Mojana Vargas
Existe uma tendência de tratar o continente africano de maneira monolítica, o que é um erro. O continente africano é o segundo mais populoso do mundo, com cerca de 19% da população mundial. É o continente que possui a maior taxa de natalidade, com média de quatro filhos por mulher. Essa taxa é de 1,9 na Ásia, de 1,6 na América do Norte e 1,4 na Europa.
Em 2024, das 20 economias com crescimento mais acelerado no mundo, 11 são africanas: Niger, Senegal, Líbia, Ruanda, Costa do Marfim, Etiópia, Benin, Djibuti, Tanzânia, Togo e Uganda. Alguns deles passaram ou estão passando por crises sociais e políticas recentes. A Líbia ainda vive em crise política e social, desde a chamada Primavera Árabe. No Senegal um candidato de esquerda venceu uma eleição recente, com um projeto nacionalista. No Niger ocorreu um golpe de Estado e o país está suspenso da União Africana devido a essa mudança inconstitucional de regime.
O PIB africano deve crescer em 2025 entre 3,8% e 4,2%, de acordo com projeções do Banco Africano de Desenvolvimento. São índices superiores aos mundiais, que deverão oscilar entre 2,9 e 3,2. Ou seja, com todas as dificuldades que enfrenta, o continente africano é hoje um polo dinâmico na economia internacional. É um cenário muito distinto dos anos 1990, quando a maioria dos países passava por gravíssima crise de endividamento, adotando os ajustes estruturais financiados pelo FMI.
A partir de 2003 o Brasil adota nova abordagem sobre a África, priorizando mecanismos de integração, com interesse particular voltado ao Brics, mas também através da Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul.
Nos últimos cinco ou seis anos a integração das economias africanas tem sido o foco principal no Continente, através de diferentes estratégias conduzidas pela União Africana. Ocorreram duas cúpulas importantes.
Em 2022, o Departamento de Estado promoveu nos Estados Unidos uma reunião de líderes africanos com grande repercussão midiática, tendo como temas a segurança alimentar, paz e segurança, respostas à crise climática e ampliação dos laços da diáspora africana. Dois temas foram levantados como obstáculos, a questão dos Direitos Humanos e a promoção de regimes democráticos, incluindo nesse caso reunião de Biden com os líderes do Congo, Gabão, Libéria, Madagascar, Nigéria e Serra Leoa.
De fato, a diplomacia norte-americana considera a África irrelevante, mas essa cúpula veio como resposta à presença crescente da China e também da Rússia na região, atores não tradicionais na região. Os antigos colonizadores – Portugal, Espanha, França, Inglaterra e Holanda principalmente – atores tradicionais, seguem presentes, mas prevalece uma expansão da presença chinesa.
Logo após a cúpula africana convocada pelos Estados Unidos, a Rússia convocou evento semelhante em 2023, buscando ampliar sua cooperação econômica com a África, mas também com objetivos geopolíticos de reforçar o multilateralismo, oferecendo novas opções de articulação política aos países africanos, ao mesmo tempo em que se buscava romper o isolamento da própria Rússia.
Mojana Vargas - Doutora em Estudos Africanos pelo ISCTE-IUL (Instituto Universitário de Lisboa), possui Mestrado em Relações Internacionais pelo Programa San Tiago Dantas (Unesp-Unicamp-PUC/SP) e graduação em História - Bacharelado e Licenciatura, pela Fac. de Filosofia, Letras e Ciências Humanas - USP (2004). Tem interesse na área de História Política, com ênfase em Política Externa do Brasil, atuando principalmente nos seguintes temas: África nas Relações Internacionais Brasileiras e Política Africana. Atualmente é docente no curso de Relações Internacionais Universidade Federal da Paraíba e Coordenadora do NEABI-UFPB (Núcleo de Estudos e Pesquisas Afro-Brasileiros e Indígenas) da mesma instituição