Mundo do Trabalho

A proposta de filiar a CUT à Ciosl, da qual fazem parte organizações pelegas e pró-imperialistas, representa a negação de toda uma trajetória de luta. É fundamental, isto sim, construir uma nova central mundial, democrática e independente.

A filiação da Central Única dos Trabalhadores à Ciosl é uma das questões mais polêmicas do 4º Concut. Dentro da CUT existem correntes e dirigentes que defendem esta filiação e devem levar a proposta ao Congresso. Nossa posição é oposta; é favorável a que a CUT tome a iniciativa, junto com outras centrais independentes, de construir uma nova central mundial. Queremos explicar por que somos contra a vinculação à Ciosl.

Os argumentos desenvolvidos pelos que nem apóiam a filiação são, basicamente, três. Em primeiro lugar, os companheiros afirmam que a crescente internacionalização do capital, assim como sua estratégia, mostram que a CUT não pode enfrentar sozinha este novo cenário mundial. Outro argumento muito empregado, é que a Ciosl já não representa o sindicalismo de direita norte-americano, da AFL-CIO, e que, hoje, nela predominaria o sindicalismo europeu, socialista e democrático. E, por último, que, em decorrência do segundo, existe uma forte disputa entre a esquerda socialista, representada pelo sindicalismo europeu, e a direita, composta pela AFL-CIO e pelo sindicalismo japonês. A CUT deveria, portanto, se filiar à Ciosl, participando ativamente da disputa entre esquerda e direita e ajudando a criar uma correlação de forças mais favorável à esquerda na central mundial. Para responder a estes argumentos é preciso, antes de tudo, enxergar o que é de fato a Ciosl, partindo da política que vêm adotando as centrais filiadas a ela, particularmente aquelas que dirigem a entidade.

Primeiro, é importante lembrar que a chamada "direita" da Ciosl, a AFL-CIO norte-americana, é praticamente agente do governo dos EUA e respaldou toda a sua política imperialista. A AFL-CIO apoiou diferentes governos norte-americanos na guerra genocida contra o Vietnã, apoiou entusiasticamente as diversas agressões militares dos Estados Unidos à Nicarágua etc.

Mas não é somente a AFL-CIO que tem este comportamento abertamente pró-patronal. Fazem parte da Ciosl, também, centrais como a CGT (Argentina), CMT (México) e a CTV (Venezuela), todas atreladas, em seus países, aos governos que são ponta de lança de uma política de entreguismo, arrocho salarial e fome, hoje chamada de neoliberalismo.

A Ciosl convive pacificamente com estas práticas. Como é possível a CUT estar dentro de uma central mundial que compactua com a existência, em seu interior, de centrais nacionais com semelhante prática, pró-patronal, pelega e, em alguns casos, abertamente pró-imperialista?

A ala "esquerda" da Ciosl, que hoje está na direção da central, tem uma política que na prática é muito semelhante à direita. Mudam apenas alguns dos seus métodos e o seu discurso. A "esquerda" seria formada basicamente pelas centrais ligadas à social-democracia. O problema é que estas centrais são a vanguarda na defesa da aplicação dos planos de austeridade dos governos social-democratas nos países da Europa.

Na verdade, a ala social-democrata tem a mesma política de defender os planos capitalista-imperialistas que tentam descarregar a crise econômica sobre as costas dos trabalhadores. Procuram apenas negociar, aqui e ali, o rigor desta ou daquela medida. A diferença é formal. A AFL-CIO assume diretamente o discurso do governo norte-americano. O mesmo faz o sindicalismo japonês. Já as centrais de "esquerda", social-democratas, o fazem de forma mais disfarçada, com o discurso da "concertação social", do "entendimento", do "diálogo", dos "pactos", dos "acordos", ou qualquer nome que se queira dar à velha política de traição ou de colaboração de classes.

É só ver os "pactos sociais", negociados pelas centrais sindicais filiadas à Ciosl. O "Pactos de la Moncloa", assinado pela UGT na Espanha, é um bom exemplo. Além de reduzir consideravelmente os salários dos trabalhadores espanhóis, obrigou-os a conviver com um desemprego que chegou a atingir 20% da população economicamente ativa do país. No Chile, a central sindical fez um pacto com o governo de Aylwinn, que por sua vez aplica toda a política econômica anti-trabalhadores do governo de Pinochet, chegando a manter, inclusive, este último como chefe das Forças Armadas, em acordo com o imperialismo.

Os próprios representantes da Ciosl defendem esta política. No ano passado, houve um seminário no Instituto Cajamar sobre "Perspectivas Internacionais e o Movimento Sindical", com participação do Desesp (CUT). Neste seminário, Luis Anderson, secretário-geral da Organização Regional Interamericana do Trabalho (Orit), seção latino-americana da Ciosl, contrapôs a estratégia de "concertação social", ou pacto social, à estratégia da greve geral, considerando-a mais viável. Mais claro é impossível. Esta é a estratégia da suposta ala "esquerda", ou seja, social-democrata da Ciosl.

A Ciosl é, no conjunto, uma central mundial de colaboração com os planos aplicados pelos governos capitalistas contra a classe trabalhadora, tanto nos países imperialistas como nos países dependentes. O que muda é o caráter desta ligação. Algumas centrais são ligadas aos governos imperialistas de George Bush e de Toshiki Kaifu, primeiro-ministro japonês; e outras são ligadas aos governos imperialistas de François Mitterrand e de Felipe González. Qualquer disputa entre "esquerda" e "direita" se dá dentro desse marco, é uma disputa entre aparatos sindicais de convivência perfeitamente normal, numa central completamente corrompida.

A CUT nasceu e se consolidou, justamente, contra a prática de colaboração de classes, do sindicalismo pelego com os governos capitalistas no Brasil, especialmente com os governos militares. Por isso mesmo, todos os congressos da CUT sempre repudiaram todas as políticas de "pacto social", ou seja, de colaboração de classe. Seria uma incoerência enorme, se a CUT se filiasse a uma central que tem como estratégia, como eixo ordenador da sua política, a "concertação social". Significaria perder a independência de classe da CUT, pela via internacional; seria vincular nossa central a uma central mundial que agrupa algumas das organizações sindicais mais pelegas de todo mundo.

Por isso, consideramos que a proposta de filiar a CUT à Ciosl representa um imenso retrocesso, nega a origem e a trajetória classista e de luta da CUT.

O único argumento que nos parece correto é que a CUT necessita estreitar seus vínculos internacionais. Fortalecer os laços e a atividade internacionalista para melhor enfrentar o imperialismo e seus planos neoliberais e, principalmente, para enfrentar melhor a própria patronal brasileira e o governo Collor, capacho do imperialismo. No entanto, o fortalecimento da nossa luta neste sentido, não se dará filiando a CUT a centrais mundiais ligadas ao imperialismo norte-americano, à social-democracia, à Igreja Católica como a CMT, ou ao stalinismo como a FSM.

A CUT tem diante de si um desafio enorme no terreno internacional. É preciso iniciar discussões, gestões, junto a outras centrais nacionais que, como a CUT, se mantêm independentes no terreno internacional. É o caso da COB (Bolívia), da Cosatu (África do Sul), da Central Sandinista dos Trabalhadores (Nicarágua) e de outras centrais, federações de sindicatos e até sindicatos independentes que surgiram na luta contra seus governos burgueses e contra o imperialismo e que não têm nenhuma vinculação com as grandes centrais mundiais burocratizadas.

A CUT tem a autoridade que vem de sua trajetória de lutas e de independência de classe, para propor a estas centrais a organização de um movimento internacional pela formação de uma nova central sindical mundial classista, democrática e independente do imperialismo e dos governos burgueses e burocráticos de todo o mundo. Esta é a grande tarefa que tem o movimento sindical mundial no próximo período. Esta é a proposta que levaremos ao 4º Concut.

José Maria de Almeida é presidente da Federação Democrática dos Metalúrgicos de Minas Gerais e membro da direção nacional da CUT.