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Com o avanço das críticas ao neoliberalismo, a defesa do socialismo volta a encontrar espaço

A crise do governo Fernando Henrique é parte de um cenário mundial de impasses e crescente contestação do projeto neoliberal, que está alterando a correlação de forças e o quadro geral das lutas políticas em benefício dos setores populares.

Não estamos frente a um simples desgaste eleitoral do governo, mas perante a crise da expressão nacional de um projeto internacional. Nosso programa e nosso discurso devem, para vencermos em 2002, estar balizado por estes dois aspectos.

Devemos ecoar e amplificar a contestação internacional da legitimidade da globalização neoliberal. Revoltas populares sucedem-se em diversos países, a instabilidade crescente da economia mundial retira legitimidade do projeto neoliberal e é visível desde fins de 1999, com as manifestações de Seattle, que começa a se organizar uma resistência internacional às políticas regressivas. Tudo isso já levou a vitórias importantes, como o bloqueio do "Acordo Multilateral de Investimentos" e da abertura de uma nova rodada de liberalização do comércio internacional na Organização Mundial do Comércio. A globalização das resistências ao neoliberalismo abre também a oportunidade para o desenvolvimento de um novo internacionalismo e, no interior deste movimento, para a reconstrução de uma alternativa socialista.

O processo é desigual, e os militantes que animam suas diversas frentes têm perspectivas distintas, mas o lema "o mundo não é uma mercadoria" ganha cada vez mais força. O Fórum Social Mundial mostrou que há amplas possibilidades de convergência deste movimento em torno da idéia de que um outro mundo é possível. A realização do Fórum Social em 2002 representará um maior esforço na formulação de alternativas e estas terão, certamente, incidência no debate eleitoral brasileiro.

A crise do governo Fernando Henrique é parte de um cenário mundial de impasses e crescente contestação do projeto neoliberal, que está alterando a correlação de forças e o quadro geral das lutas políticas em benefício dos setores populares.

Não estamos frente a um simples desgaste eleitoral do governo, mas perante a crise da expressão nacional de um projeto internacional. Nosso programa e nosso discurso devem, para vencermos em 2002, estar balizado por estes dois aspectos.

Devemos ecoar e amplificar a contestação internacional da legitimidade da globalização neoliberal. Revoltas populares sucedem-se em diversos países, a instabilidade crescente da economia mundial retira legitimidade do projeto neoliberal e é visível desde fins de 1999, com as manifestações de Seattle, que começa a se organizar uma resistência internacional às políticas regressivas. Tudo isso já levou a vitórias importantes, como o bloqueio do "Acordo Multilateral de Investimentos" e da abertura de uma nova rodada de liberalização do comércio internacional na Organização Mundial do Comércio. A globalização das resistências ao neoliberalismo abre também a oportunidade para o desenvolvimento de um novo internacionalismo e, no interior deste movimento, para a reconstrução de uma alternativa socialista.

O processo é desigual, e os militantes que animam suas diversas frentes têm perspectivas distintas, mas o lema "o mundo não é uma mercadoria" ganha cada vez mais força. O Fórum Social Mundial mostrou que há amplas possibilidades de convergência deste movimento em torno da idéia de que um outro mundo é possível. A realização do Fórum Social em 2002 representará um maior esforço na formulação de alternativas e estas terão, certamente, incidência no debate eleitoral brasileiro.

Devemos catalisar as aspirações de mudança de vastos setores da população, ampliadas pela crise de projeto do bloco no poder. As políticas neoliberais têm perdido espaço desde que a crise financeira internacional atingiu o país em 1998-99. A crise cambial abalou definitivamente a imagem de que a economia estava sob controle e o desgaste que isto representou para FHC não foi mais revertido, solapando a legitimidade do governo. Desde então, as mobilizações sociais têm crescido, com a retomada das lutas sindicais e no campo, a Marcha dos Cem Mil a Brasília em 1999, os protestos populares durante as comemorações dos 500 anos e as manifestações contra a corrupção e o "apagão" em junho deste ano. O resultado das eleições municipais do ano passado, quando o PT obteve importantes vitórias, já expressava este novo quadro político.

Neste ano aumentou o descrédito dos partidos que sustentam FHC, cada vez mais identificados com a corrupção. A crise energética assumiu o primeiro plano: o país descobriu que o governo ignorou sucessivos alertas para a gravidade da situação e toda a população está tendo que pagar o preço disso. E como a economia brasileira está cada vez mais vulnerável aos humores dos capitais especulativos, o cenário econômico internacional apenas promete dificuldades.

O governo está colhendo o que plantou. A corrupção, a dependência econômica e o enfraquecimento dos serviços públicos estatais são características centrais do modelo vigente.

O bloco no poder oferece a continuidade do modelo, visível na discussão sobre a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Com a Alca o Brasil perderá tudo que acumulou em meio século de construção nacional.

Nestes marcos, nosso programa e nosso discurso devem evidenciar os impasses a que as elites nos conduziram e mostrar que outro Brasil é urgente. Defender um outro Brasil significa, portanto, manter o ataque em toda escala ao neoliberalismo, ao governo federal, às forças que lhe dão sustentação e aos compromissos que firmou. Mas denunciar também os limites das oposições burguesas, seus compromissos conservadores e sua incapacidade de atender aos interesses das maiorias nacionais.

O PT estará tão mais preparado para o confronto eleitoral quanto mais definido e firme estiver em defesa dos interesses dos trabalhadores e dos setores populares, de uma política de alianças de esquerda e de um programa de reformas estruturais do país. Este programa só poderá ser realizado em confrontação com a aliança do latifúndio, dos oligopólios financeiros e do grande capital internacional, a base de sustentação do atual governo e do projeto neoliberal. Sua sustentação só pode ser assegurada pela participação política democrática de dezenas de milhões de homens e mulheres e seu envolvimento na implantação destas reformas, bem como pela solidariedade que despertar e puder catalisar no movimento contra a globalização neoliberal.

Abriu-se uma brecha para passarmos à ofensiva, derrotarmos o bloco no poder e assumirmos a direção do governo central e de um número maior de governos estaduais. O PT acumulou o patrimônio da resistência popular ao programa neoliberal, uma credibilidade que pode se expressar eleitoralmente na votação em nossos candidatos. Produzir uma alternativa de governo e mudar o país depende da aliança social e política que construirmos fundada num programa democrático e popular.

Lembremos que uma das conclusões extraídas do Fórum Social Mundial foi a de que "Davos e Porto Alegre representam dois projetos de civilização incompatíveis". Se não rompemos com a lógica atual do capitalismo, não apenas não poderemos resolver os problemas básicos sentidos pelo povo, como não evitaremos que se aprofundem.

Com o avanço das críticas ao neoliberalismo, a defesa do socialismo volta a encontrar espaço no debate político. Nossas propostas de transformação da sociedade se inscrevem em uma lógica coletiva, solidária, democrática, antimercantil e, portanto, socialista. Isso não é apenas uma perspectiva teórica, mas a lição decisiva que devemos tirar das experiências mais importantes que desenvolvemos aqui no Brasil.

Tem um caráter socialista a prática dos trabalhadores quando, por meio da luta, constroem formas de organização superiores, avançam em sua unidade e conquistam a independência política frente à burguesia. O mesmo se dá com a prática de participação popular das administrações petistas que colocam esta questão como central, onde o controle público sobre o Estado começa a ser exercido diretamente pela população. Nesta forma superior de democracia, o cidadão e a cidadã não mais limitam sua participação política ao ato de votar em dia de eleição, mas desenvolvem uma cidadania ativa em que, contra a lógica de uma sociedade capitalista, é reduzida a distância entre governantes e governados, são combatidos os preconceitos tecnocráticos e é criada uma nova cultura de participação e de responsabilidade coletivas no trato da coisa pública.

Temos, igualmente, desenvolvido experiências práticas de apropriação crítica dos frutos das inovações técnicas, por meio do controle do uso das plantas transgênicas ou da difusão generalizada dos softwares livres, através da conquista do acesso aos medicamentos necessários à vida ou do uso criativo da internet para a organização internacional da luta contra a globalização capitalista. E também tem um caráter socialista a prática de luta radical dos movimentos sociais, em que os excluídos atuam diretamente para transformar o mundo, mas onde também, quando vitoriosos em suas reivindicações imediatas, desenvolvem um aprendizado coletivo e constroem formas de economia solidária.

A síntese destas experiências exige um novo Estado para um novo país. Isso só será possível se formularmos claramente uma proposta de reorganização do Estado brasileiro segundo princípios democráticos, a partir de uma visão não liberal de democracia, assentada na garantia e na ampliação dos direitos, na crítica ao predomínio dos princípios mercantis, e na constituição de uma esfera pública cada vez mais estruturada por processos de democracia direta e participativa. Sem uma cultura que dignifique o que é público, sem questionar a fundo e abertamente os privilégios do grande capital e da grande propriedade fundiária, sem reconstruir as políticas sociais não é possível fazer um novo Brasil. É a partir de tudo isto que poderemos construir um novo modelo de desenvolvimento econômico e tecnológico sustentável, de crescimento com distribuição de renda e redução das desigualdades regionais.

Formulada para um país da periferia, nossa proposta tem de incorporar em seu centro os temas da soberania nacional e do apoio à construção de uma nova ordem internacional. A recusa à Alca deve dar o impulso para a retomada histórica de um projeto latino-americano independente do imperialismo norte-americano.

Joaquim Soriano é secretário nacional de Formação Política do PT.