Apesar da situação ainda indefinida, não há dúvida que os palestinos marcaram pontos fundamentais no cenário internacional em favor de sua causa
Apesar da situação ainda indefinida, não há dúvida que os palestinos marcaram pontos fundamentais no cenário internacional em favor de sua causa
s negociações entre palestinos e israelenses para um acordo de paz que viabilize a convivência de “dois Estados e dois povos” foram interrompidas em 2010, pois, além de inócuas, o governo de Israel deu continuidade às construções nos territórios ocupados.
Para tentar romper o impasse, a Autoridade Palestina (AP) adotou uma estratégia com duas vertentes. De um lado, o reforço da unidade política interna, reaproximando-se do Hamas, que domina a Faixa de Gaza e, agora, poderá inclusive se integrar à Organização pela Libertação da Palestina (OLP) e ao Parlamento palestino no exílio. De outro, a busca da adesão da Palestina às Nações Unidas como Estado membro – por meio de solicitação entregue pelo presidente Mahmoud Abbas ao secretário-geral Ban Ki-moon, em 23 de setembro –, bem como a outras organizações multilaterais do sistema ONU. Na Conferência Geral da Unesco, obteve sucesso, em 31 de outubro, por 107 votos a favor, 14 contra e 49 abstenções.
As reações do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e do governo norte-americano, seu principal sustentáculo internacional, foram virulentas. O primeiro afirmou que a AP estava reativando relações com um grupo terrorista que não reconhece o Estado de Israel e que a discussão sobre limites territoriais em um fórum multilateral como a ONU significava a rejeição palestina a negociações diretas de paz com seu país. Em retaliação, acelerou a aprovação de novos assentamentos e suspendeu o repasse dos impostos recolhidos nos atuais territórios governados pela AP.
O presidente Barack Obama, dos EUA, e sua secretária de Estado, Hillary Clinton, adotaram o mesmo bordão quanto ao ingresso na ONU, isto é, que a constituição do Estado Palestino deveria surgir de negociações diretas com Israel. Durante a abertura da Assembleia Geral da ONU, Obama declarou que vetaria a solicitação palestina no Conselho de Segurança (CS) e, quando da decisão da Unesco, suspendeu as contribuições financeiras dos Estados Unidos à instituição.
A hipocrisia inserida nessas posições é indisfarçável, pois desde os “Acordos de Oslo 2”, em 1995, nunca mais houve avanços nas inúmeras conversações entre israelenses e palestinos. Apesar de sua aversão ao Hamas, em outubro o governo israelense acertou com o grupo a libertação do soldado Gilad Shalit, capturado em 2006, em troca de cerca de mil prisioneiros políticos palestinos – e o momento escolhido visou constranger o presidente da AP, que não participou da negociação.
A posição adotada pelos americanos contraria declarações anteriores de Obama em favor do Estado Palestino nos limites de 1967 e também suas críticas aos assentamentos israelenses, mas a busca dos votos da comunidade judaica nos EUA para sua campanha de reeleição fala mais alto.
Contudo, a repercussão da iniciativa palestina levou o “quarteto” – União Europeia, Rússia, EUA e ONU – a instar israelenses e palestinos a retomarem conversações para, num prazo de três meses, apresentarem propostas sobre território e segurança. Esse prazo vence no final de janeiro. Até o momento, porém, só houve algumas reuniões de representantes de escalões inferiores para tentar definir procedimentos para eventuais negociações mais estruturadas.
Nesse meio tempo, a solicitação palestina à ONU foi analisada pelo Comitê de Novos Membros do Conselho de Segurança, que em seu relatório de 11 de novembro admitiu não haver consenso sobre o tema entre os integrantes do CS. Apesar do apoio dos países do Brics, que estão todos no Conselho, em particular do Brasil – a presidenta Dilma Rousseff manifestou inequivocamente sua posição favorável ao pleito palestino no discurso de abertura da Assembleia Geral, em setembro –, ao que tudo indica apenas oito de seus quinze membros votariam a favor, enquanto os EUA e seus aliados se oporiam ou absteriam.
A AP poderá ainda solicitar uma votação no CS ou saltar essa etapa para, posteriormente, levar a discussão à assembleia. No entanto, mesmo com o veto americano, seria importante conseguir o mínimo necessário de nove votos, expondo as posições dos integrantes do CS, para depois buscar os dois terços dos votos necessários na assembleia, o que permitiria aos palestinos, pelo menos, conquistar a posição de membro observador, dando-lhe direito de se tornar membro das diferentes instâncias e organismos do sistema ONU, como é atualmente a situação do Vaticano.
Mesmo com as atuais indefinições, não há dúvida que os palestinos marcaram pontos fundamentais no cenário internacional em favor de sua causa.
Kjeld Jakobsen é consultor em Cooperação e Relações Internacionais