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A mídia está na agenda pública: nos movimentos sociais, universidades, sindicatos, nos partidos políticos.

A mídia está na agenda pública: nos movimentos sociais, nas universidades, nos sindicatos, nos partidos políticos, nas igrejas. E não faltam fatos novos para reforçar a necessidade de repensar o modelo geral de organização do setor de comunicações. Três recentes: a anunciada criação da Empresa Brasil de Comunicação, a proposta de instalação da CPI da Abril-Telefónica na Câmara dos Deputados e o novo canal de notícias Record News.

1. A confirmação pelo governo da indicação de conhecidos(as) jornalistas oriundos(as) da mídia privada para ocupar cargos de comando na estrutura administrativa e de jornalismo da nova empresa pública de comunicação tem levantado questões sobre o risco de repetir ali os mesmos modelos – e problemas – das emissoras comerciais. Da mesma forma que não se deseja uma comunicação estatal disfarçada de pública, também não se pretende uma empresa pública funcionando como empresa privada e comercial. Dessa forma, fica cada vez mais clara a necessidade fundamental de que existam mecanismos democráticos de controle sobre a comunicação pública – seriam os conselhos curador e fiscal? – para que ela não se desvirtue do caminho de autonomia e independência, tanto do mercado quanto do Estado.

2. A não instalação na Câmara dos Deputados (até a redação deste texto, em 1º de outubro) da CPI sobre a venda da TVA do Grupo Abril para o Grupo Telefónica de Espanha suscita, por seu lado, questões intrigantes. O lobby da Abril conseguiu que 22 deputados de vários partidos que já haviam assinado o pedido de instalação da CPI encaminhassem (sem  sucesso) à Mesa Diretora pedido de retirada de seus nomes. Alguns deputados que nem sequer haviam assinado o requerimento também fizeram o pedido, aparentemente, para que se registrasse formalmente sua recusa em participar da iniciativa.

Que poder formidável é esse que consegue mudar a posteriori a decisão de tantos deputados e, mais ainda, adia (ou impede?) a instalação de uma CPI cujo requerimento foi subscrito por 182 deputados de 15 dos 19 partidos com representação na Câmara e segue as regras estabelecidas na Casa? Por que não se pode investigar a transparência de uma instituição que julga seu dever cobrar transparência de todas as outras e atribui a si mesma a legitimidade de agir como tal?

Na verdade, uma CPI sobre a transação da Abril com a Telefónica quase certamente provocaria também a investigação da compra da NET pela Telmex, uma vez que, segundo a própria Abril, as transações comerciais são análogas.

3. Um dos poucos limites existentes para a concentração da propriedade na radiodifusão brasileira é o estabelecido pelo artigo 14 do Decreto n° 52.795/63 (com a redação dada pelo Decreto n° 2.108/96), isto é, a proibição de que uma entidade ou as pessoas que integram seu quadro societário e diretivo detenham, na mesma localidade, outorga do mesmo tipo de serviço de radiodifusão.

Estaria essa norma legal sendo cumprida? Como fica o novo canal aberto de notícias da Rede Record, recentemente inaugurado em São Paulo com a presença do presidente da República, do governador do estado e do prefeito de São Paulo? Quem não sabe que os grupos Bandeirantes e Globo controlam concessões de rádio na mesma localidade?

A resposta da Record é de que ela possui em São Paulo uma outorga de geradora e uma de retransmissora, o que não configuraria a duplicidade proibida, mesmo que todos saibamos que a retransmissora é, de fato, uma geradora.

Questões como essas potencializam a necessidade inadiável de uma conferência nacional, plural e democrática que, a exemplo de outras já realizadas com sucesso para setores como educação e saúde, defina os parâmetros para um novo marco regulatório das comunicações.

E é exatamente isso que está sendo reivindicado por um número cada vez maior de brasileiros, em todo o país.

Venício A. de Lima é sociólogo e jornalista, autor de A Mídia nas Eleições de 2006