familiar permaneça viva. Temos hoje apenas 23% das terras com agricultura familiar, que se apresentam de várias formas: pequenos proprietários, comodatários, os que trabalham em agroindústrias, os sem-terra.
Apenas 23% das terras, mas representando 67% das ocupações no meio rural brasileiro. Ou seja, numa pequena parte das terras temos muitos agricultores que produzem. E suas famílias também trabalham ali, diferente do agronegócio.
Importante também destacar que 23% do valor bruto da produção agropecuária nacional correspondem à dinamização econômica de 96% dos municípios com até 20.000 habitantes.
Uma dificuldade recente muito grande foi o esvaziamento das políticas públicas nos últimos dois governos federais. O esvaziamento teve impacto muito grande no meio rural. Desde o ano passado, com o retorno do MDA, a gente vem conseguindo a retomada das políticas públicas, apesar de ainda persistirem dificuldades de acesso. Mas já se percebe como tem melhorado.
Outro desafio que permanece é o trabalho análogo à escravidão. Tivemos notícias sobre o Rio Grande do Sul na imprensa, mas não é só lá. A questão climática também representa desafio importante. Afeta muito as condições de produção e também do bem-viver. Cabe destacar também o tema das inovações e as novas tecnologias de informação e comunicação.
Problema sério também está no grande êxodo rural. Falta de mão de obra no campo. Muitos culpam a Bolsa Família por isso, mas ela não é a causa. O êxodo cresceu com a falta de políticas públicas, que ampliou a dificuldade de permanência das pessoas no campo.
Precisamos pensar sobre como as tecnologias podem ajudar. Não só para a produção capitalista. Elas podem trazer, inclusive, diminuição na carga horária. Como produtora de café, muitas vezes precisava levantar às 3 horas da manhã para conseguir dar conta de colher o café na safra, porque a gente não tem o ano todo.
Quando a gente fala sobre essa modernização, precisamos pensar num equilíbrio entre a inovação e a inclusão para garantir mais igualdade. É muito grande a desigualdade no campo, entre o agronegócio e a agricultura familiar. É preciso dialogar também com a questão dos assalariados rurais.
Hoje, quem tem sofrido mais no campo é a população preta, a juventude e as mulheres. Entre 2012 e 2023 a população jovem, de 16 a 32 anos, que é o recorte adotado pela Contag, saiu do campo numa cifra de 1.488.000. Mais de 1 milhão de pessoas numa década. Foram 26% na região Centro-Oeste, 25% na Sudeste, 20% na Sul e 19% na Norte. E tivemos um acréscimo muito grande dessa juventude na região Norte, 20% na Sul e 19% na Nordeste, enquanto a Região Norte registrou até um pequeno acréscimo, de 0,1%.
A gente sente falta deste debate lá nas comunidades. É preciso que este debate chegue na juventude, chegue nas mulheres, nas comunidades quilombolas, ribeirinhas e a gente avance. Precisamos trabalhar o bem-viver em nossa sociedade, e quando a gente fala desse mundo do trabalho, a gente está falando de condições de vida e de igualdade.
Monica Bufon - Atua na área da agricultura familiar, produtora de café CONILON. Atualmente é secretária de Jovens da Contag. Filiada ao Partido dos Trabalhadores,Formada em Gestão Pública e curso Psicanálise