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Medida que muito contribuiria para a higienização da política seria a votação de uma reforma política com o fim do financiamento privado de campanhas eleitorais

O Congresso Nacional, com a instalação da Comissão Mista Parlamentar de Inquérito (CPMI) para investigar práticas criminosas descobertas nas operações Vegas e Monte Carlo, da Polícia Federal, especialmente a relação do bicheiro Carlinhos Cachoeira com agentes públicos e empresas, tem a oportunidade histórica de propor medidas que aprofundem a transparência, combatam a corrupção, detalhem os conflitos de interesse e responsabilizem também os corruptores, além de explicitar os métodos de atuação de falsos moralistas, inclusive de agentes políticos e da imprensa.

No campo da transparência, cujos avanços são notáveis, sobretudo após a aprovação da Lei Geral de Acesso à Informação, uma das medidas recomendadas seria a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 50/2006, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), que acaba com o voto secreto em deliberações no Congresso, mesmo nos casos de cassação de mandatos.

No combate à corrupção, uma das medidas que muito contribuiriam para a higienização da política seria a votação de uma reforma política que eliminasse o financiamento privado de campanhas eleitorais, em especial o de pessoa jurídica, que faz do detentor de mandato quase refém do poder econômico. O parecer do deputado Henrique Fontana (PT-RS) a projeto enviado ao Congresso pelo ex-presidente Lula vai nessa direção.

Para os conflitos de interesse, o remédio é a aprovação pelo Senado do projeto de iniciativa do Poder Executivo, PLC nº 26/2012, já votado na Câmara, que classifica como agente público servidores e detentores de mandato para efeito de combate ao tráfico de influência e ao acesso e uso de informação privilegiada em proveito próprio ou de terceiros, além de ampliar os prazos de quarentena para ex-ocupantes de cargos estratégicos da administração pública.

Na punição aos corruptores, recomenda-se a aprovação do Projeto de Lei nº 6.826/2010, de iniciativa do Poder Executivo, que responsabiliza administrativa e civilmente pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública. A lei, que dá efetividade a três tratados internacionais antissuborno e anticorrupção ratificados pelo Brasil (convenções da Organização das Nações Unidas, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico e da Organização dos Estados Americanos), contribui para melhorar o padrão de integridade dos agentes públicos no desempenho de suas funções, bem como tornar a administração mais eficiente na prestação de serviços públicos e na prevenção e combate à corrupção e ao suborno, duas chagas da vida pública brasileira.

Finalmente, sem que faça disso o foco central, a CMPI deve também incluir entre suas prioridades o esclarecimento sobre a relação de veículos de comunicação com o contraventor Carlos Cachoeira, assim como a demora do Ministério Público em denunciar o senador Demóstenes Torres, cuja quebra de decoro já era conhecida pela Procuradoria-Geral da República desde 2009. Esses fatos precisam ser elucidados, de preferência de viva voz. Caso isso não seja viável, que pelo menos o faça por escrito. Mas a sociedade não pode ter dúvidas sobre a conduta do Ministério Público nem da imprensa.

Por tudo isso, a CPMI – que tem sido o principal tema de debate na sociedade, no governo e no Parlamento no momento – deve aproveitar a oportunidade para contribuir com o aperfeiçoamento das instituições políticas e administrativas e do padrão ético dos agentes públicos. De um lado, punindo com rigor os envolvidos, inclusive com cassação de mandato e responsabilização civil e criminal. De outro, propondo normas legais que impeçam ou dificultem a prática de delitos e crimes contra o erário e o interesse público, além de prestar os indispensáveis esclarecimentos sobre comportamentos dúbios de agentes públicos e setores da imprensa nesse episódio.

Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e diretor de documentação do Diap