Política

Zambelli deverá ter seu mandato cassado por declaração a ser feita pela Mesa da Câmara dos Deputados em cumprimento à decisão penal condenatória definitiva exarada pelo STF

A Constituição Federal de 1988, elaborada por um Congresso Constituinte sufragado direta e democraticamente pela população e devidamente promulgada com toda legitimidade, é um documento de excelente qualidade, mas, como qualquer empreendimento humano, contém falhas que, entretanto, podem ser solucionadas recorrendo-se ao próprio texto constitucional bem como por meio da exegese do Supremo Tribunal Federal (STF), guardião da Constituição. Uma dessas falhas se encontra na questão referente à cassação do mandato de deputado federal em virtude de condenação criminal definitiva determinada pela Corte Suprema.

Segundo o artigo 55, caput, perderá o mandato o parlamentar federal, deputado ou senador:

I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior;

II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;

III - que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;

IV - que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;

V - quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;

VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.

No caso da deputada Zambelli, pode-se enquadrar sua situação no art. 55, VI, já que sofreu condenação criminal em sentença transitada em julgado exarada pelo STF. Para esse caso específico, a Constituição, no próprio art. 55, § 2º, estabelece que: a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”.

Em decorrência da adoção do procedimento previsto nesse dispositivo da Constituição, a Mesa da Câmara promoveu a votação e o mandato da referida parlamentar foi preservado.

Entretanto, conforme argumentado antes, as contradições da Constituição podem ser sanadas pelo exame do seu próprio texto. Ocorre que a decisão de condenação da deputada Zambelli pela Suprema Corte teve fundamento no artigo 55, IV em conjunto com o artigo 55, §3º combinados com o artigo 15, III. Vejamos o que dizem esses dispositivos isoladamente para depois fazermos uma apreciação conjunta dos aludidos dispositivos.

O artigo 55, IV determina que o parlamentar federal perderá o mandato quando perder ou tiver suspensos os direitos políticos. O artigo 15, IV diz que a perda ou suspensão dos direitos políticos ocorrerá em decorrência de condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos, o que vem a ser exata e precisamente o caso da deputada Zambelli. E o que determina o artigo 55, parágrafo 3º da Carta Magna é que nesse caso aqui abordado, a perda do mandato será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

Ora, as condenações criminais da referida deputada tiveram como fundamento constitucional o exame conjunto do artigo 55, IV e seu parágrafo 3º combinado com o artigo 15, IV da Lei Maior. O amparo constitucional da condenação penal da deputada Zambelli foi o antes citado, e não a interpretação equivocada feita pela Câmara dos Deputados, que não é instância recursal do STF, de que seria aplicável ao caso o art. 55, VI combinado com o artigo 55, parágrafo 2º.

Carla Zambelli deverá ter seu mandato cassado por declaração a ser feita pela Mesa da Câmara dos Deputados em cumprimento à decisão penal condenatória definitiva exarada pelo STF com base no artigo 55, IV combinado com o artigo 15,IV e também com a aplicação do artigo 55, parágrafo 3º, conforme preconiza o texto constitucional.

Carlos Frederico Alverga é economista graduado na UFRJ, especialista em administração pública pelo Cipad/FGV e em Direito do Trabalho e Crise Econômica pela Universidade de Castilla La Mancha (Espanha) e mestre em Ciência Política pela UnB. E-mail: [email protected]