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São muitos os filmes bem-sucedidos ao tratar de envelhecimento. Listamos aqui alguns mais recentes

Multiplicam-se os filmes sobre a velhice, suscitados pela ampliação da expectativa de vida nos últimos tempos, com número crescente de pessoas chegando aos 100 anos. O que também multiplica os problemas – de saúde, invalidez, perda de memória, empecilhos à locomoção, veto a morar sozinho, falta de recursos. Não se trata de um assunto fácil. Por isso a maioria dos filmes é pungente, enquanto outros podem até ser divertidos, dando azo a que se trate com humor um tema tão grave e incontornável como a finitude.
Amor (Amour)
Diretor: Michael Haneke – França/Áustria/Alemanha, 2012, 127 minutos

Um entrecho trágico conta com uma dupla de atores extraordinários: Jean-Louis Trintignant, um dos principais galãs da Nouvelle Vague, e Emmanuelle Rivas, a inesquecível atriz de Hiroshima, Meu Amor. Isabelle Huppert faz a filha do casal. Mostra como um casamento bem-sucedido a longo prazo mesmo assim é surpreendido pela rápida degenerescência de um dos cônjuges, por mais que o parceiro dê assistência. É ver o quanto o tema pode render nas mãos de um dos maiores diretores da atualidade. Palma de Ouro no Festival de Cannes e Oscar de melhor filme estrangeiro.

Longe Dela (Away from Her)
Direção: Sarah Polley – Canadá, 2006, 110 minutos

Julie Christie encarna mulher com doença de Alzheimer que, esquecida de tudo, se apaixona por outro homem no asilo, apesar da presença do marido, perplexo com a situação. O objeto desse amor é senil em estado irreversível, surdo-mudo e preso a uma cadeira de rodas. A jovem diretora se destaca por enfrentar assuntos difíceis e realizar excelentes filmes. Paralelamente, o documentário First Cousin Once Removed (EUA, 2012), do premiado diretor americano Alan Berliner, especialista em documentários, registra sem misericórdia a progressão do Alzheimer em Edwin Honig, poeta e crítico.

Ainda Adoráveis (Lovely, Still)
Diretor: Nicholas Fackler – EUA, 2008, 90 minutos

Também sob o signo do Alzheimer se desenrola este filme, sobre a descoberta tardia do amor por um casal já em plena velhice. Ellen Burstyn e Martin Landau vivem esse casal, mas o filme é inteiramente dominado pelo protagonista. A vida inteira esse ator teve uma carreira de coadjuvante, e quase sempre em filmes de segunda linha, com raras exceções. Aqui surpreende, num papel dificílimo, com todas as angústias de uma doença que avança (e nem uma só vez é mencionada), trazendo muito sofrimento, fazendo perder o pé na realidade. É uma verdadeira revelação de um grande ator, habituado a ser subaproveitado. O filme começa muito água com açúcar, até que aos poucos vai revelando sua terrível trama.

Sob a Figueira (Sous le Figuier)
Direção: Anne-Marie Etienne – França, 2012, 92 minutos

Show de interpretação de Gisèle Casadesus, na pessoa de uma velhinha com câncer que não quer morrer num hospital sob tratamentos dolorosos e humilhantes, mas cercada por agitação e movimento, pelo rumor da vida, enfim. Vai então passar o verão numa casa de campo francesa, daquelas rústicas e charmosas, que aparecem em tantos filmes de várias famílias que gozam férias juntas: trata-se de um clichê cinematográfico. Aqui detonado por causa da presença da morte e porque não há qualquer família convencional presente. Há um homem só com três filhas, uma mulher só sem filhos, uma mulher só com a filha que acaba de ser abandonada pelo marido. Veja-se que há apenas um elemento masculino, propositalmente, assim mesmo feminilizado pelo trato de três filhas. O filme é um encanto e mostra bem um ponto de vista de mulher.

E Se Vivêssemos Todos Juntos? (Et Si on Vivait Tous Ensemble?)
Direção: Stéphane Robelin – França/Alemanha, 2011, 96 minutos

Três homens e duas mulheres, amigos de longa data, ao aproximar-se a idade avançada que lhes tolhe os movimentos, percebem que recolher-se a um asilo é a alternativa que os aguarda. Por isso, e pensando bem, decidem-se a morar juntos numa espécie de comunidade que criam. Um divertido velho mulherengo e dois casais constituem o excêntrico coletivo. Com Jane Fonda e Geraldine Chaplin.

O Quarteto (Quartet)
Direção: Dustin Hoffman – Inglaterra, 2012, 98 minutos

Artistas aposentados das artes cênicas vivem na “Casa do Artista”, uma bela mansão no campo, na Inglaterra. Mas estão prestes a sofrer uma ação de despejo, por impostos atrasados. Resolvem por isso promover uma grande festa de Natal e encenar a ópera Rigoletto, visando angariar fundos para pagar as dívidas. Curiosa incursão do famoso ator pela direção. Com um naipe de esplêndidos veteranos dos palcos ingleses, capitaneados pela grande Maggie Smith num daqueles papéis antipáticos em que ela é perita.

 

O Exótico Hotel Marigold (The Best Exotic Marigold Hotel)
Direção: John Madden – Inglaterra, 2011, 124 minutos

Velhos ingleses vão passar feriados num hotel decadente na Índia, atraídos pelo exotismo, sem pensar no desconforto – mas o hotel nem de longe oferece o que promete, criando equívocos cômicos. As pessoas não se conhecem previamente, a não ser um casal. Os conflitos se manifestam e eclodem, levando a interessantes conjunturas, fazendo as pessoas encararem seus problemas, abrindo oportunidade para autoconhecimento e novas relações humanas. Novamente, temos veteranos da primeira linha da profissão, como Maggie Smith, Judi Dench, Bill Nighy, Tom Wilkinson.

O Desaparecimento de Giulia (La Disparition de Giulia)
Direção: Christoph Schaub – Suíça, 2009, 108 minutos

Temos aqui o raro prazer de ver um filme da Suíça, com elementos surrealistas e fantásticos. Três entrechos de festas de aniversário, em três gerações. Cheio de humor: variações sobre o tema de que a velhice torna a pessoa invisível, fartamente demonstrado pelo filme. Com um notável ator alemão, Bruno Ganz, que viu sua fama expandir-se ao interpretar Hitler, em A Queda. Premiado no festival de Locarno.

 

Amor Eterno Amor (Innocence)
Direção: Paul Cox – Austrália/Bélgica, 2000, 95 minutos

Belo filme, em que o reaparecimento de um amor de juventude perturba a vida de três velhos: ela, seu marido e aquele que ressurge do passado. Ela se apaixona novamente por ele e abandona o marido, provocando um cataclismo a seu redor, deixando todo mundo desnorteado.

 

 

O Amor Não Tem Fim (Late Bloomers)
Direção: Julie Gravas – França/Bélgica/Inglaterra, 2010, 95 minutos

Uma meditação sobre os males físicos e emocionais da idade avançada, concentrados num casal que se distanciou com o passar do tempo. Termina numa reconciliação que se pensaria impossível. Afora a mão da diretora, já provada em outras obras, o filme conta com os talentos de dois atores notáveis e não dos mais usuais, William Hurt e Isabella Rossellini.

 

Hanami: Cerejeiras em Flor (Kirschblüten – Hanami)
Diretor: Doris Dörrie – Alemanha, 2007, 127 minutos

Filme alemão sobre casal idoso em que a esposa morre inesperadamente, deixando o viúvo para enfrentar as consequências. Ela sempre quisera visitar o Japão na época da floração das cerejeiras, verdadeiro ritual coletivo em que o país inteiro se dirige aos parques para contemplá-las, cerimônia a que alude o título japonês “Hanami”. Por isso o viúvo enfrenta os filhos odiosos, que não entendem nada, e parte para o Japão, em preito ao desejo da falecida. Lembra um pouco o estilo do grande Ozu em Tokio Monogatari.

Mulheres de Meia-Idade (Les Grandes Chaleurs)
Direção: Sophie Lorain – Canadá, 2009, 99 minutos

Uma respeitável mulher de meia-idade perde (ou ganha) a cabeça por um rapaz de 20 anos, para escândalo de todos que a cercam. Divertidíssimo. Bom exemplo do excelente cinema canadense, lamentavelmente ausente de nossas telas. Faz pensar que muitos comportamentos menos convencionais com relação ao que a sociedade decreta como padrão feminino, e com isso a explicitação de muitas fantasias, estão aparecendo em filmes dirigidos por mulheres. Pense-se em Lolita, por exemplo, e seu significado para espectadores homens. Vale a pena ficar atento a novos desenvolvimentos.

Mil Anos de Orações (A Thousand Years of Good Prayers)

Direção: Wayne Wang – EUA, 2007, 83 minutos

Como se fosse insuficiente o já de si espinhoso tema da velhice, o filme aborda-a pela perspectiva de um duplo conflito: entre gerações mas também entre culturas. Velho chinês e velha russa conversam num banco de jardim, nos Estados Unidos. Balbuciam algumas palavras em inglês, poucas mas suficientes para se entenderem, sobre suas experiências no Novo Mundo e com os filhos adultos. O chinês, cientista de foguetes cujo passado esconde um segredo, ao aposentar-se resolveu conhecer o país e visitar a filha divorciada que lá vive. É uma presença intrusiva e exigente que, com base em costumes tradicionais, espiona a filha e cobra seu comportamento, esperando no ponto de ônibus a última corrida da noite sob pretexto de protegê-la. Ela chega de carro com o namorado, que escondia do pai. Profissional realizada e independente, não suporta que o pai a trate como uma garotinha. Afinal, ela pede que ele continue a projetada viagem pelo país. O pai pensa ser óbvio que uma mulher divorciada foi trocada por outra, e fica confuso quando descobre que foi ela quem deixou o marido por outro homem – coisa impensável para ele. Cineasta independente, autor de filmes pequenos, Wayne Wang, nascido em Hong Kong e naturalizado americano já adulto, faz filmes sobre os chineses de hoje sobretudo na diáspora, e já ganhou muitos prêmios. Com Henry O (incomparável como o velho chinês, com uma máscara de expressões sutis e notável linguagem corporal), Faye Yue (a filha americanizada), Vida Ghahremani (a velha russa). Premiado nos festivais de Berlim e de San Sebastián.

Walnice Nogueira Galvão é professora emérita da FFLCH da USP e integra o Conselho de Redação de Teoria e Debate

Walnice Nogueira Galvão é professora emérita da FFLCH da USP e integrante do Conselho de Redação de Teoria e Debate