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Neste segundo mandato, o governo deve ter uma nova postura diante dos problemas estruturais

O segundo governo Lula exigirá uma nova postura diante dos problemas estratégicos da comunicação no que se refere tanto às políticas públicas quanto às relações com jornalistas e a grande mídia.

Essa nova postura implica de imediato uma reforma administrativa.

Hoje a formulação das políticas públicas de comunicações está diluída entre a Casa Civil, o MinC e o MiniCom. A ausência de responsabilidades definidas só aumenta a inércia e as possibilidades de divergências entre propostas de diferentes ministérios. Da mesma forma, as relações com as empresas de mídia, incluindo a distribuição dos recursos publicitários, e o serviço de assessoria de imprensa estão diluídos entre a Secretaria de Comunicação – na Secretaria Geral desde a crise política de 2005 – e a Secretaria de Imprensa, vinculada ao Gabinete do presidente.

Em relação às políticas públicas, quatro áreas são prioritárias. Primeiro, a regulação da mídia eletrônica. Entramos 2007 no mesmo ambiente de caos regulatório que tem prevalecido há anos. O Código Brasileiro de Telecomunicações, desatualizado e fragmentado, completará 45 anos em outubro, regulando (ou deixando de regular) um setor em que os avanços tecnológicos fazem com que novas práticas se tornem obsoletas em poucos meses. Não temos uma lei geral de comunicação eletrônica de massa e nem sequer um projeto de lei. O GTI criado para tratar do assunto nunca chegou a se reunir.

Uma segunda prioridade são as rádios comunitárias, que continuam regidas pela segregacionista Lei n° 9.612/98. A atividade permanece reprimida de forma gritantemente assimétrica em relação a dezenas de concessionários da radiodifusão comercial que funcionam de modo precário e sem a renovação de suas outorgas. As comunitárias continuam a sofrer repressão constante da Anatel e da Polícia Federal, inclusive emissoras que já existiam e prestavam serviço público de qualidade a suas comunidades antes da lei. O fato de terem seu trabalho reconhecido – e até premiado – por instituições públicas brasileiras e internacionais e de virem tentando se legalizar de acordo com a kafkiana burocracia exigida pelo MiniCom não tem impedido a repressão.

Uma terceira prioridade se refere à digitalização da radiodifusão. Não há garantias de que a escolha do padrão tecnológico ISDB japonês vá cumprir as promessas democratizadoras alimentadas pelo Decreto n° 4.901/2003, que criou o SBTVD-T. O decreto tinha como objetivos, entre outros, a democratização da informação, a promoção da diversidade cultural, o desenvolvimento da indústria e tecnologia nacionais, a inclusão social e a participação da sociedade civil. Hoje, o próprio Ministério Público move ação contra a escolha do modelo japonês.

E, por fim, é prioritário o apoio à criação de um sistema público de mídia que ofereça uma alternativa de qualidade e complemente – como manda a Constituição – o sistema privado comercial historicamente dominante. O primeiro passo nessa direção está sendo dado pelo MinC e pela Radiobrás, que articulam a realização do I Fórum Nacional de TVs Públicas, em fevereiro. A iniciativa conta com a participação das associações de TVs educativas, universitárias, legislativas e comunitárias e de setores da sociedade civil.

No que se refere às relações com jornalistas e com a grande mídia, uma das expectativas é de que serão cumpridas as promessas do presidente de tornar permanentes as entrevistas coletivas. Isso ajudaria a distender o tensionamento agravado pela cobertura claramente desequilibrada que a grande mídia privada ofereceu tanto da crise política quanto dos dois turnos da eleição presidencial.

Essas são prioridades mínimas de ação para um governo democrático-popular no setor de comunicações, cada vez mais decisivo para a política e a governabilidade nas sociedades contemporâneas.

Venício A. de Lima é sociólogo e jornalista, autor de Mídia: Crise Política e Poder no Brasil