Críticas da grande imprensa e de setores do Parlamento ao decreto presidencial têm outros objetivos que não a defesa de prerrogativas do Congresso
Críticas da grande imprensa e de setores do Parlamento ao decreto presidencial têm outros objetivos que não a defesa de prerrogativas do Congresso
A Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS), instituídos pelo Decreto nº 8.243, de 23 de maio de 2014, fazem parte da política de governança participativa, prática comum nos países democráticos e prevista na Constituição Federal brasileira. O decreto presidencial tem o mérito de sistematizar e organizar a participação de cidadãos e entidades nos conselhos consultivos e deliberativos, possibilitando maior articulação e interação do governo com a sociedade.
As críticas das forças conservadoras, capitaneadas pela grande imprensa brasileira e por setores do Parlamento, que chegaram a propor decretos legislativos para sustar os efeitos do instrumento presidencial na Câmara e no Senado Federal, têm outros objetivos que não a defesa de prerrogativas do Congresso Nacional ou da separação dos poderes.
Eles, os adversários, sabem que a sociedade e o governo ganham com a PNPS, conforme veremos a seguir, mas temem que a iniciativa governamental se constitua em precedente perigoso para a criação de outros mecanismos de controle social, como a regulação da mídia. Por isso, o interesse em derrotar o governo nessa matéria.
A sociedade ganha porque se beneficia de novas arenas de consulta, participação, deliberação e atuação, possibilitando o surgimento e o recrutamento de novas habilidades e capacidades para contribuir com o aperfeiçoamento das políticas públicas, além de garantir maior visibilidade e facilidade para a inserção de seus interesses na agenda governamental.
Para o governo, apesar de o Estado deixar de ser o único lócus de poder na sociedade, as vantagens são muitas e significativas, especialmente por assegurar legitimidade, lealdade e aderência às políticas públicas que resultarem de consenso em órgãos colegiados com participação da sociedade.
Além disso, esses mecanismos de participação preparam a burocracia para o novo momento de empoderamento da relação Estado-cidadão, tornando-a mais tolerante e menos desconfiada dos atores sociais.
Apesar de no Brasil, só no governo federal, existirem mais de 170 órgãos colegiados, com participação da sociedade, a cultura de participação e o nível de institucionalização ainda são muito baixos, o que reforça o mérito do decreto presidencial que organiza a política de participação social.
A interação do governo com a sociedade sempre foi e será uma necessidade no processo de formulação de políticas públicas, principalmente para alertar sobre riscos de omissão e/ou lacunas que poderiam ser facilmente equacionadas com um acompanhamento mais permanente por parte dos agentes econômicos e sociais.
A reação dos setores conservadores contra a PNPS, sob o fundamento de que invade competências do Congresso Nacional ou fere a separação dos poderes, chega a ser ridícula na medida em que se trata de uma instância de diálogo, de “concertação” e de fornecimento de subsídios ao governo federal na elaboração de políticas públicas no âmbito do Poder Executivo.
O temor de que PNPS sirva de pretexto para outras iniciativas mais ousadas, como a regulação da mídia, é tamanho que o presidente da Câmara pretende aproveitar os próximos esforços concentrados de julho e agosto para pautar o pedido de urgência para tentar votar e aprovar o Projeto de Decreto Legislativo nº 1.491/2014, de autoria do líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE), que susta a vigência do decreto presidencial.
Para fazer o contraponto às forças conservadoras, os setores populares e democráticos precisam defender a PNPS, sob pena de inviabilizar qualquer reforma futura com participação popular, além de tornar letra morta o artigo 1º da Constituição Federal, segundo o qual “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. O objetivo, portanto, é esclarecer a população e pressionar os parlamentares para evitar esse retrocesso, que seria a sustação dos efeitos do decreto presidencial.