O Comitê de Política Monetária (Copom) nasceu em 20 de junho de 1996 com o objetivo de estabelecer as diretrizes da política monetária e a taxa básica de juros Selic. A sistemática de "metas para a inflação" foi instituída pelo Decreto nº 3.088 de 21/6/1999 e, de lá para cá, a política monetária passou a ter como objetivo cumprir as metas para a inflação definidas pelo Conselho Monetário Nacional. O único instrumento para isso é a Selic.
Do início do Copom até 19 de julho de 2006, a Selic esteve acima de 15% ao ano, com média de 20,5%, inflação de 6,9%, ou seja, uma taxa real de 12,8% por mais de dez anos! Só a partir de 20 de julho de 2006 a Selic passou a ficar abaixo de 15%. Assim, desde a existência do Copom até três meses atrás é provável que o Brasil tenha ostentado o desonroso título de campeão mundial da mais alta taxa básica de juros. Essa é a maior distorção macroeconômica da economia brasileira, que contribuiu para travar o crescimento econômico e causar forte dano às finanças públicas, com sérias limitações aos investimentos na área social e na infraestrutura do país. Pior do que tudo, fazendo uma distribuição de renda às avessas, por premiar o sistema financeiro com recursos públicos pagos principalmente pelas camadas de renda média e baixa.
Como baliza de forma direta e indireta todas as demais taxas de juros da dívida pública, a Selic é a determinante básica das despesas com juros nas contas públicas do país.
Admitindo que fossem mantidos os mesmos superávits primários – receitas menos despesas exclusive juros – de 1997 a 2008, a dívida líquida do setor público poderia estar hoje zerada caso a Selic média nesse período fosse de 13,6%, ao invés da ocorrida, de 18,7%. Nessa condição, a economia proporcionada pela redução das despesas com juros atingiria em valores atuais R$ 1,4 trilhão! Essa quantia permitiria resolver todo o déficit habitacional e pagar o Bolsa Família por cem anos.
Em uma comparação internacional, essa Selic de 13,6% é 2,6 vezes maior que a praticada pelos 30 países-membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) nesse mesmo período, que foi de 5,1%.
A tendência da inflação no mundo e no Brasil é se manter em níveis baixos devido à queda acentuada do comércio internacional, que obriga as empresas a direcionar parte substancial dessa perda para seu mercado interno, além da redução da demanda interna em termos de consumo e investimentos. Caso o Copom leve isso em conta e venha a decidir por posicionar a Selic mais em linha com a prática da maioria dos bancos centrais, as despesas com juros poderão cair, abrindo espaço para reduções no superávit primário, fortalecendo políticas contracíclicas e possibilitando melhores resultados fiscais. Do contrário, o país continuará a ter de suportar despesas com juros, que nos últimos doze meses encerrados em maio atingiram R$ 159 bilhões, o mesmo nível registrado desde 2005.
Com a recente decisão do Copom de reduzir a Selic para 8,75%, o Brasil passou a ser o quinto país com a mais alta taxa básica de juros real, com impacto de R$ 135 bilhões de juros por ano nas despesas do setor público.
Como neste ano a atividade econômica aponta para pouco ou nenhum crescimento do PIB, o principal efeito nas contas públicas é a queda real na arrecadação, fato verificado no primeiro semestre. As ações fiscais contracíclicas sem a redução adicional dos juros e o aumento da arrecadação, apesar da redução do superávit fiscal, podem caminhar assim para seu esgotamento.
Para o país retomar o desenvolvimento econômico com contas públicas em equilíbrio é absolutamente necessário que o Copom continue reduzindo a Selic até o final do ano para atingir níveis compatíveis com a realidade internacional. Isso já deveria ter sido feito há muito tempo.
Amir Khair é mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor