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Entrevista com Luiz Marinho, prefeito eleito de São Bernardo do Campo

Luiz Marinho. Foto: Antonio Cruz/ABr

Luiz Marinho venceu nas últimas eleições, em segundo turno, com 58,19% dos votos válidos, o tucano Orlando Morando, na disputa pela Prefeitura de São Bernardo do Campo (SP), cidade berço do sindicalismo dos anos 1970 e do Partido dos Trabalhadores.

Metalúrgico, foi presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABCD por três gestões consecutivas. Na presidência da Central Única dos Trabalhadores de 2003 a 2005, Marinho conduziu as negociações para a implantação do crédito consignado para os trabalhadores e iniciou, junto como as demais centrais sindicais do país, a luta pela formulação da política para recuperação no longo prazo do poder aquisitivo do salário mínimo.

Em 2005, convidado pelo presidente da República, assumiu o Ministério do Trabalho e Emprego. Negociador nato, comandou o processo de discussões histórico com representantes de todas as centrais sindicais para definir o valor do salário mínimo de 2006: piso nacional de R$ 350, equivalentes a 13% de aumento real, ou seja, descontada a inflação do período, o maior índice alcançado desde 1995, mais a antecipação do reajuste para abril. Em 2007, após uma reestruturação ministerial, passou a ministro da Previdência Social.

Luiz Marinho governará a cidade que tem o terceiro maior orçamento municipal do estado de São Paulo (R$ 2,2 bilhões), que faz parte do terceiro maior mercado consumidor do país, o Grande ABC, colado a São Paulo, que é o primeiro, próxima ao Porto de Santos, o maior da América Latina.

Quais são as suas prioridades para São Bernardo? O que destacaria como mais inovador dentro de seu programa?

Como prioridade, vamos cuidar da periferia, que está abandonada, além de saúde, habitação e transporte. O debate na campanha girou principalmente em torno de saúde. Reconhecemos o que foi feito, mas há muitos questionamentos. A principal reclamação da cidade é em relação à saúde. Vamos construir o hospital geral, dois novos prontos-socorros, e trabalhar a gestão para dar garantia ao atendimento. Pretendemos implantar o bilhete único, para promover a integração do transporte público. Queremos inovar na área de infra-estrutura com a construção de uma usina para a produção de energia a partir do lixo, em vez de depositá-lo em aterro sani-tário, como é hoje. Já existe tecnologia que possibilita a queima do lixo para produzir energia. Isso dá inclusive crédito de carbono.

Celso Daniel, prefeito de Santo André, assassinado em 2002, tinha um olhar sobre toda a região do ABCD. Você pretende recuperar a visão do projeto de desenvolvimento regional e de uma atuação conjunta com os municípios vizinhos, e em que medida?

Temos instrumentos regionais: o Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, a Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC... O consórcio não foi adequado a nossa legislação municipal, foi formado sob a liderança de Celso Daniel, mas sem respaldo legal na legislação nacional para se transformar em consórcio público. Era um consórcio de prefeitos, com atuação limitada. Podia fazer muito bem o diagnóstico, mas não tinha instrumentos para executar o diagnóstico. Precisamos dar esse passo, transformá-lo em consórcio público para que ele também possa executar, contratar políticas. Por exemplo, a questão do lixo. Como trabalhar no consórcio de prefeitos de maneira que ele possa formar uma empresa regional para fazer a incineração do lixo. É preciso ir além da situação atual, de uma instância de articulação, e passar a ser uma instância de articulação e execução de políticas.

A crise financeira internacional já delineia um clima de apreensão no país. Nas montadoras, cortes de horas extras, antecipação de férias coletivas, suspensão de novas contratações colocam os trabalhadores em São Bernardo do Campo em estado de atenção. Caso a situação se agrave, qual a possível atuação da esfera municipal nessa questão?

Primeiro, creio que essa situação da crise econômica mundial, que não é brasileira, e sim de origem norte-americana, pode ter maior ou menor intensidade no Brasil. O governo brasileiro, o presidente Lula, vem tomando medidas corretas para diminuir o impacto dessa crise na nossa economia. Cabe ao presidente, aos governadores, ministros, prefeitos, empresários, tomar a frente para não permitir que a repetição e a previsão do caos venha a criar definitivamente o caos. Creio que as orientações que o presidente Lula tem dado para a Petrobras, para as empresas públicas, e fazendo com que esse entendimento se estenda à iniciativa privada, devem fazer parte também da ação dos prefeitos em suas decisões de investimentos e convencendo também os empresários a dar continuidade aos investimentos. Só os investimentos poderão evitar que a economia sofra mais. O que está acontecendo com as montadoras e alguns setores é uma freada de arrumação, porque se há alarde de diminuição de consumo é preciso fazer o arranjo político. O mercado interno ainda não sofreu todo esse impacto. Mas creio que se trabalharmos corretamente para que todas as empresas, todos os segmentos dêem continuidade aos investimentos, rapidamente isso se refletirá no mercado interno.

É evidente que as cidades devem estar atentas para eventualidades e tenham de complementar alguma ação do governo federal ou estadual, mas não estão claras ainda quais as medidas que aos municípios cabe tomar.

Quais os principais desafios da geração de prefeitos petistas eleita em 2008? Como você analisa a relação desses gestores com o governo Lula?

A geração de prefeitos que assumirá em 1º de janeiro e a que dará continuidade a um segundo mandato têm como tarefa fazer uma boa gestão, buscar ações inovadoras, implementar um projeto de desenvolvimento para a cidade, ter mecanismos que levem à participação da sociedade, da comunidade, e aperfeiçoar o processo democrático. É a partir da realidade da cidade que isso pode ser feito, a partir das discussões planejadas de participação, da interação da democracia representativa com a participativa. É criando redes de diálogo com os prefeitos em suas regiões que proporcionaremos condições dearticulação do partido para disputar o governo do estado. Essa também tem de ser a colaboração dos prefeitos para enfrentar a eleição em 2010 do sucessor do presidente Lula, que será bastante difícil.

E, por falar em 2010, após sua eleição seu nome passou a figurar nas listas especulativas de candidatos ao governo do estado. O que você acha disso?

Eu acho precipitado. São Bernardo é uma cidade importante, mas está bastante desestruturada. Vamos ter de reestruturar a gestão da cidade, há muitas demandas. Apesar de São Bernardo ter um bom orçamento, o estado de pobreza de grande parte da população é muito grande. Há falta de infra-estrutura social. O meu papel é fazer uma gestão completa e bem-feita, caminhar para a reeleição e realizar o projeto de transformação que a cidade precisa. O partido deverá pensar em outras alternativas para 2010, não poderá nem pensar na possibilidade de meu nome estar à frente de uma empreitada como essa. Meu desafio é governar bem São Bernardo.

Qual o peso que você atribui ao apoio do presidente Lula a sua campanha?

A ajuda que ele pôde dar a todas as candidaturas do partido é a qualidade do governo que vem exercendo no país. A vitória que tivemos em São Bernardo é composta de vários elementos, desde a qualidade do governo do presidente Lula, a sua participação pessoal, até o processo de alianças formatado na cidade. A participação direta do presidente foi muito importante em várias atividades de campanha. Todo o respaldo e toda a mensagem transmitida foram de que nós vamos fazer uma administração que terá grande proximidade com o governo federal. A presença do presidente foi determinante para deixar clara a mensagem de parceria entre os governos municipal e federal – e vencermos.

Qual o significado de um ex-metalúrgico e petista ser eleito prefeito em São Bernardo?

Para mim e para a categoria metalúrgica é muito importante. Principalmente porque enfrentamos o preconceito arraigado na sociedade. Tanto o jornal da região como o meu adversário se referiam a mim não como ministro, mas como sindicalista, tentando com isso colocar um ponto de interrogação na cabeça de parcela da população da cidade que ainda tem valores conservadores bastante fortes. Passar por cima do preconceito, que ainda está presente e faz parte do debate, contra o trabalhador é importante para desmistificá-lo.

Rose Spina é editora de Teoria e Debate.