O partido praticamente dobrou o número de prefeituras no estado, porém diminuiu terreno em relação à população sob suas administrações
O partido praticamente dobrou o número de prefeituras no estado, porém diminuiu terreno em relação à população sob suas administrações
No caso específico de Fortaleza, o apelo inescrupuloso a campanhas difamatórias, os bordões antipetistas, o derrame em proporções industriais de dinheiro às vésperas das eleições, a partidarização explícita das estruturas governamentais em favor do candidato oficial do governador nos trazem à reflexão a permanência do arcaico na política e os desafios da manutenção de uma política de alianças que nos asfixia e anula
As eleições municipais no Ceará assinalaram um momento importante de disputa social e política de projetos, de maior enraizamento partidário. O PT no Ceará foi capaz de estruturar candidaturas fortes, eleitoralmente viáveis nas principais cidades cearenses. Soube traduzir os compromissos do partido no âmbito local, com todas as dificuldades e assimetrias, próprias de nosso desenvolvimento desigual e ainda demasiadamente concentrado em poucos polos urbanos. Também não se pode deixar de registrar as limitações de nossa atuação, dada a improvisação de meios e o peso do tradicionalismo político em nosso meio.
Nesse sentido, as eleições no Ceará devem ser compreendidas como parte de uma dinâmica contraditória. Não obstante os significativos avanços obtidos no campo da distribuição de renda, da melhoria dos indicadores sociais, do acesso ao crédito etc., tais conquistas não foram devidamente trabalhadas política e ideologicamente. Crescemos, mas não estabelecemos com nitidez o que representamos em termos estratégicos, nem nossa identidade socialista, nem os vínculos entre as conquistas imediatas e os passos futuros no caminho da emancipação popular. Por vezes a diluição nas alianças conduz à perda do sentido pedagógico da salutar diferenciação dos interesses de classe e do campo democrático e popular que representamos em colisão com as demandas do capital e seus agentes.
O PT no Ceará, por exemplo, praticamente dobrou o número de prefeituras que administra no estado. Das quinze anteriores, saltou para 29 nestas eleições. Ao mesmo tempo, porém, diminuiu terreno em relação à população sob suas administrações. Ou seja, ganhamos peso institucional, capacidade de disputa e espraiamento por todo o estado, mas perdemos no diálogo com setores fundamentais com os quais acumulamos projetos e desenvolvíamos disputas em centros urbanos decisivos.
Expandimos em 93% nossas gestões, dando continuidade à linha evolutiva do PT no Ceará. Contudo, se em 2008 governávamos municípios que somavam 3.163.979 habitantes (37,44% da população total do estado), agora são 1.095.248 habitantes (12,83%) sob nossa responsabilidade administrativa, de acordo com dados do Anuário Estatístico do Ceará de 2011, do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece). Com relação ao PIB cearense, em 2008 o PT passou a administrar 53,73% do total à época, cerca de R$ 60 bilhões, e a partir de agora as cidades sob seu governo representam 9,60%, segundo dados de 2009 do Ipece.
Se comparamos nossa trajetória com a do PSB – que empolga a administração estadual e possui a máquina eleitoral mais “azeitada” –, verificaremos as diferenças. Dos 22 municípios em que venceu as eleições em 2008 passou para quarenta em 2012, ampliando significativamente a população sob seus governos, uma vez que ganhou em Fortaleza.
Com as cidades conquistadas em 2008, o PSB representava somente 7,45% da população cearense de então. Em 2012, saltou para 44,27%. Se somarmos, porém, as prefeituras que o PSB passará a administrar com as do PSD, que estão dentro da órbita do mesmo grupo político, terá sob seu comando mais da metade da população do estado (50,13%).
Se no período anterior o PSB administrou um PIB de cerca de R$ 4 bilhões, a partir do 2013 somará por volta de R$ 40 bilhões, ou seja, 59,86% do PIB do Ceará. Contando com as prefeituras conquistadas pelo PSD, o percentual chega a quase 63%, obtendo assim um crescimento de 82% em relação às eleições passadas.
Por fim, saliente-se que perdemos os principais centros urbanos do estado – Fortaleza, Juazeiro do Norte –, com exceção de Sobral, onde se produziu uma aliança PT-PSB, dirigida e hegemonizada pelos Ferreira Gomes. No caso específico de Fortaleza, centro do processo político estadual, dada a densidade política, social, econômica e cultural da mesa, observou-se uma preocupante atuação do governador, de sua família e aliados. O apelo inescrupuloso a campanhas difamatórias, o agitar de bordões antipetistas, o derrame em proporções industriais de dinheiro às vésperas das eleições, a partidarização explícita das estruturas governamentais em favor do candidato oficial do governador nos trazem à reflexão a permanência do velho, do arcaico em nossa política e os desafios da manutenção de uma política de alianças que nos asfixia e anula pedagogicamente como agentes da transformação profunda do país, do Ceará de que tanto precisamos.
Newton de Menezes Albuquerque é membro do Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo
Herbert Lima é militante do Núcleo Américo Barreira